Com as lágrimas do tempo e a cal do meu dia eu fiz o cimento da minha poesia.
Passagens sobre Dia
2705 resultadosO mais triste é que a única coisa que se pode fazer durante oito horas por dia é trabalhar.
Falavam-me de Amor
Quando um ramo de doze badaladas
se espalhava nos móveis e tu vinhas
solstício de mel pelas escadas
de um sentimento com nozes e com pinhas,menino eras de lenha e crepitavas
porque do fogo o nome antigo tinhas
e em sua eternidade colocavas
o que a infância pedia às andorinhas.Depois nas folhas secas te envolvias
de trezentos e muitos lerdos dias
e eras um sol na sombra flagelado.O fel que por nós bebes te liberta
e no manso natal que te conserta
só tu ficaste a ti acostumado.
Vivemos num mundo onde nos escondemos para fazer amor! Enquanto a violência é praticada em plena luz do dia.
Os médicos disseram que talvez eu tivesse amnésia pós-operatória. Não tive, mas, pensando bem, com a quantidade de contas que tenho para pagar depois de tantos dias no hospital, até que seria uma boa uma amnésia.
Um dia sem rir é um dia desperdiçado.
Alegria
De passadas tristezas, desenganos
amarguras colhidas em trinta anos,
de velhas ilusões,
de pequenas traições
que achei no meu caminho…,
de cada injusto mal, de cada espinho
que me deixou no peito a nódoa escuraduma nova amargura…
De cada crueldade
que pôs de luto a minha mocidade…
De cada injusta pena
que um dia envenenou e ainda envenena
a minha alma que foi tranquila e forte…
De cada morte
que anda a viver comigo, a minha vida,
de cada cicatriz,
eu fiz
nem tristeza, nem dor, nem nostalgia
mas heróica alegria.Alegria sem causa, alegria animal
que nenhum mal
pode vencer.
Doido prazer
de respirar!
Volúpia de encontrar
a terra honesta sob os pés descalços.Prazer de abandonar os gestos falsos,
prazer de regressar,
de respirar
honestamente e sem caprichos,
como as ervas e os bichos.
Alegria voluptuosa de trincar
frutos e de cheirar rosas.Alegria brutal e primitiva
de estar viva,
feliz ou infeliz
mas bem presa à raíz.
Quando uma existência digna preparou a velhice, não é a decadência o que ela recorda, mas os primeiros dias de imortalidade.
Cada dia vivido, é menos um dia de vida.
Ele deixa tão claro como o dia o que é, sem nominá-la… porque existem sentimentos demais pra poucas definições e palavras… e eles são tão generalizados… e a Litost, nada mais era (antes desse livro) um sentimento tão obscuro, que apesar de estar ali não notava sua existência!
Respiro e Vejo
Respiro e vejo. A noite e cada sol
vão rompendo de mim a todo o instante,
tarde e manhã que são tecido tempo,
chuva e colheita. O céu, repouso e vento.Vergel de aves. Vou entre viveiros,
a caçar com o olhar, passarinhagem
dos pequeninos sóis e das estrelas
que emigram neste céu de goiabeiras.mas sigo a jardinagem, podo o tempo,
o desgosto do espaço, a sombra e o fogo,
as florações da luz e da cegueira.E, no dia, suspensa cachoeira,
neste jogo sagrado, vivo e vejo
o que veio em meus olhos desenhado.
A Tua Morte em Mim
À memória de Raquel Moacir
A tua morte é sempre nova em mim.
Não amadurece. Não tem fim.
Se ergo os olhos dum livro, de repente
tu morreste.
Acordo, e tu morreste.
Sempre, cada dia, cada instante,
a tua morte é nova em mim,
sempre impossível.E assim, até à noite final
irás morrendo a cada instante
da vida que ficou fingindo vida.
Redescubro a tua morte como outros
descobrem o amor,
porque em cada lugar, cada momento,
tu estás viva.Viverei até à hora derradeira a tua morte.
Aos goles, lentos goles. Como se fosse
cada vez um veneno novo.
Não é tanto a saudade que dói, mas o remorso.
O remorso de todo o perdido em nossa vida,
coisas de antes e depois, coisas de nunca,
palavras mudas para sempre, um gesto
que sem remédio jamais teve destino,
o olhar que procura e nunca tem resposta.O único presente verdadeiro é teres partido.
