Textos sobre Velhos

175 resultados
Textos de velhos escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

Lembrar ou Recordar

A recordação não tem apenas que ser exacta; tem que ser também feliz; é preciso que o aroma do vivido esteja preservado, antes de selar-se a garrafa da recordação. Tal como a uva não deve ser pisada em qualquer altura, tal como o tempo que faz no momento de esmagá-la tem grande influência no vinho, também o que foi vivido não está em qualquer momento ou em qualquer circunstância pronto para ser recordado ou pronto para dar entrada na interioridade da recordação.
Recordar não é de modo algum o mesmo que lembrar. Por exemplo, alguém pode lembrar-se muito bem de um acontecimento, até ao mais ínfimo pormenor, sem contudo dele ter propriamente recordação. A memória é apenas uma condição transitória. Por intermédio da memória o vivido apresenta-se à consagração da recordação.
A diferença é reconhecível logo nas diferentes idades da vida. O ancião perde a memória, que aliás é a primeira capacidade a perder-se. Contudo, o ancião tem em si algo de poético; de acordo com a representação popular ele é profeta, é divinamente inspirado. A recordação é afinal também a sua melhor força, a sua consolação: consola-o com esse alcance da visão poética.
A infância, pelo contrário,

Continue lendo…

Os Velhos São os Verdadeiros Rebeldes

Os velhos são os verdadeiros rebeldes. Os jovens, por muiro rasgados que estejam os blusões de cabedal, querem sempre conformar-se com qualquer coisa. Querem fazer parte dum movimento. Querem fazer parte de uma revolução ou de uma comunidade. Os velhos só querem fazer partes. De preferência gagas. Os velhos não têm nada a perder. Podem dizer e fazer o que lhes apetece. É por isso que os velhos, mais do que os novos, dizem quase sempre a verdade. Nós é que podemos não querer ouvi-la. Há-de reparar-se que aquilo que os velhos dizem é que «a vida é uma chatice». Nós dizemos que eles estão senis. Mas eles é que têm razão.

O Talento na Juventude e na Velhice

Nada menos exacto do que supor que o talento constitui privilégio da mocidade. Não. Nem da mocidade, nem da velhice. Não se é talentoso por se ser moço, nem genial por se ser velho. A certidão de idade não confere superioridade de espírito a ninguém. Nunca compreendi a hostilidade tradicional entre velhos e moços (que aliás enche a história das literaturas); e não percebo a razão por que os homens se lançam tantas vezes recíprocamente em rosto, como um agravo, a sua velhice ou a sua juventude.
Ser idoso não quer dizer que se seja necessáriamente intolerante e retrógado; e engana-se quem supuser que a mocidade, por si só, constitui garantia de progresso ou de renovação mental. As grandes descobertas que ilustram a história da ciência e contribuiram para o progresso humano são, em geral, obra dos velhos sábios; e a mocidade literária, negando embora sistemáticamente o passado, é nele que se inspira, até que o escritor adquire (quando adquire) personalidade própria.
(…) A mocidade, em geral, não cria; utiliza, transformando-o, o legado que recebeu. Juventude e velhice não se opõem; completam-se na harmonia universal dos seres e das coisas. A vida não é só o entusiasmo dos moços;

Continue lendo…

Depois do Casamento

Tenho a certeza. Uma pessoa casa sem saber bem o que faz, a juventude, as ilusões, porque durante o namoro as pessoas só mostram o que têm de melhor, só a parte boa, e às vezes até fingem essa parte, com muita manha. Só depois do casamento ficamos a conhecer realmente o outro. Mas isso até o sabem as velhas, que nos dizem que as coisas foram sempre assim e que nós, raparigas novas, não fazemos caso delas, ficamos cegas de amor e não queremos ouvir a voz da experiência, pois somos tolas ao ponto de pensar que nunca ninguém se apaixonou como nós, como se tivéssemos sido nós a inventar o amor.

O Amor entre o Trigo

Cheguei ao acampamento dos Hernández antes do meio-dia, fresco e alegre. A minha cavalgada solitária pelos caminhos desertos, o repouso do sono, tudo isso refulgia na minha taciturna juventude.
A debulha do trigo, da aveia, da cevada, fazia-se ainda com éguas. Nada no mundo é mais alegre que ver rodopiar as éguas, trotando à volta do calcadouro do cereal, sob o grito espicaçante dos cavaleiros. Brilhava um sol esplêndido e o ar era um diamante silvestre que fazia brilhar as montanhas. A debulha é uma festa de ouro. A palha amarela acumula-se em montanhas douradas. Tudo é actividade e bulício, sacos que correm e se enchem, mulheres que cozinham, cavalos que tomam o freio nos dentes, cães que ladram, crianças que a cada momento é preciso livrar, como se fossem frutos da palha, das patas dos cavalos.

