O Amolecimento pela Sociedade de Consumo
Nos países subdesenvolvidos, a arte (literatura, pintura, escultura) entra quase sempre em conflito com as classes possidentes, com o poder instituído, com as normas de vida estabelecidas. Em revolta aberta, o artista, originário por via de regra da média e da pequena burguesia ou mais raramente das classes proletárias, contesta o statu quo, propõe soluções revolucionárias ou, quando estas não podem sequer divisar-se, limita-se a derruir (ou a tentar fazê-lo pela crítica, violenta ou irónica) o baluarte dos preconceitos, das defesas que os beneficiários do sistema de produção ergueram contra as aspirações da maioria. Nas sociedades industriais mais adiantadas, o artista pode permanecer numa atitude idêntica de inconformismo; porém, os resultados da sua actividade de criação e reflexão tornam-se matéria vendável e, nalguns casos, matéria integrável.
O consumo do objecto artístico, seja ele o livro, o quadro ou o disco, quando feito sob uma tutela de opinião, que os meios de comunicação de massa, em escala larguíssima , exercem, torna-se, senão totalmente inócuo, pelo menos parcialmente esvaziado do seu conteúdo crítico. Despotencializa-se. Amolece. É o que se verifica, por exemplo, em boa parte, nos Estados Unidos. A ideologia repressiva da liberdade no mundo capitalista monopolista torna-se tanto mais perigosa quanto aborve,
Textos sobre Opinião
257 resultadosTodas as Nossas Paixões se Justificam a Si Próprias
Existem duas ocasiões distintas em que examinamos a nossa própria conduta e buscamos vê-la sob a luz em que o espectador imparcial a veria: primeiro, quando estamos prestes a agir; e, segundo, depois que agimos. Em ambos os casos os nossos juízos tendem a ser bastante parciais, mas eles tendem a tornar-se ainda mais parciais quando seria da maior importância que não fossem. Quando estamos prestes a agir, a veemência da paixão raramente nos permitirá considerá-la com a isenção de uma pessoa neutra. As violentas emoções que nesse momento nos agitam distorcem os nossos juízos sobre as coisas, mesmo quando buscamos colocar-nos na situação de outra pessoa. (…) Por essa razão, como diz Malebranche, todas as nossas paixões se justificam a si próprias, e parecem razoáveis e proporcionais aos seus objectos enquanto nós estivermos a senti-las. (… ) A opinião que cultivamos do nosso próprio carácter depende inteiramente dos nossos juízos acerca da nossa conduta passada. Mas é tão desagradável pensarmos mal de nós mesmos que amiúde afastamos propositadamente o nosso olhar das circunstâncias que poderiam tornar o julgamento desfavorável. (…) Esse auto-engano, essa fraqueza fatal dos homens, é a fonte de metade das desordens da vida humana. Se pudéssemos ver-nos como os outros nos vêem,
O Engano do Imediato
É preciso dominar a impressão produzida pelo que é visível e presente; tal impressão tem uma força extraordinária se for confrontada com o que é meramente pensado e sabido, não em virtude de sua matéria e seu conteúdo, frequentemente insignificantes, mas da sua forma, da clareza e do imediatismo por meio dos quais ela se impõe ao espírito, perturbando a sua paz ou até mesmo fazendo vacilar os seus propósitos. É assim que algo agradável, ao qual renunciamos depois de reflectir, nos estimula quando o temos diante dos olhos; assim nos magoa um julgamento cuja incompetência é do nosso conhecimento, irrita-nos uma ofensa cujo carácter desprezível compreendemos; da mesma maneira, dez razões contra a existência de um perigo são sobrepujadas pela falsa aparência da sua real presença etc.
(…) Quando todos os que nos circundam têm uma opinião diferente da nossa e se comportam em conformidade com ela, é difícil não ficarmos abalados, por mais que estejamos convencidos do erro dessas pessoas. Pois o que é presente, o visível, por estar facilmente ao alcance da vista, age sempre com toda a sua força; em contrapartida, pensamentos e causas requerem tempo e calma para serem analisados com cuidado, razão pela qual não podemos tê-los presentes a todo o instante.