Reagir à Saudade e à Tristeza
A maneira de reagir à saudade e à tristeza é ter um coração bom e uma cabeça viva. A saudade e a tristeza não são doenças, ou lapsos, ou intervalos, como se diz nos países do Norte. São verdades, condições, coisas do dia a dia, parecidas com apertar os atacadores dos sapatos. É banalizando-as que as acompanhamos. Um sofrimento não anula outro. Mas acompanha-o. Para isto é preciso inteligência e bondade.
Aquilo que resta são as pequenas alegrias. No contexto de tamanha tristeza e tanta verdade tornam-se grandes, por serem as únicas que há. Não falo nas alegrias que passam, como passam quase todas as paixões.
Falo das alegrias que se tornam rotinas, com que se conta: comprar revistas, jantar ao balcão, dormir junto do mar, dizer disparates, beber de mais, rir. Coisas assim. São essas coisas — entre as quais o amor — que não se podem deitar fora sem, pelo menos, morrer primeiro.
A ideia de uma obrigação social qualquer […] só essa ideia me estorva os pensamentos de um dia, e às vezes é desde a mesma véspera que me preocupo, e durmo mal, e o caso real, quando se dá, é absolutamente insignificante, não justifica nada; e o caso repete-se e eu não aprendo a aprender.
Em Viagem
Desde aquela dor tamanha
Do momento em que parti
Um só prazer me acompanha,
Filha, o de pensar em ti:Por sobre a negra paisagem
Do meu ermo coração
O luar branco da tua imagem
Veste um benigno clarão.A tarde, no azul celeste,
Há uma estrela esmorecida,
Que é o beijo que tu me deste
Na hora da despedida.Beijo tão longo e dolente,
Tão longo e cortado de ais,
Que o meu coração pressente
Que não te torno a ver mais.Conto no céu estrelado
Lágrimas de oiro sem fim:
É o pranto que tens chorado,
De dia e noite, por mim…Quando me deito na cama
E vou quase adormecido,
Oiço a tua voz que me chama,
Num suplicante gemido.Num gemido tão suave,
Tão triste na noite escura,
Que é como uma queixa d’ave
Presa numa sepultura!…Em sonho, às vezes, meu Deus,
Cuido que vou expirar,
Sem levar nos olhos meus
O teu derradeiro olhar.E sem extremo conforto
Que eu ness’hora quero ter:
Beijar a fronte do morto
Aquela que o fez viver.
É infeliz o pessimista que, preocupado, desenterra a semente todos os dias para ver se está germinando. A semente acabará apodrecendo.
Perdi a conta dos dias que transcorreram desde que fugi dos horrores da fortaleza louca de Vasco Miranda, na aldeia de Benengeli, nas montanhas de Andaluzia; fugi da morte na escuridão da noite, deixando mensagem pregada na porta.
A Herança dos Empresários
Hoje em dia o sector opulento, que é quase unicamente integrado pelos empresários, só ele tem a posição de homens livres. Aos artistas e aos pensadores resta, na maioria dos casos, o recurso a serem integrados no funcionalismo público para salvaguardarem uma relativa decência económica. O empresário não está preparado para se pronunciar como director intelectual da sociedade; a sua filosofia de vida é incoerente e, muitas vezes, suspeita. Deixará uma herança datada, mas não uma obra confidencial para as futuras gerações que irão propagá-la e, com tal, merecer no mundo o seu êxito moral face aos outros povos.
A Árvore, a Estrela e a Pequena Mão
A pequena mão desenha a árvore
onde uma estrela se aninha para dormir.
Que dia será o de amanhã
no meio dos escombros onde o eco da súplica
enlouquece os cães famintos?
Quadro trágico para uma noite assim.
A pequena mão pega na borracha
e tenta apagar toda a dor do mundo
e acender com um novo traço
a claridade que resgata a alma.
A estrela acorda numa copa alta
e segue o caminho do que sabe
até encontrar a pequena mão
que tudo reinventa à medida do que somos.
Quando o encontro acontece
já não é noite nem dia, tempo infinito,
mas apenas um lugar onde o choro das crianças
de súbito se transforma em cântico.A pequena mão desenha tudo
o que falta desenhar para o sonho fazer sentido.
É uma mão frágil mas firme, apenas sábia,
e quando abre o livro azul das manhãs
é sempre para escrever as palavras
que o estrondo abafou nas cidades feridas.
A pequena mão desenha uma árvore,
uma estrela e uma mãe aflita.
Depois desenha uma linha de horizonte,
Há livros que são no mundo como almas penadas. Andam, andam, tropeçam através de séculos pela obscuridade e pelo sofrimento, até que um dia apareça alguém que os tire do limbo do esquecimento. E isto, parecendo que não, dá esperança…