Textos sobre Região

28 resultados
Textos de região escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

Actividade Exterior Por Não Existir Actividade Interior

As pessoas necessitam de actividade exterior porque não têm actividade interior. Quando, pelo contrário, esta última existe, é provável que a primeira seja um aborrecimento muito incómodo, mesmo execrável, e um impedimento. Este facto também explica a inquietação daqueles que nada têm para fazer, e as suas viagens sem objectivo. O que os impele de país em país é o mesmo tédio que no seu país os congrega em tão grandes grupos que chegam a tornar-se divertidos.

Recebi certa vez uma excelente confirmação desta verdade através de um cavalheiro de cinquenta anos que não conhecia, e que me falou de uma viagem de recreio de dois anos que havia feito a terras distantes e a estranhas regiões da Terra. Quando observei que por certo tivera de enfrentar muitas dificuldades e perigos, respondeu-me muito ingenuamente, sem hesitação nem preâmbulo, mas como se enunciasse simplesmente a conclusão de um silogismo: «Não tive um instante de aborrecimento».

A Alegoria da Caverna

– Imagina agora o estado da natureza humana com respeito à ciência e à ignorância, conforme o quadro que dele vou esboçar. Imagina uma caverna subterrânea que tem a toda a sua largura uma abertura por onde entra livremente a luz e, nessa caverna, homens agrilhoados desde a infância, de tal modo que não possam mudar de lugar nem volver a cabeça devido às cadeias que lhes prendem as pernas e o tronco, podendo tão-só ver aquilo que se encontra diante deles. Nas suas costas, a certa distância e a certa altura, existe um fogo cujo fulgor os ilumina, e entre esse fogo e os prisioneiros depara-se um caminho dificilmente acessível. Ao lado desse caminho, imagina uma parede semelhante a esses tapumes que os charlatães de feita colocam entre si e os espectadores para esconder destes o jogo e os truques secretos das maravilhas que exibem.
– Estou a imaginar tudo isso.
– Imagina homens que passem para além da parede, carregando objectos de todas as espécies ou pedra, figuras de homens e animais de madeira ou de pedra, de tal modo que tudo isso apareça por cima do muro. Os que tal transportam, ou falam uns com os outros,

Continue lendo…

O Gosto Pela Contemplação

O poder interior do homem pode-se comparar ao de um rio que, impedido por um dique, forme uma bacia artificial dando assim origem a uma fonte de energia. Mas há séculos que este dique tem uma falha, a bacia está quase vazia, a energia pouco menos que gasta e todas as regiões em volta estão na escuridão. Deve-se portanto reforçar o dique e permitir que o nível da água suba. Por outras palavras, para encontrar uma ideia do homem, isto é, uma fonte de verdadeira energia, necessita-se que os homens reencontrem o gosto pela contemplação. A contemplação é o dique que alimenta de água a bacia. Ela permite aos homens acumular de novo a energia de que a acção os privou.

O Estado de Transe

O estado de transe é um estado quase normal no ser humano; basta muito pouco para provocá-lo. Uma coisa de nada, um pouco de álcool no sangue, um pouco de droga, excesso de oxigénio, a cólera, o cansaço. Mas este estado é interessante na medida em que é orientável. Trata-se de um balanço, mas esse lança mão das regiões desconhecidas do nosso espírito. De facto, não há fundamentalmente nenhuma diferença, entre um homem intoxicado pelo álcool e um santo que se entregue ao êxtase. E no entanto há apesar de tudo uma diferença: a da interpretação. O momento de loucura é preparado por uma etapa onde o assunto é mergulhado numa espécie de vacilação da consciência, de excitação cerebral violenta. É esse momento que fabrica verdadeiramente o êxtase e lhe dá o sentido. Enquanto o êxtase em si mesmo é cego. É o vazio total, sem ascensão nem queda. A calma plana. Tanto quanto se possa dizer que o santo nunca conhecerá Deus. Aproxima-O, depois regressa. E estas duas etapas são as que são. Entre as duas, é o nada. O vazio, a amnésia completa. No momento X do êxtase, o santo e o intoxicado são semelhantes, estão no mesmo local.