As Três Fases da Moralidade
Temos o primeiro sinal de que o animal se tornou homem, quando a sua actuação já não se relaciona com o bem-estar momentâneo, mas com o duradouro, prova de que o homem adquire o sentido do “útil”, do “adequado”: é então que, pela primeira vez, irrompe o livre senhorio da razão. Um estádio ainda mais elevado é alcançado, quando ele age consoante o princípio da honra; graças ao mesmo, ele adapta-se, submete-se a sentimentos comuns, e isso ergue-o muito acima da fase, em que só a utilidade entendida em termos pessoais o guiava: ele respeita e quer ser respeitado, isto é, entende o proveito como dependente do que ele opina acerca dos outros, do que os outros opinam acerca dele. Finalmente, na fase mais elevada da moralidade em uso até agora, ele age segundo o seu critério quanto às coisas e às pessoas, ele próprio determina para si e para outros o que é honroso, o que é útil; tornou-se o legislador das opiniões, em conformidade com o conceito cada vez mais desenvolvido do útil e do honroso. O conhecimento habilita-o a preferir o mais útil, ou seja, a colocar o proveito geral e duradouro à frente do pessoal, a respeitosa estima de valia geral e duradoura à frente da momentânea;
A Maldade como Poderoso Elemento do Progresso Humano
Os sentimentos fixos e de forma constante qualificados de paixões constituem, também, possantes factores de opiniões, de crenças e, por conseguinte, de conduta. Certas paixões contagiosas tornam-se, por esse motivo, facilmente colectivas. A sua acção é, então, irresistível. Elas precipitaram muitos povos uns contra os outros nas diversas fases da história. As paixões podem excitar a nossa actividade, porém, alteram, as mais das vezes, a justeza das opiniões, impedindo de ver as coisas como realmente são e de compreender a sua génese. Se nos livros de história são abundantes os erros, é porque, na maior parte dos casos, as paixões ditam a sua narrativa. Não se citaria, penso eu, um historiador que haja relatado imparcialmente a Revolução.
O papel das paixões é, como vemos, muito considerável nas nossas opiniões e, por conseguinte, na génese dos acontecimentos. Não são, infelizmente, as mais recomendáveis que têm exercido maior acção. Kant reconheceu a grande força social das piores paixões. A maldade é, no seu juízo, um poderoso elemento do progresso humano. Parece, infelizmente, muito certo que, se os homens tivessem seguido o preceito do Evangelho “Amai-vos uns aos outros”, ao invés de obedecerem ao da Natureza, que os incita a se destruírem mutuamente,
Agrada-te a Ti
Nunca conseguirás agradar a todos, mas podes sempre agradar-te a ti.
Querer agradar a toda a gente é o primeiro passo para o desrespeito e o caminho mais rápido para a perdição.
É, aliás, tão perigoso e letal que chega a ofuscar toda a luz que nos alimenta e dizimar todo e qualquer sentido de vida com o qual tenhamos nascido. Quem escolhe essa via nunca passará de um pássaro de asas partidas, frágil e desesperado, que a qualquer momento pode ser pisado, caçado, esmagado ou morto por qualquer um. E o que não falta aí é gente que precisa cilindrar, torturar e macerar alguém para sentir algum bem-estar na sua vida.
Não te podes permitir isso.
Não podes querer ser o par de sapatos de toda a gente.
Tens de ser as tuas pernas, o teu próprio coração e a orientação da tua cabeça.
De que te adianta agradar a todos se isso pode ser desagradável para ti?
