Ausencia
Lúgubre solidão! Ó noite triste!
Como sinto que falta a tua Imagem
A tudo quanto para mim existe!Tua bemdita e efémera passagem
No mundo, deu ao mundo em que viveste,
Á nossa bôa e maternal Paisagem,Um espirito novo mais celeste;
Nova Forma a abraçou e nova Côr
Beijou, sorrindo, o seu perfil agreste!E ei-la agora tão triste e sem verdor!
Depois da tua morte, regressou
Ao seu velhinho estado anterior.E esta saudosa casa, onde brilhou
Tua voz num instante sempiterno,
Em negra, intima noite se occultou.Quando chego á janela, vejo o inverno;
E, á luz da lua, as sombras do arvoredo
Lembram as sombras pálidas do Inferno.Dos recantos escuros, em segredo,
Nascem Visões saudosas, diluidos
Traços da tua Imagem, arremêdoQue a Sombra faz, em gestos doloridos,
Do teu Vulto de sol a amanhecer…
A Sombra quer mostrar-se aos meus sentidos…Mas eu que vejo? A luz escurecer;
O imperfeito, o indeciso que, em nós, deixa
A amargura de olhar e de não vêr…
Passagens sobre Alegria
882 resultadosNão te Queixes
Não te queixes. Recolhe em ti a amargura, não a disperses, não a esbanjes com os outros. Ela é tua, nasceu de ti, da tua miséria, pertence-te como os ossos e as vísceras. Concentra-te nela, absorve-a, faz dela a tua grandeza. Porque só se é grande pelo sofrimento, não pela futilidade do prazer. As pedras não sofrem, Cristo esteve «triste até à morte». Tem desprezo pelos homens felizes, porque dos homens felizes «não reza a história». Só a dor pode medir o teu tamanho de excepção, só ela pode medir o que tu vales. O sofrimento medíocre não dá mais do que a comédia, mas a grandeza da tragédia só pode atribuir-se aos grandes. Não te aconselho a que vás ao encontro da amargura, mas se ela vier ter contigo, acolhe-a com serenidade. Não sucumbas aos seus golpes, aguenta-os até onde puderes. E se és homem de verdade, tu a aguentarás.
Também as grandes alegrias são do destino dos grandes, porque elas são irmãs dos grandes sofrimentos. Só os pequenos e mesquinhos se alegram e sofrem com o que é mesquinho e pequeno. Aquilo que é pequeno é imperceptível a quem o não é. Que juízo fazem de ti,
A tristeza é uma doença, a alegria é um veneno.
Escravizados ao Além
Acabar com a morte como agonia diária da humanidade é talvez o maior bem que se pode fazer hoje ao homem. O cristianismo transformou a vida numa cruz, porque lhe pôs a consciência da morte à cabeceira. E crentes e ateus vivem no mesmo terror. Ora a ideia terrífica do fim não é uma condição fisiológica, nem mesmo intelectual do homem. Nem os Gregos, nem os Romanos, por exemplo, sentiam a morte com a irreparável angústia que nos rói. É forçoso, pois, que se arranquem as raízes desta dor, custe o que custar. Escravizados ao além, os nossos dias aqui não podem ter liberdade nem alegria. Qualquer doutrina que nega ao homem o direito de ser pleno na sua física duração, é uma doutrina de castração e de aniquilamento. Ir buscar ao post-mortem as leis que devem limitar a expansão abusiva da personalidade, é o artifício mais desgraçado que se podia inventar. Pregue-se e exija-se do indivíduo medida e disciplina, mas que nasçam da sua própria harmonia. Institua-se uma ética com raízes no mesmo chão onde o homem caminha.
O homem hoje, para ser salvo, só tem necessidade de uma coisa: abrir o coração à alegria.
Sonho Branco
De linho e rosas brancas vais vestido,
Sonho virgem que cantas no meu peito!…
És do Luar o claro deus eleito,
Das estrelas puríssimas nascido.Por caminho aromal, enflorescido,
Alvo, sereno, límpido, direito,
Segues radiante, no esplendor perfeito,
No perfeito esplendor indefinido…As aves sonorizam-te o caminho…
E as vestes frescas, do mais puro linho
E as rosas brancas dão-te um ar nevado…No entanto, Ó Sonho branco de quermesse!
Nessa alegria em que tu vais, parece
Que vais infantilmente amortalhado!
Nada Nos Falta, porque Nada Somos
Ao longe os montes têm neve ao sol,
Mas é suave já o frio calmo
Que alisa e agudece
Os dardos do sol alto.Hoje, Neera, não nos escondamos,
Nada nos falta, porque nada somos.
