Meu Deus
Meu Deus, me dê a coragem de viver trezentos e sessenta e cinco dias e noites, todos vazios de Tua presença. Me dê a coragem de considerar esse vazio como uma plenitude. Faça com que eu seja a Tua amante humilde, entrelaçada a Ti em êxtase. Faça com que eu possa falar com este vazio tremendo e receber como resposta o amor materno que nutre e embala. Faça com que eu tenha a coragem de Te amar, sem odiar as Tuas ofensas à minha alma e ao meu corpo. Faça com que a solidão não me destrua. Faça com que minha solidão me sirva de companhia. Faça com que eu tenha a coragem de me enfrentar. Faça com que eu saiba ficar com o nada e mesmo assim me sentir como se estivesse plena de tudo. Receba em teus braços meu pecado de pensar.
Passagens sobre Humildes
172 resultadosAmor De Mentiras
“Amor… De Mentiras…”
I
Eram beijos de fogo, eram de lavas,
e sabiam a sonhos e ambrosias.
Como pensar que a boca com que os dava
era a mesma afinal com que mentias?Se eras as mais humilde das escravas
em dádivas, anseios, alegrias,
– como prever que o amor que me juravas
seria mais uma das tuas heresias ?Como supor ser tudo um falso jogo?
E crer que se extinguisse aquele fogo
que acendia em teus olhos duas piras?E descobrir, – no instante em que me amavas, –
que em tua boca ansiosa misturavas
ao mesmo tempo beijos e mentiras ?
Haverá alguém de espírito humilde que tenha convicções fortes?
Olhasses tu o mundo da perspectiva da rã ou da relva e serias tão humilde e discreto como elas.
O Segredo das Mulheres
Como os homens andam sempre atrasados em relação às mulheres (porque só pensam numa coisa de cada vez e acham que falar acerca das coisas é pior do que fazê-las), quem sabe se não é estudando o comportamento feminino de hoje que poderemos vislumbrar o nosso macaquismo masculino de amanhã?
As mulheres de hoje sabem quem lhes pode fazer mal: são as outras mulheres. Os homens, por muito amados e queridos, nem sequer são considerados competidores. São como são, têm a inteligência e o material que têm – e que Deus os abençoe por ser assim, como os pêssegos-rosa e os arcos-íris e todos os outros fenómenos naturais que são difíceis de prever e de controlar.O segredo das mulheres, que nenhum homem pode perceber, a não ser que seja amado por alguma que se sinta suficientemente amada por um para lhe contar mais do que o suficiente para ele continuar a existir tal como é (que mais não se lhe pede) é: os homens não entram na equação. É tudo uma questão entre elas.
Elas são espertas. É por isso que morrem de medo umas das outras. Conhecem o perigo e sabem quem pode emperigá-las.
Entendimento Influenciado pela Vontade
Na ciência de julgar, alguma vez é desculpável o erro do entendimento, o da vontade nunca; como se o entender mal não fosse crime, erro sim; ou como se houvesse uma grande diferença entre o erro, e o crime: o entendimento pode errar, porém só a vontade pode delinquir. Assim se desculpam comummente os julgadores, mas é porque não vêem, que o que dizem que procedeu do entendimento, se bem se ponderar, procedeu unicamente da vontade. É um parto suposto, cuja origem, não é aquela que se dá. Querem os sábios enobrecer o erro, com o fazer vir do entendimento, e com lhe encobrir o vício que trouxe da vontade; mas quem é que deixa de ver, que o nosso entendimento quási sempre se sujeita ao que nós queremos; e que o seu maior empenho, é servir à nossa inclinação; por isso raras vezes se opõe, e o mais em que se ocupa, é em conformar-se de tal sorte ao nosso gosto, que ainda a nós mesmos fique parecendo, que foi resolução do entendimento aquilo que não foi senão acto da vontade.
O entendimento é a parte que temos em nós mais lisonjeira; daqui vem que nem sempre segue a razão,
Foste Tu que me Desvendaste o Amor
Querida: estamos sozinhos à mesa nesta noite infinita em que a chuva cai lá fora com um ruido monótono de chôro. Estamos sós nesta noite de saudade e nunca foi maior a nossa companhia, porque cada vez me sinto mais perto dos mortos. Rodeiam-nos, chegam-se para mim e sentam-se ao nosso lume. São legião… Mais perto, que eu faço uma labareda que nos aqueça a todos. A velha mesa da consoada foi-se despovoando com o tempo, mas hoje estão aqui sentadas todas as figuras que conheço desde que me conheço… Tu, toda branca, e que mesmo através do túmulo me transmites sonho; tu, mais longe, mais apagada e sumida; e tu, que vens de volta, e encostas os teus cabelos brancos aos meus cabelos brancos, para me dizeres baixinho: — Menino!—Pois ainda me chamas menino?! — Outro acolá sorri e outro tenta falar… Dois vivos e tantos mortos sentados à roda desta mesa que veio de meu pai, foi de meu avô e pertenceu já a outras gerações desconhecidas, mas que estão aqui também comigo, escutando e sorrindo, enquanto as pinhas se transformam em flores maravilhosas e as vides que plantei se reduzem a cinza!… Nunca estive tão acompanhado como hoje nesta ceia religiosa de fantasmas,
Noitinha
A noite sobre nós se debruçou…
Minha alma ajoelha, põe as mãos e ora!
