Deitada em minha rede com o livro sobre meu colo em êxtase puríssimo… não sou mais aquela menina com seu livro, mas uma mulher com seu amante.
Passagens sobre Meninos
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Aprendemos a matemática numérica, mas não aprendemos a matemática da emoção. Aprendemos a língua, mas não aprendemos a linguagem da emoção. Por isso, aprendemos a explorar o mundo de fora, mas não aprendemos a explorar o mundo de dentro.
Centenas de milhões de alunos frequentam a escola clássica, mas não se preparam para a escola de vida. As ofensas derrotam-nos, as frustrações abatem-nos, as perdas traumatizam-nos. Quem não se prepara para ser ofendido e frustrado e para sofrer algumas perdas, não aprendeu as lições básicas da escola da vida. Quem não aprendeu a proteger a sua emoção dos focos de tensão faz dela um balde de lixo.
A educação clássica está a séculos de distância da educação da emoção. Não por culpa dos professores. Esses são heróis anónimos, pois as salas de aula deixaram de ser um jardim e transformaram-se num árido solo. A culpa está no sistema de educação que se arrasta por séculos, que raramente conhece e discute temas fundamentais, como gerir os pensamentos e navegar nas águas da emoção.
Infelizmente a nossa espécie está a adoecer coletivamente. Está a adoecer nem sempre por causa de doenças clássicas, como a depressão, a síndrome do pânico,
Meninos e passarinhos, com todos os carinhos.
Tudo que é preciso para fazer uma comédia é um parque, um policial e menina bonita.
Mãezinha
A terra de meu pai era pequena
e os transportes difíceis.
Não havia comboios, nem automóveis, nem aviões, nem mísseis.
Corria branda a noite e a vida era serena.Segundo informação, concreta e exacta,
dos boletins oficiais,
viviam lá na terra, a essa data,
3023 mulheres, das quais
43 por cento eram de tenra idade,
chamando tenra idade
à que vai desde o berço até à puberdade.
28 por cento das restantes
eram senhoras, daquelas senhoras que só havia dantes.
Umas, viúvas, que nunca mais (Oh nunca mais!) tinham sequer sorrido
desde o dia da morte do extremoso marido;
outras, senhoras casadas, mães de filhos…
(De resto, as senhoras casadas,
pelas suas próprias condições,
não têm que ser consideradas
nestas considerações.)Das outras, 10 por cento,
eram meninas casadoiras, seriíssimas, discretas,
mas que, por temperamento,
ou por outras razões mais ou menos secretas,
não se inclinavam para o casamento.Além destas meninas
havia, salvo erro, 32,
que à meiga luz das horas vespertinas
se punham a bordar por detrás das cortinas
espreitando,
Verdade e Mentira
Neste livro do mundo
Quase perfeito
Preto e branco irmanados
De igual jeito
Quem não foi a tribunal
Quem teve mão
Nos juizes da Santa Inquisição?Em menino te ensinaram
Mentiras que a morte leva
Para outra morte bem longe
De pensares que outra contrária
Com a tua se aglomera
Neste livro de concórdia
Só tem guarida o Infinito
Por Giordano Bruno amado
Como se fora seu filho
Acima da besta fera
Que na fogueira o lançava
Aquela verdade brilha
A morte à morte diziam
Os que não adivinhavam
Que era verdade a mentira
Até o Mar se acomoda
E paciente requebra
Enquanto gritas à toa
A tua verdade cega
Conta as areias da praia
O grande mago do mundo?
Só não mente quem não sente
Que o mistério não tem fundo
O Engraxanço e o Culambismo Português
Noto com desagrado que se tem desenvolvido muito em Portugal uma modalidade desportiva que julgara ter caído em desuso depois da revolução de Abril. Situa-se na área da ginástica corporal e envolve complexos exercícios contorcionistas em que cada jogador procura, por todos os meios ao seu alcance, correr e prostrar-se de forma a lamber o cu de um jogador mais poderoso do que ele.
Este cu pode ser o cu de um superior hierárquico, de um ministro, de um agente da polícia ou de um artista. O objectivo do jogo é identificá-los, lambê-los e recolher os respectivos prémios. Os prémios podem ser em dinheiro, em promoção profissional ou em permuta. À medida que vai lambendo os cus, vai ascendendo ou descendendo na hierarquia.
