Passagens sobre Filhos

824 resultados
Frases sobre filhos, poemas sobre filhos e outras passagens sobre filhos para ler e compartilhar. Leia as melhores citações em Poetris.

Lusos Heróis, Cadáveres Cediços

Lusos heróis, cadáveres cediços,
Erguei-vos dentre o pó, sombras honradas,
Surgi, vinde exercer as mãos mirradas
Nestes vis, nestes cães, nestes mestiços.

Vinde salvar destes pardais castiços
As searas de arroz, por vós ganhadas;
Mas ah! Poupai-lhe as filhas delicadas,
Que. Elas culpa não têm, têm mil feitiços.

De pavor ante vós no chão se deite
Tanto fusco rajá, tanto nababo,
E as vossas ordens, trémulo, respeite.

Vão para as várzeas, leve-os o Diabo;
Andem como os avós, sem mais enfeite
Que o langotim, diámetro do rabo.

Ao Tempo

Levanta o pano, ó tragador das eras,
A cena mostra das fatais desditas,
Pois que no giro das paixões que incitas
Tragar venturas, vorazmente, esperas.

Do vário mundo que só nutre feras,
Co’a torva dextra lhe desvia as ditas.
Solta das asas as Tentações malditas,
Os filhos traga, que indolente geras.

Leva de rojo, c’o decretado gume,
Planos que traças ao profundo Averno.
Acende e apaga da Razão o lume!

Ó Tempo, ó Tempo, regedor do Inferno!
Louvem-te as Fúrias, de quem tens ciúme,
Que só adoro as decisões do Eterno.

Há no Pensador uma Tragédia Limitada

há no pensador uma tragédia limitada
o diabo atira pelas frestas para acertar
na verdade na mãe opressora no pai incalculável
se alguma qualidade pode ser preferida
se os sentidos do filho excluírem a perda
na medida exata dos ancestrais
e reter a morte com outra igual haverá muita
precisão embora tal habilidade não restrinja
a estupidez no vazio e bastará uma brasa para
incendiar o mundo e sei que a miséria
aspirará o ar bem fundo pra estourar a razão

Uma boa mãe dá ao enteado um pedaço de bolo igual ao que dá ao próprio filho, mas fá-lo de maneira diferente.

Há demasiadas pessoas no mundo a partilharem uma cama e um número incontável de ressentimentos. Há demasiadas pessoas no mundo a mentirem a si próprias e a discutirem à frente dos filhos.

O Abraço

O abraço. O abraço que parece estar a acabar. O abraço raro, o abraço verdadeiro. Da mãe que recebe o filho, da mulher que recebe o marido, do amigo que recebe o amigo. O abraço que não se pensa, que não se imagina. O abraço que não é; o abraço que tem de ser. O abraço que serve para viver. O abraço que acontece – e que não se esquece. Um dia hei-de passar todo o dia a ensinar o abraço. A visitar as escolas e a explicar que abraçar não é dois corpos unidos e apertados pelos braços. Abraçar é dois instantes que se fundem por dentro do que une dois corpos. Abraçar é um orgasmo de vida, um clímax de partilha – uma orgia de gente. Abraçar é fechar os olhos e abrir a alma, apertar os músculos e libertar o sonho. Abraçar é fazer de conta que se é herói – e sê-lo mesmo. Porque nada é mais heróico do que um abraço que se deixa ser. Porque nada é mais heróico do que ter a coragem de abraçar, em frente do mundo, em frente da dor, em frente do fim, em frente da derrota. Abraçar é a vitória do homem sobre o homem,

Continue lendo…

A Loucura do Dinheiro

O dinheiro suscita a maior parte das vociferações que ouvimos: é o dinheiro que fatiga os tribunais, é ele que coloca pais e filhos em desavença, é ele que derrama venenos, é ele que põe a espada nas mãos dos assassinos e das legiões; ele está manchado de sangue nosso; é por causa dele que as discussões de marido e mulher ressoam na noite, é por causa dele que a turba aflui aos tribunais; por causa dele, os reis massacram, saqueiam e arrasam cidades que demoraram séculos a construir, para procurarem ouro e prata entre as cinzas. Vês os cofres arrumados a um canto? É por causa deles que se grita até os olhos saírem das suas órbitas e que os brados ressoam nos tribunais; é por causa deles que juízes vindo de regiões longínquas se reúnem para decidir qual é a avidez mais justa.
E quando, não por um cofre, mas por um punhado de ouro ou por um denário que se dispensaria a um escravo, se perfura o estômago de um velho que ia morrer sem herdeiros? E quando, possuindo vários milhares, um usurário de pés e mãos deformados, incapaz sequer de mexer no dinheiro, reclama, furioso,

Continue lendo…

Idílio

Sinto que, ás vezes, choras, minha Irmã,
No teu sombrio quarto recolhida…
É que ele vem rompendo a sombra vã
Da Morte, e lhe aparece á luz da vida!

