Textos sobre Esperança

208 resultados
Textos de esperança escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

Todos os Prazeres Terminam pelo Enfartamento

Como o que o homem procura nos prazeres é um infinito, e como ninguém será jamais capaz de renunciar à esperança de atingir esse infinito, sucede, portanto, que todos os prazeres terminam pelo enfartamento. É um achado da Natureza para se arrancar violentamente a eles.

Amigos com Carácter

A vida caminha precipitadamente. Perseguimos alguns esquemas flutuantes ou somos perseguidos por algum medo ou autoridade atrás de nós. Mas, se, de repente, encontramos um amigo, paramos; o nosso calor e a nossa pressa tornam-se ridículos. Ora a pausa, ora o domínio são necessários e também a força para encher o momento dos eflúvios do coração. O momento é tudo, em todas as relações nobres.
Uma pessoa divina é a profecia do espírito; um amigo é a esperança do coração. A nossa ventura espera pela concretização destas duas em uma.
Os séculos estão a dilatar essa força moral. Toda a força é a sombra ou o símbolo daquela. A poesia é alegre e forte quando extrai nessa fonte a sua inspiração. Os homens só inscrevem os seus nomes no mundo quando estão cheios deste. A história tem sido ignóbil; as nossas nações têm sido a gentalha; nunca vimos um homem: essa forma divina que ainda não conhecemos, mas apenas o sonho e a profecia de tal; não conhecemos os modos majestosos que lhe são peculiares e que acalmam e exaltam o observador.

Um dia veremos que a energia mais particular é a mais pública, que a qualidade afina com a quantidade e a grandeza de carácter actua na sombra e socorre aos que nunca a viram.

Continue lendo…

Saber Negar

Nem tudo se há-de conceder, nem a todos. É tão importante quanto o saber conceder, e nos que mandam é consideração indispensável. Aí entra o modo. Mais se preza o não de alguns que o sim de outros, porque um não dourado satisfaz mais que um sim a seco. Há muitos que têm sempre um não na boca. Neles o não é sempre o primeiro, e, ainda que depois tudo venham a conceder, não se entende por que precedeu aquela primeira mágoa. Não deverão as coisas ser negadas de chofe: sorva-se aos tragos o desengano; nem se negue de todo, que seria desesperar a dependência. Que fiquem sempre alguns vestígios de esperança a temperar o amargor do negar. Que a cortesia encha o vazio do favor e que as boas palavras supram a falta das obras. O não e o sim são breves de dizer, e pedem muito pensar.

A Ira não Escolhe Idade nem Estatuto Social

A ira não escolhe idade nem estatuto social. Algumas pessoas, graças à sua indigência, não conhecem a luxúria; outros, porque têm uma vida movimentada e errante, escapam à preguiça; aqueles que têm modos rudes e uma vida rústica desconhecem as prisões, as fraudes e todos os males da cidade: mas ninguém está livre da ira, tão poderosa entre os Gregos como entre os bárbaros, tão funesta entre aqueles que temem as leis como entre aqueles que se regem pela lei da força. Assim, se outras afecções atacam os indivíduos, a ira é a única afecção que, por vezes, se apodera de um povo inteiro. Nunca um povo inteiro ardeu de amor por uma mulher, nem uma cidade inteira depositou toda a sua esperança no dinheiro e no lucro; a ambição apossa-se de indivíduos, a imoderação não é um mal público.
Por vezes, uma multidão inteira é conduzida à ira: homens e mulheres, velhos e novos, os principais cidadãos e o vulgo são unânimes, e toda a multidão agitada por algumas palavras sobrepõe-se ao próprio agitador: corre a pegar em armas e tochas e declara guerra ao seu vizinho e fá-la contra os seus concidadãos; casas inteiras são queimadas com toda a família e aquele cuja eloquência lhe granjeara muitos benefícios é eliminado pela ira que as suas palavras geraram;