As pessoas só vão gostar todas de ti depois de morreres ou se escolheres ficar calado para sempre, o que, e na minha opinião, é apenas outra forma de estar morto,
Palavras com Poucas Ideias
Os homens tomam as palavras como sendo as marcas regulares e constantes de noções aceites, quando na verdade não são mais que sinais voluntários e instáveis das suas próprias idéias. [… ] Esse abuso, que leva a confiar cegamente nas palavras, não foi em nenhum lugar tão disseminado, nem ocasionou tantos efeitos maléficos, como entre os homens de letras. A multiplicação e obstinação das disputas que têm devastado o mundo intelectual deve-se tão-só a esse mau uso das palavras. Pois, ainda que em geral se acredite existir grande diversidade de opiniões nos volumes e variedade das controvérsias que agitam o mundo, o máximo que posso constatar é que, ao discutirem entre si, os doutos em contenda nas diferentes facções falam línguas distintas.
A Honra e a Glória
A honra possui, em certo sentido, um carácter negativo, a saber, em oposição à glória, que tem um carácter positivo. Pois a honra não é a opinião sobre as qualidades especiais pertencentes a um único sujeito, mas só sobre aquelas que, via de regra, deve-se pressupor que não lhe faltem. Por conseguinte, ela só assevera que este sujeito não é nenhuma excepção, enquanto a glória afirma que ele o é. A glória, portanto, tem primeiro de ser conquistada; a honra, pelo contrário, precisa apenas de não ser perdida.
Nos Extremos é que Está a Sabedoria
Pode-se dizer que, muito plausivelmente, há uma ignorância abecedária que precede o saber e uma outra, doutoral, que se lhe segue, ignorância esta que o saber produz e engendra da mesma maneira que desfaz e destrói aqueloutra. Dos espíritos simples, menos curiosos e menos instruídos, fazem-se bons cristãos, que, por reverência e obediência, com simplicidade, crêem e mantêm-se submissos às leis. É nos espíritos de vigor e capacidade médios que se engendram as opiniões erróneas, pois eles seguem a aparência das suas primeiras impressões e têm pretextos para interpretar como simpleza e estultícia o nosso apego aos antigos usos, considerando que nós aí não chegámos por via do estudo dessas matérias.
Os grandes espíritos, mais avisados e clarividentes, constituem um outro género de bons crentes: por meio de uma aturada e escrupulosa investigação, penetram nas Escrituras até atingir uma luz mais profunda e abstrusa, e entendem o misterioso e divino segredo da nossa política eclesiástica. Vemos, porém, alguns, com maravilhoso proveito e com consolidação da sua fé, chegarem, através do segundo, a este último nível, como o extremo limite da inteligência cristã, e rejubilar na sua vitória com refrigério, acções de graças, reformas dos costumes e grande modéstia. Não entendo nesta categoria situar aqueloutros que,
Impressões mal Fundamentadas
Sócrates- Quando a cera que está na alma de alguém é não apenas densa, mas abundante e lisa, com a consistência adequada, o que vem através das percepções grava-se neste «coração» da alma. Como Homero lhe chama de modo enigmático, referindo-se à semelhança com a cera. Nesse momento, os sinais tornam-se puros nestas pessoas e têm suficiente densidade para chegarem a ser duradouros. Quantos são desse tipo têm, em primeiro lugar, facilidade em aprender, em segundo, boa memória, e, em terceiro, não desviam os sinais das suas percepções, mas têm opiniões verdadeiras. Com efeito, dado que os sinais são claros e bem espaçados, distribuem-nos rapidamente em cada uma das impressões, às quais sem dúvida se chama coisas que são. E estas pessoas são chamadas sábias. Ou não te parece?
Teeteto- Sem dúvida. A explicação é maravilhosamente convincente.
Sócrates- Ora bem, vejamos o que sucede quando o coração de uma pessoa é hirsuto – coisa que o poeta elogiou, na sua enorme sabedoria – ou, quando a cera está suja e é impura, ou quando é extremamente líquida ou dura: aqueles cuja cera é líquida têm facilidade para aprender, mas tornam-se esquecidos, enquanto, com aqueles cuja cera é dura,
A Opinião Alheia
Na realidade, o valor e a preocupação constante que atribuímos à opinião alheia ultrapassam, em regra, quase todo o objectivo ponderado, de modo que ela pode ser vista como uma espécie de mania generalizada ou, antes, inata.
