Passagens sobre Asas

363 resultados
Frases sobre asas, poemas sobre asas e outras passagens sobre asas para ler e compartilhar. Leia as melhores citações em Poetris.

Joropo Para Timples E Harpa

Em duas asas prontas para o vôo
assim se foi em par a minha vida
e com rilhar de dentes me perdôo
trilhando as horas nuas na medida

Bilros tecendo rendas amarelas
bordando em vão um tempo já remoto
no sol dos girassóis da cidadela
canto um recanto que me faz devoto

A dor que existe em mim raiz que medra
no rastro mais sombrio as minhas luas
talvez não fora Sísifo ou a pedra

que encontro todo dia pelas ruas
ao revirar as heras nessa redra
trilhando na medida as horas nuas

Não Fora o Mar!

Não fora o mar,
e eu seria feliz na minha rua,
neste primeiro andar da minha casa
a ver, de dia, o sol, de noite a lua,
calada, quieta, sem um golpe de asa.

Não fora o mar,
e seriam contados os meus passos,
tantos para viver, para morrer,
tantos os movimentos dos meus braços,
pequena angústia, pequeno prazer.

Não fora o mar,
e os seus sonhos seriam sem violência
como irisadas bolas de sabão,
efémero cristal, branca aparência,
e o resto — pingos de água em minha mão.

Não fora o mar,
e este cruel desejo de aventura
seria vaga música ao sol pôr
nem sequer brasa viva, queimadura,
pouco mais que o perfume duma flor.

Não fora o mar
e o longo apelo, o canto da sereia,
apenas ilusão, miragem,
breve canção, passo breve na areia,
desejo balbuciante de viagem.

Não fora o mar
e, resignada, em vez de olhar os astros
tudo o que é alto, inacessível, fundo,
cimos, castelos, torres, nuvens, mastros,
iria de olhos baixos pelo mundo.

Continue lendo…

Quem nas asas da fama voa também padece, porque não há asas sem penas, ainda que estas sejam as plumagens com que o benemérito se adorna.

Gaivota

Se uma gaivota viesse
trazer-me o céu de Lisboa
no desenho que fizesse,
nesse céu onde o olhar
é uma asa que não voa,
esmorece e cai no mar.

Que perfeito coração
no meu peito bateria,
meu amor na tua mão,
nessa mão onde cabia
perfeito o meu coração.

Se um português marinheiro,
dos sete mares andarilho,
fosse quem sabe o primeiro
a contar-me o que inventasse,
se um olhar de novo brilho
no meu olhar se enlaçasse.

Que perfeito coração
no meu peito bateria,
meu amor na tua mão,
nessa mão onde cabia
perfeito o meu coração.

Se ao dizer adeus à vida
as aves todas do céu,
me dessem na despedida
o teu olhar derradeiro,
esse olhar que era só teu,
amor que foste o primeiro.

Que perfeito coração
morreria no meu peito morreria,
meu amor na tua mão,
nessa mão onde perfeito
bateu o meu coração.

Entardecer

Sol-posto ungindo o mar: incensos de ouro!

Recolhe funda a tarde em sonho e mágoa.
Surdina fluida: anda o silêncio a orar –
E há crepúsculos de asas e, na água,
O céu é mármore extático a cismar!

E nas faces marmóreas dos rochedos
Esboçam-se perfis,
– Cintilações,
Penumbra de segredos!

Ó painéis de nuvens sobre a terra,
Ogivas delirantes
Na água refractando…
Encheis de sombra o mar de espumas rasas,
Iniciando
A hora pânica das asas!

E, à meia luz da tarde,
Na areia requeimada,
São vultos sonolentos
As proas dos navios…

Ó tristeza dos balões
Iluminando,
Na água prateada,
Os pegos e baixios…

Dormentes constelações
Que, em fundos lacustres
E musgosos,
Pondes reverberações
Em nossos olhos ansiosos.

Ó tardes de aquático esplendor,
Descendo em meu olhar!

Num sonho de regresso,
Numa ânsia de voltar,
Em mim todo me esqueço
E fico-me a cismar.

A tarde é toda um sonho moribundo.
É já olor da cor que amorteceu.

Continue lendo…

Judia

Ah! Judia! Judia impenitente!
De erma e de turva região sombria
De areia fulva, bárbara, inclemente,
Numa desolação, chegaste um dia…

Través o céu mais tórrido, mais quente,
Onde a luz mais flamívoma radia,
A voz dos teus, nostálgica, plangente,
Vibrou, chorou, clamou por ti, Judia!

Ave de melancólicos mistérios,
Ruflaste as asas por Azuis sidérios,
Ébria dos vícios célebres que salvam…

Para alguns corações que ainda te buscam
És como os sóis que rútilos coruscam
E a torva terra do deserto escalvam!

