Textos sobre Últimos

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Textos de últimos escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

A Serenidade

A serenidade não é feita nem de troça nem de narcisismo, é conhecimento supremo e amor, afirmação da realidade, atenção desperta junto à borda dos grandes fundos e de todos os abismos; é uma virtude dos santos e dos cavaleiros, é indestrutível e cresce com a idade e a aproximação da morte. É o segredo da beleza e a verdadeira substância de toda a arte.
O poeta que celebra, na dança dos seus versos, as magnificências e os terrores da vida, o músico que lhes dá os tons de duma pura presença, trazem-nos a luz; aumentam a alegria e a clareza sobre a Terra, mesmo se primeiro nos fazem passar por lágrimas e emoções dolorosas. Talvez o poeta cujos versos nos encantam tenha sido um triste solitário, e o músico um sonhador melancólico: isso não impede que as suas obras participem da serenidade dos deuses e das estrelas. O que eles nos dão, não são mais as suas trevas, a sua dor ou o seu medo, é uma gota de luz pura, de eterna serenidade. Mesmo quando povos inteiros, línguas inteiras, procuram explorar as profundezas cósmicas em mitos, cosmogonias, religiões, o último e supremo termo que poderão atingir é essa serenidade.

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Preciso de Ti

Antes de começar… Acabei de suplicar dez minutos para este bilhete… Terrivelmente, terrivelmente vivo, dorido, e sentindo absolutamente que preciso de ti. Permiti o silêncio deliberadamente, sentindo uma grande necessidade de me retirar em mim mesmo, para escrever, e mil coisas prevalecendo.

Mudei para outra máquina, assustadora; a máquina francesa… maldita, e eu bêbedo com o desejo de te escrever. Ouve, ligo-te de manhã: esta noite ou escrevo ou rebento, mas tenho de te ver. Vejo-te brilhante e maravilhosa e ao mesmo tempo tenho estado a escrever à June e todo dividido mas tu compreenderás — tens de compreender. Vou atirar-me a uma pausa e faço uma chamada. Anais, apoia-me. Não deixes que os silêncios te preocupem: estás toda à minha volta como uma chama clara. Nada a não ser dois pontos, não encontro o ponto nem os apóstrofos. Nenhuma cópia disto também: óptimo: bêbedo… bêbedo de vida… Anais, por Cristo: se tu soubesses o que estou a sentir agora.

Isto foi [escrito] ao chegar [ao escritório]. Agora 3h20 da manhã no quarto do Fred… Toda a força desaparecida e destruída por imagens. O Fred está na cama com a Gaby do chambre 48. Está deitada como um cadáver.

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O Desejo de Ser Sincero é Superficial

O desejo de ser sincero é superficial. Não é por acaso que muitos dos romances entre os últimos aparecidos são escritos na primeira pessoa, de modo a que o eu repetido e disseminado ao longo das páginas produza uma sensação de algo muito próximo a uma lembrança, a uma confissão, a um diário. Não é também por acaso que neles se evita com muito cuidado o enredo ou de certa forma tudo o que possa parecer invenção; e que se narre os factos com garra jornalística, como coisa que realmente tivesse acontecido. A sinceridade, no seu estrito sentido, não suporta a narração objectiva que é um princípio de artifício nem a invenção que em todas as ocasiões pode parecer falsa.
A sinceridade parece-se muito com o mar em certos dias. Há manhãs de tanta bonança que se andamos de barco e nos inclinamos para contemplar a água debaixo de nós, tem-se a impressão de que estamos suspensos sobre transparentes e tangíveis precipícios. A água, por muito profunda que seja, não se opõe a que se olhe a prumo para baixo e se veja, numa claridade esverdeada, o fundo areoso espargido de seixos e de trigueiras céspedes. Nasce então uma espécie de exaltação,

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Deixar Sempre as Coisas a Meio

