Passagens sobre SilĂȘncio

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Se Eu Agora Inventasse o Mundo

Se eu agora inventasse o mundo
criaria a luz da manhĂŁ jĂĄ explicada
sem o luto que pesa
na sombra dos homens
– conspiração da noite
com as pedras.

Luz que o cheiro das ervas da madrugada
aproxima os mortos do silĂȘncio
com esqueletos de asas
– conluio com o sol
para estarem mais presentes
no tacto da pele da manhĂŁ,
mil mĂŁos a afogarem a paisagem,
bafo de flores donde cai
o enlace das sementes…

Abro a janela
O mundo cheira tĂŁo bem a trevos ausentes!

Bons dias, mortos. Bons dias, Pai.

Uma Doença CĂșmplice

uma doença cĂșmplice, marcas pĂșrpura
dĂŁo ao teu rosto a expressĂŁo do exĂ­lio
a que te submetes, gemeste
toda a noite, soçobraste

Ă  febre alta do final da tarde, uma prega,
vincada no teu rosto,
mantém-te inanimado
entre a vigĂ­lia e a injĂșria

que hĂĄ no sacrifĂ­cio
e te pÔe a carne em chaga.
uma doença altiva, a consistĂȘncia

do silĂȘncio Ă© como aço e o transe
permanece, Ă© superiormente excessiva
tanta angĂșstia.

Barganha

Domingo Ă© dia de barganha.
Troco um relĂłgio dos antigos
por um cavalo rosilho,
um bode por um trinca-ferro,
e uma roda de cabriolé
por um radinho de pilha.
Troco um gibĂŁo de cigano
pela serra que serrou
o tronco mais odorante
e por um fogĂŁo de lenha
troco um cachorro de caça
e uma panela de cobre.
Troco toda a luz do sol
pela sombra de um sĂł pĂĄssaro.
Por uma espingarda troco
um tacho que foi de escravos
além de um almofariz
e uma xĂ­cara sem asa.
Troco a salmoura dos peixes
por qualquer gosto de lĂĄgrima.
Pela vitrola rachada
dou a minha bicicleta
com os pneus arriados.
Troco o entulho que restou
do muro que derrubei
pelo calor da fogueira
que por uma noite apenas
negou o frio dos pobres.
Troco um lençol de noivado
e uma toalha bordada
pela sua reflectida
na escuridĂŁo das cisternas.
Troco o meu selim de couro
por um arreio de prata.
Dou um caminhĂŁo de pedra
por um portĂŁo de peroba.

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Eu sei criar silĂȘncio. É assim: ligo o rĂĄdio bem alto – entĂŁo de sĂșbito desligo. E assim capto o silĂȘncio. SilĂȘncio estelar. O silĂȘncio da lua muda. PĂĄra tudo: criei o silĂȘncio. (…) O silĂȘncio nĂŁo Ă© o vazio, Ă© a plenitude.

Nunca Te Intitules FilĂłsofo

Nunca te intitules FilĂłsofo nem fales demasiado sobre os PrincĂ­pios com os iletrados; faz, antes, o que deles decorre. Assim, num banquete, nĂŁo discutas como devem as pessoas comer, mas come como Ă© devido. Lembra que SĂłcrates evitava inteiramente a ostentação. As pessoas vinham a ele encaminhadas a filĂłsofos, e ele prĂłprio as encaminhava, tĂŁo bem suportava ser desdenhado. Da mesma maneira, se alguma conversa relativa a princĂ­pios ocorrer entre os iletrados, procura guardar silĂȘncio. Pois corres o risco de vomitar o que digeriste mal. E quando alguĂ©m te disser que nĂŁo sabes nada e tu nĂŁo te apoquentares com isso, podes estar certo que estĂĄs finalmente no bom caminho.

HĂĄ um grande silĂȘncio dentro de mim. E esse silĂȘncio tem sido a fonte de minhas palavras. E do silĂȘncio tem vindo o que Ă© mais precioso que tudo: o prĂłprio silĂȘncio.

DistĂąncia

NĂŁo vĂĄs para tĂŁo longe!
Vem sentar-te
Aqui na chaise-longue, ao pĂ© de mim…
Tenho o desejo doido de contar-te
Estas saudades que nĂŁo tinham fim.

NĂŁo vĂĄs para tĂŁo longe;
Quero ver
Se ainda sabes olhar-me como d’antes,
E se nas tuas mĂŁos acariciantes,
Inda existe o perfume de que eu gosto.

