O momento presente é a única ocasião que temos para não falhar a nossa existência. Devemos aprender a «espiritualidade das árvores», que, embora permanecendo paradas, estão em constante atividade.
Passagens sobre Existência
593 resultadosSe me é permitido aplicar o termo especulação à atividade que consiste em prever a psicologia do mercado e o termo empreendimento à que consiste em prever a renda provável dos bens durante toda sua existência, de modo algum se pode dizer que a especulação sempre prevaleça sobre o investimento.
O Homem Deformado pela Sociedade
Formou Deus o homem, e o pôs num paraíso de delícias; tornou a formá-lo a sociedade, e o pôs num inferno de tolices. O homem — não o homem que Deus fez, mas o homem que a sociedade tem contrafeito, apertando e forçando em seus moldes de ferro aquela pasta de limo que no paraíso terreal se afeiçoara à imagem da divindade — o homem assim aleijado como nós o conhecemos, é o animal mais absurdo, o mais disparatado e incongruente que habita na terra.
Rei nascido de todo o criado, perdeu a realeza: príncipe deserdado e proscrito, hoje vaga foragido no meio de seus antigos estados, altivo ainda e soberbo com as recordações do passado, baixo, vil e miserável pela desgraça do presente.
Destas duas tão apostas actuações constantes, que já per si sós o tornariam ridículo, formou a sociedade, em sua vã sabedoria, um sistema quimérico, desarrazoado e impossível, complicado de regras a qual mais desvairada, encontrado de repugnâncias a qual mais aposta. E vazado este perfeito modelo de sua arte pretensiosa, meteu dentro dele o homem, desfigurou-o, contorceu-o, fê-lo o tal ente absurdo e disparatado, doente, fraco, raquítico; colocou-o no meio do Éden fantástico de sua criação — verdadeiro inferno de tolices — e disse-lhe,
A vida não tem um valor oculto que apenas alguns podem descobrir. O seu sentido resulta da construção da existência que nos é própria através de cada uma das nossas decisões.
A Felicidade na Perseverança
Meu bem-amado Lucílio, conjuro-te a tomar o único partido que pode garantir a felicidade. Dispersa e pisoteia os esplendores de fora, as suas promessas, os seus lucros; volta o olhar para o vero bem; sê feliz mercê do teu próprio cabedal. Qual é esse cabedal? Tu mesmo, e a melhor parte de ti. Este pobre corpo esforça-se por ser nosso colaborador indispensável; considera-o antes um objecto necessário do que importante. Ele procura os prazeres vãos, breves, seguidos de descontentamento e destinados, se uma grande moderação não os tempera, a passarem para o estado oposto. Sim, sim, o prazer está à beira de um declive: inclina-se para o sofrimento quando deixa de observar o justo limite. Ora, observar tal limite é difícil em relação àquilo que se acreditou fosse um bem. O ávido desejo do verdadeiro bem não oferece risco algum.
Em que consiste o verdadeiro bem – quereis saber – e qual é a fonte de onde emana?Eu to direi: é a boa consciência, as intenções virtuosas, as rectas acções, o desprezo pelos eventos fortuitos, o desenvolvimento tranquilo e regular de uma existência que anda por um só caminho. Quanto a esses homens que vão de desejo em desejo,
Existe uma coisa que uma longa existência me ensinou: toda a nossa ciência, comparada à realidade, é primitiva e inocente; e, portanto, é o que temos de mais valioso.
Só o amor e a arte tornam a existência tolerável.
Às vezes podemos ser tentados a deixarmo-nos tomar pela preguiça ou, pior, pelo desalento, sobretudo perante os trabalhos e as provocações da vida. Nestes casos, não desanimemos e invoquemos o Espírito Santo, para que, como o dom da Sua fortaleza, possa levantar o nosso coração e comunicar nova energia e novo entusiasmo à nossa existência e à nossa imitação de Jesus.
Paradoxalmente, aquilo que pode ser submetido a experimentos não é existência verdadeira, e aquilo que não pode ser objeto de experiências é existência verdadeira.
Emma Woodhouse, bonita, inteligente e rica, com uma casa confortável e bem localizada, parecia reunir as melhores bênçãos sobre a sua existência e vivera até perto dos vinte e um anos em ambiente no qual havia pouquíssima aflição ou preocupação.
Só um louco pode desejar guerras. A guera destrói a própria lógica da existência humana.
A nossa identidade constrói-se pelo que fazemos. Assim, quando nos deixamos prender e arrastar pelas algemas da monotonia, muitos de nós perdem a oportunidade de uma existência plena por não ousarem remar contra as suas próprias marés de costumes e tradições…
Dia de Natal
Hoje é dia de ser bom.
É dia de passar a mão pelo rosto das crianças,
de falar e de ouvir com mavioso tom,
de abraçar toda a gente e de oferecer lembranças.
É dia de pensar nos outros – coitadinhos – nos que padecem,
de lhes darmos coragem para poderem continuar a aceitar a sua miséria,
de perdoar aos nossos inimigos, mesmo aos que não merecem,
de meditar sobre a nossa existência, tão efémera e tão séria.Comove tanta fraternidade universal.