Continue lendo…

A Verdade Universal Não Existe

Consultei os filósofos, folheei os seus livros, examinei as suas diversas opiniões; achei-os todos orgulhosos, afirmativos, dog­máticos – mesmo no seu pretenso cepticismo -, não ignorando nada, não demonstrando nada, troçando uns dos outros; e esse ponto, que é comum a todos eles, pareceu-me ser o único em que todos concordavam. Triunfantes quando atacam, não têm vigor quando se defendem. Se examinais as suas razões, só as têm pa­ra destruir; se contais os seus caminhos, cada um está limitado ao seu; só se põem de acordo para discutir; prestar-lhes ouvidos não era o meio de me livrar da minha incerteza. Compreendi que a insuficiência do espírito humano é a pri­meira causa dessa prodigiosa diversidade de sentimentos, e que o orgulho é a segunda.
Nós não temos a medida dessa imensa máqui­na, não podemos calcular as suas proporções; não lhe conhecemos nem as primeiras leis nem a causa final; ignoramo-nos a nós mes­mos; não conhecemos nem a nossa natureza nem o nosso princípio activo; mal sabemos se o homem é um ser simples ou composto: mistérios impenetráveis rodeiam-nos por todos os lados; pairam por cima da região sensível; para os compreendermos, supomos ter inteligência, e apenas temos imaginação. Cada um de nós abre­ através desse mundo imaginário –

Continue lendo…

As Ideias dependem das Sensações

À primeira vista, nada pode parecer mais ilimitado do que o pensamento humano, que não apenas escapa a toda autoridade e a todo poder do homem, mas também nem sempre é reprimido dentro dos limites da natureza e da realidade. Formar monstros e juntar for­mas e aparências incongruentes não causam à imaginação mais em­baraço do que conceber os objectos mais naturais e mais familiares. Apesar de o corpo confinar-se num só planeta, sobre o qual se arrasta com sofrimento e dificuldade, o pensamento pode transportar-nos num instante às regiões mais distantes do Universo, ou mesmo, além do Universo, para o caos indeterminado, onde se supõe que a Natureza se encontra em total confusão. Pode-se conceber o que ainda não foi visto ou ouvido, porque não há nada que esteja fora do poder do pensamento, excepto o que implica absoluta contradição.

Entretanto, embora o nosso pensamento pareça possuir esta liber­dade ilimitada (…) ele está realmente confinado dentro de limites muito reduzidos e todo o poder criador do espírito não ultrapassa a faculdade de combinar, de transpor, aumentar ou de diminuir os materiais que nos foram fornecidos pelos sentidos e pela experiência. Quando pensamos numa montanha de ouro, apenas unimos duas idéias compatíveis,

Continue lendo…

Os Dois Infinitos

Duas coisas enchem a alma de admiração e de respeito sempre renovados e que aumentam à medida que o pensamento mais vezes se concentra nelas: acima de nós, o céu estrelado; no nosso íntimo, a lei moral. Não é necessário buscá-las e adivinhá-las como se estivessem ofuscadas por nuvens ou situadas em região inacessível, para além do meu horizonte; vejo-as ante mim e relaciono-as imediatamente com a consciência da minha existência. A primeira, a partir do lugar que ocupo no mundo exterior, estende a relação do meu ser com as coisas sensíveis a todo esse imenso espaço onde os mundos se sucedem aos mundos e os sistemas aos sistemas e a toda a duração ilimitada dos seus movimentos periódicos. A segunda parte do meu invisível eu, da minha personalidade e do meu posto num mundo que possui a verdadeira infinitude, mas no qual o entendimento mal pode penetrar e ao qual reconheço estar vinculado por uma relação não apenas contingente, mas universal e necessária (relação que também alargo a todos esses mundos visíveis).
Numa, a visão de uma infinidade de mundos quase aniquila a minha importância, na medida em que me considero uma criatura animal que, depois de ter (não se sabe como) gozado a vida durante um breve lapso de tempo,

Continue lendo…

A Sociedade é Filha do Medo

Creio que a sociedade é filha do medo, não da fome. Ou melhor, eu diria que o primeiro efeito da fome deve ter sido mais dispersar os homens do que agrupá-los, todos indo buscar o seu alimento justamente nas regiões menos exploradas. Só que, enquanto o desejo os dispersava, o medo os agrupava. Pela manhã, sentiam fome e tornavam-se anarquistas. Mas, à noite, sentiam o cansaço e o medo e amavam as leis.