Continue lendo…

O Homem é um Deus que se Ignora

Dentro do homem existe um Deus desconhecido: não sei qual, mas existe – dizia Sócrates soletrando com os olhos da razão, à luz serena do céu da Grécia, o problema do destino humano. E Cristo com os olhos da fé lia no horizonte anuveado das visões do profeta esta outra palavra de consolação – dentro do homem está o reino dos céus. Profundo, altíssimo, acordo de dois génios tão distantes pela pátria, pela raça, pela tradição, por todos os abismos que uma fatalidade misteriosa cavou entre os irmãos infelizes, violentamente separados, duma mesma família! Dos dois pólos extremos da história antiga, através dos mares insondáveis, através dos tempos tenebrosos, o génio luminoso e humano das raças índicas e o génio sombrio, mas profundo, dos povos semíticos se enviam, como primeiro mas firme penhor da futura unidade, esta saudação fraternal, palavra de vida que o mundo esperava na angústia do seu caos – o homem é um Deus que se ignora.
Grande, soberana consolação de ver essa luz de concórdia raiar do ponto do horizonte aonde menos se esperava, de ver uma vez unidos, conciliados esses dois extremos inimigos, esses dois espíritos rivais cuja luta entristecia o mundo, ecoava como um tremendo dobre funeral no coração retalhado da humanidade antiga!

Continue lendo…

Realização e Êxtase

Conviria distinguir bem um do outro o caminho para o êxtase e o próprio êxtase; o primeiro ainda pode ter algum interesse por todas as lutas interiores, por todas as incertezas, por todo o esforço de pensar amplamente a que em geral dá origem; no entanto já nele mesmo poderíamos ver, além de uma preocupação egoísta, uma alternativa de esperança e desespero, um gosto da revelação e dos auxílios sobrenaturais que não poderão talvez classificar-se como superiores.
Do êxtase, porém, não alimentamos grandes desejos; o amor que nele descobrimos não pertence à categoria do amor que mais nos interessa — o que eleva o amado acima de si próprio, o que se esforça por esculpir uma alma com entusiasmo e paciência; é um amor a que se chega como recompensa de tarefa cumprida; não marca as delícias do caminho difícil, apaga-as da memória; faz desaparecer do peito do homem o seu único motivo de alegria, a sua única fonte de verdadeira glória.
Viver interessa mais que ter vivido; e a vida só é vida real quando sentimos fora de nós alguma coisa de diferente; se a diferença se tornar oposição, se o que era caminho diverso se transformar em muro de rocha,

Continue lendo…

Carta de Amor

Eu sabia que seria apenas depois de te teres ido embora que iria perceber a completa extensão da minha felicidade e, alas! o grau da minha perda também. Ainda não a consegui ultrapassar, e se não tivesse à minha frente aquela caixinha pequena com a tua doce fotografia, pensaria que tudo não teria passado de um sonho do qual não quereria acordar. Contudo os meus amigos dizem que é verdade, e eu próprio consigo-me lembrar de detalhes ainda mais charmosos, ainda mais misteriosamente encantadores do que qualquer fantasia sonhadora poderia criar. Tem que ser verdade. Martha é minha, a rapariga doce da qual todos falam com admiração, que apesar de toda a minha resistência cativou o meu coração logo no primeiro encontro, a rapariga que eu receava cortejar e que veio para mim com elevada confiança, que fortaleceu a minha confiança em mim próprio e me deu esperanças e energia para trabalhar, na altura que eu mais precisava.

Quando tu voltares, querida rapariga, já terei vencido a timidez e estranheza que até agora me inibiu perante a tua presença. Iremos sentar-nos de novo sozinhos naquele pequeno quarto agradável, vais-te sentar naquela poltrona castanha , eu estarei a teus pés no banquinho redondo,

Continue lendo…

A Educação da Fé

Sendo a fé um dom, como pode ser motivo de educação? Não pode realmente ser ensinada, mas sim irradiada. Os que a possuem podem significar a estrela-guia, a perseverança num encontro difícil de suceder, mas cuja esperança comove todo o nosso ser. É possível que a Igreja se volte para esse apostolado da fé que foi extremamente importante no seu começo. Não o velho sistema de grupos sectários que são o modelo dos processos políticos e que, quando se afirma um movimento e este toma amplitude, se eliminam. Não é isso. Trata-se de focos de comunicação que dispensam a organização premeditada e até a linguagem elaborada, o discurso piedoso e a erudição duma exegese. Um interessar a alma na fé sem recorrer ao preconceito da santidade. Descobrir a imensa novidade da fé num mundo em que o próprio cristão vive de maneira pagã e singularmente a coberto dos antigos textos que esqueceu ou que desconhece completamente.

