As ciências têm as raízes amargas, porém os frutos são doces.
Passagens sobre Raízes
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A ideia de que somente é belo o que é novo e jovem envenena as nossas relações com o passado e com o nosso próprio futuro. Impede-nos de compreender as nossas raízes e as maiores obras da nossa cultura e das outras culturas. Faz-nos também recear o que está à nossa frente e leva muita gente a fugir à realidade.
Destino, Acaso ou Coincidência
Podemos muito bem, se for esse o nosso desejo, vaguear sem destino pelo vasto mundo do acaso. Que é como quem diz, sem raízes, exactamente da mesma maneira que a semente alada de certas plantas esvoaça ao sabor da brisa primaveril.
E, contudo, não faltará ao mesmo tempo quem negue a existência daquilo a que se convencionou chamar o destino. O que está feito, feito está, o que tem se ser tem muita força e por aí fora. Por outras palavras, quer queiramos quer não, a nossa existência resume-se a uma sucessão de instantes passageiros aprisionados entre o «tudo» que ficou para trás e o «nada» que temos pela frente. Decididamente, neste mundo não há lugar para as coincidências nem para as probabilidades.
Na verdade, porém, não se pode dizer que entre esses dois pontos de vista exista uma grande diferença. O que se passa – como, de resto, em qualquer confronto de opiniões – é o mesmo que sucede com certos pratos culinários: são conhecidos por nomes diferentes mas, na prática, o resultado não varia.
Os preconceitos têm mais raízes do que os princípios.
A coisa mais bela que o homem pode experimentar é o mistério. É essa emoção fundamental que está na raiz de toda ciência e toda arte.
A Noite na Ilha
Dormi contigo toda a noite
junto ao mar, na ilha.
Eras doce e selvagem entre o prazer e o sono,
entre o fogo e a água.Os nossos sonos uniram-se
talvez muito tarde
no alto ou no fundo,
em cima como ramos que um mesmo vento agita,
em baixo como vermelhas raízes que se tocam.0 teu sono separou-se
talvez do meu
e andava à minha procura
pelo mar escuro
como dantes,
quando ainda não existias,
quando sem te avistar
naveguei a teu lado
e os teus olhos buscavam
o que agora
— pão, vinho, amor e cólera —
te dou às mãos cheias,
porque tu és a taça
que esperava os dons da minha vida.Dormi contigo
toda a noite enquanto
a terra escura gira
com os vivos e os mortos,
e ao acordar de repente
no meio da sombra
o meu braço cingia a tua cintura.
Nem a noite nem o sono
puderam separar-nos.Dormi contigo
e, ao acordar, tua boca,
A Solidão
Ora, a solidão, ainda vai ter de aprender muito para saber o que isso é, Sempre vivi só, Também eu, mas a solidão não é viver só, a solidão é não sermos capazes de fazer companhia a alguém ou a alguma coisa que está dentro de nós, a solidão não é uma árvore no meio duma planície onde só ela esteja, é a distância entre a seiva profunda e a casca, entre a folha e a raiz, Você está a tresvariar, tudo quanto menciona está ligado entre si, aí não há nenhuma solidão, Deixemos a árvore, olhe para dentro de si e veja a solidão, Como disse o outro, solitário andar por entre a gente, Pior do que isso, solitário estar onde nem nós próprios estamos.
Disseram que o amor pelo dinheiro é a raiz de todos os males. O mesmo se pode dizer da falta de dinheiro.
A raiz do mal reside no facto de se insistir demasiadamente que no êxito da competição está a principal fonte de felicidade.
O Êxito e a Felicidade
A raiz do mal reside no facto de se insistir demasiadamente que no êxito da competição está a principal fonte da felicidade. Não nego que o sentimento do triunfo torna a vida mais agradável. Um pintor, por exemplo, que viveu obscuramente na juventude, decerto se sentirá feliz se o seu talento acabar por ser reconhecido. Não nego também que o dinheiro, até um certo limite, é capaz de aumentar a felicidade; para lá desse limite, julgo que não. O que eu afirmo é que o êxito só pode ser um dos vários elementos da felicidade e que é demasiado o preço pelo qual se obtém se a ele se sacrificam todos os outros.
A sensualidade ultrapassa muitas vezes o crescimento do amor, de forma que a raiz permanece fraca e arranca-se facilmente.
Amamos as nossas mães quase sem o saber e só nos damos conta da profundidade das raízes desse amor no momento da derradeira separação.
Devemos desconfiar do amor que nasce antes de criar raízes: o fogo incipiente apaga-se com pouca água.
A Realidade Transfigurada
Não quero ter a terrível limitação de quem vive apenas do que é passível de fazer sentido. Eu não: quero é uma verdade inventada. O que te direi? te direi os instantes. Exorbito-me e só então é que existo e de um modo febril. Que febre: conseguirei um dia parar de viver? ai de mim, que tanto morro. Sigo o tortuoso caminho das raízes rebentando a terra, tenho por dom a paixão, na queimada de tronco seco contorço-me às labaredas. A duração de minha existência dou uma significação oculta que me ultrapassa. Sou um ser concomitante: reúno em mim o tempo passado, o presente e o futuro, o tempo que lateja no tique-taque dos relógios.
