Rir!
Rir! Não parece ao século presente
Que o rir traduza, sempre, uma alegria…
Rir! Mas não rir como essa pobre gente
Que ri sem arte e sem filosofia.Rir! Mas com o rir atroz, o rir tremente,
Com que André Gil eternamente ria.
Rir! Mas com o rir demolidor e quente
Duma profunda e trágica ironia.Antes chorar! Mais fácil nos parece.
Porque o chorar nos ilumina e nos aquece
Nesta noite gelada do existir.Antes chorar que rir de modo triste…
Pois que o difícil do rir bem consiste
Só em saber como Henri Heine rir!…
Passagens sobre Alegria
882 resultadosMediadora do Vento
Ligeira sobre o dia
ao som dos jogos,
desliza com o vento
num encantado gozo.Pelas praias do ar
difunde-se em prodígios.
Tudo é acaso leve,
tudo é prodígio simples.Pequena e magnífica
no seu amor volante
propaga sem destino
surpresas e carícias.Pátria, só a do vento
de tão subtil e viva.
Azul, sempre azul
em completa alegria.
O Maior Triunfo do Homem
O maior triunfo do homem é quando se convence de que o ridículo é uma coisa sua que existe só para os outros, e, mesmo, sempre que outros queiram. Ele então deixa de importar-se com o ridículo, que, como não está em si, ele não pode matar.
Três coisas tem o homem superior que ensinar-se a esquecer para que possa gozar no perfeito silêncio a sua superioridade – o ridículo, o trabalho e a dedicação.
Como não se dedica a ninguém, também nada exige da dedicação alheia. Sóbrio, casto, frugal, tocando o menos possível na vida, tanto para não se incomodar como para não aproximar as coisas de mais, a ponto de destruir nelas a capacidade de serem sonhadas, ele isola-se por conveniência do orgulho e da desilusão. Aprende a sentir tudo sem o sentir directamente; porque sentir directamente é submeter-se – submeter-se à acção da coisa sentida.Vive nas dores e nas alegrias alheias, Whitman olímpico, Proteu da compreensão, sem partilhar de vivê-las realmente. Pode, a seu talante, embarcar ou ficar nas partidas de navios e pode ficar e embarcar ao mesmo tempo, porque não embarca nem fica. Esteve com todos em todas as sensações de todas as horas da sua vida.
São francisco de Assis é o exemplo por excelência da preocupação por quem é fraco e de uma ecologia integral, vivida com alegria e autenticidade. Era um mìstico e um peregrino que vivia com simplicidade numa maravilhosa harmonia com Deus, com os outros, com a natureza e consigo próprio.
Junto Dele
Que terrivel tragedia ver a gente,
No seu exiguo e doloroso leito,
Uma creança morta, um Inocente,
Um pequenino Amôr inda perfeito!Oh que mimosa palidês tremente
A do gélido rôsto contrafeito!
A as mãosinhas de cêra, docemente,
Ó dôr, ó dôr, cruzadas sobre o peito!Ó Deus cruel que matas as Creanças!
Auroras para o nosso coração,
Alegrias, alivios, esperanças!Não sei quem és; eu não te entendo, Deus!
E penso, com terror, na escuridão
Desse teu Reino tragico dos Céus…
A Percepção do Poeta
Sim, o que é o próprio homem senão um cego insecto inane a zumbir (?) contra uma janela fechada; instintivamente sente para além do vidro uma grande luz e calor. Mas é cego e não pode vê-la; nem pode ver que algo se interpõe entre ele e a luz. De modo que preguiçosamente (?) se esforça por se aproximar dela. Pode afastar-se da luz, mas não pode ir além do vidro. Como o ajudará a Ciência? Pode descobrir a aspereza e nodosidade próprias do vidro, pode chegar a conhecer que aqui é mais espesso, ali mais fino, aqui mais grosseiro, ali mais delicado: com tudo isto, amável filósofo, quão mais perto está da luz? Quão mais perto alcança ver? E contudo, acredito que o homem de génio, o poeta, de algum modo consegue atravessar o vidro para a luz do outro lado; sente calor e alegria por estar tão mais além de todos os homens (?), mus mesmo assim não continuará ele cego?
A alegria é a pedra filosofal que tudo converte em ouro.
A única coisa que consola os tristes é a tristeza – a alegria irrita-os.
Como Escrever
Minhas intuições se tornam mais claras ao esforço de transpô-las em palavras. É neste sentido, pois, que escrever me é uma necessidade. De um lado, porque escrever é um modo de não mentir o sentimento (a transfiguração involuntária da imaginação é apenas um modo de chegar); de outro lado, escrevo pela incapacidade de entender, sem ser através do processo de escrever. Se tomo um ar hermético, é que não só o principal é não mentir o sentimento como porque tenho incapacidade de transpô-lo de um modo claro sem que o minta — mentir o pensamento seria tirar a única alegria de escrever. Assim, tantas vezes tomo um ar involuntariamente hermético, o que acho bem chato nos outros. Depois da coisa escrita, eu poderia friamente torná-la mais clara? Mas é que sou obstinada. E por outro lado, respeito uma certa clareza peculiar ao mistério natural, não substituível por clareza outra nenhuma. E também porque acredito que a coisa se esclarece sozinha com o tempo: assim como num copo de água, uma vez depositado no fundo o que quer que seja, a água fica clara. Se jamais a água ficar limpa, pior para mim. Aceito o risco. Aceitei risco bem maior, como todo o mundo que vive.