O luar, pelas colinas, nesta hora,
É água dum gomil que se entornou…Não sei quem tanta pérola espalhou!
Murmura alguém pelas quebradas fora…
Flores do campo, humildes, mesmo agora.
A noite, os olhos brandos, lhes fechou…Fumo beijando o colmo dos casais…
Serenidade idílica de fontes,
E a voz dos rouxinóis nos salgueirais…Tranquilidade… calma… anoitecer…
Num êxtase, eu escuto pelos montes
O coração das pedras a bater…
Somos orgulhosos ou humildes consoante a maneira como os negócios nos correm.
Mentir-me não Adianta
Vieram hoje dizer-me
mentiras a meu respeito,
mas nunca podem esconder-me
o que lhes vai lá no peito.Só quero hoje a verdade,
mais nua que ave perdida…
Os sinos tangem-me a idade
na alta torre da vida.Mentiras, fora daqui!
Ide acampar noutra parte!
Existe um espelho que ri,
ao desnudar-vos com arte.Palavras, gestos, partissem,
morressem antes do dia!
Humildes, se diluíssem
na madrugada bem fria.Deixai-me as cordas do sino
de me sentir como sou.
Puxando-as, oiço o menino
que nas entranhas ficou.Idade! Já tenho tanta!
Nasci num dia riscado
do calendário do Tempo.
O meu destino é dobrado,
mentir-me não adianta!
Nunca Mostrar Espírito e Entendimento
Como ainda é inexperiente quem supõe que, ao mostrar espírito e entendimento, recorre a um meio seguro para fazer-se benquisto em sociedade! Na verdade, na maioria das pessoas, tais qualidades despertam ódio e rancor, que serão tão mais amargos quanto quem os sentir não tiver o direito de externar o motivo, chegando até a dissimulá-lo para si mesmo. Isso acontece da seguinte forma: se alguém nota e sente uma grande superioridade intelectual naquele com quem fala, então conclui tacitamente e sem consciência clara que este, em igual medida, notará e sentirá a sua inferioridade e a sua limitação. Essa conclusão desperta o ódio, o rancor e a raiva mais amarga.
(…) Mostrar espírito e entendimento é uma maneira indirecta de repreender nos outros a sua incapacidade e estupidez. Ademais, o indivíduo comum revolta-se ao avistar o seu oposto, sendo a inveja o seu instigador secreto. A satisfação da vaidade é, como se pode ver diariamente, um prazer que as pessoas colocam acima de qualquer outro, mas que só é possível por intermédio da comparação delas próprias com os demais. No entanto, nenhum mérito torna o homem mais orgulhoso do que o intelectual: só neste repousa a sua superioridade em relação aos animais.
Portugal
Maior do que nós, simples mortais, este gigante
foi da glória dum povo o semideus radiante.
Cavaleiro e pastor, lavrador e soldado,
seu torrão dilatou, inóspito montado,
numa pátria… E que pátria! A mais formosa e linda
que ondas do mar e luz do luar viram ainda!
Campos claros de milho moço e trigo loiro;
hortas a rir; vergéis noivando em frutos de oiro;
trilos de rouxinóis; revoadas de andorinhas;
nos vinhedos, pombais: nos montes, ermidinhas;
gados nédios; colinas brancas olorosas;
cheiro de sol, cheiro de mel, cheiro de rosas;
selvas fundas, nevados píncaros, outeiros
de olivais; por nogais, frautas de pegureiros;
rios, noras gemendo, azenhas nas levadas;
eiras de sonho, grutas de génios e de fadas:
riso, abundância, amor, concórdia, Juventude:
e entre a harmonia virgiliana um povo rude,
um povo montanhês e heróico à beira-mar,
sob a graça de Deus a cantar e a lavrar!
Pátria feita lavrando e batalhando: aldeias
conchegadinhas sempre ao torreão de ameias.
Cada vila um castelo. As cidades defesas
por muralhas, bastiões, barbacãs, fortalezas;
e, a dar fé, a dar vigor,
A flor mais bem cheirosa é tímida e humilde.
Ode Marítima
Sozinho, no cais deserto, a esta manhã de Verão,
Olho pro lado da barra, olho pro Indefinido,
Olho e contenta-me ver,
Pequeno, negro e claro, um paquete entrando.
Vem muito longe, nítido, clássico à sua maneira.
Deixa no ar distante atrás de si a orla vã do seu fumo.
Vem entrando, e a manhã entra com ele, e no rio,
Aqui, acolá, acorda a vida marítima,
Erguem-se velas, avançam rebocadores,
Surgem barcos pequenos de trás dos navios que estão no porto.
Há uma vaga brisa.
