A Minha Avó
Minh’alma vai cantar, alma sagrada!
Raio de sol dos meus primeiros dias…
Gota de luz nas regiões sombrias
De minha vida triste e amargurada.Minh’alma vai cantar, velhinha amada!
Rio onde correm minhas alegrias…
Anjo bendito que me refugias
Nas tuas asas contra a sina irada!Minh’alma vai cantar… Transforma o seio
N’um cofre santo de carícias cheio,
Para este livro todo o meu tesouro… –Eu quero vê-lo, em desejada calma,
No rico santuário de tu’alma…
– Hóstia guardada n’um cibório de ouro! –
Passagens sobre Seios
277 resultadosNa Tebaida
Chegas, com os olhos úmidos, tremente
A voz, os seios nus, como a rainha
Que ao ermo frio da Tebaida vinha
Trazer a tentação do amor ardente.Luto: porém teu corpo se avizinha
Do meu, e o enlaça como uma serpente..
Fujo: porém a boca prendes, quente,
Cheia de beijos, palpitante, à minha…Beija mais, que o teu beijo me incendeia!
Aperta os braços mais! que eu tenha a morte,
Preso nos laços de prisão tão doce!Aperta os braços mais, frágil cadeia
Que tanta força tem não sendo forte,
E prende mais que se de ferro fosse!
Tão Conformes na Ventura
Quantas vezes do fuso se esquecia
Daliana, banhando o lindo seio,
Outras tantas de um áspero receio
Salteado Laurénio a cor perdia.Ela, que a Sílvio mais que a si queria,
Para podê-lo ver não tinha meio.
Ora como curara o mal alheio
Quem o seu mal tão mal curar podia?Ele, que viu tão clara esta verdade,
Com soluços dizia (que a espessura
Inclinavam, de mágoa, a piedade):Como pode a desordem da natura
Fazer tão diferentes na vontade
Aos que fez tão conformes na ventura?
E tu, sozinho e pensativo na tua dor,
procurarás a tua mãe, e nestes braços
esconderás o teu rosto;
no seio que nunca muda terás repouso.
Num Bairro Moderno
Dez horas da manhã; os transparentes
Matizam uma casa apalaçada;
Pelos jardins estancam-se as nascentes,
E fere a vista, com brancuras quentes,
A larga rua macadamizada.Rez-de-chaussée repousam sossegados,
Abriram-se, nalguns, as persianas,
E dum ou doutro, em quartos estucados,
Ou entre a rama do papéis pintados,
Reluzem, num almoço, as porcelanas.Como é saudável ter o seu conchego,
E a sua vida fácil! Eu descia,
Sem muita pressa, para o meu emprego,
Aonde agora quase sempre chego
Com as tonturas duma apoplexia.E rota, pequenina, azafamada,
Notei de costas uma rapariga,
Que no xadrez marmóreo duma escada,
Como um retalho da horta aglomerada
Pousara, ajoelhando, a sua giga.E eu, apesar do sol, examinei-a.
Pôs-se de pé, ressoam-lhe os tamancos;
E abre-se-lhe o algodão azul da meia,
Se ela se curva, esguelhada, feia,
E pendurando os seus bracinhos brancos.Do patamar responde-lhe um criado:
“Se te convém, despacha; não converses.
Eu não dou mais.” È muito descansado,
Atira um cobre lívido, oxidado,
Que vem bater nas faces duns alperces.
O Oleiro
Há em todo o teu corpo
uma taça ou doçura a mim destinada.Quando levanto a mão
encontro em cada lugar uma pomba
que andava à minha procura, como
se te houvessem, meu amor, feito de argila
para as minhas mãos de oleiro.Os teus joelhos, os teus seios,
a tua cintura,
faltam em mim como no côncavo
duma terra sedenta
a que retiraram
uma forma,
e, juntos,estamos completos como um só rio,
como um só areal.
Ainda que Mal
Ainda que mal pergunte,
ainda que mal respondas;
ainda que mal te entenda,
ainda que mal repitas;
ainda que mal insista,
ainda que mal desculpes;
ainda que mal me exprima,
ainda que mal me julgues;
ainda que mal me mostre,
ainda que mal me vejas;
ainda que mal te encare,
ainda que mal te furtes;
ainda que mal te siga,
ainda que mal te voltes;
ainda que mal te ame,
ainda que mal o saibas;
ainda que mal te agarre,
ainda que mal te mates;
ainda assim te pergunto
e me queimando em teu seio,
me salvo e me dano: amor.
Escreve!
Não sei o que supor
Do teu silêncio. Escreve!