Não esperamos nada
E temos frio ao sol.Mas tal como é, gozemos o momento,
Solenes na alegria levemente,
E aguardando a morte
Como quem a conhece.
O amor e a paixão não nos fazem necessariamente felizes, mas são uma festa e uma alegria porque deles podemos esperar ao menos isto: que eles nos tornem um pouco outros, que eles nos mudem.
Repouso na Alegria Comedido
Leda serenidade deleitosa,
Que representa em terra um paraíso;
Entre rubis e perlas, doce riso,
Debaixo de ouro e neve, cor-de-rosa;Presença moderada e graciosa,
Onde ensinando estão despejo e siso
Que se pode por arte e por aviso,
Como por natureza, ser formosa;Fala de que ou já vida, ou morte pende,
Rara e suave, enfim, Senhora, vossa,
Repouso na alegria comedido:Estas as armas são com que me rende
E me cativa Amor; mas não que possa
Despojar-me da glória de rendido.
A alegria verdadeira não tem explicação possível, não tem a possibilidade de ser compreendida – e se parece com o início de uma perdição irrecuperável.
Eu amo tudo que foi
Tudo o que já não é
A dor que já não me dói
A antiga e errônea fé
O ontem que deixou alegria
Só porque foi,e voou
E hoje é já outro dia
Silêncio, Nostalgia…
Silêncio, nostalgia…
Hora morta, desfolhada,
sem dor, sem alegria,
pelo tempo abandonada.Luz de Outono, fria, fria…
Hora inútil e sombria
de abandono.
Não sei se é tédio, sono,
silêncio ou nostalgia.Interminável dia
de indizíveis cansaços,
de funda melancolia.
Sem rumo para os meus passos,
para que servem meus braços,
nesta hora fria, fria?
Toda a educação, no momento, não parece motivo de alegria, mas de tristeza
Toda a educação, no momento, não parece motivo de alegria, mas de tristeza. Depois, no entanto, produz naqueles que assim foram exercitados um fruto de paz e de justiça.
Acordando
Em sonho, às vezes, se o sonhar quebranta
Este meu vão sofrer; esta agonia,
Como sobe cantando a cotovia,
Para o céu a minh’alma sobe e canta.Canta a luz, a alvorada, a estrela santa,
Que ao mundo traz piedosa mais um dia…
Canta o enlevo das cousas, a alegria
Que as penetra de amor e as alevanta…Mas, de repente, um vento humido e frio
Sopra sobre o meu sonho: um calafrio
Me acorda. — A noite é negra e muda: a dorCá vela, como d’antes, ao meu lado…
Os meus cantos de luz, anjo adorado,
São sonho só, e sonho o meu amor!
A única alegria no mundo é começar. É bom viver porque viver é começar sempre, a cada instante.
A alegria que se tem em pensar e aprender faz-nos pensar e aprender ainda mais.
E tudo aquilo – todas esta frescura lenta da manhã leve, era análogo a uma alegria que ele nunca pudera ter.
Bem Supremo e Razão
Quando a experiência me ensinou que os acontecimentos ordinários da vida são fúteis e vãos e me apercebi de que tudo que era para mim causa ou objecto de receio não tem em si mesmo nada de bom ou de mau, a não ser na medida da comoção que excita na alma, resolvi, finalmente, indagar se existia um bem verdadeiro e susceptível de se comunicar, qualquer coisa enfim cuja descoberta e posse me trouxessem para sempre um júbilo continuo e soberano.
(…) O que nos ocupa mais frequentemente na vida e que os homens, como pode concluir-se dos seus actos, consideram ser o bem supremo pode reduzir-se a três coisas: riqueza, fama, prazer dos sentidos.
Ora cada um deles distrai o espírito de tal modo que mal pode pensar noutro bem. (…)
– Pelo prazer sensual se detém a alma como se repousasse num bem verdadeiro, o que a impede em absoluto de pensar noutra coisa; após o prazer vem a extrema tristeza, que, se não suspende o pensamento, perturba e embota. A busca da fama e da riqueza não absorve menos o espírito, sobretudo quando a riqueza é desejada por si mesma, conferindo-lhe, então, a categoria de bem supremo.
Nós, poetas, na nossa mocidade começamos com alegria,
Mas daí passamos finalmente ao desalento e à loucura.
Alegria
Já ouço gritos ao longe
Já diz a voz do amor
A alegria do corpo
O esquecimento da dorJá os ventos recolheram
Já o verão se nos oferece
Quantos frutos quantas fontes
Mais o sol que nos aqueceJá colho jasmins e nardos
Já tenho colares de rosas
E danço no meio da estrada
As danças prodigiosasJá os sorrisos se dão
Já se dão as voltas todas
Ó certeza das certezas
Ó alegria das bodas