Passagens sobre Romances

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O que conto neste livro (Número Zero), salvo a fantasia desse Braggadocio sobre o corpo de Mussolini, é verdadeiro, teve processos judiciais e já foi publicado. O pior do que conto no meu romance não é o que se fez de terrível, mas que as pessoas se estejam nas tintas para todos esses acontecimentos. Vejo que tudo entra por uma orelha e sai pela outra das pessoas, como se as coisas terríveis que se passaram há 50 anos não preocupem ninguém e sejam aceites tranquilamente.

A Voz que Ouço quando Leio

Quando leio, há uma voz que lê dentro de mim. Paro o olhar sobre o texto impresso, mas não acredito que seja o meu olhar que lê. O meu olhar fica embaciado. É essa voz que lê. Quando é séria, ouço-a falar-me de assuntos sérios. Às vezes, sussurra-me. Às vezes, grita-me. Essa voz não é a minha voz. Não é a voz que, em filmagens de festas de anos e de natais, vejo sair da minha boca, do movimento dos meus lábios, a voz que estranho por, num rosto parecido com o meu, não me parecer minha. A voz que ouço quando leio existe dentro de mim, mas não é minha. Não é a voz dos meus pensamentos. A voz que ouço quando leio existe dentro de mim, mas é exterior a mim. É diferente de mim. Ainda assim, não acredito que alguém possa ter uma voz que lê igual à minha, por isso é minha mas não é minha. Mas, claro, não posso ter a certeza absoluta. Não só porque uma voz é indescritível, mas também porque nunca ninguém me tentou descrever a voz que ouve quando lê e porque eu nunca falei com ninguém da voz que ouço quando leio.

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Ao longo da minha experiência foi-me dado observar o comportamento das pessoas, e com isso fiz romances. Eles ficam, no entanto, muito aquém do que aconteceu, porque há uma coisa que se chama a timidez da alma, e o que nos é revelado pode ser-nos proibido também.

Sentidos Inconscientes

Nada consola mais o autor de um romance do que descobrir as leituras nas quais não havia pensado e que lhe são sugeridas pelos leitores… Não digo que o autor não possa descobrir uma leitura que lhe pareça aberrante, mas em todos os casos deveria calar-se: que os outros a contestem, texto em punho. De resto, a grande maioria dos leitores faz-nos descobrir efeitos de sentidos nos quais não havíamos pensado.

O Que Devemos Sentir

Todas as pessoas devem ter experimentado a sensação desagradável que se tem nas estações de caminho de ferro. Vamos despedir-nos de alguém. A pessoa já entrou no comboio, mas ele demora a partir. Ali ficam as duas pessoas, uma na plataforma e a outra à janela, esforçando-se por conversar, mas de repente não têm nada para dizer.
Isto, evidentemente, resulta de não podermos sentir o que queremos. A situação impõe-nos um determinado sentimento. E quem não experimentou aquele tremendo alívio quando o comboio finalmente parte?
Ou nos funerais. Quando alguém morre ou adoece, quando surgem as desilusões, espera-se sempre que sintamos determinadas coisas.
Em todas as situações, excepto as mais quotidianas, as mais neutras, há uma pressão que se exerce sobre nós, que nos dita a forma como devemos conduzir-nos, aquilo que devemos sentir, E se examinarmos bem o fenómeno, verificamos, não raras vezes, que esses papéis nos são atribuídos por romances, filmes ou peças de teatro que vimos há muito tempo.
Quando somos realmente confrontados com situações invulgares (por exemplo, rivalidades que prevíamos e não se verificam, e em vez disso se transformam num amor que nos deixa sós), a primeira coisa a que nos agarramos são esses padrões sentimentais livrescos.

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Eu vejo-me a mim próprio como um professor sério, que, ao fim de semana, escreve romances.

Um romance é como a maionese, uma emulsão de elementos bem enlaçados. A chave não é o argumento nem uma grande escrita, mas essa emulsão final sem a qual o romance fracassa.

Quem sabe se o romance não será uma mais perfeita realidade e vida que Deus cria através de nós, que nós – quem sabe – existimos apenas para criar?