A grandeza, o verdadeiro luxo, está nessa displicência algo aristocrática, não na pior aceção da palavra, de deixar sempre as coisas a meio: esse copo de conhaque que se abandona na varanda do bar, as moedas que nunca mais se acabam de recolher da bandejinha em que o criado nos trazia o troco, os pratos por limpar, as tardes inteiras de torpor e moleza, desperdiçadas sem culpa porque sobra vida, porque haverá tempo. Essa é a atitude que se opõe à do miserável a quem a necessidade mais visceral e mesquinha faz ver poesia nesse sorver até à última gota o que a vida lhe oferece. E não deita nada fora, então, e guarda para amanhã, e mesquinhamente esconde as sobras para as aproveitar depois como um cão saciado que enterra os ossos junto de uma árvore para não desperdiçar nem um grama de alimento; e molha no chocolate todos os churros que fazem parte da dose, mesmo a rebentar de cheio, caibam ou não dentro do seu estômago. E mil vezes preferível deixar sempre qualquer coisa no prato, desdenhar com elegância de parte do festim; jantar, por exemplo, com uma senhora admirável e permitir graciosamente que escape viva. E,

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Fé No Sentimento

A razão age com lentidão, e com tantas vistas, sobre tantos princípios, os quais é mister estejam sempre presentes, que a todo o instante adormece ou perde-se, deixa de ter todos os seus princípios presentes. O sentimento não age dessa maneira; age instantaneamente, e está sempre pronto para agir. É preciso, pois, depositar a nossa fé no sentimento; de outro modo, ela será sempre vacilante.
(…) O último passo da razão é o de reconhecer que existe uma infinidade de coisas que a ultrapassam; se não chegar a isso, é porque é fraca.

O Asco da Imprensa

É impossível percorrer uma qualquer gazeta, seja de que dia for, ou de que mês, ou de que ano, sem aí encontrar, em cada linha, os sinais da perversidade humana mais espantosa, ao mesmo tempo que as presunções mais surpreendentes de probidade, de bondade, de caridade, a as afirmações mais descaradas, relativas ao progresso e à civilização.
Qualquer jornal, da primeira linha à última, não passa de um tecido de horrores. Guerras, crimes, roubos, impudicícias, torturas, crimes dos príncipes, crimes das nações, crimes dos particulares, uma embriaguez de atrocidade universal.
E é com este repugnante aperitivo que o homem civilizado acompanha a sua refeição de todas as manhãs. Tudo, neste mundo, transpira o crime: o jornal, a muralha e o rosto do homem.
Não compreendo que uma mão pura possa tocar num jornal sem uma convulsão de asco.

Ser Amigo

O coração de um amigo é uma coisa que sempre quer. Ser amigo é estar ao lado de quem não tem razão, contra qualquer inimigo que tenha, e apareça, dizendo com toda a justiça que o amigo não a tem. Não é suspender a razão – é usá-la friamente, aplicá-la, estar sempre consciente dela. E, contudo, não dizê-la, não mostrá-la, ficar sempre acima dela. Ser amigo é ter razão e não querer saber dela. Ser amigo é pensar duas vezes quando a última vez pertence ao que repensa o coração.

O amigo discordava dele. Dizia: Queres tu dizer que para se ser um bom amigo é preciso, às vezes, ser-se muito má pessoa? Sim, respondia ele, era isso que ele queria dizer. Porque ser amigo tem de ser uma coisa que custa. Às vezes é um trabalho, muitas horas, muitas dores; um trabalho que é o contrário do que seria natural, e do que apetece. Ser má pessoa para se ser um bom amigo (ou um bom português, ou um bom professor), é fazer fé que um outro fim faz valer o desconforto, faz valer o arrependimento, acaba por se abater sobre a vergonha. E sofrer bastante para que o outro nada sofra,

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Usar as Palavras dos Outros com Cuidado

Um escritor exprime-se em palavras que já foram usadas porque elas exprimem melhor a sua ideia do que ele mesmo o pode fazer, ou porque são belas e espirituosas, ou porque espera que elas toquem uma corda de associação na mente do seu leitor, ou porque deseja mostrar que é culto e lido. As citações devidas a este último motivo falham invariavelmente: o leitor inteligente descobre-o e passa a desprezar o autor; o leitor menos avisado talvez fique impressionado, mas ao mesmo tempo sente repulsa, pois as citações pretensiosas são o caminho mais seguro para o tédio.

