Passagens sobre SilĂȘncio

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Um Amor

Aproximei-me de ti; e tu, pegando-me na mĂŁo,
puxaste-me para os teus olhos
transparentes como o fundo do mar para os afogados. Depois, na rua,
ainda apanhĂĄmos o crepĂșsculo.
As luzes acendiam-se nos autocarros; um ar
diferente inundava a cidade. Sentei-me
nos degraus do cais, em silĂȘncio.
Lembro-me do som dos teus passos,
uma respiração apressada, ou um princípio de lågrimas,
e a tua figura luminosa atravessando a praça
até desaparecer. Ainda ali fiquei algum tempo, isto é,
o tempo suficiente para me aperceber de que, sem estares ali,
continuavas ao meu lado. E ainda hoje me acompanha
essa doente sensação que
me deixaste como amada
recordação.

Urgentemente

É urgente o amor
É urgente um barco no mar

É urgente destruir certas palavras,
Ăłdio, solidĂŁo e crueldade,
alguns lamentos, muitas espadas.

É urgente inventar alegria,
multiplicar os beijos, as searas,
Ă© urgente descobrir rosas e rios
e manhĂŁs claras.

Cai o silĂȘncio nos ombros e a luz
impura, até doer.
É urgente o amor, Ă© urgente
permanecer.

Sei agora, o fim e o desespero sĂŁo a serenidade de uma solidĂŁo eterna e irremediĂĄvel, sĂŁo uma mĂĄgoa que Ă© um sofrimento eterno e irremediĂĄvel, tudo eterno e tudo irremediĂĄvel, sĂŁo o silĂȘncio de quem chora sozinho numa noite inteira.

O Lado de Fora

Eu nĂŁo procuro nada em ti,
nem a mim prĂłprio, Ă© algo em ti
que procura algo em ti
no labirinto dos meus pensamentos.

Eu estou entre ti e ti,
a minha vida, os meus sentidos
(principalmente os meus sentidos)
toldam de sombras o teu rosto.

O meu rosto nĂŁo reflecte a tua imagem
o meu silĂȘncio nĂŁo te deixa falar,
o meu corpo nĂŁo deixa que se juntem
as partes dispersas de ti em mim.

Eu sou talvez
aquele que procuras,
e as minhas dĂșvidas a tua voz
chamando do fundo do meu coração.

A harmonia secreta da desarmonia: quero nĂŁo o que estĂĄ feito mas o que tortuosamente ainda se faz. Minhas desequilibradas palavras sĂŁo o luxo de meu silĂȘncio. Escrevo por acrobĂĄticas aĂ©reas piruetas – escrevo por profundamente querer falar. Embora escrever sĂł esteja me dando a grande medida do silĂȘncio.

Rumor dos Fogos

hoje Ă  noite avistei sobre a folha de papel
o dragĂŁo em celulĂłide da infĂąncia
escuro como o interior polposo das cerejas
antigo como a insĂłnia dos meus trinta e cinco anos…

dantes eu conseguia esconder-me nas paisagens
podia beber a humidade aérea do musgo
derramar sangue nos dedos magoados
foi hĂĄ muito tempo
quando corria pelas ruas sem saber ler nem escrever
o mundo reduzia-se a um berlinde
e as mĂŁos eram pequenas
desvendavam os nocturnos segredos dos pinhais

nĂŁo quero mais perceber as palavras nem os corpos
deixou de me pertencer o choro longĂ­nquo das pedras
prossigo caminho com estes ossos cor de malva
som a som o vegetal silĂȘncio sĂ­laba a sĂ­laba o abandono
desta obra que fica por construir… o receio
de abrir os olhos e as rosas nĂŁo estarem onde as sonhei
e teu rosto ter desaparecido no fundo do mar

ficou-me esta mĂŁo com sua sombra de terra
sobre o papel branco… como Ă© louca esta mĂŁo
tentando aparar a tristeza antiga das lĂĄgrimas

Penso noventa e nove vezes e nada descubro; deixo de pensar, mergulho em profundo silĂȘncio – e eis que a verdade se me revela.

Na procura de conhecimentos, o primeiro passo Ă© o silĂȘncio, o segundo ouvir, o terceiro relembrar, o quarto praticar e o quinto ensinar aos outros.

