Passagens sobre Aranhas

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Sepultura d’um Poeta Maldito

Se, em noite horrorosa, escura,
Um cristão, por piedade,
te conceder sepultura
Nas ruínas d’alguma herdade,

As aranhas hão-de armar
No teu coval suas teias,
E nele irão procriar
Víboras e centopeias.

E sobre a tua cabeça,
A impedi-la que adormeça.
– Em constantes comoções,

Hás-de ouvir lobos uivar,
Das bruxas o praguejar,
E os conluios dos ladrões.

Tradução de Delfim Guimarães

Que este Amor não me Cegue

Que este amor não me cegue nem me siga.
E de mim mesma nunca se aperceba.
Que me exclua do estar sendo perseguida
E do tormento
De só por ele me saber estar sendo.
Que o olhar não se perca nas tulipas
Pois formas tão perfeitas de beleza
Vêm do fulgor das trevas.
E o meu Senhor habita o rutilante escuro
De um suposto de heras em alto muro.

Que este amor só me faça descontente
E farta de fadigas. E de fragilidades tantas
Eu me faça pequena. E diminuta e tenra
Como só soem ser aranhas e formigas.

Que este amor só me veja de partida.

Pequenos Poemas Mentais

Mental: nada, ou quase nada sentimental.

I

Quem não sai de sua casa,
não atravessa montes nem vales,
não vê eiras
nem mulheres de infusa,
nem homens de mangual em riste, suados,
quem vive como a aranha no seu redondel
cria mil olhos para nada.
Mil olhos!
Implacáveis.
E hoje diz: odeio.
Ontem diria: amo.
Mas odeia, odeia com indômitos ódios.
E se se aplaca, como acha o tempo pobre!
E a liberdade inútil,
inútil e vã,
riqueza de miseráveis.

II

Como sempres, há-de-chegar, desde os tempos!
Vozes, cumprimentos, ofegantes entradas.
Mas que vos reunirá, pensamentos?
Chegais a existir, pensamentos?
É provável, mas desconfiados e inválidos,
Rosnando estúpidos, com cães.

Ó inúteis, aquietai-vos!
Voltai como os cães das quintas
ao ponto da partida, decepcionados.
E enrolai-vos tristonhos, rabugentos, desinteressados.

III

Esse gesto…
Esse desânimo e essa vaidade…
A vaidade ferida comove-me,
comove-me o ser ferido!

A vaidade não é generosa, é egoísta,
Mas chega a ser bela,

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As leis são como as teias de aranha que apanham os pequenos insectos e são rasgadas pelos grandes.

(dream)

Qualquer coisa de obscuro permanece
No centro do meu ser. Se me conheço,
É até onde, por fim mal, tropeço
No que de mim em mim de si se esquece.

Aranha absurda que uma teia tece
Feita de solidão e de começo
Fruste, meu ser anónimo confesso
Próprio e em mim mesmo a externa treva desce.

Mas, vinda dos vestígios da distância
Ninguém trouxe ao meu pálio por ter gente
Sob ele, um rasgo de saudade ou ânsia.

Remiu-se o pecador impenitente
À sombra e cisma. Teve a eterna infância,
Em que comigo forma um mesmo ente.

Os Comunistas

… Passaram bastantes anos desde que ingressei no Partido… Estou contente… Os comunistas constituem uma boa família… Têm a pele curtida e o coração valoroso… Por todo o lado recebem pauladas… Pauladas exclusivamente para eles… Vivam os espiritistas, os monárquicos, os aberrantes, os criminosos de vários graus… Viva a filosofia com fumo mas sem esqueletos… Viva o cão que ladra e que morde, vivam os astrólogos libidinosos, viva a pornografia, viva o cinismo, viva o camarão, viva toda a gente menos os comunistas… Vivam os cintos de castidade, vivam os conservadores que não lavam os pés ideológicos há quinhentos anos… Vivam os piolhos das populações miseráveis, viva a força comum gratuita, viva o anarco-capitalismo, viva Rilke, viva André Gide com o seu coribantismo, viva qualquer misticismo… Tudo está bem… Todos são heróicos… Todos os jornais devem publicar-se… Todos devem publicar-se, menos os comunistas… Todos os políticos devem entrar em São Domingos sem algemas… Todos devem festejar a morte do sanguinário Trujillo, menos os que mais duramente o combateram… Viva o Carnaval, os derradeiros dias do Carnaval… Há disfarces para todos… Disfarces de idealistas cristãos, disfarces de extrema-esquerda, disfarces de damas beneficentes e de matronas caritativas… Mas, cuidado, não deixem entrar os comunistas…

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A felicidade não passa de um sonho, e a dor é real… Há oitenta anos que o sinto. Quanto a isso, não posso fazer outra coisa senão me resignar, e dizer que as moscas nasceram para serem comidas pelas aranhas e os homens para serem devorados pelo pesar.