Em tudo o que fazemos ou deixamos de fazer, levamos em consideração a opinião alheia quase antes de qualquer outra coisa, e se fizermos uma análise precisa veremos que dessa preocupação nasce praticamente a metade de todas as aflições e de todos os temores sentidos por nós. Pois a opinião alheia é a origem de todo o nosso amor próprio – muitas vezes magoado por ter uma sensibilidade doentia -, de todas as nossas vaidades e pretensões, bem como de nosso fausto e de nossa presunção.
Glória é Vaidade
A glória repousa propriamente sobre aquilo que alguém é em comparação com os outros. Portanto, ela é essencialmente relativa; por isso, só pode ter valor relativo. Desapareceria inteiramente se os outros se tornassem o que o glorioso é. Uma coisa só pode ter valor absoluto se o mantiver sob todas as circunstâncias; aqui, contudo, trata-se daquilo que alguém é imediatamente e por si mesmo. Consequentemente, é nisso que tem de residir o valor e a felicidade do grande coração e do grande espírito. Logo, valiosa não é a glória, mas aquilo que faz com que alguém a mereça, pois isso, por assim dizer, é a substância, e a glória é apenas o acidente. Ela age sobre quem é célebre, sobretudo como um sintoma exterior pelo qual ele adquire a confirmação da opinião elevada de si mesmo. Desse modo, poder-se-ia dizer que, assim como a luz não é visível se não for reflectida por um corpo, toda a excelência só adquire total consciência de si própria pela glória. Mas o sintoma não é sempre infalível, visto que também há glória sem mérito e mérito sem glória. Eis a justificativa para a frase tão distinta de Lessing: Algumas pessoas são famosas, outras merecem sê-lo.
Todos os grandes males que os homens causam uns aos outros, por força de certas intenções, desejos, opiniões ou princípios religiosos, são devidos por igual à existência, pois que nascem da ignorância, que é a carência da sabedoria.
Loucura Subjectiva
Às vezes não tenho tanto a certeza de quem tem o direito de dizer quando um homem é louco e quando não é. Às vezes penso que não há ninguém completamente louco tal como não há ninguém completamente são até a opinião geral o considerar assim ou assado. É como se não fosse tanto o que um tipo faz, mas o modo como a maioria das pessoas o encara quando o faz.
Seguir o Nosso Caminho Doa a quem Doer
Siga o governo firme na sua missão de bem governar, que me encontrará sempre firme e pronto a coadjuvá-lo e a dar-lhe força em tudo quanto seja necessário. Há muita coisa a fazer e creio que se pode e deve fazer e temos que seguir o nosso caminho doa a quem doer. As dificuldades que encontrarmos no nosso caminho não devem ser para nos assustar ou fazer recuar, mas sim para as encarar com calma e firmeza. Com calma, firmeza e boa vontade, e essas qualidades creio que as temos, vencer-se-á esta campanha e se o fizermos, como confiadamente acredito, poderemos então descansar um pouco com a consciência de termos feito alguma coisa útil e de termos bem servido o nosso País. Eu bem sei que seria mais fácil, e menos penoso para nós, o tratar de agradar a todos, mas espero também que um dia a opinião pública, que felizmente não é sempre a opinião que se publica, saberá fazer-nos justiça.
Todos os Homens São Proprietários
Todos os homens são proprietários, mas na realidade nenhum possui. Não são proprietários apenas porque até o último dos pedintes tem sempre alguma coisa além do que traz em cima, mas porque cada um de nós é, a seu modo, um capitalista.
Além dos proprietários de terras, de mercadorias, de máquinas e de dinheiro, existem, ainda mais numerosos, os proprietários de capitais pessoais, que se podem alugar, vender ou fazer frutificar como os outros. São os proprietários e locadores de força física – camponeses, operários, soldados – e proprietários e prestadores de forças intelectuais – médicos, engenheiros, professores, escritores, burocratas, artistas, cientistas. Quem aluga os seus músculos, o seu saber ou o seu engenho obtém um rendimento, que pressupõe um património.