A prova de que o cristão vive como um bárbaro é o sentido que tomou a arte religiosa. Não é raro encontrar nas salas de convívio burguesas, juntamente com a televisão, ou a mesa de jogo, ou a instalação estereofónica para o gira-disco,

Continue lendo…

Os Revolucionários Existirão Sempre

Os revolucionários existirão sempre, porque a esperança do homem é infinita ou o seu sonho infinito. Mas toda a realização, porque é realização, é obviamente finita. Conceber portanto o fim da história é absurdo. Curiosamente, a revolução do homem começou com a revolução religiosa, ou seja, com o combate à religião. Devia vir no fim. Antes de haver cidades houve cemitérios — e foi do cemitério que se partiu para a ideação da cidade. O reino dos céus devia ser prometido depois do reino da terra. E se calhar viria a sê-lo de novo, quando a terra fosse do homem. O ciclo que se fecha. (Mas a terra nunca será do homem. E muito menos de «quem a trabalha», porque é só dos que dizem que é.)

SMS

Ela caminha já a tarde vai alta pelo passeio que segue paralelo ao mar, por cima das praias. Em baixo, a areia estende-se vazia até à água, acabando numa espuma branca, das ondas que rebentam com o fragor dos dias de Inverno. Vai sozinha. Cruza-se com jovens a passo de corrida, outros que deslizam em patins, um casal com o filho pequeno feliz na sua bicicleta de rodinhas, acompanhado por um cãozinho saltitante que corre para a frente e para trás em redor dele.
Leva na mão o telemóvel e nos olhos castanhos brilhantes uma esperança. Vai pensativa e sem horas, caminhando sem pressa, reparando nas pessoas, no mar desabrido que se atira à praia, no ar fresco que respira, no vento que se levanta com uma promessa de tempestade. Cruza o casaco grosso, azul-escuro, à frente do peito, sem apertar os botões. Cruza os braços. Uma folha de jornal passa por ela a esvoaçar, notícias antigas, pensa divertida, logo se concentrando no navio de carga iluminado que vem de Lisboa e ruma ao mar aberto com o vagar de quem tem um destino certo num dia certo.

Acaba por apertar os botões do casaco e levantar a gola para se sentir mais protegida do vento,

Continue lendo…

Entender os Outros

Nós combatemos a nossa superficialidade, a nossa mesquinhez, para tentarmos chegar aos outros sem esperanças utópicas, sem uma carga de preconceitos ou de expectativas ou de arrogância, o mais desarmados possível, sem canhões, sem metralhadoras, sem armaduras de aço com dez centímetros de espessura; aproximamo-nos deles de peito aberto, na ponta dos dez dedos dos pés, em vez de estraçalhar tudo com as nossas pás de catterpillar, aceitamo-los de mente aberta, como iguais, de homem para homem, como se costuma dizer, e, contudo, nunca os percebemos, percebemos tudo ao contrário.
Mais vale ter um cérebro de tanque de guerra. Percebemos tudo ao contrário, antes mesmo de estarmos com eles, no momento em que antecipamos o nosso encontro com eles; percebemos tudo ao contrário quando estamos com eles; e, depois, vamos para casa e contamos a outros o nosso encontro e continuamos a perceber tudo ao contrário.
Como, com eles, acontece a mesma coisa em relação a nós, na realidade tudo é uma ilusão sem qualquer percepção, uma espantosa farsa de incompreensão. E, contudo, que fazer com esta coisa terrivelmente significativa que são os outros, que é esvaziada do significado que pensamos ter e que, afinal, adquire um significado lúdico;

Continue lendo…

O Amor não se Promete

Há uma distância fundamental entre as palavras e os gestos de cada homem. As palavras prometem mundos, os gestos constroem-nos. As palavras esclarecem pouco, os gestos definem quase tudo.