E afflicta, como choras, minha Irmã…
Teu chôro é tua voz emudecida,
Ante a imagem do Filho, essa Manhã
Em profunda saudade amanhecida.

Silencio! Não palpites, coração;
Nem canto de ave ou mistica oração
Um tal idilio venham perturbar!

Deixae o Filho amado e a Mãe saudosa:
O Filho a rir, de face carinhosa,
E a Mãe, tão triste e pálida, a chorar…

Poema para a Catarina

Hei-de levar-te filha a conhecer a neve
tu que sabes do sol e das marés
mas nunca repousaste os teus pequenos pés
na alvura que só longe e em ti houve

Tinha estado na morte e não pudera
aguentar tamanha solidão
mas depois tive a companhia do nevão
e tu hás-de vir filha com a primavera

E o deslumbrante resplendor da alegria
tua fidelidade eterna à vida
já não permitirão tua partida
quando raiar fatal o novo dia

As barcas carregadas com as rosas
virão perto daquela pura voz
abandonada pelos meus longínquos avós
em lagoas profundas perigosas

Não me afecta o mínimo cuidado
sinto-me vertical sinto-me forte
embora leve em mim até à morte
a cabeça de um príncipe coitado

Naquelas madrugadas primitivas
eu segregava um secreto pranto
vizinho da alegria enquanto
pelos dias tu ias de mãos vivas
O costume da minha solidão
é ver pela janela as oliveiras
que de todas as árvores foram as primeiras
que tocaram meu jovem coração

Purificado pelo tempo estou
um tempo de feroz esquecimento
vem minha filha vem neste momento
em que eu liberto ao teu encontro vou

Recordo-me do teu cabelo de chuva
quando tu caminhavas ágil e ladina
pelos desfiladeiros da neblina
nessa distante região da uva

Minha paixão viril serena pelos ritos
deseja que na minha companhia
tu sejas imolada à alegria
na surda região alheia aos gritos

Não olhes o meu rosto devastado pela idade
a vida para mim é como se chovesse
mas se viesses seria como se me acontecesse
cantar contigo a perene mocidade

O tempo em que viesses sim seria
um tempo vertebrado um tempo inteiro
e não meras palavras arrancadas ao tinteiro
e alinhadas em fugaz caligrafia

Viesses tu que a tua vinda afastaria
todos os meus cuidados transumantes
e para sempre alegre viveria
os meus dias infantes já distantes

A solução da solidão compartilhada
onde vejo o meu mais profundo mundo
seria a solução ampla e sem fundo
oposta sem resposta ao meu país do nada

Com a voracidade do olvido
seria só tu vires e lutares
e por mim de olhos enormes e crepusculares
serias ente querido recebido

Volta com os primeiros anjos de dezembro
num vasto laranjal eu quero amar-te
e então a tua vida há-de ser a minha arte
e o teu vulto a única coisa que relembro

O passado é mentira digo eu
sensível ao esplendor do meio-dia
e sob a árvore plena da alegria
o mínimo cuidado esmoreceu

Ao grande peso de tanto passado
com a insónia da dúvida na testa
basta a tua presença que protesta
e todo eu me sinto renovado

O Ideal

Nunca poderá ser pálida bonequinha,
Produto sem frescor qual manequim de molas,
Pés para borzeguins, dedos p’ra castanholas,
Que há-de satisfazer almas como esta minha.

Eu deixo a Gavarni, poeta de enfermaria,
Seu rebanho gentil de belezas cloróticas,
Porque nunca encontrei n’essas plantas exóticas
A rubra flor que anela a minha fantasia.

Meu torvo coração, na angústia que o oprime,
Sonha Lady Macbeth, alma fadada ao crime,
Pesadelo infernal que um Ésquilo criou;

E contigo também, ó Noite grandiosa,
Filha de Miguel-Anjo, esfinge misteriosa,
Sereia colossal que algum Titã gerou!

Tradução de Delfim Guimarães

Ser Português é Difícil

Os Portugueses têm algum medo de ser portugueses. Olhamos em nosso redor, para o nosso país e para os outros e, como aquilo que vemos pode doer, temos medo, ou vergonha, ou «culpa de sermos portugueses». Não queremos ser primos desta pobreza, madrinhas desta miséria, filhos desta fome, amigos desta amargura. Os Portugueses têm o defeito de querer pertencer ao maior e ao melhor país do mundo. Se lhes perguntarmos “Qual é actualmente o melhor e o maior país do mundo?”, não arranjam resposta. Nem dizem que é a União Soviética nem os Estados Unidos nem o Japão nem a França nem o Reino Unido nem a Alemanha. Dizem só, pesarosos como os kilogramas nos tempos em que tinham kapa: «Podia ter sido Portugal…» E isto que vai salvando os Portugueses: têm vergonha, culpa, nojo, medo de serem portugueses mas «também não vão ao ponto de quererem ser outra coisa».