Trazes-me em Tuas Mãos de Vitorioso

Trazes-me em tuas mãos de vitorioso
Todos os bens que a vida me negou,
E todo um roseiral, a abrir, glorioso
Que a solitária estrada perfumou.

Neste meio-dia límpido, radioso,
Sinto o teu coração que Deus talhou
Num pedaço de bronze luminoso,
Como um berço onde a vida me pousou.

O silêncio, ao redor, é uma asa quieta…
E a tua boca que sorri e anseia,
Lembra um cálix de tulipa entreaberta…

Cheira a ervas amargas, cheira a sândalo…
E o meu corpo ondulante de sereia
Dorme em teus braços másculos de vândalo…

Agrada-te a Ti

Nunca conseguirás agradar a todos, mas podes sempre agradar-te a ti.

Querer agradar a toda a gente é o primeiro passo para o desrespeito e o caminho mais rápido para a perdição.

É, aliás, tão perigoso e letal que chega a ofuscar toda a luz que nos alimenta e dizimar todo e qualquer sentido de vida com o qual tenhamos nascido. Quem escolhe essa via nunca passará de um pássaro de asas partidas, frágil e desesperado, que a qualquer momento pode ser pisado, caçado, esmagado ou morto por qualquer um. E o que não falta aí é gente que precisa cilindrar, torturar e macerar alguém para sentir algum bem-estar na sua vida.

Não te podes permitir isso.

Não podes querer ser o par de sapatos de toda a gente.

Tens de ser as tuas pernas, o teu próprio coração e a orientação da tua cabeça.

De que te adianta agradar a todos se isso pode ser desagradável para ti?

As pessoas só vão gostar todas de ti depois de morreres ou se escolheres ficar calado para sempre, o que, e na minha opinião, é apenas outra forma de estar morto,

Continue lendo…

Soneto XVII

A Pero de Maris sobre o seu livro

Sentindo-se de força e vigor falta,
Mal a que o tempo enfim todos condena,
Renovar-se outra vez a Águia ordena,
Abre as asas ao Sol, e as nuvens salta.

Depois que lá se vê soberba e alta,
Lança-se ao mar com fúria não pequena,
E caindo-lhe a velha e antiga pena,
De nova glória se reveste e esmalta.

Mar sois Maris, a língua lusitana
É esta Águia, que antiga se renova
E os ares sobre todas livre raia.

Temo-lhe o caso de Ícaro de ufana;
Mas se do Sol queimada em mar o prova,
Será para que sempre nova saia.

Alda

Alva, do alvor das límpidas geleiras,
Desta ressumbra candidez de aromas…
Parece andar em nichos e redomas
De Virgens medievais que foram freiras.

Alta, feita no talhe das palmeiras,
A coma de ouro, com o cetim das comas,
Branco esplendor de faces e de pomas
Lembra ter asas e asas condoreiras.

Pássaros, astros, cânticos, incensos
Formam-lhe aureoles, sóis, nimbos imensos
Em torno a carne virginal e rara.

Alda fez meditar nas monjas alvas,
Salvas do Vicio e do Pecado salvas,
Amortalhadas na pureza clara.

Há aves que levam a vida a dizer: «Ah, se eu quisesse!…» – e nunca levantam voo, só andam. Provavelmente, o melhor ainda será nascer sem asas e fazê-las nascer e alargar à nossa própria custa. Sonhar que voamos é sinal de crescimento.

A Cigarra Que Ficou

Depois de ouvir por tanto tempo, a fio,
As cigarras, bem perto ou nas distâncias,
Só me ficou no coração vazio
A saudade de antigas ressonâncias…

Todas se foram… bando fugidio
Em busca do calor de outras estâncias,
Carregando nas asas como um rio
Leva nas águas – seus desejos e ânsias…

E ainda cantaram na hora da partida:
Era um clamor dentro da madrugada…
Essa, entretanto, desgarrou daquelas,

E entrou, tonta de luz, na minha vida,
Porque sabia que era a mais amada,
E cantava melhor que todas elas…

Harpas Eternas

Hordas de Anjos titânicos e altivos,
Serenos, colossais, flamipotentes,
De grandes asas vívidas, frementes,
De formas e de aspectos expressivos.

Passam, nos sóis da Glória redivivos,
Vibrando as de ouro e de Marfim dolentes,
Finas harpas celestes, refulgentes,
Da luz nos altos resplendores vivos

E as harpas enchem todo o imenso espaço
De um cântico pagão, lascivo, lasso,
Original, pecaminoso e brando…

E fica no ar, eterna, perpetuada
A lânguida harmonia delicada
Das harpas, todo o espaço avassalando.