O amor é um projeto, uma construção que necessita de ser realizada a cada dia. Sem grandes discursos. Qualquer hora é tempo de amar. Se o amor é verdadeiro, não há tempos de descanso, porque o silêncio no coração dos que buscam lutar contra as trevas dos egoísmos é a paz mais profunda e o maior descanso… ainda que se cravem espinhos na carne, ainda que não sarem as feridas antigas, ainda que a esperança tenha pouco mais onde se apoiar do que nela própria.

Cada um de nós é aquilo que for capaz de ir construindo de firme e duradouro a cada dia por entre todas as tempestades da vida.
Há muito quem sonhe e passe o tempo a desejar o que não é… esperam e desesperam por algo que lhes há de chegar de fora… rejeitando quase tudo quanto são, quando, na verdade, é com o que temos e somos que devemos ser felizes, por pouco e por pior que seja… somos nós. Mas nós não somos quem somos só para nós mesmos.

Continue lendo…

No Amor, o Homem Deve Tomar a Iniciativa

O pudor inibe a mulher de provocar certas carícias, mas sente prazer em recebê-las quando outro as começa. Sim, um homem tem em demasiada conta as suas qualidades físicas, se espera que seja a mulher a primeira a rogar. É ao homem que compete começar, é ao homem que compete pronunciar as palavras suplicantes; a ela acolher favorávelmente as suas brandas preces. Queres possuí-la? pede. Ela deseja tanto como tu ser rogada. Explica-lhe a causa e a origem do teu amor. Júpiter dirigia-se suplicante às antigas heroínas; apesar do seu poder, nenhuma o vinha provocar.
Mas se as tuas preces se quebram na distância dum orgulho desdenhoso, abandona o que começaste e recua. Como elas desejam o que lhes escapa, e detestam o que está ao seu alcance! Sendo menos insistente, não mais serás repelido.
E a esperança de alcançares os teus fins nem sempre deve aparecer nos teus pedidos; que o amor penetre sob o nome da amizade. Vi mulheres esquivas serem enganadas desta maneira: o que fora seu cortesão, tornara-se seu amante.

Intelecto Sentimental

O intelecto humano não é luz pura, pois recebe influência da vontade e dos afectos, donde se poder gerar a ciência que se quer. Pois o homem inclina-se a ter por verdade o que prefere. Em vista disso, rejeita as dificuldades, levado pela impaciência da investigação; a sobriedade, porque sofreia a esperança; os princípios supremos da natureza, em favor da superstição; a luz da experiência, em favor da arrogância e do orgulho, evitando parecer se ocupar de coisas vis e efémeras; paradoxos, por respeito à opinião do vulgo. Enfim, inúmeras são as fórmulas pelas quais o sentimento, quase sempre imperceptivelmente, se insinua e afecta o intelecto.

O Sentido Trágico do Amor

Todo o homem tende naturalmente para o amor. Acontece que o conceito comum de amor corresponde de forma quase universal a uma ideia genérica, ambivalente e, tantas vezes, errada, porque tão irreal.

Amar é dar-se. Entregar a própria essência a um outro, lutando em favor dele. De forma pura e gratuita, sem esperar outra recompensa senão a de saber que se conseguirá ser o que se é. Amar, ao contrário do que julgam muitos, não é uma fonte de satisfação… Amar é algo sério, arrebatador e tremendamente desagradável. Quem ama sabe que isso mais se parece com uma espécie de maldição do que com narrativas infantis de final invariavelmente feliz…

Cavaleiros valentes e princesas encantadas são, no entanto, excelentes metáforas que pretendem passar a ideia da coragem e da nobreza de carácter essenciais a quem ama. Ama-se quando se é capaz de se ser quem é, verdadeiramente.
Esta luta heróica pelo valor da essência do outro não está ao alcance de todos. A maior parte das pessoas são egocêntricas, alegram-se a entrançar os seus egoísmos em figuras improvisadas de resultado sempre disforme a que teimam chamar amor. Talvez porque assim consigam disfarçar o vazio que é a prova de quão frustrante,

