A Distorção do Entendimento
Que difícil é propor um problema ao entendimento alheio sem corromper esse entendimento pela maneira de propor! Se dizemos: acho isto belo, acho obscuro, ou outra coisa semelhante, arrastamos a imaginação para este juízo, ou irritamo-la, levando-a ao juízo contrário. Mais vale nada dizer, e então o outro julga segundo o que é, ou segundo o que é naquele momento, e de acordo com o que as outras circunstâncias, de que não somos responsáveis, lá tiverem posto. Mas pelo menos nós não pusemos nada; a não ser que o nosso silêncio tenha também o seu efeito, segundo o sentido e a interpretação que ele estiver disposto a atribuir-lhe, ou segundo o que depreende dos movimentos e da expressão do rosto, ou do tom de voz, conforme for melhor ou pior fisionomista: tão difícil é não deslocar um entendimento da sua base natural, ou antes, tão pouco um entendimento tem de firme e estável!
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Quem presumir, Senhora, de louvar-vos
Com humano saber, e não divino,
Ficará de tamanha culpa dino
Quamanha ficais sendo em contemplar-vos.Não pretenda ninguém de louvor dar-vos,
Por mais que raro seja, e peregrino:
Que vossa fermosura eu imagino
Que Deus a ele só quis comparar-vos.Ditosa esta alma vossa, que quisestes
Em posse pôr de prenda tão subida,
Como, Senhora, foi a que me destes.Melhor a guardarei que a própria vida;
Que, pois mercê tamanha me fizestes,
De mim será jamais nunca esquecida.
Os Convencidos da Vida
Todos os dias os encontro. Evito-os. Às vezes sou obrigado a escutá-los, a dialogar com eles. Já não me confrangem. Contam-me vitórias. Querem vencer, querem, convencidos, convencer. Vençam lá, à vontade. Sobretudo, vençam sem me chatear.
Mas também os aturo por escrito. No livro, no jornal. Romancistas, poetas, ensaístas, críticos (de cinema, meu Deus, de cinema!). Será que voltaram os polígrafos? Voltaram, pois, e em força.
Convencidos da vida há-os, afinal, por toda a parte, em todos (e por todos) os meios. Eles estão convictos da sua excelência, da excelência das suas obras e manobras (as obras justificam as manobras), de que podem ser, se ainda não são, os melhores, os mais em vista.
Praticam, uns com os outros, nada de genuinamente indecente: apenas um espelhismo lisonjeador. Além de espectadores, o convencido precisa de irmãos-em-convencimento. Isolado, através de quem poderia continuar a convencer-se, a propagar-se?
(…) No corre-que-corre, o convencido da vida não é um vaidoso à toa. Ele é o vaidoso que quer extrair da sua vaidade, que nunca é gratuita, todo o rendimento possível. Nos negócios, na política, no jornalismo, nas letras, nas artes. É tão capaz de aceitar uma condecoração como de rejeitá-la.
Os melhores livros são os que nos contam aquilo que já sabíamos.
A melhor medicina é a vida ordenada.
Quanto Mais Objectos de Interesse um Homem Tem, Mais Ocasiões Tem Também de Ser Feliz
Toda a desilusão é para mim uma doença que certas circunstâncias podem tornar inevitável, é verdade, mas que, quando se produz, nem por isso deve deixar de ser tratada o mais rápidamente possível, em vez de ser olhada como uma forma superior de sabedoria. Um homem, suponhamos, gosta de morangos e um outro não gosta; em que é que o último é superior ao primeiro? Não há nenhuma prova impessoal e abstracta de que os morangos sejam bons ou maus. Para quem gosta são bons, para quem não gosta são maus. Mas o homem que gosta tem um prazer que o outro não conhece; sobre este ponto, a sua vida é mais agradável e está melhor adaptado ao mundo onde ambos têm de viver.
O que é verdadeiro neste exemplo trivial é igualmente verdade nas questões mais importantes. O homem que gosta de assistir a desafios de futebol é sob esse aspecto supeior ao homem que não gosta. O que aprecia a leitura é ainda mais superior do que aquele que não a aprecia, pois as oportunidade de ler são mais frequentes do que as de ver desafios de futebol. Quanto mais objectos de interesse um homem tem,
Não poderia melhor comparar-se o absurdo das meias medidas do que ao das medidas absolutas.
Se Nada Há de Novo
Se nada há de novo e tudo o que há
já dantes era como agora é,
só ilusão a criação será:
criar o já criado para quê?Que alguém me mostre, sobre um livro antigo
como quinhentas translações astrais,
a tua imagem, na inscrição, no abrigo
do espírito em seus signos iniciais.Que eu saiba o que diria o velho mundo
deste milagre que é a tua forma;
se te viram melhor, se me confundo,se as translações seguem a mesma norma.
Mas disto estou seguro: antigos textos
louvaram mais com bem menores pretextos.Tradução de Carlos de Oliveira
Escreva-se sempre para estar só. A escrita afasta concretamente o mundo. Não é o melhor método, mas é um.
Nem sempre faço o que é melhor pra mim, mas nunca faço o que eu não tô a fim de fazer
As pessoas mais felizes não têm as melhores coisas. Elas sabem fazer o melhor das oportunidades que aparecem em seus caminhos.