Para me interpretar e formular-me preciso de novos sinais e articulações novas em formas que se localizem aquém e além de minha história humana. Transfiguro a realidade e então outra realidade, sonhadora e sonâmbula, me cria. E eu inteira rolo e à medida que rolo no chão vou me acrescentando em folhas, eu, obra anônima de uma realidade anônima só justificável enquanto dura a minha vida. E depois? depois tudo o que vivi será de um pobre supérfluo.
Mas por enquanto estou no meio do que grita e pulula.
As raízes do estudo são amargas, mas seus frutos são doces.
As Mãos
Brandamente escrevem dos espasmos do sol.
Envelhecem do pulso ao cérebro, ao calor baço
de um revérbero no eixo dos ventos, usura
das máscaras que, sucessivamente, as transformamde consciência em cal ou metal obscuro.
E já não é por si que a presença existe ou
subsiste o que separa. Destroem as sementes,
apodrecem como um sopro e não são remansona areia ou domadoras de chamas. Igualam-se
à água, para serem raiz do que se cala
e insinuam-se, para sempre, no pó da noite.Um castelo de pele tomba. Deixam de ser
nomeadas ou nome. Escrevem, brandamente,
do termo da música o luto do silêncio.
A Mulher que Passa
Meu Deus, eu quero a mulher que passa.
Seu dorso frio é um campo de lírios
Tem sete cores nos seus cabelos
Sete esperanças na boca fresca!Oh! Como és linda, mulher que passas
que me sacias e suplicias
Dentro das noites, dentro dos dias!Teus sentimentos são poesia
Teus sofrimentos, melancolia.
Teus pêlos leves são relva boa
Fresca e macia.
Teus belos braços são cisnes mansos
Longe das vozes da ventania.Meu Deus, eu quero a mulher que passa!
Como te adoro, mulher que passas
Que vens e passas, que me sacias
Dentro das noites, dentro dos dias!Porque me faltas, se te procuro?
Por que me odeias quando te juro
Que te perdia se me encontravas
E me encontrava se te perdias?Por que não voltas, mulher que passa?
Por que não enches a minha vida?
Por que não voltas, mulher querida
Sempre perdida, nunca encontrada?
Por que não voltas à minha vida
Para o que sofro não ser desgraça?Meu Deus, eu quero a mulher que passa!
Igualdade não é Identidade
Combaterei pelo primado do Homem sobre o indivíduo – como do universal sobre o particular. Creio que o culto do universal exalta e liga as riquezas particulares – e funda a única ordem verdadeira, que é a da vida. Uma árvore está em ordem, apesar das raízes que diferem dos ramos.
Creio que o culto do particular só leva à morte – porque funda a ordem na semelhança. Confunde a unidade do Ser com a identidade das suas partes. E devasta a catedral para alinhar pedras. Combaterei, pois, todo aquele que pretenda impor um costume particular aos outros costumes, um povo aos outros povos, uma raça às outras raças, um pensamento aos outros pensamentos.
Creio que o primado do Homem fundamenta a única Igualdade e a única Liberdade que têm significado. Creio na Igualdade dos direitos do Homem através de cada indivíduo. E creio que a única liberdade é a da ascensão do homem. Igualdade não é Identidade. A Liberdade não é a exaltação do indivíduo contra o Homem. Combaterei todo aquele que pretenda submeter a um indivíduo – ou a uma massa de indivíduos – a liberdade do Homem.
Creio que a minha civilização denomina «Caridade» o sacrifício consentido ao Homem para que este estabeleça o seu reino.
Alma Serena
Alma serena, a consciência pura,
assim eu quero a vida que me resta.
Saudade não é dor nem amargura,
dilui-se ao longe a derradeira festa.Não me tentam as rotas da aventura,
agora sei que a minha estrada é esta:
difícil de subir, áspera e dura,
mas branca a urze, de oiro puro a giesta.Assim meu canto fácil de entender,
como chuva a cair, planta a nascer,
como raiz na terra, água corrente.Tão fácil o difícil verso obscuro!
Eu não canto, porém, atrás dum muro,
eu canto ao sol e para toda a gente.
Eu Peneiro o Espírito e Crivo o Ritmo
Eu peneiro o espírito e crivo o ritmo
Do sangue no amor, o movimento para fora
O desabrigo completo. Peneiro os múltiplos
Sentidos da palavra que sopra a sua voz
Nos pulsos. Crivo a pulsação do canto
E encontro
O silêncio inigualável de quem escutaEis porque as minhas entranhas vibram de modo igual
Ao da cítaraEu peneiro as entranhas e encontro a dor
De quem toca a cítara. A frágil raiz
De quem criva horas e horas a vida e encontra
A corda mais azul, a veia inesgotável
De quem ama
Encontro o silêncio nas entranhas de quem cantaEis porque o amor vibra no espírito de quem criva
O músico incompleto peneira a ideia das formas
Eu sopro a água viva. Crivo
O sofrimento demorado do canto
Encontro o mistério
Da cítara