Passagens sobre Olhar

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Frases sobre olhar, poemas sobre olhar e outras passagens sobre olhar para ler e compartilhar. Leia as melhores citações em Poetris.

Nós todos somos turistas, algum dia. Mesmo o mais pobrezinho um dia toma um ônibus e vai para o interior, visitar uma avó; […] Quem é que não precisa de contato com a natureza, um banho de cachoeira, um castelo na areia, uma caminhada nas matas, olhar as vaquinhas no pasto, sentir o vento debaixo de um coqueiral, tomar uma cervejinha com os pés nas águas frias do maceió? […] Quebrar a rotina, ver novas paisagens, novos comportamentos, esquecer os problemas, as regras, o frio, a neve, a parede da própria casa, a janela que dá para outra janela, o cimento diante de cimento…

A Esmola De Dulce

Ao Alfredo A.

E todo o dia eu vou como um perdido
De dor, por entre a dolorosa estrada,
Pedir a Dulce, a minha bem amada,
A esmola dum carinho apetecido.

E ela fita-me, o olhar enlanguescido,
E eu balbucio trêmula balada:
– Senhora, dai-me u’a esmola – e estertorada
A minha voz soluça num gemido.

Morre-me a voz, e eu gemo o último harpejo,
Estendo à Dulce a mão, a fé perdida,
E dos lábios de Dulce cai um beijo.

Depois, como este beijo me consola!
Bendita seja a Dulce! A minha vida
Estava unicamente nessa esmola.

Existem momentos na vida onde a questão de saber se se pode pensar diferentemente do que se pensa, e perceber diferentemente do que se vê, é indispensável para continuar a olhar ou a refletir.

O verdadeiro lugar de nascimento é aquele em que lançamos pela primeira vez um olhar inteligente sobre nós mesmos: minhas primeiras pátrias foram os livros. Em menor escala, as escolas.

A verdade só pede olhos que a vejam. O pior é quando as pessoas teimam em olhar para o outro lado…

Soneto De Intimidade

Nas tardes da fazenda há muito azul demais.
Eu saio às vezes, sigo pelo pasto agora
Mastigando um capim, o peito nu de fora
No pijama irreal de há três anos atrás.

Desço o rio no vau dos pequenos canais
Para ir beber na fonte a água fria e sonora
E se encontro no mato o rubro de uma amora
Vou cuspindo-lhe o sangue em torno dos currais.

Fico ali respirando o cheiro bom do estrume
Entre as vacas e os bois que me olham sem ciúme
E quando por acaso uma mijada ferve

Seguida de um olhar não sem malícia e verve
Nós todos, animais sem comoção nenhuma
Mijamos em comum numa festa de espuma.

Este Não-Futuro que a Gente Vive

Será que nos resta muito depois disto tudo, destes dias assim, deste não-futuro que a gente vive? (…) Bom, tudo seria mais fácil se eu tivesse um curso, um motorista a conduzir o meu carro, e usasse gravatas sempre. Às vezes uso, mas é diferente usar uma gravata no pescoço e usá-la na cabeça. Tudo aconteceu a partir do momento em que eu perdi a noção dos valores. Todos os valores se me gastaram, mesmo à minha frente. O dinheiro gasta-se, o corpo gasta-se. A memória. (…) Não me atrai ser banqueiro, ter dinheiro. Há pessoas diferentes. Atrai-me o outro lado da vida, o outro lado do mar, alguma coisa perfeita, um dia que tenha uma manhã com muito orvalho, restos de geada… De resto, não tenho grandes projectos. Acho que o planeta está perdido e que, provavelmente, a hipótese de António José Saraiva está certa: é melhor que isto se estrague mais um bocadinho, para ver se as pessoas têm mais tempo para olhar para os outros.