A Minha Cidade Preferida
É o Porto. Tem umas características muito particulares, muito suas. Ou melhor, tinha. Estão agora a fazer força para tirá-las, ao contrário do que se faz lá fora. Mesmo às cidades que foram arrasadas pela guerra, como Varsóvia, na Polónia, que foi refeita tal qual era antes. O mesmo aconteceu em Berlim. Aqui destroem o que está feito para construir uma porcaria qualquer incaracterística, que não representa coisa nenhuma. Por exemplo, o que querem fazer no mercado do Bolhão é uma vergonha – querem meter lá um supermercado, ou outra borra qualquer, que tira todo o carácter à cidade e a modifica. Assim, as cidades confundem-se todas: a gente chega a uma cidade e já não sabe onde está. É tudo igual em toda a parte.
O Amor pelo Outro
Os filósofos e os próprios teólogos distinguem duas espécies de amor, a saber, o amor que chamam de concupiscência, que não passa do desejo ou do sentimento que se tem por aquilo que nos dá prazer, sem que nos interessemos se ele está a receber amor; e o amor de benevolência, que é o sentimento que se tem por aquele que, pelo seu prazer e sua felicidade, nos dá amor. O primeiro faz-nos visar o nosso prazer, e o segundo, o prazer do outro, mas como se fizesse, ou melhor, constituindo o nosso; pois, se não tornasse a cair sobre nós de alguma maneira, não poderíamos por ele nos interessar, porque é impossível, seja o que for que digam, nos desapegarmos do nosso próprio bem.
A candeia que vai à frente é a que alumia melhor.
É melhor ser pirata que alistar-se na marinha estadunidense.
O homem incapaz de julgar, por um lado, nem vê o que é melhor nem o aprova; por outro, aprova o que é pior e segue-o como se fosse o melhor.
Amo-te, Portugal
Portugal,
Estou há que séculos para te escrever. A primeira vez que dei por ti foi quando dei pela tua falta. Tinha 19 anos e estava na Inglaterra. De repente, deixei de me sentir um homem do mundo e percebi, com tristeza, que era apenas mais um dos teus desesperados pretendentes.
Apaixonaste-me sem que eu desse por isso. Deve ter sido durante os meus primeiros 18 anos de vida, quando estava em Portugal e só queria sair de ti. Insinuaste-te. Não fui eu que te escolhi. Quando descobri que te amava, já era tarde de mais.
Eu não queria ficar preso a ti; queria correr mundo. Passei a querer correr para ti – e foi para ti que corri, mal pude.
Teria preferido chegar à conclusão que te amava por uma lenta acumulação de razões, emoções e vantagens. Mas foi ao contrário. Apaixonei-me de um dia para o outro, sem qualquer espécie de aviso, e desde esse dia, que remédio, lá fui acumulando, lentamente, as razões por que te amo, retirando-as uma a uma dentre todas as outras razões, para não te amar, ou não querer saber de ti.
Custou-me justificar o meu amor por ti.
As ideias harmonizam-se muito melhor entre elas do que os homens.
Inveja é Vaidade
O que chamamos inveja, não é senão vaidade. Continuamente acusamos a injustiça da fortuna (sorte), e a consideramos ainda mais cega do que o amor, na repartição das felicidades. Desejamos o que os outros possuem, porque nos parece, que tudo o que os outros têm, nós o merecíamos melhor; por isso olhamos com desgosto para as cousas alheias, por nos parecer, que deviam ser nossas: que é isto senão vaidade? Não podemos ver luzimento em outrem, porque imaginamos, que só em nós é próprio: cuidamos, que a grandeza só em nós fica sendo natural, e nos mais violenta: o esplendor alheio passa no nosso conceito por desordem do acaso, e por miséria do tempo.
As Discussões Nunca São Feitas de Boa Fé
Só os ingénuos podem crer que uma discussão visa resolver um problema ou esclarecer uma questão difícil. Na realidade, a sua única justificação é testar a capacidade de os participantes derrubarem o adversário. O que está em jogo não é a verdade, mas o amor próprio. O bem falante leva a melhor sobre o que tartamudeia, o temerário sobre o tímido e o arrebatado sobre o escrupuloso. Estar de boa fé equivale a potenciar as desvantagens, porquanto os escrúpulos se somam à circunspecção, dificultando a expressão. O que é a boa fé? Uma conduta de fracasso, um autêntico suicídio… Quem participa em debates fala sem escutar, espezinha qualquer raciocínio que não seja conduzido por si próprio, despreza as oposições, ignora as obstrucções e, de certo modo, conquista a vitória à força de palavras.
Cultiva a má fé com o profissionalismo do jardineiro que cria uma planta venenosa cujo veneno possui suavidades tão profundas que quem o prova já não passa sem ele. Para dar melhor resultado, a má fé não deve ser demasiado subtil. Com efeito, o seu impacte não será suficiente para desnortear o outro, rápida e duradouramente. Nesta matéria, a subtileza não substitui a brutalidade que, não obstante a detestável fama em certos meios intelectuais,