É só abrir o rádio e logo um coro de anjos,
como se de anjos fosse,
numa toada doce,
de violas e banjos,
entoa gravemente um hino ao Criador.
E mal se extinguem os clamores plangentes,
a voz do locutor
anuncia o melhor dos detergentes.De novo a melopeia inunda a Terra e o Céu
e as vozes crescem num fervor patético.
(Vossa excelência verificou a hora exacta em que o Menino Jesus nasceu?)
Não seja estúpido! Compre imediatamente um relógio de pulso antimagnético.)
Torna-se difícil caminhar nas preciosas ruas.
Toda a gente acotovela,
A arte serve a beleza, e a beleza é a felicidade de possuir uma forma, e a forma é a chave orgânica da existência; tudo o que vive deve possuir uma forma para poder existir, e, portanto, a arte, mesmo a trágica, conta a felicidade da existência.
Insensibilidade Experiente
Envolve-me lentamente uma carapaça de insensibilidade; verifico-o sem me queixar. É também um desfecho natural, um modo de começar a tornar-me anorgânico. A isto costuma chamar-se, segundo creio, a serenidade da idade. É algo que sem dúvida deve estar ligado a uma viragem decisiva nas relações entre as duas pulsões cuja existência supus. A transformação que a acompanha não é talvez excessivamente forte; permanece cheio de interesse tudo quanto tinha outrora, mas há um certo eco que falta; eu, que não sou músico, represento-me esta diferença como uma questão de usar ou não o pedal. A pressão sensível e incessante de uma enorme quantidade de sensações importunas deve ter apressado este estado prematuro, esta disposição a sentir tudo sub specie aeternitatis.
Não Queira Ser Especial
Se uma pessoa se aceitar tal como é e usar as suas capacidades para desenvolver a criatividade – e todas as pessoas nascem com certas capacidades, determinados talentos e alguma criatividade será imensamente feliz apesar de não ser ninguém. Um indivíduo não tem de ser forçosamente feliz só porque se converteu no homem mais rico ou no homem mais poderoso do mundo. Estas são as noções infantis do homem primitivo, um fardo que temos carregado até aos dias de hoje.
Eu gostava de lhe pedir: abandone as palavras «aceitação total». Substitua-as por palavras simples e sinta-se alegre interiormente. No momento em que se alegrar em si mesmo, toda a existência se alegra em si. Terá, então, alcançado a sintonia com a dança harmoniosa que acontece ao seu redor.
Só o homem se desfez em pedaços, e o motivo por que se desfez tem que ver com o facto de querer ser especial. Se quiser ser especial, terá de aceitar algum tipo de loucura.
O Existencialista
Dostoievski escreveu: «Se Deus não existisse, tudo seria permitido». Aí se situa o ponto de partida do existencialismo. Com efeito, tudo é permitido se Deus não existe , fica o homem, por conseguinte , abandonado, já que não encontra em si, nem fora de si, uma possibilidade a que se apegue. Antes de mais nada, não há desculpas para ele. Se, com efeito, a existência precede a essência, não será nunca possível referir uma explicação a uma natureza humana dada e imutável; por outras palavras, não há determinismo, o homem é livre, o homem é liberdade. Se, por outro lado, Deus não existe, não encontramos diante de nós valores ou imposições que nos legitimem o comportamento. Assim, não temos nem atrás de nós, nem diante de nós, no domínio luminoso dos valores, justificações ou desculpas. Estamos sós e sem desculpas. É o que traduzirei dizendo que o homem está condenado a ser livre. Condenado, porque não se criou a si próprio; e no entanto livre, porque uma vez lançado ao mundo, é responsável por tudo quanto fizer. O existencialista não crê na força da paixão. Não pensará nunca que uma bela paixão é uma torrente devastadora que conduz fatalmente o homem a certos actos e que por conseguinte,
Conhecimento Maduro
Passa-se com os livros uma coisa semelhante ao que sucede com um novo conhecimento que travamos com alguém. Num primeiro momento experimentamos um profundo prazer em encontrar coincidências gerais de opinião ou ao sentirmo-nos tocados num aspecto importante da nossa existência. Só depois, quando o conhecimento se aprofunda, começam a surgir as diferenças. Nessa altura, o comportamento inteligente caracteriza-se pela capacidade de não retroceder imediatamente, como muitas vezes acontece na juventude, e de pelo contrário reter o que há de coincidente enquanto se vão esclarecendo mutuamente todas as diferenças, sem se pretender chegar a acordo absoluto.
O último passo da razão é reconhecer a existência de uma infinidade de coisas que a ultrapassam.
Dia
De que céu caído,
oh insólito,
imóvel solitário na onda do tempo?
És a duração,
o tempo que amadurece
num instante enorme, diáfano:
flecha no ar,
branco embelezado
e espaço já sem memória de flecha.
Dia feito de tempo e de vazio:
desabitas-me, apagas
meu nome e o que sou,
enchendo-me de ti: luz, nada.E flutuo, já sem mim, pura existência.
Tradução de Luis Pignatelli