O Homem Amesquinhado

Apesar do quadro negro de uma cúpula política e intelectual desvairada e grossa e de um povo abandonado a seu próprio destino, ainda havia ali, no país, naquele espantoso verão de 1955, uma considerável energia vital, uma exaltada alegria de viver, acentuada, em alguns lugares e num ou noutro indivíduo, ainda mais possuído do gozo pleno de um extraodinário senso lúdico tropical. Estávamos, poderíamos nos considerar como estando, num dos últimos redutos do ser humano. Depois disso viria o fim, não, como todos pensavam, com um estrondo, mas com um soluço. A densa nuvem desceria, não, como todos pensavam, feita de moléculas radioativas, mas da grosseria de todos os dias, acumulada, aumentada, transmitida, potenciada. O homem se amesquinharia, vítima da mesquinharia do seu semelhante, cada dia menos atento a um gesto de gentileza, a um ato de beleza, a um olhar de amor desinteressado, a uma palavra dita com uma precisa propriedade. E tudo começou a ficar densamente escuro, porque tudo era terrivelmente patrocinado por enlatadores de banha, fabricantes de chouriço e vendedores de desodorante, de modo que toda a pretensa graça da vida se dirigia apenas à barriga dos gordos, à tripa dos porcos, ou, no máximo de finura e elegância,

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Trazer a Paixão de Volta

Se te encontras numa relação, e parto do princípio que se lá estás é porque ainda a queres, a única via para trazeres a paixão de volta ao seio do vosso quotidiano passa por rompê-lo. Sim, acabar com os hábitos, com as rotinas doentias e enfadonhas e com tudo aquilo que está, deem conta ou não, a acabar convosco e a consumir-vos lentamente. Daqui a pouco, se é que já não se encontram nesse estado, já nem podem olhar um para o outro, ouvir-se, cheirar-se e muito menos tocar-se e, por incrível que pareça, nada disto significa que o amor tenha desaparecido. O que se escafedeu foi mesmo a paixão, a ponte que passa por cima de todas as diferenças, conflitos e afins. Uma noite de sexo ou uma conchinha ao dormir, por exemplo, conseguem salvar a turbulência de uma semana inteira. É a magia dos sentidos.

Portanto, e retomando a nossa conversa, se queres despertar novamente o fogo entre ti e a pessoa com quem estás, não esperes mais pelo trágico e anunciado fim nem por uma eventual iniciativa que o outro possa tomar, agarra tu nas rédeas da tua vida e convida a pessoa para um jantar ou um outro programa qualquer num lugar diferente,

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A Voz do Amor

Nessa pupila rútila e molhada,
Refúgio arcano e sacro da Ternura,
A ampla noite do gozo e da loucura
Se desenrola, quente e embalsamada.

E quando a ansiosa vista desvairada
Embebo às vezes nessa noite escura,
Dela rompe uma voz, que, entrecortada
De soluços e cânticos, murmura…

É a voz do Amor, que, em teu olhar falando,
Num concerto de súplicas e gritos
Conta a história de todos os amores;

E vêm por ela, rindo e blasfemando,
Almas serenas, corações aflitos,
Tempestades de lágrimas e flores…

Memória Consentida

Neste lugar sem tempo nem memória,
nesta luz absoluta ou absurda,
ou só escuridão total, relances há
em que creio, ou se me afigura,
ter tido, alguma vez, passado

com biografia, onde se misturam
datas, nomes, caras, paisagens
que, de tão rápidas, me deixam
apenas a lembrança agoniada
de não mais poder lembrá-las.

Sobra, por vezes, um estilhaço
ou fragmento, como o latido
de um cão na tarde dolente
e comprida de uma remota infância.
Ou o indistinto murmúrio de vozes

junto de um rio que, como as vozes,
não existe já quando para ele
volvo, surpreso, o olhar cansado.
Insidiosas, rangem tábuas no soalho,
ou é o sussurro brando do vento

no zinco ondulado, na fronde umbrosa
dos eucaliptos de perfil no horizonte,
com o mar ao fundo. Que soalho,
de que casa, que vento em que paragens,
onde o mar ao longe que, entrevistos,

os não vejo já ou, sequer, recordo
na brevidade do instante cruel?
De que sonho, ou vida, ou espaço de outrem
provêm tais sombras melancólicas,

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Personagem

Teu nome é quase indiferente
e nem teu rosto já me inquieta.
A arte de amar é exactamente
a de se ser poeta.

