Nua E Crua
Doire a Poesia a escura realidade
E a mim a encubra! Um visionário ardente
Quis vê-la nua um dia; e, ousadamente,
Do áureo manto despoja a divindade;O estema da perpétua mocidade
Tira-lhe e as galas; e ei-la, de repente,
Inteiramente nua e inteiramente
Crua, como a Verdade! E era a Verdade!Fita-a em seguida, e atônito recua…
– Ó Musa! exclama então, magoado e triste,
Traja de novo a louçainha tua!Veste outra vez as roupas que despiste!
Que olhar se apraz em ver-te assim tão nua?…
À nudez da Verdade quem resiste?!
Passagens sobre Mocidade
144 resultadosPaixão Única
Quem me dera poder ver-te!
Ai! quem me dera dizer-te,
Que pude amar-te, e perder-te,
Mas olvidar-te… isso não!
Que no ardor de outros amores,
Através de mil dissabores,
Senti vivas sempre as dores
Duma remota paixão.Com que dorida saudade
Penso nessa mocidade,
Nessa vaga ansiedade,
Que soubeste compreender!
E tu só, só tu soubeste,
Que, num mundo, como este,
Qual florinha em penha agreste,
Pode a flor da alma morrer.Orvalhaste-a quando ainda,
Ao nascer, singela e linda,
Respirava a esperança infinda,
Que consigo a infância tem.
Amparaste-a, quando o norte
Das paixões, soprando forte,
Lhe quiz dar rápida morte
Como à cândida cecem!E, depois, nuvem escura
Lá no céu desta ventura
Enlutou-me a aurora pura
Dos meus anos infantis.
Houve nesta vida um espaço,
Onde nunca dei um passo,
Em que não deixasse um traço
De paixões torpes e vis !E não tenho outra memória
Que me inspire altiva gloria,
Nem outro nome na historia
De meus delírios fatais.
O verdadeiro tesouro do homem é a verde mocidade. Os anos que nos restam são apenas invernos.
Que não daria eu, para voltar a mocidade? Aceitaria qualquer condição, menos, é claro, fazer exercícios, acordar cedo e tornar-me respeitável.
A Acção é o Segredo da Felicidade
Felicidade é a plena expansão dos instintos – e isso confunde-se com mocidade. Para a maioria dos homens, é o único período da vida em que realmente vivemos; depois dos quarenta anos tudo são reminiscências, cinzas do que já foi chama. A tragédia da vida está em que só nos vem a sabedoria quando a mocidade se afasta.
A saúde está na acção e portanto a saúde enfeita a mocidade. Ocupar-se sem parar é o segredo da graça e metade do segredo do contentamento. Não peças aos deuses riquezas – e sim coisas para fazer.
Na Utopia, disse Thoreau, cada criatura construirá a sua própria casa – e o canto brotará espontâneo do coração do homem, como brota do pássaro que constrói o ninho. Mas se não podemos construir a nossa casa, podemos, pelo menos, andar, pular, saltar, correr – velho é quem apenas assiste a isso. Brinquemos é tão bom como Rezemos – e de resultados mais seguros. Por isso a mocidade tem muita razão em preferir os campos desportivos às salas de aula – e em colocar o futebol acima da filosofia.
Sem Poesia Não Há Humanidade
Sem Poesia não há Humanidade. É ela a mais profunda e a mais etérea manifestação da nossa alma. A intuição poética ou orfaica antecede, como fonte original, o conhecimento euclidiano ou científico. E nos dá o sentido mais perfeito e harmónico da vida. Aperfeiçoando o ser humano, afasta-o do antropóide e aproxima-o dos antropos. Que a mocidade actual, obcecada pela bola e pelo cinema, reduzida quase a uma fotografia peculiar e uma espécie de máquina de fazer pontapés, despreza o seu aperfeiçoamento moral; e, com o seu fato de macaco, prefere regressar à Selva a regressar ao Paraíso. E assim, igualando-se aos bichos, mente ao seu destino, que é ser o coração e a consciência do Universo: o sagrado coração e o santo espírito. Eis o destino do homem, desde que se tornou consciente. E tornou-se consciente, porque tal acontecimento estava contido nas possibilidades da Natureza. Sim, a nossa consciência é a própria Natureza numa autocontemplação maravilhosa. Ou é o próprio Criador numa visão da sua obra, através do homem. E, vendo-a, desejou corrigi-la, transfigurando-se em Redentor.
À Virgem Santíssima
Cheia de Graça, Mãe de Misericórdia
N’um sonho todo feito de incerteza,
De nocturna e indizível ansiedade,
É que eu vi teu olhar de piedade
E (mais que piedade) de tristeza…Não era o vulgar brilho da beleza,
Nem o ardor banal da mocidade…
Era outra luz, era outra suavidade,
Que até nem sei se as há na natureza…Um místico sofrer… uma ventura
Feita só do perdão, só da ternura
E da paz da nossa hora derradeira…Ó visão, visão triste e piedosa!
Fita-me assim calada, assim chorosa…
E deixa-me sonhar a vida inteira!
Proposição das rimas do poeta
Incultas produções da mocidade
Exponho a vossos olhos, ó leitores:
Vede-as com mágoa, vede-as com piedade,
Que elas buscam piedade, e não louvores:Ponderai da Fortuna a variedade
Nos meus suspiros, lágrimas e amores;
Notai dos males seus a imensidade,
A curta duração de seus favores:E se entre versos mil de sentimento
Encontrardes alguns cuja aparência
Indique festival contentamento,Crede, ó mortais, que foram com violência
Escritos pela mão do Fingimento,
Cantados pela voz da Dependência.