Oe Hernández eram uma tribo singular. Os homens, despenteados e por barbear, em mangas de camisa e com revólver à cinta, andavam quase sempre besuntados de óleo, de poeiras, de lama, ou molhados até aos ossos pela chuva. Pais, filhos, sobrinhos, primos, eram todos da mesma catadura. Estavam horas inteiras ocupados debaixo de um motor, em cima de um tecto,

Continue lendo…

O Mundo Avança

O mundo avança. É verdade, disse eu, avança, mas dando voltas em torno do sol. (…) Os adolescentes da minha geração, alvoraçados pela vida, esqueceram em corpo e alma as ilusões do futuro, até que a realidade lhes ensinou que o futuro não era como o sonhavam, e descobriram a nostalgia. Ali estavam as minhas crónicas dominicais, como uma relíquia arqueológica entre os escombros do passado, e aperceberam-se que não eram só para velhos mas também para jovens que não tivessem medo de envelhecer.

A História da Humanidade em Três Palavras

Felipe lembrou-se da história do Rei do Oriente que, desejando conhecer a história da humanidade, recebeu de um sábio quinhentos volumes; ocupado com negócios de Estado, pediu-lhe que a condensasse. Ao cabo de vinte anos, o sábio voltou e a sua história ocupava agora apenas cinquenta volumes; mas o rei, já velho demais para ler tantos livros volumosos, pediu-lhe que a fosse abreviar mais uma vez. Passaram-se de novo vinte anos, e o sábio, velho e encanecido, trouxe um único volume com os conhecimentos que o rei procurara; este, porém, estava deitado no seu leito de morte, nem tinha mais tempo de ler sequer aquilo. Aí o sábio deu-lhe a história da humanidade numa única linha: “Nasceram, sofreram, morreram”.

Os Comunistas

… Passaram bastantes anos desde que ingressei no Partido… Estou contente… Os comunistas constituem uma boa família… Têm a pele curtida e o coração valoroso… Por todo o lado recebem pauladas… Pauladas exclusivamente para eles… Vivam os espiritistas, os monárquicos, os aberrantes, os criminosos de vários graus… Viva a filosofia com fumo mas sem esqueletos… Viva o cão que ladra e que morde, vivam os astrólogos libidinosos, viva a pornografia, viva o cinismo, viva o camarão, viva toda a gente menos os comunistas… Vivam os cintos de castidade, vivam os conservadores que não lavam os pés ideológicos há quinhentos anos… Vivam os piolhos das populações miseráveis, viva a força comum gratuita, viva o anarco-capitalismo, viva Rilke, viva André Gide com o seu coribantismo, viva qualquer misticismo… Tudo está bem… Todos são heróicos… Todos os jornais devem publicar-se… Todos devem publicar-se, menos os comunistas… Todos os políticos devem entrar em São Domingos sem algemas… Todos devem festejar a morte do sanguinário Trujillo, menos os que mais duramente o combateram… Viva o Carnaval, os derradeiros dias do Carnaval… Há disfarces para todos… Disfarces de idealistas cristãos, disfarces de extrema-esquerda, disfarces de damas beneficentes e de matronas caritativas… Mas, cuidado, não deixem entrar os comunistas…

Continue lendo…

A Morte Não É Nada Para Nós

Habitua-te a pensar que a morte não é nada para nós, pois que o bem e o mal só existem na sensação. Donde se segue que um conhecimento exacto do facto de a morte não ser nada para nós permite-nos usufruir esta vida mortal, evitando que lhe atribuamos uma idéia de duração eterna e poupando-nos o pesar da imortalidade. Pois nada há de temível na vida para quem compreendeu nada haver de temível no facto de não viver. É pois, tolo quem afirma temer a morte, não porque sua vinda seja temível, mas porque é temível esperá-la.
Tolice afligir-se com a espera da morte, pois trata-se de algo que, uma vez vindo, não causa mal. Assim, o mais espantoso de todos os males, a morte, não é nada para nós, pois enquanto vivemos, ela não existe, e quando chega, não existimos mais.
Não há morte, então, nem para os vivos nem para os mortos, porquanto para uns não existe, e os outros não existem mais. Mas o vulgo, ou a teme como o pior dos males, ou a deseja como termo para os males da vida. O sábio não teme a morte, a vida não lhe é nenhum fardo,

Continue lendo…

A Juventude e a Literatura

Os jovens são, geralmente, melhores juízes das obras destinadas a estimular sentimentos e imagens do que os homens maduros ou velhos. Mas por outro lado, vê-se que os jovens que não são educados para a leitura procuram nela um prazer mais do que humano, infinito, e de características absurdas; e não encontrando isso nela, desprezam os escritores; o que por vezes acontece também noutras idades, por razões idênticas, com os iliteratos.