Para pensar em ti, me basta
o próprio amor que por ti sinto:
és a ideia, serena e casta,
nutrida do enigma do instinto.

O lugar da tua presença
é um deserto, entre variedades:
mas nesse deserto é que pensa
o olhar de todas as saudades.

Meus sonhos viajam rumos tristes
e, no seu profundo universo,
tu, sem forma e sem nome, existes,
silêncio, obscuro, disperso.

Teu corpo, e teu rosto, e teu nome,
teu coração, tua existência,
tudo – o espaço evita e consome:
e eu só conheço a tua ausência.

Eu só conheço o que não vejo.
E, nesse abismo do meu sonho,
alheia a todo outro desejo,
me decomponho e recomponho.

Flores Velhas

Fui ontem visitar o jardinzinho agreste,
Aonde tanta vez a lua nos beijou,
E em tudo vi sorrir o amor que tu me deste,
Soberba como um sol, serena como um vôo.

Em tudo cintilava o límpido poema
Com ósculos rimado às luzes dos planetas:
A abelha inda zumbia em torno da alfazema;
E ondulava o matiz das leves borboletas.

Em tudo eu pude ver ainda a tua imagem,
A imagem que inspirava os castos madrigais;
E as vibrações, o rio, os astros, a paisagem,
Traziam-me à memória idílios imortais.

E nosso bom romance escrito num desterro,
Com beijos sem ruído em noites sem luar,
Fizeram-mo reler, mais tristes que um enterro,
Os goivos, a baunilha e as rosas-de-toucar.

Mas tu agora nunca, ah! Nunca mais te sentas
Nos bancos de tijolo em musgo atapetados,
E eu não te beijarei, às horas sonolentas,
Os dedos de marfim, polidos e delgados…

Eu, por não ter sabido amar os movimentos
Da estrofe mais ideal das harmonias mudas,
Eu sinto as decepções e os grandes desalentos
E tenho um riso meu como o sorrir de Judas.

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O Mapa

Olho o mapa da cidade
Como quem examinasse
A anatomia de um corpo…

(É nem que fosse o meu corpo!)

Sinto uma dor infinita
Das ruas de Porto Alegre
Onde jamais passarei…

Há tanta esquina esquisita,
Tanta nuança de paredes,
Há tanta moça bonita
Nas ruas que não andei
(E há uma rua encantada
Que nem em sonhos sonhei…)

Quando eu for, um dia desses,
Poeira ou folha levada
No vento da madrugada,
Serei um pouco do nada
Invisível, delicioso

Que faz com que o teu ar
Pareça mais um olhar,
Suave mistério amoroso,
Cidade de meu andar
(Deste já tão longo andar!)

E talvez de meu repouso…

Até a Pessoa Amada Voltar

Até ela, a pessoa amada, voltar, o tempo não corre como costuma correr. Atrasa-se e detém-se. Suspende-se e atrapalha-nos. Move-se de um lado para o outro. Arrasta os lugares: aqueles onde ela está e aquele (a nossa casa) onde eu espero por ela.

Esperar é um sofrimento mas também se aprende a esperar. Olhar para um relógio é a pior coisa que se pode fazer porque esses quantificadores malévolos são contabilistas automatizados que sabem contar todos os tempos, excepto os tempos de quem ama, espera e tem medo.

Não são capazes de contar os tempos de todas as pessoas dotadas de um corpo com coração e alma. Que somos todos, quer queiramos, quer não. Quem é que quer? Ninguém. E de que nos serve? De nada. Até ela, a pessoa amada, voltar, a única coisa que podemos fazer é a que mais nos custa: esperar que ela volte. Mas quando é que ela volta? Os minutos podem não ser anos mas os quartos-de-hora são semanas inteiras.