Flor da Mocidade
Eu conheço a mais bela flor;
És tu, rosa da mocidade,
Nascida, aberta para o amor.
Eu conheço a mais bela flor.
Tem do céu a serena cor,
E o perfume da virgindade.
Eu conheço a mais bela flor,
És tu, rosa da mocidade.Vive às vezes na solidão,
Coma * filha da brisa agreste.
Teme acaso indiscreta mão;
Vive às vezes na solidão.
Poupa a raiva do furacão
Suas folhas de azul celeste.
Vive às vezes na solidão,
Como filha da brisa agreste.Colhe-se antes que venha o mal,
Colhe-se antes que chegue o inverno;
Que a flor morta já nada val.
Colhe-se antes que venha o mal.
Quando a terra é mais jovial
Todo o bem nos parece eterno.
Colhe-se antes que venha o mal,
Colhe-se antes que chegue o inverno.
A vida do homem divide-se em cinco períodos: infância, adolescência, mocidade, virilidade e velhice. No primeiro período o homem ama a mulher como mãe; no segundo, como irmã; no terceiro, como amante; no quarto, como esposa; no quinto, como filha.
Memória vs Recordação – As Armas da Juventude e da Velhice
Recordar-se não é o mesmo que lembrar-se; não são de maneira nenhuma idênticos. A gente pode muito bem lembrar-se de um evento, rememorá-lo com todos os pormenores, sem por isso dele ter a recordação. A memória não é mais do que uma condição transitória da recordação: ela permite ao vivido que se apresente para consagrar a recordação. Esta distinção torna-se manifesta ao exame das diversas idades da vida. O velho perde a memória, que geralmente é de todas as faculdades a primeira a desaparecer. No entanto, o velho tem algo de poeta; a imaginação popular vê no velho um profeta, animado pelo espírito divino. Mas a recordação é a sua melhor força, a consolação que os sustenta, porque lhe dá a visão distante, a visão de poeta. Ao invés, o moço possui a memória em alto grau, usa dela com facilidade, mas falta-lhe o mínimo dom de se recordar. Em vez de dizer: «aprendido na mocidade, conservado na velhice», poderíamos propor: «memória na mocidade, recordação na velhice». Os óculos dos velhos são graduados para ver ao perto; mas o moço que tem de usar óculos, usa-os para ver ao longe; porque lhe falta o poder da recordação, que tem por efeito afastar,
A mocidade é defeito que se corrige dia a dia.
A mocidade é uma embriaguez contínua: é a febre da razão.
Amaritudo
Só por ti, astro ainda e sempre oculto,
Sombra do Amor e sonho da Verdade,
Divago eu pelo mundo e em ansiedade
Meu próprio coração em mim sepulto.De templo em templo, em vão, levo o meu culto,
Levo as flores d’uma íntima piedade.
Vejo os votos da minha mocidade
Receberem somente escárnio e insulto.À beira do caminho me assentei…
Escutarei passar o agreste vento,
Exclamando: assim passe quando amei! —Oh minh’alma, que creste na virtude!
O que será velhice e desalento,
Se isto se chama aurora e juventude?
A mocidade é um erro belo, porque vive a vida que está para diante; a velhice é um erro triste, porque vive a vida que ficou para trás.
Vossa Formosa Juventude
Vossa formosa juventude leda,
Vossa felicidade pensativa,
Vosso modo de olhar a quem vos olha,
Vosso não conhecer-vos —Tudo quanto vós sois, que vos semelha
À vida universal que vos esquece
Dá carinho de amor a quem vos ama
Por serdes não lembrandoQuanta igual mocidade a eterna praia
De Cronos, pai injusto da justiça,
Ondas, quebrou, deixando à só memória
Um branco som de ‘spuma.
Mancebos! De Mil Louros Triunfantes
Mancebos! De mil louros triunfantes
Adornai o Moisés da mocidade,
O Anjo que nos guia da verdade
Pelos doces caminhos sempre ovantes.Coroai de grinaldas verdejantes
Quem rompeu para a Pátria nova idade,
Guiando pelas leis sãs da amizade
Os moços do progresso sempre amantes.Vê, Brasil, este filho que o teu nome
Sobre o mapa dos povos ilustrados
Descreve qual o forte de Vendôme.Conhece que os Andradas e os Machados,
Que inda vivem nas asas do renome
Não morrem nestes céus abençoados;
A mocidade tem a vida; não precisa da arte para nada.
Os excessos de nossa mocidade são saques sobre a nossa velhice, pagáveis com juros trinta anos depois.
Soneto XXXXVII
Como depois de tanta idade de ano
Agora o Céu vos dá, Jacinto, à terra?
Esta tardança algua culpa encerra
Ou mistério, que passa o ser humano.Foi descuido do Céu, ou foi engano
Da terra, que sem Céu mil vezes erra?
Ou pouco merecer, que este desterra
De tanta glória o prémio soberano?Nem foi erro da terra, nem foi vosso,
Nem do Céu foi, mas foi mistério seu
Que à Católica Igreja se aparelha.Filhos na mocidade o Céu lhe deu:
Guardou-vos, por vos dar filho mais moço
Para consolação desta Mãe velha.