Os Deuses Reclinados

… Por todos os lados as estátuas de Buda, de Lorde Buda… As severas, verticais, carcomidas estátuas, com um dourado de resplendor animal, com uma dissolução como se o ar as desgastasse… Crescem-lhes nas faces, nas pregas das túnicas, nos cotovelos, nos umbigos, na boca e no sorriso pequenas máculas: fungos, porosidades, vestígios excrementícios da selva… Ou então as jacentes, as imensas jacentes, as estátuas de quarenta metros de pedra, de granito areento, pálidas, estendidas entre as sussurrantes frondes, inesperadas, surgindo de qualquer canto da selva, de qualquer plataforma circundante… Adormecidas ou não adormecidas, estão ali há cem anos, mil anos, mil vezes mil anos… Mas são suaves, com uma conhecida ambiguidade ultraterrena, aspirando a ficar e a ir-se embora… E aquele sorriso de suavíssima pedra, aquela majestade imponderável, mas feita de pedra dura, perpétua, para quem sorriem, para quem, sobre a terra sangrenta?… Passaram as camponesas que fugiam, os homens do incêndio, os guerreiros mascarados, os falsos sacerdotes, os turistas devoradores…

E manteve-se no seu lugar a estátua, a imensa pedra com joelhos, com pregas na túnica de pedra, com o olhar perdido e não obstante existente, inteiramente inumana e de alguma forma também humana, de alguma forma ou de alguma contradição estatuária,

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O jornalista atribui a si mesmo uma missão, e essa missão tem notáveis semelhanças com uma operação de guerra: trata-se de conquistar audiências, bombardear com notícias num tempo precioso e milimetricamente calculado. O jornalista está em cima do acontecimento como se o evento fosse um alvo preciso. O acontecimento é a presa dessa aranha que é o repórter, nessa teia noticiosa que dá a volta ao planeta.

Maldade Eterna

É difícil, a vida do pecador. Deus fez este mundo, mas não o fez a contento de todos, pois não?
Não me parece que ele estivesse a pensar muito em mim.
Pois, disse o velho. Mas em que é que as ideias de um homem o ajudam? Que mundos viu ele que preferia a este?
Consigo imaginar lugares melhores e melhores costumes.
E vossemecê consegue fazê-los existir?
Não.
Não. É um mistério. Um homem vê-se em palpos de aranha para entender a própria mente porque só tem a própria mente para entendê-la. Pode entender o próprio coração, mas não quer. E faz muito bem. O melhor é nem espreitar lá para dentro. Não é o coração de uma criatura que esteja no caminho que Deus lhe traçou. Encontra-se ruindade na mais mesquinha das criaturas, mas quando Deus criou o homem tinha o diabo à sua ilharga. Uma criatura capaz de tudo, capaz de criar uma máquina e uma máquina para criar a máquina. E maldade que se perpetua sozinha durante um milhar de anos, sem ser preciso alimentá-la. Vossemecê acredita nisso?
Não sei.
Pois acredite.

A Vida Oblíqua

Só agora pressenti o oblíquo da vida. Antes só via através de cortes retos e paralelos. Não percebia o sonso traço enviesado. Agora adivinho que a vida é outra. Que viver não é só desenrolar sentimentos grossos — é algo mais sortilégico e mais grácil, sem por isso perder o seu fino vigor animal. Sobre essa vida insolitamente enviesada tenho posto minha pata que pesa, fazendo assim com que a existência feneça no que tem de oblíquo e fortuito e no entanto ao mesmo tempo sutilmente fatal. Compreendi a fatalidade do acaso e não existe nisso contradição.

A vida oblíqua é muito íntima. Não digo mais sobre essa intimidade para não ferir o pensar-sentir com palavras secas. Para deixar esse oblíquo na sua independência desenvolta.
E conheço também um modo de vida que é suave orgulho, graça de movimentos, frustração leve e contínua, de uma habilidade de esquivança que vem de longo caminho antigo. Como sinal de revolta apenas uma ironia sem peso e excêntrica. Tem um lado da vida que é como no inverno tomar café num terraço dentro da friagem e aconchegada na lã.
Conheço um modo de vida que é sombra leve desfraldada ao vento e balançando leve no chão: vida que é sombra flutuante,

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Nada Vale Nada

Aqui tenho à mesa de cabeceira o último livro ainda a cheirar à tinta da tipografia. Não há dúvida nenhuma que o concebi, que o realizei, e que, depois disso, com os magros vinténs que vou ganhando por estes montes, consegui pô-lo em letra redonda — a forma material máxima que se pode dar a um escrito. E, contudo, olho esta realidade que eu tirei do nada, que bem ou mal arranquei de mim, com o mesmo desânimo com que olho uma teia de aranha. E não é por saber de antemão que o livro vai ser abocanhado ou ignorado. Não obstante a lei natural que aconselha a que não haja homem sem homem, é preciso que a santa cegueira do artista lhe dê a força bastante para, em última análise, ficar só e confiante. Ora eu tenho, como artista, essa cegueira. O meu desalento vem duma voz negativa que me acompanha desde o berço e que nas piores horas diz isto: Nada, em absoluto, vale nada.