NĂŁo vĂĄs para tĂŁo longe!
Tenho medo
Do silĂȘncio pesado d’esta sala…
Como soluça o vento no arvoredo!
E a tua voz, amor, como se cala!

NĂŁo vĂĄs para tĂŁo longe!
Antigamente,
Era sempre demais o curto espaço
Que havia entre nĂłs dois…
Agora, um embaraço,
Hesitas e depois,
Com um gesto de tédio e de cansaço,
Achas inconveniente
O meu abraço.

NĂŁo vĂĄs para tĂŁo longe!
Fica. Inda Ă© tĂŁo cedo!
O vento continua a fustigar
Os ramos sofredores do arvoredo,
E eu ponho-me a pensar
E tenho medo!

NĂŁo vĂĄs para tĂŁo longe!
Na sombra impenetrada,
Como se agita e se debate o vento!…
Paira nas velhas ruĂ­nas do convento

Que além se avista,

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25 de Abril

Esta Ă© a madrugada que eu esperava
O dia inicial inteiro e limpo
Onde emergimos da noite e do silĂȘncio
E livres habitamos a substĂąncia do tempo

Uma Casa Cheia de Livros

Os livros, esses animais sem pernas, mas com olhar, observam-nos mansos desde as prateleiras. NĂłs esquecemo-nos deles, habituamo-nos ao seu silĂȘncio, mas eles nĂŁo se esquecem de nĂłs, nĂŁo fazem uma pausa mĂ­nima na sua vigia, sentinelas atĂ© daquilo que nĂŁo se vĂȘ. Desde as estantes ou pousados sem ordem sobre a mesa, os livros conseguem distinguir o que somos sem qualquer expressĂŁo porque eles sabem, eles existem sobretudo nesse nĂ­vel transparente, nessa dimensĂŁo sussurrada. Os livros sabem mais do que nĂłs mas, sem defesa, estĂŁo Ă  nossa mercĂȘ. Podemos atirĂĄ-los Ă  parede, podemos atirĂĄ-los ao ar, folhas a restolhar, ar, ar, e vĂȘ-los cair, duros e sĂ©rios, no chĂŁo.

(…) Os livros, esses animais opacos por fora, essas donzelas. Os livros caem do cĂ©u, fazem grandes linhas rectas e, ao atingir o chĂŁo, explodem em silĂȘncio. Tudo neles Ă© absoluto, atĂ© as contradiçÔes em que tropeçam. E estĂŁo lĂĄ, aqui, a olhar-nos de todos os lados, a hipnotizar-nos por telepatia. Devemos-lhes tanto, atĂ© a loucura, atĂ© os pesadelos, atĂ© a esperança em todas as suas formas.

Quem ama encontra sempre uma forma de se fazer presente. Sempre. Sempre. O seu silĂȘncio Ă© vontade de acolher, Ă© cuidar, Ă© a entrega simples do que Ă© mais sublime. É amor.

Quando me viam, parado e recatado, no meu invisĂ­vel recanto, eu nĂŁo estava pasmado. Estava desempenhado, de alma e corpo ocupados: tecia os delicados fios com que se fabrica a quietude. Eu era um afinador de silĂȘncios.

Dignidade Perdida

A meditação perdeu toda a sua dignidade exterior; ridicularizou-se o cerimonial e a atitude solene daquele que reflecte; jĂĄ nĂŁo se poderia continuar a suportar um sages da velha escola. Pensamos demasiado depressa, e pelo caminho, em plena marcha, no meio de negĂłcios de toda a espĂ©cie, mesmo quando se trate das coisas mais graves; temos apenas necessidade de pouca preparação, e atĂ© de pouco silĂȘncio: tudo se passa como se tivĂ©ssemos na cabeça uma mĂĄquina que girasse incessantemente e que prosseguisse o seu trabalho, mesmo nas piores circunstĂąncias. Outrora, quando alguĂ©m se queria pĂŽr a pensar – era uma coisa excepcional! – era coisa que se notava imediatamente ; notava-se que queria tornar-se mais sĂĄbio e que se preparava para uma ideia: o seu rosto ganhava uma expressĂŁo como em oração; o homem detinha-se na sua marcha; ficava atĂ© imĂłvel durante horas na rua, apoiado numa perna ou nas duas, quando a ideia lhe «surgia». A coisa «valia» entĂŁo «esse trabalho».