Mesmo saber que ela, a pessoa amada, voltará é difícil. Até acreditamos que queira voltar. Mas preocupamo-nos: e se ela não puder voltar? Pensar nisso é como morrer vivo sem pensar nisso.

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Louvor A Unidade

“Escafandros, arpões, sondas e agulhas
“Debalde aplicas aos heterogêneos
“Fenômenos, e, há inúmeros milênios,
“Num pluralismo hediondo o olhar mergulhas!

“Une, pois, a irmanar diamantes e hulhas,
“Com essa intuição monística dos gênios,
“À hirta forma falaz do are perennius
“A transitoriedade das fagulhas!”

– Era a estrangulação, sem retumbância,
Da multimilenária dissonância
Que as harmonias siderais invade…

Era, numa alta aclamação, sem gritos,
O regresso dos átomos aflitos
Ao descanso perpétuo da Unidade!

A Imaginação é a Base do Homem

De tal modo a imaginação é a base do homem — Joana de novo — que todo o mundo que ele tem construído encontra sua justificativa na beleza da criação e não na sua utilidade, não em ser o resultado de um plano de fins adequados às necessidades. Por isso é que vemos multiplicarem-se os remédios destinados a unir o homem às ideias e instituições existentes — a educação, por exemplo, tão difícil — e vemo-lo continuar sempre fora do mundo que ele construiu. O homem levanta casas para olhar e não para nelas morar. Porque tudo segue o caminho da inspiração. O determinismo não é um determinismo de fins, mas um estreito determinismo de causas. Brincar, inventar, seguir a formiga até seu formigueiro, misturar água com cal para ver o resultado, eis o que se faz quando se é pequeno e quando se é grande. É erro considerar que chegamos a um alto grau de pragmatismo e materialismo. Na verdade o pragmatismo — o plano orientado para um dado fim real — seria a compreensão, a estabilidade, a felicidade, a maior vitória de adaptação que o homem conseguisse. No entanto fazer as coisas «para quê» parece-me, perante a realidade,

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O Meu Sonho Habitual

Tenho às vezes um sonho estranho e penetrante
Com uma desconhecida, que amo e que me ama
E que, de cada vez, nunca é bem a mesma
Nem é bem qualquer outra, e me ama e compreende.

Porque me entende, e o meu coração, transparente
Só pra ela, ah!, deixa de ser um problema
Só pra ela, e os suores da minha testa pálida,
Só ela, quando chora, sabe refrescá-los.

Será morena, loira ou ruiva? — Ainda ignoro.
O seu nome? Recordo que é suave e sonoro
Como esses dos amantes que a vida exilou.

O olhar é semelhante ao olhar das estátuas
E quanto à voz, distante e calma e grave, guarda
Inflexões de outras vozes que o tempo calou.

Tradução de Fernando Pinto do Amaral

Eu Nunca Guardei Rebanhos

Eu nunca guardei rebanhos,
Mas é como se os guardasse.
Minha alma é como um pastor,
Conhece o vento e o sol
E anda pela mão das Estações
A seguir e a olhar.
Toda a paz da Natureza sem gente
Vem sentar-se a meu lado.
Mas eu fico triste como um pôr de sol
Para a nossa imaginação,
Quando esfria no fundo da planície
E se sente a noite entrada
Como uma borboleta pela janela.

Mas a minha tristeza é sossego
Porque é natural e justa
E é o que deve estar na alma
Quando já pensa que existe
E as mãos colhem flores sem ela dar por isso.

Como um ruído de chocalhos
Para além da curva da estrada,
Os meus pensamentos são contentes.
Só tenho pena de saber que eles são contentes,
Porque, se o não soubesse,
Em vez de serem contentes e tristes,
Seriam alegres e contentes.

Pensar incomoda como andar à chuva
Quando o vento cresce e parece que chove mais.

Não tenho ambições nem desejos
Ser poeta não é uma ambição minha
É a minha maneira de estar sozinho.

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