Um demagogo ou um dirigente de partido pode viver pobremente, mas se milhões de homens estão dispostos a obedecer a uma palavra sua, é, na realidade, um capitalista, que, em vez de possuir milhões de liras, possui milhões de vontades. O talento visual de um pintor, a eloquência de um advogado, o espírito inventivo de um mecânico são verdadeiros capitais e medem-se pelo preço que deve pagar, para obter os seus produtos, quem não os possui e carece deles.
O Homem Cruel
Quando o rico tira um pertence ao pobre (por exemplo, um príncipe que tira a amante ao plebeu), então gera-se um erro no pobre; este acha que aquele tem de ser absolutamente infame, para lhe tirar o pouco que ele tem. Mas aquele não sente de modo algum tão profundamente o valor de um único pertence, porque está habituado a ter muitos: portanto, não se pode transpor para o espírito do pobre e não comete tal uma injustiça tão grande como este julga. Ambos têm um do outro uma concepção errada. A injustiça do poderoso, a que mais indigna na História, não é assim tão grande como parece. O mero sentimento hereditário de ser um ser superior, com direitos superiores, torna uma pessoa bastante fria e deixa-lhe a consciência tranquila: até todos nós, se a distância entre nós e um outro ente for muito grande, já não sentimos absolutamente nada de injusto e matamos um mosquito, por exemplo, sem qualquer remorso.
Assim, não é sinal de maldade em Xerxes (a quem mesmo todos os Gregos descrevem como eminentemente nobre) quando ele tira a um pai o seu filho e o manda esquartejar, porque este havia manifestado uma inquieta e ominosa desconfiança em relação a toda a expedição militar: neste caso,
As Opiniões Alheias
Posso concordar ou não com as posições alheias, mas respeito os meus colegas e os seus pontos de vista, e, mesmo quando a estes não adiro, nunca ouso a qualificá-los com adjetivos depreciativos. Admito que as opiniões dos outros sejam melhores. Mas isso, é evidente, não me dispensa, sobretudo nesta Casa, de expender apenas as minhas, porque a responsabilidade das minhas atitudes, e do meu voto, não a posso, nem quero eu, transferir seja para quem for.
Intelecto Sentimental
O intelecto humano não é luz pura, pois recebe influência da vontade e dos afectos, donde se poder gerar a ciência que se quer. Pois o homem inclina-se a ter por verdade o que prefere. Em vista disso, rejeita as dificuldades, levado pela impaciência da investigação; a sobriedade, porque sofreia a esperança; os princípios supremos da natureza, em favor da superstição; a luz da experiência, em favor da arrogância e do orgulho, evitando parecer se ocupar de coisas vis e efémeras; paradoxos, por respeito à opinião do vulgo. Enfim, inúmeras são as fórmulas pelas quais o sentimento, quase sempre imperceptivelmente, se insinua e afecta o intelecto.
Em Portugal cada um Quer Tudo
E quando os homens são de tal condição, que cada um quer tudo para si, com aquilo com que se pudera contentar a quatro, é força que fiquem descontentes três. O mesmo nos sucede. Nunca tantas mercês se fizeram em Portugal, como neste tempo; e são mais os queixosos, que os contentes. Porquê? Porque cada um quer tudo. Nos outros reinos com uma mercê ganha-se um homem; em Portugal com uma mercê, perdem-se muitos. Se Cleofas fora português, mais se havia de ofender da a metade do pão que Cristo deu ao companheiro, do que se havia de obrigar da outra metade, que lhe deu a ele. Porque como cada um presume que se lhe deve tudo, qualquer cousa que se dá aos outros, cuida que se lhe rouba. Verdadeiramente, que não há mais dificultosa coroa que a dos reis de Portugal: por isto mais, do que por nenhum outro empenho.
(…) Em nenhuns reis do mundo se vê isto mais claramente que nos de Portugal. Conquistar a terra das três partes do mundo a nações estranhas, foi empresa que os reis de Portugal conseguiram muito fácil e muito felizmente; mas repartir três palmos de terra em Portugal aos vassalos com satisfação deles,