Antes do 25 de Abril esta modalidade era mais rudimentar. Era praticada por amadores, muitos em idade escolar, e conhecida prosaicamente como «engraxanço». Os chefes de repartição engraxavam os chefes de serviço, os alunos engraxavam os professores,os jornalistas engraxavam os ministros, as donas de casa engraxavam os médicos da caixa, etc… Mesmo assim, eram raros os portugueses com feitio para passar graxa. Havia poucos engraxadores. Diga-se porém, em abono da verdade, que os poucos que havia engraxavam imenso.
O Divino
Nobre seja o homem,
Caridoso e bom!
Pois isso apenas
É que o distingue
De todos os seres
Que conhecemos.Glória aos incógnitos
Mais altos seres
Que pressentimos!
Que o homem se lhes iguale!
Seu exemplo nos ensine
A crer naqueles!Pois insensível
É a natureza:
O sol ‘spalha luz
Sobre maus e bons,
E ao criminoso
Brilham como ao santo
A lua e as ‘strelas.Vento e torrentes,
Trovão e saraiva
Rugem seu caminho
E agarram,
Velozes passando,
Um após outro.Tal a sorte às cegas
Lança mãos à turba
E agarra os cabelos
Do menino inocente
Ou a fronte calva
Do velho culpado.Por eternas leis,
Grandes e de bronze,
Temos todos nós
De fechar os círculos
Da nossa existência.Mas somente o homem
Pode o impossível:
Só ele distingue,
Escolhe e julga;
E pode ao instante
Dar duração.Só ele é que pode
Premiar o bom,
Castigar o mau,
Jura
Pelas rugas da fronte que medita…
Pelo olhar que interroga — e não vê nada…
Pela miséria e pela mão gelada
Que apaga a estrela que nossa alma fita…Pelo estertor da chama que crepita
No ultimo arranco d’uma luz minguada…
Pelo grito feroz da abandonada
Que um momento de amante fez maldita…Por quanto há de fatal, que quanto há misto
De sombra e de pavor sob uma lousa…
Oh pomba meiga, pomba de esperança!Eu t’o juro, menina, tenho visto
Cousas terriveis — mas jamais vi cousa
Mais feroz do que um riso de criança!
Epitáfio
Ainda correm lágrimas pelos
teus grisalhos, tristes cabelos,
na terra vã desintegrados,
em pequenas flores tornados.Todos os dias estás viva,
na soledade pensativa,
ó simples alma grave e pura,
livre de qualquer sepultura!E não sou mais do que a menina
que a tua antiga sorte ensina.
E caminhamos de mão dada
pelas praias da madrugada.
A uma Rapariga
À Nice
Abre os olhos e encara a vida! A sina
Tem que cumprir-se! Alarga os horizontes!
Por sobre lamaçais alteia pontes
Com tuas mãos preciosas de menina.Nessa estrada da vida que fascina
Caminha sempre em frente, além dos montes!
Morde os frutos a rir! Bebe nas fontes!
Beija aqueles que a sorte te destina!Trata por tu a mais longínqua estrela,
Escava com as mãos a própria cova
E depois, a sorrir, deita-te nela!Que as mãos da terra façam, com amor,
Da graça do teu corpo, esguia e nova,
Surgir à luz a haste duma flor!…
Cantigas
Quando vejo a minha amada
Parece que o Sol nasceu;
Cantai, cantai alvorada
Ó avezinhas do céu.Nessas águas do Mondego
Se pode a gente mirar,
Elas procuram sossego…
E vão caminho do mar.A rosa que tu me deste
Peguei-lhe, mudou de cor;
Tornou-se de azul-celeste
Como o céu do nosso amor.Não me fales da janela,
Que te não ouço da rua;
Fala-me de alguma estrela,
Que te vou ouvir da Lua.Dizes que a letra não deve
Ser nunca miudinha;
Mas grada ou miúda escreve,
Que o coração adivinha.Não digas que me não amas
A ver se tenho ciúme;
Os laços do amor são chamas,
E não se brinca com lume.A virgem dos meus amores
Sobressai entre as mais belas:
É como a rosa entre flores,
É como o Sol entre estrelas.Eu zombo de sol e chuva,
Noite e dia, terra e mar;
Ais de uma pobre viúva,
Se os ouço, dá-me em chorar.A sombra da nuvem passa
depressa pela seara;
Natal Diferente
I
Catedrais de luz erguidas na cidade.
Neve artificial nas montras com brinquedos.
Soa um Cântico antigo no vento da tarde
que arrefece. Em cada rosto, em cada olhar,
um não-sei-quê de pasmo nesta hora de Natal.Não é serenidade o que se bebe pelas ruas.