E aqueles jovens que se dedicam às letras facilmente preferem, não só quando escrevem mas também quando avaliam as obras dos outros, o excessivo ao moderado, a sumptuosidade ou a afectação das expressões e dos ornamentos ao simples e ao natural, e as belezas ilusórias às verdadeiras, em parte devido à sua pouca experiência e em parte ao arrebatamento próprio da idade. Donde se deduz que os jovens, que são sem dúvida, entre todos os homens, aqueles que estão mais dispostos a louvar o que lhes parece bom, por serem mais sinceros e ingénuos, raramente são capazes de apreciar a hábil e perfeita boa qualidade das obras literárias. Com o avançar dos anos, aumenta a capacidade que se adquire com o treino e diminui a natural. Contudo,

Continue lendo…

Não abandones um velho amigo, visto que o novo não é igual a ele

Não abandones um velho amigo, visto que o novo não é igual a ele. Vinho novo, amigo novo: deixa-o envelhecer, e o beberás com prazer.

O Medo da Morte só se Justifica na Juventude

Algumas pessoas idosas vivem obcecadas com o medo da morte. Este sentimento só se justifica na juventude. Os jovens que receiam, com razão, morrer na guerra, podem legitimamente sentir a amargura do pensamento de terem sido defraudados do melhor que a vida lhes podia oferecer. Mas num velho que conheceu já as alegrias e dores humanas e que cumpriu a sua missão, qualquer que fosse, o receio da morte é algo de abjecto e ignóbil. O melhor meio de o vencer – pelo menos quanto a mim – é aumentar gradualmente as nossas preocupações, torná-las cada vez mais impessoais, até ao momento em que, a pouco e pouco, os limites da nossa personalidade recuem e a nossa vida mergulhe mais ainda na vida universal.
Pode-se comparar a existência de um indivíduo a um rio – pequeno a princípio, estreitamente encerrado entre duas margens, arremetendo, com entusiasmo, primeiro os seixos e depois as cataratas. A pouco e pouco, o rio alarga-se, as suas margens afastam-se, a água corre mais calmamente e, por fim, sem nenhuma mudança brusca, desagua no oceano e perde sem sofrimento a sua existência individual.
O homem que na velhice pode ver a sua vida desta maneira,

Continue lendo…

A Actualidade Absorve o Romance

O espírito do romance é o espírito da complexidade. Cada romance diz ao leitor: «As coisas são mais complicadas do que tu pensas». É a verdade eterna do romance mas que cada vez se faz menos ouvir na algazarra das respostas simples e rápidas que precedem a pergunta e a excluem. Para o espírito do nosso tempo é ou Anna ou então Karenine quem tem razão, e a velha sabedoria de Cervantes, que nos fala da dificuldade de saber e da inacessível verdade, parece incómoda e inútil.
O espírito do romance é o espírito de continuidade: cada obra é a resposta às obras precedentes, cada obra contém toda a experiência anterior do romance. Mas o espírito do nosso tempo está fixado sobre a actualidade que é tão expansiva, tão ampla, que empurra o passado do nosso horizonte e reduz o tempo ao único segundo presente. Incluído neste sistema, o romance já não é obra (coisa destinada a durar, a ligar o passado ao futuro) mas acontecimento da actualidade como outros acontecimentos, um gesto sem amanhã.

O Fundo é o que Menos Falta Faz

Será possível plantar uma faia num jardim assim tão pequeno? Portas e janelas dos sete «ateliers» contíguos ligam umas com as outras, no pequeno pátio onde eu e o meu irmão vivemos. A semente da faia é uma banana um tanto podre ou uma batata. Há umas velhas que não andam nada contentes connosco. Mas se a faia crescer, nunca será demasiado grande, e se não cresce, de que servirá plantá-la? Ora, ao plantá-la, os meus amigos foram dar com as pedras preciosas que eu tinha perdido.

Estranheza e Novidade

A novidade, em si mesma, nada significa, se não houver nela uma relação com o que a precedeu. Nem, propriamente, há novidade sem que haja essa relação. Saibamos distinguir o novo do estranho – o que, conhecendo o conhecido, o transforma e varia, e o que aparece de fora, sem conhecimento de coisa nenhuma. Entre os escritores que descendem com novidade da velha estirpe e os que aparecem por novos por pertencer a uma estirpe incógnita há a mesma diferença que há entre o homem que nos dá uma sensação de novidade por frases novas que diz e o que nos dá uma sensação de novidade, por, falando mal nossa língua, nos dizer estropiadamente qualquer frase dela.