Quem é amado deve
Ser grato ao menos, flor!Se eu fosse tão feliz
Que te falasse um dia,
De viva voz diria
Mais do que a carta diz.Mas olha, tal qual é,
Não rias desse escrito,
Que pouco ou muito é dito
Tudo de boa-fé.Há nesse teu olhar
A doce luz da Lua,
Mas luz que se insinua
A ponto de abrasar…Pareça nele, sim,
Que há só doçura, embora,
Há fogo que devora…
Que me devora a mim!Que mata, mas que dá
Uma suave morte;
Mata da mesma sorte
Que uma árvore que há;Que ao pé se lhe ficou
Acaso alguém dormindo
Adormeceu sorrindo…
Porém não acordou!Esse teu seio então…
Que encantadora curva!
Como de o ver se turva
A vista e a razão!Como até mesmo o ar
Suspende a gente logo,
Pregando olhos de fogo
Em tão formoso par!
Hora Vermelha
Por que vieste, pensamento?
Já me bastava o Mar violento,
Já me bastava o Sol que ardia…
P’los meus sentidos escorria
não sei lá bem que seiva forte
que a carne toda me deixava
qual uma flor ou uma lava
num riso aberto contra a Morte.Já me bastava tudo isto.
Mas tu vieste, pensamento,
e vieste duro, turbulento.
Vieste com formas e com sangue:
erectos seios de mulher,
as carnes róseas como frutos.Boca rasgada num pedido
a que se quer e se não quer
dizer que não.
Os braços longos estendidos.
A mão em concha sobre o sexo
que nem a Vénus de Camões.Aí!, pensamento,
deixa-me a calma da Poesia!
Aqui na praia só com ela,
virgem castíssima, sincera!…
Sua mão branca saberia
chamar cordeiro ao Mar violento,
Pôr meigo, meigo, o Sol que ardia.
Mas tu vieste, pensamento.
Tua nudez, que me obsidia,
logo, subtil, encheu de alento
velhos desejos recalcados,
beijos mordidos
antes de os ver a luz do Dia.
Quem Dirá aos Amantes
Quem dirá aos amantes
o caminho
pelo qual os corpos vão
ao termo do que souberam?
E depois foi noção,
espaço, letra,
e não quiseram o retorno?
Quem os aguardará do outro lado
onde o riso,
a aveia, são o preâmbulo
da carícia no seio?Quem dirá aos
amantes que o amor há-de despir
o acontecido
e passará pela mão
como passou o frio
de flor em flor?
Saudade
Hoje que a mágoa me apunhala o seio,
E o coração me rasga atroz, imensa,
Eu a bendigo da descrença, em meio,
Porque eu hoje só vivo da descrença.À noute qaundo em funda soledade
Minh’alma se recolhe tristemente,
P’ra iluminar-me a alma descontente,
Se acende o círio triste da Saudade.E assim afeito às mágoas e ao tormento,
E à dor e ao sofrimento eterno afeito,
Para dar vida à dor e ao sofrimento,Da saudade na campa enegrecida
Guardo a lembrança que me sangra o peito,
Mas que no entanto me alimenta a vida.
Nunca Me Tinha Apaixonado Verdadeiramente
Escrevi até o princípio da manhã aparecer na janela. O sol a iluminar os olhos dos gatos espalhados na sala, sentados, deitados de olhos abertos. O sol a iluminar o sofá grande, o vermelho ruço debaixo de uma cobertura de pêlo dos gatos. O sol a chegar à escrivaninha e a ser dia nas folhas brancas. Escrevi duas páginas. Descrevi-lhe o rosto, os olhos, os lábios, a pele, os cabelos. Descrevi-lhe o corpo, os seios sob o vestido, o ventre sob o vestido, as pernas. Descrevi-lhe o silêncio. E, quando me parecia que as palavras eram poucas para tanta e tanta beleza, fechava os olhos e parava-me a olhá-la. Ao seu esplendor seguia-se a vontade de a descrever e, de cada vez que repetia este exercício, conseguia escrever duas palavras ou, no máximo, uma frase. Quando a manhã apareceu na janela, levantei-me e voltei para a cama. Adormeci a olhá-la. Adormeci com ela dentro de mim.
Nunca me tinha apaixonado verdadeiramente. A partir dos dezasseis anos, conheci muitas mulheres, senti algo por todas. Quando lhes lia no rosto um olhar diferente, demorado, deixava-me impressionar e, durante algumas semanas, achava que estava apaixonado e que as amava. Mas depois,
Uma mulher sem seios, é uma cama sem travesseiros.
Lúcia
(Alfred de Musset)
Nós estávamos sós; era de noite;
Ela curvara a fronte, e a mão formosa,
Na embriaguez da cisma,
Tênue deixava errar sobre o teclado;
Era um murmúrio; parecia a nota
De aura longínqua a resvalar nas balsas
E temendo acordar a ave no bosque;
Em torno respiravam as boninas
Das noites belas as volúpias mornas;
Do parque os castanheiros e os carvalhos
Brando embalavam orvalhados ramos;
Ouvíamos a noite, entre-fechada,
A rasgada janela
Deixava entrar da primavera os bálsamos;
A várzea estava erma e o vento mudo;
Na embriaguez da cisma a sós estávamos
E tínhamos quinze anos!Lúcia era loura e pálida;
Nunca o mais puro azul de um céu profundo
Em olhos mais suaves refletiu-se.