Cinzenta é a cor do céu. Decerto vai chover.
No ambiente superficial
representam-se alegrias.
As notícias nos jornais agravam
o cepticismo deste Natal a haver.Sinto-me vazio. Lasso. Sem vontade.
Uma grande ternura a boiar dentro de rnirn:
Lástima, piedade, amor pelos humanos?
Mas de que serve comover-me assim?Vou aceitar este Natal, tal como está.
Com álcool. Com prazer.
Embriagar-me de luz, de sons e de ilusões.
Ser como toda a gente. E possa o mundo arder!II
Meu Menino Jesus que deves estar no Céu
vem tiritar nas cidades sem calor.
Vem dar realidade a este dia, vem!
— Trinta e três anos e a consciência em flor.
Mas não venhas de fraldas: a Estrela já brilhou.
Traz o corpo macerado,
Sem pensar em mais nada, fecho os olhos para esquecer. Dorme, menina, repito no escuro, o sono também salva. Ou adia.
Assim começam todos os amores: assim vai até ao altar a menina que se casa; acompanham-a até lá quiméricas legiões de espíritos lúcidos, cujas asas se enlaçam, para a embalarem num coxim ideal de aspirações e santos desejos. E, depois, é muito triste vê-la, passados dois meses, a fazer um rol de roupa suja, a acertar a gravata do marido, que vai ver o cambio, ou, oh essência do materialismo! a pregar um botão nas calças conjugais! Esta é a ordem do mundo, leitores! Cinjamos os rins de silício, cubramo-nos de saco, e baixemos a cabeça ao mundo conveniente, qual ele é, porque o método é uma necessidade prima, até no romance.
Terra – 7
Onde ficava o mundo?
Só pinhais, matos, charnecas e milho
para a fome dos olhos.
Para lá da serra, o azul de outra serra e outra serra ainda.
E o mar? E a cidade? E os rios?
Caminhos de pedra, sulcados, curtos e estreitos,
onde chiam carros de bois e há poças de chuva.
Onde ficava o mundo?
Nem a alma sabia julgar.
Mas vieram engenheiros e máquinas estranhas.
Em cada dia o povo abraçava um outro povo.
E hoje a terra é livre e fácil como o céu das aves:
a estrada branca e menina é uma serpente ondulada
e dela nasce a sede da fuga como as águas dum rio.
Tudo quanto Sonhei se Foi Perdido
O que sonhei e antes de vivido
Era perfeito e lúcido e divino,
Tudo quanto sonhei se foi perdido
Nas ondas caprichosas do destino.Que os fados em mim mesmo depuseram
Razões de ser e de não ser, contrárias,
Nas emoções que, dentro em mim, cresceram
Tumultuosas, carinhosas, várias.Naqueles seres que fui dentro de um ser,
Que viveram de mais para eu viver
A minha vida luminosa e calma,Se desdobraram gestos de menino
E rudes arremedos de assassino.
Foram almas de mais numa só alma.
De todos os animais selvagens, o menino é o mais incontrolável. Variante: De todos os animais selvagens, o homem jovem é o mais difícil de domar.
Liberdade sem juízo é pólvora em mão de menino.
A uma Dama
Por fazer lisonja às flores
De flores touca o cabelo
Nise, a gala do donaire,
Nise, a glória dos desejos.
Invejosas as estrelas
Murmuraram tanto emprego,
Se as não contentara Nise
Com tê-las nos olhos negros.
De garbo, postura e talhe
Vai luzida em tanto extremo,
Que nas vidas que cativa
Tem muita parte o asseio.
Quanto pisa e quanto fala,
Vai brotando e florescendo
Uma rosa em cada passo,
Um jasmim em cada alento.
Caçadora ufana e dextra,
Quem viu caçadora Vénus?
Pede as armas emprestadas
Dizem que a um menino cego.
Galharda o arco exercita,
E, com movimento dextro,
De quantas setas lhe fia,
Nenhuma lhe leva o vento.
Guarde-se todo o alvedrio,
Que não dão as frechas erro,
Pois para acertar as vidas
Tomam nos olhos preceitos.
Despejada comunica
Ao monte seus raios belos,
Que nem sempre o majestoso
Há-de afectar o encoberto.
E, com deixar-se admirar,
Nada lhe perde o respeito;
Mas tais amas traz consigo…
Pastores, diga-o Fileno.