Filtro

Meu Amor, não é nada: – Sons marinhos
Numa concha vazia, choro errante…
Ah, olhos que não choram! Pobrezinhos…
Não há luz neste mundo que os levante!

Eu andarei por ti os maus caminhos
E as minhas mãos, abertas a diamante,
Hão de crucificar-se nos espinhos
Quando o meu peito for o teu mirante!

Para que corpos vis te não desejem,
Hei de dar-te o meu corpo, e a boca minha
Pra que bocas impuras te não beijem!

Como quem roça um lago que sonhou,
Minhas cansadas asas de andorinha
Hão-de prender-te todo num só vôo…

De Memória

Nunca te surpreendeu o sorriso estático
das imagens antigas? Alguma coisa aqui
tivemos de perder. Percorro dias e corpos na memória,
mas o que procuro mais é não te ver.

Quem ama quem? As máscaras trocaram-se
e a tua voz ressoa neste palco.
Trouxe versos e música para te dar,
mas o rosto que tivemos já partiu;
fiquei eu só, à beira da memória,
água do mar que não serve para beber.

Porque esta foi a paixão, o grande acto,
a tímida paixão de asas de chumbo.
Eu vi-te muitas vezes frente ao mar,
mas quem de nós para acender a cinza?
– ronda-nos a ave de presa despojada
sobre os malefícios. Aliás, coisas passadas.

Não te surpreendeu? O amor
surpreende – não convém, desarruma.
E nunca se ama ao certo quem se ama.
Procuramos apenas um brilho,
um brilho muito intenso no olhar,
um brilho que não vamos definir
e que algum dia iremos renegar.

Santos Óleos

Com os santos óleos de que vens ungido
Podes andar no mundo sem receio.
Quem veio para a Luz, por certo veio
Para ser valoroso e ser temido.

Que tudo é embalde, tudo em vão, perdido
Quando se traz esse divino anseio,
Esse doce tranporte ou doce enleio
Que deixa tudo e tudo confundido.

A Alma que comop a vela chega ao porto
Sente o melhor, consolador conforto
E a asa nas asas dos Arcanjos toca…

Os santos óleos são a luz guiadora
Que vigia por ti na pecadora
Terra e o teu mundo celestial evoca

Poema da Auto-estrada

Voando vai para a praia
Leonor na estrada preta.
Vai na brasa, de lambreta.

Leva calções de pirata,
Vermelho de alizarina,
modelando a coxa fina
de impaciente nervura.
Como guache lustroso,
amarelo de indantreno,
blusinha de terileno
desfraldada na cintura.

Fuge, fuge, Leonoreta.
Vai na brasa, de lambreta.

Agarrada ao companheiro
na volúpia da escapada
pincha no banco traseiro
em cada volta da estrada.
Grita de medo fingido,
que o receio não é com ela,
mas por amor e cautela
abraça-o pela cintura.
Vai ditosa, e bem segura.

Como um rasgão na paisagem
corta a lambreta afiada,
engole as bermas da estrada
e a rumorosa folhagem.
Urrando, estremece a terra,
bramir de rinoceronte,
enfia pelo horizonte
como um punhal que se enterra.
Tudo foge à sua volta,
o céu, as nuvens, as casas,
e com os bramidos que solta
lembra um demónio com asas.

Na confusão dos sentidos
já nem percebe, Leonor,
se o que lhe chega aos ouvidos
são ecos de amor perdidos
se os rugidos do motor.

Continue lendo…

Poeta

– Poeta errante,
de olhar vago e distante
e azul,
o teu perfil singular
recorta-se angular
ao norte e ao sul.

– Os teus fatos coçados
bate-os o vento
e leva-os aos bocados…

E os sapatos gastos
pedem grandes repastos,
abrem bocas, esfomeados.

(Nos bolsos, imagino
asas de borboletas,
molhos de folhas secas,
poeiras e papéis…)

– Poeta errante,
caem por terra os livros e a estante,
e as torres esguias das igrejas,
e as paredes velhas dos bordéis!…

– Poeta errante,
vamos dormir na sombra dos vergéis!…

Coitado! que em um tempo choro e rio

Coitado! que em um tempo choro e rio;
Espero e temo, quero e aborreço;
Juntamente me alegro e entristeço;
Du~a cousa confio e desconfio.

Voo sem asas; estou cego e guio;
E no que valho mais menos mereço.
Calo e dou vozes, falo e emudeço,
Nada me contradiz, e eu aporfio.

Queria, se ser pudesse, o impossível;
Queria poder mudar-me e estar quedo;
Usar de liberdade e estar cativo;

Queria que visto fosse e invisível;
Queira desenredar-me e mais me enredo:
Tais os extremos em que triste vivo!