Todas as alegrias têm um pedaço de medo, ou mais do que um pedaço, nenhuma alegria subsiste sem medo, choro de medo de não te ter.
Controlar o Desejo de Posse
É difícil, senão impossível, determinar os limites dos nossos desejos razoáveis em relação à posse. Pois o contentamento de cada pessoa, a esse respeito, não repousa numa quantidade absoluta, mas meramente relativa, a saber, na relação entre as suas pretensões e a sua posse. Por isso, esta última, considerada nela mesma, é tão vazia de sentido quanto o numerador de uma fração sem denominador. Um homem que nunca alimentou a aspiração a certos bens, não sente de modo algum a sua falta e está completamente satisfeito sem eles; enquanto um outro, que possui cem vezes mais do que o primeiro, sente-se infeliz, porque lhe falta uma só coisa à qual aspira.
A esse respeito, cada um tem um horizonte próprio daquilo que pode alcançar, e as suas pretensões vão até onde vai esse horizonte. Quando algum objecto se apresenta a ele nos limites desse horizonte, de modo que possa ter confiança em alcançá-lo, sente-se feliz; pelo contrário, sente-se infeliz quando dificuldades advindas o privam de semelhante perspectiva. Aquilo que reside além desse horizonte não faz efeito sobre ele. Eis por que as grandes posses do rico não inquietam o pobre, e, por outro lado, o muito que já possui,
O paciente resistirá até ao momento oportuno, mas depois a alegria brotará para ele
O paciente resistirá até ao momento oportuno, mas depois a alegria brotará para ele.
Experimentemos fazer esta pergunta: «Quem sou eu? Quem sou eu ante o meu Senhor? Sou capaz de exprimir a minha alegria, de O louvar? Ou tomo as minas distâncias? Quem sou eu ante Jesus que sofre?»
A verdadeira alegria é um pedaço de vida pura, uma migalha de felicidade que subjaz a este mundo, uma forma simples de amar a vida.
Keats disse que uma coisa bela é uma alegria eterna. Hoje a beleza é a voz sufocada de uma perdida sabedoria.
Precisamos olhar para a espiritualidade como uma arte integral de ser. Observamos muitas vezes em nós próprios um analfabetismo perante as expressões fundamentais da vida. Até temos certezas, até praticamos, até sabemos, mas há momentos da vida que nos deixam sem palavras, que nos fazem sentir sem apoio: uma doença, um incidente, uma crise, ou então uma grande alegria, um grande encontro…
Para ter a alegria e a paz do coração: primeiro, rezar; segundo, dar graças. E como faço para dar graças?
Recorda a tua vida e pensa nas muitas coisas boas que a vida te ofereceu; verás que não consegues contá-las e o teu coração transbordará de gratidão.
Os Reis Magos convidam-nos a seguir uma luz, uma luz amável, que não se apaga, porque não é deste mundo: vem do çeu e brilha… Onde? No coração. Esta luz é o própio Senhor: uma luz que não encandeia, mas acompanha e dá uma alegria única.
A própria libertinagem, sopitada nos seus letargos de estafada devassidade, tem sonhos melancólicos, saudades das impecáveis alegrias da infância.
A Inconstância no Amor e na Amizade
Não pretendo justificar aqui a inconstância em geral, e menos ainda a que vem só da ligeireza; mas não é justo imputar-lhe todas as transformações do amor. Há um encanto e uma vivacidade iniciais no amor que passa insensivelmente, como os frutos; não é culpa de ninguém, é culpa exclusiva do tempo. No início, a figura é agradável, os sentimentos relacionam-se, procuramos a doçura e o prazer, queremos agradar porque nos agradam, e tentamos demonstrar que sabemos atribuir um valor infinito àquilo que amamos; mas, com o passar do tempo, deixamos de sentir o que pensávamos sentir ainda, o fogo desaparece, o prazer da novidade apaga-se, a beleza, que desempenha um papel tão importante no amor, diminui ou deixa de provocar a mesma impressão; a designação de amor permanece, mas já não se trata das mesmas pessoas nem dos mesmos sentimentos; mantêm-se os compromissos por honra, por hábito e por não termos a certeza da nossa própria mudança.
Que pessoas teriam começado a amar-se, se se vissem como se vêem passados uns anos? E que pessoas se poderiam separar se voltassem a ver-se como se viram a primeira vez? O orgulho, que é quase sempre senhor dos nossos gostos,