Passagens sobre Poesia

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Frases sobre poesia, poemas sobre poesia e outras passagens sobre poesia para ler e compartilhar. Leia as melhores citações em Poetris.

Nua E Crua

Doire a Poesia a escura realidade
E a mim a encubra! Um visionário ardente
Quis vê-la nua um dia; e, ousadamente,
Do áureo manto despoja a divindade;

O estema da perpétua mocidade
Tira-lhe e as galas; e ei-la, de repente,
Inteiramente nua e inteiramente
Crua, como a Verdade! E era a Verdade!

Fita-a em seguida, e atônito recua…
– Ó Musa! exclama então, magoado e triste,
Traja de novo a louçainha tua!

Veste outra vez as roupas que despiste!
Que olhar se apraz em ver-te assim tão nua?…
À nudez da Verdade quem resiste?!

A Inutilidade da Crítica

Que a obra de boa qualidade sempre se destaca é uma afirmação sem valor, se aplicada a uma obra de qualidade realmente boa e se por “destaca” quer-se fazer referência à aceitação na sua própria época. Que a obra de boa qualidade sempre se destaca, no curso de sua futuridade, é verdadeiro; que a obra de boa qualidade, mas de segunda ordem sempre se destaca na sua própria época, é também verdadeiro.
Pois como há-de um crítico julgar? Quais as qualidades que formam, não o incidental, mas o crítico competente? Um conhecimento da arte e da literatura do passado, um gosto refinado por esse conhecimento, e um espírito judicioso e imparcial. Qualquer coisa menos do que isto é fatal ao verdadeiro jogo das faculdades críticas. Qualquer coisa mais do que isto é já espírito criativo e, portanto, individualidade; e individualidade significa egocentrismo e certa impermeabilidade ao trabalho alheio.
Quão competente é, porém, o crítico competente? Suponhamos que uma obra de arte profundamente original surja diante dos seus olhos. Como a julga ele? Comparando-a com as obras de arte do passado. Se for original, porém afastar-se-á em alguma coisa — e quanto mais original mais se afastará — das obras de arte do passado.

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Os trabalhos escolares são provas para o carácter, não para a inteligência. Quer se trate de ortografia, de poesia ou de cálculo, está sempre em causa aprender a querer.

O que é um Romance?

Um romance é aquilo que o autor quiser que seja. O Herberto Helder tem razão quando diz que está tudo misturado: não se sabe quando é que a poesia não dá origem a um romance, quando é que um ensaio não é um romance, quando é que no interior de um ensaio não aparece um poema… Não vejo por que é que essas coisas hão-de ser catalogadas. Há páginas de grandes romances que são grandes páginas de poesia. Bom, mas isto é mais um pressentimento que uma certeza, que o início de uma teoria… É uma interrogação. O meu problema é que sempre li mais prosa que poesia. Na verdade, a poesia aborrece-me mais. Não é bem isso… é no sentido de que ocupa um espaço muito menor nas minhas leituras.

A poesia é toda aquela forma da arte literária em que se recebe uma emoção estética por motivos independentes do sentido da frase.

Notícias do Bloqueio

Aproveito a tua neutralidade,
o teu rosto oval, a tua beleza clara,
para enviar notícias do bloqueio
aos que no continente esperam ansiosos.

Tu lhes dirás do coração o que sofremos
nos dias que embranquecem os cabelos…
tu lhes dirás a comoção e as palavras
que prendemos – contrabando – aos teus cabelos.

Tu lhes dirás o nosso ódio construído,
sustentando a defesa à nossa volta
– único acolchoado para a noite
florescida de fome e de tristezas.

Tua neutralidade passará
por sobre a barreira alfandegária
e a tua mala levará fotografias,
um mapa, duas cartas, uma lágrima…

Dirás como trabalhamos em silêncio,
como comemos silêncio, bebemos
silêncio, nadamos e morremos
feridos de silêncio duro e violento.

Vai pois e noticia com um archote
aos que encontrares de fora das muralhas
o mundo em que nos vemos, poesia
massacrada e medos à ilharga.

Vai pois e conta nos jornais diários
ou escreve com ácido nas paredes
o que viste, o que sabes, o que eu disse
entre dois bombardeamentos já esperados.

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Literatura Real e Literatura Aparente

Em todas as épocas, existem duas literaturas que caminham lado a lado e com muitas diferenças entre si: uma real e outra apenas aparente. A primeira cresce até se tornar uma leitura permanente. Exercida por pessoas que vivem para a ciência ou para a poesia, ela segue o seu caminho com seriedade e tranquilidade, produzindo na Europa pouco menos de uma dúzia de obras por século, que, no entanto, permanecem. A outra, exercida por pessoas que vivem da ciência ou da poesia, anda a galope, com rumor e alarido por parte dos interessados, trazendo anualmente milhares de obras ao mercado. Após poucos anos, porém, as pessoas perguntam: Onde estão essas obras? Onde está a sua glória tão prematura e ruidosa? Por isso, pode-se também chamar esta última de literatura que passa, e aquela, de literatura que fica.

Alheamento

Meu corpo estiraçado, lânguido, ao logo do leito.

O cigarro vago azulando os meus dedos.

O rádio… a música…

A tua presença que esvoaça
em torno do cigarro, do ar, da música…

Ausência!, minha doce fuga!

Estranha coisa esta, a poesia,
que vai entornando mágoa nas horas
como um orvalho de lágrimas, escorrendo dos vidros
duma janela,

numa tarde vaga, vaga…

Toda a poesia – e a canção é uma poesia ajudada – reflecte o que a alma não tem. Por isso a canção dos povos tristes é alegre e a canção dos povos alegres é triste.

Incoerência ?

Achas-me indiferente… e até crês que há desdém
quando falo de amor em palavras singelas…
– pensas que as juras todas que já ouviste, aquelas
juras, a outras mulheres vou fazer também…

Dizes que não te quero… E eu te pergunto: – a quem
devo tudo o que fiz, as poesias mais belas?
– outras dirão talvez que as fiz pensando nelas,
mas todas te pertencem mais do que a ninguém!

Não vês que o que te cerca é a mentira da vida…
– nem sabes descobrir essa paixão imensa
que o meu orgulho torna egoísta e dolorida…

Não vês que o meu viver é falso, – e se resume
em te amar como um louco em minha indiferença,
e fingir que amo as outras para teu ciúme!

Quando a Morte Vier, Meu Amor

Quando a morte vier, meu amor,
fechemos os olhos para a olhar por dentro
e deixemos aos nossos lábios o murmúrio
da palavra branda jamais pronunciada
e às nossas mãos a carícia dispersa;
relembremos o dia impossível,
belo por isso e por isso desprezado,
e esqueçamos o que nos não deixaram ver
e o resto que sobrou do nada que possuímos;
deixemos à poesia que surge
o pranto de quem a trocou para comer
e os passos sem rumo pelas ruas hostis;
deixemos à carne o que não alcançámos,
e morramos então, naturalmente…