Mas a minh’alma está com o que vejo menos,
Com o paquete que entra,
Porque ele está com a Distância, com a Manhã,
Com o sentido marítimo desta Hora,
Com a doçura dolorosa que sobe em mim como uma náusea,
Como um começar a enjoar, mas no espírito.Olho de longe o paquete, com uma grande independência de alma,
E dentro de mim um volante começa a girar, lentamente,Os paquetes que entram de manhã na barra
Trazem aos meus olhos consigo
O mistério alegre e triste de quem chega e parte.
Ser humilde com os superiores é obrigação, com os colegas é cortesia, com os inferiores é nobreza.
O Sucesso para um Grande Amor
Estou contente porque a minha querida não tem ainda o afecto exclusivo e único que há-de sentir um dia por um homem, apesar de todas as suas teorias que há-de ver voar, voar para tão longe ainda!… E no entanto, elas são tão verdadeiras! Ainda assim, minha querida Júlia, uma das coisas melhores da nossa vida de tão prosaico século, é o amor, o grande e discutido amor, o nosso encanto e o nosso mistério; as nossas pétalas de rosa e a nossa coroa de espinhos. O amor único, doce e sentimental da nossa alma de portugueses, o amor de que fala Júlio Dantas, «uma ternura casta, uma ternura sã» de que «o peito que o sente é um sacrário estrelado», como diz Junqueiro; o amor que é a razão única da vida que se vive e da alma que se tem; a paixão delicada que dá beijos ao luar e alma a tudo, desde o olhar ao sorriso, — é ainda uma coisa nobre, bela e digna! Digna de si, do seu sentir, do seu grande coração, ao mesmo tempo violento e calmo. Esse amor que «em sendo triste, canta, e em sendo alegre, chora», esse amor há-de senti-lo um dia,
Devemos ser humildes. Segundo creio, a humildade não é uma virtude, mas tão-só a verdade. Não somos senão pouca coisa. É bom conhecermos os nossos limites, porque isso implica também que tomemos consciência das nossas potencialidades.
Mysticismo Humano
A alma é como a noute escura, immensa e azul,
Tem o vago, o sinistro, e os canticos do sul,
Como os cantos d’amor serenos das ceifeiras
Que cantam ao luar, á noute pelas eiras…
Ás vezes vem a nevoa á alma satisfeita,
E cae sombria, vaga, e meuda e desfeita…
E como a folha morta em lagos somnolentos
As nossas illusões vão-se nos desalentos!Tem um poder immenso as Cousas na tristeza!
Homem! conheces tu o que é a natureza?…
– É tudo o que nos cerca – é o azul, o escuro,
É o cypreste esguio, a planta, o cedro duro,
A folha, o tronco a flor, os ramos friorentos,
É a floresta espessa esguedelhada aos ventos;
Não entra o vicio aqui com beijos dissolutos,
Nem as lendas do mal, nem os choros dos lutos!…– E os que viram passar serenos os seus dias…
E curvados se vão, ás longas ventanias,
Cheio o peito de sol, atravez das florestas,
Á calma do meio dia… e dormiam as sestas,
Tranquillos sobre a eira, entre as hervas nas leivas…
Lágrima
Orvalho do sofrer – dentro do peito nasce
e nos olhos em pranto sem querer floresce;
aumenta a pouco e pouco, e cada vez mais cresce…
– e rola finalmente em gotas pela face…sublime florescer da dor… se ela falasse
diria para o mundo a mais sentida prece,
no entanto, em seu silencio humilde é que enternece
pois guarda na mudez um triste desenlace…Repentina, ela brota, assim como se fosse
( de um mar que em nosso peito as ondas estugisse)
uma gota que o vento, aos nossos olhos, trouxe…Nuns olhos de mulher, porém, ainda não disse:
– é a pérola de um mar completamente doce,
de um mar feito de amor… de sonho e de meiguice!
As Obras e os Mistérios do Amor
Quem ama não sente o amor no seu coração. Vive no coração do amor. O amor que nos oferece os sonhos mais belos e nos faz voar, é o mesmo que nos crava os espinhos mais duros na carne e se faz mar nas nossas lágrimas.
O amor faz o que quer, onde e quando alguém o aceita. Não tem outras mãos ou olhos senão os nossos. A força do amor é aquela de que nós formos capazes. Por isso, amar é, antes de tudo, aceitar.
Há quem entregue a sua vida por amor. Quem se abandone a si mesmo, deixando para trás aquilo que outros julgam ser o seu maior tesouro… A vida é para amar, quem não ama, apenas sobrevive.
Há quem morra por amor. Mas esta vida é apenas um pedaço de outra, maior, que só é vivida pelos que tiverem a coragem imprudente de ser luz e calor na vida de alguém, aceitando-o como é… e como quer ser. Sem o julgar. Respeitando sempre os seus espaços e os seus tempos, o seu passado e o seu futuro. Amar é corrigir e ajudar quem se ama a ser melhor, mas não o obrigando aos nossos pensamentos e sentimentos,