Perante a tragĂ©dia, nunca sabemos se Ă© melhor o silĂȘncio ou as palavras, abraçarmos alguĂ©m, oferecermos-lhe a nossa sanduĂ­che ou simplesmente deixarmo-lo sozinho.

Estranha Encruzilhada

NĂŁo sei por que cruzou com a tua a minha estrada,
o destino Ă© inconsciente e nĂŁo sabe o que faz…
– Encontro-te, e afinal, jĂĄ sei que tu Ă©s amada,
encontras-me, e afinal, jĂĄ Ă© bem tarde demais…

JĂĄ nĂŁo posso esquecer a existĂȘncia passada,
perdi meu coração – o amor nĂŁo tenho mais…
– jĂĄ nĂŁo tens coração, e a tua alma, coitada,
sofrendo hĂĄ de ficar sem me esquecer jamais…

Até hoje nesse amor não tínhamos pensado:
Ă© por isso talvez que em silĂȘncio tu choras,
e em silĂȘncio tambĂ©m meu pranto Ă© derramado

Eu cheguei… Tu chegaste… Estranha encruzilhada:
se eu tenho que partir depois que tu me adoras,
se, tu tens que ficar sabendo-te adorada!…

(…) Como beber dessa bebida amarga
Tragar a dor, engolir a labuta
Mesmo calada a boca, resta o peito
SilĂȘncio na cidade nĂŁo se escuta
De que me vale ser filho da santa
Melhor seria ser filho da outra
Outra realidade menos morta
Tanta mentira, tanta força bruta(…)

NĂĄufragos que Navegam Tempestades

As tempestades sĂŁo sempre perĂ­odos longos. Poucas pessoas gostam de falar destes momentos em que a vida se faz fria e anoitece, preferem histĂłrias de praias divertidas Ă s das profundas tragĂ©dias de tantos naufrĂĄgios que sĂŁo, afinal, os verdadeiros pilares da nossa existĂȘncia.

Gente vazia tende a pensar em quem sofre como fraco… quando fracos sĂŁo os que evitam a qualquer custo mares revoltos, tempestades em que qualquer um se sente minĂșsculo, mas sĂł os que nĂŁo prestam o sĂŁo verdadeiramente. Para a gente de coração pequeno, qualquer dor Ă© grande. Os homens e mulheres que assumem o seu destino sabem que, mais cedo ou mais tarde, morrerĂŁo, mas hĂĄ ainda uma decisĂŁo que lhes cabe: desviver a fugir ou morrer sofrendo para diante.
Da morte saímos, para a morte caminhamos. O que por aqui sofremos pode bem ser a forma que temos de nos aproximarmos do coração da verdade.

Haverå sempre quem seja mestre de conversas e valente piloto de naus alheias, os que sabem sempre tudo, principalmente o que é (d)a vida do outro, e mais especificamente se estiver a passar um mau bocado. Logo se apressam a dizer que depois da tempestade vem a bonança,

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Beethoven Surdo

Surdo, na universal indiferença, um dia,
Beethoven, levantando um desvairado apelo,
Sentiu a terra e o mar num mudo pesadelo.
E o seu mundo interior cantava e restrugia.

Torvo o gesto, perdido o olhar, hirto o cabelo,
Viu, sobre a orquestração que no seu crùnio havia,
Os astros em torpor na imensidade fria,
O ar e os ventos sem voz, a natureza em gelo.

Era o nada, a eversĂŁo do caos no cataclismo,
A sĂ­ncope do som no pĂĄramo profundo,
O silĂȘncio, a algidez, o vĂĄcuo, o horror no abismo.

E Beethoven, no seu supremo desconforto,
Velho e pobre, caiu, como um deus moribundo,
Lançando a maldição sobre o universo morto!

AparĂȘncia

Cismo, numa tarde, entre esta tarde e a mor-
te, a verdade que nasce na minha carne:

Vivemos de beleza, de silĂȘncio e beleza.
Trilhamos uma estrada incerta e traiçoeira,
A estrada perfumada por um crime.

Que para nós toda certeza surge, frågil e efé-
mera, como o desenho de um dedo nos vi-
dros embaçados de uma janela durante o
mĂȘs inverno.