Revela-se aqui o que nós temos de mais insuportável e de comovente: só nos custa sermos portugueses por não sermos os melhores do mundo. E, se formos pensar, verificamos que o verdadeiro patriotismo não é aquele de quem diz “Portugal é o melhor país do mundo” (esse é simplesmente parvo ou parvamente simples),

Continue lendo…

A Base de Toda a Metafísica

E agora, cavalheiros, eu vos deixo
uma palavra
que fique nas vossas mentes
e nas vossas memórias
como princípio e também como fim
de toda a metafísica.

(Tal qual o professor aos estudantes
ao encerrar o seu curso repleto.)

Tendo estudado antigos e modernos,
sistemas dos gregos e dos germânicos,
tendo estudado e situado Kant,
Fichte, Schelling e Hegel,
situado a doutrina de Platão,
e Sócrates superior a Platão,
e outros ainda superiores a Sócrates
buscando pesquisar e situar,
tendo estudado bastante o divino Cristo,
eu vejo hoje reminiscências daqueles
sistemas grego e germânico,
deparo todas as filosofias,
templos e dogmas cristãos encontro,
e mesmo sem chegar a Sócrates eu vejo
com absoluta clareza,
e sem chegar até o divino Cristo,
eu vejo
o puro amor do homem por seu camarada,
a atração de um amigo pelo amigo,
de uma mulher pelo marido e vice-versa
quando bem conjugados,
de filhos pelos pais, de uma cidade
por outra, de uma terra
por outra.

Cenas De Escravidão

Acabara o castigo… áspero, cavo,
Cheio de angústia um grito lancinante
Estala atroz na boca hirta, arquejante;
Na boca negra, esquálida do escravo…

O seu algoz… oh! não — íntimo travo
O seu olhar espelha — rubro, iriante…
É um escravo também, brônzeo, possante;
Arfa-lhe em dor o peito largo e bravo!

Cumprira as ordens do Senhor… tremente,
Fita o infeliz, calcado ao chão, dolente,
Velado o olhar num dolorido brilho…

Fita-o… depois, num ímpeto sublime
Ergue-o; no peito cálido o comprime,
Cinge-o a chorar — Meu filho! pobre filho!

Pela Pátria

Ouve, meu Filho: cheio de carinho,
Ama as Árvores, ama. E, se puderes,
(E poderás: tu podes quanto queres!)
Vai-as plantando à beira do caminho.

Hoje uma, outra amanhã, devagarinho.
Serão em fruto e em flor, quando cresceres.
Façam os outros como tu fizeres:
Aves de Abril que vão compondo o ninho.

Torne fecunda e bela cada qual,
a terra em que nascer: e Portugal
Será fecundo e belo, e o mundo inteiro.

Fortes e unidos, trabalhai assim…
– A Pátria não é mais do que um jardim
Onde nós todos temos um canteiro.

Faço às vezes o gesto de quem segura um filho ao colo. Um filho, um filho de carne e osso, não me interessaria talvez, agora… mas sorrio a este, que é apenas amor nos meus braços.

Ode aos Natais Esquecidos

Eu vinha, pé ante pé, em busca da pequena porta
que dava acesso aos mistérios da noite,
daquela noite em particular, por ser a mais terna
de todas as noites que a minha memória
era capaz de guardar, com letras e sons,
no seu bojo de coisas imateriais e imperecíveis.
Tinha comigo os cães e os retratos dos mortos,
a lembrança de outras noites e de outros dias,
os brinquedos cansados da solidão dos quartos,
os cadernos invadidos pêlos saberes inúteis.
E todos me diziam que era ainda muito cedo,
porque a meia-noite morava já dentro do sono,
no território dos anjos e dos outros seres alados,
hora inatingível a clamar pela nossa paciência,
meninos hirtos de olhos fixos na claridade
enganadora de uma árvore sem nome.

Depois, o meu pai morreu e as minhas ilusões também.
Tudo se tornou gélido, esquivo e distante
como a tristeza de um fantasma confrontado
com a beleza da vida para sempre perdida.
Deixaram de me dar presentes e de dizer
que era o Menino Jesus que os trazia
para premiar a minha grandeza de alma,

Continue lendo…