O Prolongamento da Adolescência

No dia a seguir ao casamento os noivos estão mais velhos cinco anos. Biológicamente, a idade madura começa com o casamento, porque o descuidoso brincar de até ali substitui-se pelo trabalho e pela responsabilidade, a paixão cede diante das limitações da ordem social – a poesia passa a prosa. Esta mudança varia com os costumes e o clima; o casamento vem mui tardiamente nas cidades modernas, facto que prolonga a adolescência; mas entre os povos do Sul e do Oriente realiza-se em idade bem verde. Os rapazes orientais, diz Stanley Hall, começam a exercer as funções de marido aos treze anos, e aos trinta, já gastos, recorrem a afrodisíacos… Aos trinta anos as mulheres dos climas quentes já estão velhas. Está verificado que o dilatar da adolescência prolonga a vida. Se pudéssemos retardar a nossa maturidade sexual de modo a coincidir com a nossa maturidade económica, prolongando assim a adolescência e a fase educativa, ergueríamos a civilização a nível jamais alcançado.

Ensina a criança no caminho que deve andar, e mesmo quando velho não se desviará dele

Ensina a criança no caminho que deve andar, e mesmo quando velho não se desviará dele.

A Embriaguez e Seriedade da Juventude

Passada a adolescência, é possível conhecer-se alegrias, mas não já a embriaguez. Tapar os buracos das peúgas uns com os outros! Ter medo de perder o comboio! Ter o dinheiro à justa para a viagem e recear que à última hora um irmão ainda a dormir surripie a quantia! Talvez porque a embriaguez venha do facto da inquietação e das hesitações se tornarem mais angustiantes quando tudo se ignora. Não teria qualquer aventura amorosa em Nantes? Quem diz «amor» diz pistola, e pistola era coisa que eu não tinha. Ora o que nesta viagem mais me surpreendeu foi terem-me reconhecido, em casa de um sapateiro, por certa parecença com uma velha parente minha e o elogio que ouvi fazerem dessa criatura cuja vida eu considerava nula. Os jovens levam tudo a sério, ainda que não saibam conferir um ar sério àquilo que levam. Na realidade, experimentam apenas emoções desproporcionadas.

A Nefasta Hiperdemocracia dos Nossos Tempos

Ninguém, creio eu, deplorará que as pessoas gozem hoje em maior medida e número que antes, já que têm para isso os apetites e os meios. O mal é que esta decisão tomada pelas massas de assumir as actividades próprias das minorias, não se manifesta, nem pode manifestar-se, só na ordem dos prazeres, mas que é uma maneira geral do tempo. Assim (…) creio que as inovações políticas dos mais recentes anos não significam outra coisa senão o império político das massas. A velha democracia vivia temperada por uma dose abundante de liberalismo e de entusiasmo pela lei. Ao servir a estes princípios o indivíduo obrigava-se a sustentar em si mesmo uma disciplina difícil. Ao amparo do princípio liberal e da norma jurídica podiam atuar e viver as minorias. Democracia e Lei, convivência legal, eram sinónimos. Hoje assistimos ao triunfo de uma hiperdemocracia em que a massa actua directamente sem lei, por meio de pressões materiais, impondo suas aspirações e seus gostos.
É falso interpretar as situações novas como se a massa se houvesse cansado da política e encarregasse a pessoas especiais o seu exercício. Pelo contrário. Isso era o que antes acontecia, isso era a democracia liberal. A massa presumia que,

Continue lendo…

A Sabedoria da Velhice

Nós, os novos, seremos velhos um dia. Essa é mesmo a melhor saída para a nossa vida, sinal de que atingimos uma sabedoria maior, prémio por termos alcançado o topo da hierarquia da existência. Não é o tempo que nos faz auferir esse estatuto, mas o tempo dá-nos mais tempo para fazermos alguma coisa com ele e assim aprender para saber mais.
Ninguém sabe mais do que um velho. Ao lado do seu avô, um doutorado é um ignorante e, se afirmar saber mais do que aquelas duas gerações de diferença, é um ignorante imbecil. É o que não falta entre nós, os novos. Dá-se mais valor ao que se aprende nas faculdades do que ao que se aprende na vida, dá-se mais valor à teoria do que à prática. Coitados de nós. E depois não nos lembramos da idade, achamos que nos passa ao lado e por isso não reconhecemos aos velhos o estatuto de sábios e o respeito que lhes é devido. Somos imbecis. A maior parte de nós é tonta. Só isso justifica o abandono. Um velho é um mapa de conhecimento, tem dentro dele muitas estradas principais, muitas vias secundárias e muitos atalhos, muitos becos sem saída,

Continue lendo…