Eu me perdia na beleza dela,
E aquele amor com que eu a amava – e tanto ! –
Era assim de um irmão o afeto casto,
Tanto pudor nessa criatura havia!Nem um som despertava em nossos lábios;
Ela deixou as suas mãos nas minhas;
Tíbia sombra dormia-lhe na fronte,
O Amor e a Morte
Canção cruel
Corpo de ânsia.
Eu sonhei que te prostrava,
E te enleava
Aos meus músculos!Olhos de êxtase,
Eu sonhei que em vós bebia
Melancolia
De há séculos!Boca sôfrega,
Rosa brava
Eu sonhei que te esfolhava
Pétala a pétala!Seios rígidos,
Eu sonhei que vos mordia
Até que sentia
Vómitos!Ventre de mármore,
Eu sonhei que te sugava,
E esgotava
Como a um cálice!Pernas de estátua,
Eu sonhei que vos abria,
Na fantasia,
Como pórticos!Pés de sílfide,
Eu sonhei que vos queimava
Na lava
Destas mãos ávidas!Corpo de ânsia,
Flor de volúpia sem lei!
Não te apagues, sonho! mata-me
Como eu sonhei.
Mãezinha
Andam em mim fantasmas, sombras, ais…
Coisas que eu sinto em mim, que eu sinto agora;
Névoas de dantes, dum longínquo outrora;
Castelos d’oiro em mundos irreais…Gotas d’água tombando… Roseirais
A desfolhar-se em mim como quem chora…
— E um ano vale um dia ou uma hora,
Se tu me vais fugindo mais e mais!…Ó meu Amor, meu seio é como um berço
Ondula brandamente… Brandamente…
Num ritmo escultural d’onda ou de verso!No mundo quem te vê?! Ele é enorme!…
Amor, sou tua mãe! Vá… docemente
Poisa a cabeça… fecha os olhos… dorme…
Quatro Sonetos De Meditação – III
O efêmero. Ora, um pássaro no vale
Cantou por um momento, outrora, mas
O vale escuta ainda envolto em paz
Para que a voz do pássaro não cale.E uma fonte futura, hoje primária
No seio da montanha, irromperá
Fatal, da pedra ardente, e levará
À voz a melodia necessária.O efêmero. E mais tarde, quando antigas
Se fizerem as flores, e as cantigas
A uma nova emoção morrerem, cedoQuem conhecer o vale e o seu segredo
Nem sequer pensará na fonte, a sós…
Porém o vale há de escutar a voz.
Anseio
Oh, quem me dera embalado
Nesse berço vaporoso,
Nuvens do céu azulado…
Onde os meus olhos repouso
Já de tanto olhar cansado!De tanto olhar à procura
De um bem que o fosse deveras;
De uma paz, de uma ventura
Dessas venturas sinceras,
Se as pode haver sem mistura.Mas há, sem dúvida: creio
Neste desejo entranhável!
Há-de haver um rosto, um seio
De amor e gozo inefável
Donde mesmo este amor veio!Este amor que a vós me prende,
Nuvens do céu azulado!
E a vós, lâmpadas que acende
Depois do Sol apagado
Quem… de Quem tudo depende!
Gonçalves Dias
(AO PÉ DO MAR)
SE EU PUDESSE cantar a grande história,
Que envolve ardente o teu viver brilhante…
Filho dos trópicos que – audaz gigante –
Desceste ao túmulo subindo à Glória!Teu túmulo colossal – nest’hora eu fito –
Altivo, rugidor, sonoro, extenso –
O mar!… e ……. O sim, teu crânio imenso
Só podia conter-se no infinito…E eu – sou louco talvez – mas quando, forte,
Em seu dorso resvala – ardente – norte,
E ele espumante estruge, brada, grita,E em cada vaga uma canção estoura…
Eu – creio ser tu’alma que, sonora,
Em seu seio sem fim – brava – palpita!
Faz-se Luz
Faz-se luz pelo processo
de eliminação de sombras
Ora as sombras existem
as sombras têm exaustiva vida própria
não dum e doutro lado da luz mas no próprio seio dela
intensamente amantes loucamente amadas
e espalham pelo chão braços de luz cinzenta
que se introduzem pelo bico nos olhos do homemPor outro lado a sombra dita a luz
não ilumina realmente os objectos
os objectos vivem às escuras
numa perpétua aurora surrealista
com a qual não podemos contactar
senão como amantes
de olhos fechados
e lâmpadas nos dedos e na boca