Continue lendo…

Tudo é Engano

Tudo é engano: buscar o mínimo de ilusão, permanecer no nível usual, ou buscar o máximo. No primeiro caso, engana-se o bem, na medida em que se deseja tornar fácil demais a sua conquista; e o mal, na medida em que é colocado em condições de luta excessivamente desfavoráveis. No segundo caso, o bem é enganado na medida em que não se luta para alcançá-lo, nem mesmo naquilo que é terreno. No terceiro caso, engana-se o bem na medida em que a esperança é torná-lo impotente na sua máxima intensidade. Seria preferível, nisto tudo, o segundo caso, pois ainda assim engana-se o bem e não o mal; neste caso, pelo menos em aparência.

Moderar as Expectativas

Ordinário desaire de tudo o que é muito celebrado antes é não chegar depois ao excesso do que foi concebido. Nunca o verdadeiro pôde alcançar o imaginado, porque fingir perfeições é fácil; difícil é consegui-las. Casa-se a imagi­nação com o desejo e concebe sempre muito mais do que as coisas são. Por maiores que sejam as excelências, não bastam para satisfazer o conceito, e, se o enganam com exorbitante expectação, é mais rápido o desengano que a admiração. A esperança é grande falsificadora da verdade: que a cordura a corrija, fazendo que a fruição seja superior ao desejo. Princípios de crédito servem para despertar a curiosidade, não para empenhar o obje­cto. Melhor resulta quando a realidade excede o conceito e é mais do que se acreditou. Essa regra faltará no que é mau, pois ajuda-o a própria exageração; desmente-a o aplauso, chegando a parecer tolerável o que se temeu ser ruim ao extremo.

A Amizade é Indispensável ao Nosso Ser

A amizade é a unica coisa cuja utilidade é unanimemente reconhecida. A própria virtude tem muitos detratores, que a acusam de ostentação e charlatanismo. Muitos desprezam as riquezas e, contentes de pouco, agradam-se da mediocridade. As honras, à procura da qual se matam tanto as pessoas, quantos outros as desdenham até olhá-las como o que há de mais fútil e de mais frívolo? E, assim, quanto ao mais! O que a uns parece admirável, ao juízo doutros nada é. Mas quanto à amizade, toda a gente está de acordo: os que se ocupam dos negócios públicos, os que se apaixonaram pelo estudo e pelas indagações sapientes, e os que, longe do bulício, limitam os seus cuidados aos seus interesses privados: todos enfim, aqueles mesmos que se entregaram todos inteiros aos prazeres, declaram que a vida nada é sem a amizade, por pouco que queiram reservar a sua para algum sentimento honorável.
Ela se insinua, com efeito, não sei como, no coração de todos os homens e não se admite que, sem ela, possa passar nenhuma condição da vida. Bem mais, se é um homem de natureza selvagem, muito feroz para odiar seus semelhantes e fugir do seu contacto, como fazia,

Continue lendo…

O Cinismo dos Valores

Cada vez mais desesperado. Olho, olho, e só vejo negrura à minha volta. Fé? Evidentemente… Enquanto há vida, há esperança — lá diz o outro. Mas, francamente: fé em quê? Num mundo que almoça valores, janta valores, ceia valores, e os degrada cinicamente, sem qualquer estremecimento da consciência? Peçam-me tudo, menos que tape os olhos. Bem basta quando a terra mos cobrir! — Ah! mas a humanidade acaba por encontrar o seu verdadeiro caminho — dizem-me duas células ingénuas do entendimento. E eu respondo-lhes assim : Não, o homem não tem caminhos ideais e caminhos de ocasião. O homem tem os caminhos que anda. Ora este senhor, aqui há tempos, passou três séculos a correr atrás dum mito que se resumia em queimar, expulsar e perseguir uns outros homens, cujo pecado era este: saber filosofia, medicina, física, astronomia, religião, comércio — coisas que já nessa época eram dignas e respeitáveis.