Todo o Mal Provém não da Privação mas do Supérfluo

Ser feliz é, afinal, não esperar muito da felicidade, ser feliz é ser simples, desambicioso, é saber dosear as aspirações até àquela medida que põe o que se deseja ao nosso alcance. Pegando de novo em Tolstoi, que vem sendo em mim um padrão tutelar, lembremos de novo um dos seus heróis, o príncipe Pedro Bezoukhov (do romance ‘Guerra e Paz’). As circunstâncias fizeram-no conviver no cativeiro com um símbolo da sabedoria popular, um tal Karataiev. Pois esse companheirismo desinteressado e genuíno, esse encontro com a vida crua mas desmistificadora, não só modificaram o príncipe Pedro como lhe revelaram o que ele precisava de saber para atingir o que nós, pobres humanos, debalde perseguimos: a coerência, a pacificação interior, que são correctivos da desventura.
Tolstoi salienta-nos que Pedro, após essa vivência, apreendera, não pela razão mas por todo o seu ser, que o homem nasceu para a felicidade e que todo o mal provém não da privação mas do supérfluo, e que, enfim, não há grandeza onde não haja verdade e desapego pelo efémero. Isto, aliás, nos é repetido por outra figura de Tolstoi, a princesa Maria, ao acautelar-nos com esta síntese desoladora: «Todos lutam, sofrem e se angustiam,

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Herói Vencido

Naquele dia
Parti
A hora em que a cidade era saudosa
Das vidas que eu viveria
Se me não fora impossível.
Ali,
Tudo me prometia
O perdido para sempre,
E tudo me era sensível,
Como se fosse de novo,
Ou eu visse
Com os olhos da outra gente.

Nesse momento,
De mim próprio tão diferente,
Era o herói conhecido
De um romance concebido
E nunca realizado…

No ar da gare,
Entre o silvo das partidas,
Estava suspenso, parado,
O perfume concentrado
De todas as despedidas.

Os romances dos homens nunca são poemas. E os romances ou são poemas ou não são nada, são pura recompilação.

-Sei que a senhora gosta de ler – digo.
– Muito. Não se ria se eu disser que o romance mais bonito que li em toda a minha vida foi a Joana Eira de Carlota Bronte. Conhece? Uma jóia. Acho que li esse livro umas vinte vezes. Devorei também todo o Walter Scott e o Alexandre Dumas. Nunca suportei o Zola nem o Flaubert. Mas gostava do Tolstoi. Ah! Leio também os modernos. Estrangeiros e nacionais, naturalmente.

O amor sempre inspirou romances, ou seja, a arte de amar sempre foi romântica.

Poderíamos dizer que o romance é o genero que mais predispõe uma pessoa a um profundo discernimento da vida à nossa volta, em vez de apresentar o nosso próprio pequeno ego como o centro do universo.

Penso, cada vez mais, que um romance tem de contar uma boa história; boa e bem contada. Quanto à Agustina e ao Vergílio Ferreira, estou farto de Faulkners do Minho e de Sartres de Fontanelas, e ainda por cima maus.

O Futuro Não é Garantia de Competência

Creio apenas saber que o romance não pode já viver em paz com o espírito do nosso tempo: se quer ainda continuar a descobrir o que não está descoberto, se quer ainda «progredir» enquanto romance, só pode fazê-lo contra o progresso do mundo.
A vanguarda viu as coisas diferentemente: estava possuída pela ambição de estar em harmonia com o futuro. Os artistas de vanguarda criaram obras, corajosas é verdade, difíceis, provocatórias, apupadas, mas criaram-nas com a certeza de que o «espírito do tempo» estava com eles e que, amanhã, lhes daria razão.
Outrora, também eu considerei o futuro como único juiz competente das nossas obras e dos nossos actos. Foi mais tarde que compreendi que o flirt com o futuro é o pior dos conformismos, a cobarde lisonja do mais forte. Porque o futuro é sempre mais forte que o presente. É ele, de facto, que nos julgará. E certamente sem qualquer competência.