Henri Watson Fowler (1858-1933) e F.G.

Estou Cheia de Ti esta Noite

Estou cheia de ti esta noite, Henry, e triste porque preferiria muito mais ir embora contigo. Percebi hoje, quando falaste no meu enxoval, que, relativamente a tudo o que compro, fico a pensar se tu gostarias. Não me pergunto se o meu pai gostaria. Estou terrivelmente longe do meu passado e terrivelmente perto de ti. Tocou-me que tenhas achado o café duplamente bom. Tudo será duplamente bom nas nossas férias.

Estou realmente esfomeada pelas nossas férias. Teria sido demasiado feminino da minha parte querer ver-te todos os dias, porque senti que o teu estado de espírito estava acinzentado, e eu queria que flutuasses outra vez. Não te quero torturado… nem por uma constipação!
No sábado vamos sair e escolhemos discos juntos, okay?
Envia-me a minha carta “Auto-Retrato” que eu deixei.

Lembra-te das últimas palavras de Lawrence no Apocalypse… Algo sobre estar de bem com o Sol. Que bem trará o Sol para mim? O Sol está bem para o homem, o criador, o macho cósmico, etc. A mulher é tão terrivelmente pessoal que até o Sol deve encarnar num homem. No Henry, para mim.

A Vulgaridade Intelectual

Hoje, (…) o homem médio tem as «ideias» mais taxativas sobre quanto acontece e deve acontecer no universo. Por isso perdeu o uso da audição. Para quê ouvir, se já tem dentro de si o que necessita? Já não é época de ouvir, mas, pelo contrário, de julgar, de sentenciar, de decidir. Não há questão de vida pública em que não intervenha, cego e surdo como é, impondo as suas «opiniões».
Mas não é isto uma vantagem? Não representa um progresso enorme que as massas tenham «ideias», quer dizer, que sejam cultas? De maneira alguma. As «ideias» deste homem médio não são autenticamente ideias, nem a sua posse é cultura. A ideia é um xeque-mate à verdade. Quem queira ter ideias necessita antes de dispor-se a querer a verdade, e aceitar as regras do jogo que ela imponha. Não vale falar de ideias ou opiniões onde não se admite uma instância que as regula, uma série de normas às quais na discussão cabe apelar. Estas normas são os princípios da cultura. Não me importa quais são. O que digo é que não há cultura onde não há normas. A que os nossos próximos possam recorrer.
Não há cultura onde não há princípios de legalidade civil a que apelar.

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Inteligência de Rotina

A matemática é uma ciência muito bela. Os matemáticos porém, muitas vezes, nada valem. Acontece com a matemática quase o mesmo que com a teologia. Da mesma maneira que os homens se dedicam à última, por pouco que exerçam uma função pública, pretendem ter um crédito particular de santidade e um parentesco mais estreito com Deus, ainda que entre eles haja um grande número de autênticos tratantes, os pretensos matemáticos exigem com muita frequência ser considerados profundos pensadores, embora entre eles se encontrem as mentes mais entulhadas de mixórdias, incapazes de fazer qualquer trabalho que exija reflexão e que não possa ser reduzido de imediato a essa combinação fácil de sinais que é mais obra da rotina do que do pensamento.

O Encanto da Vida

Todas as noites acordado até desoras, à espera da última cena de pancadaria num jogo de futebol, do último insulto num debate parlamentar, do último discurso demagógico num comício eleitoral, da última pirueta dum cabotino entrevistado, da última farsa no palco internacional. Crucificações masoquistas, que a prudência desaconselha e a imprudência impõe. Vou deste mundo farto de o conhecer e faminto de o descobrir.

Mas não há perspicácia, nem constância de atenção capazes de lhe prefigurar os imprevistos. O que acontece hoje excede sempre o que sucedeu ontem. A violência, o facciosismo, a ambição de poder, a crueldade e o exibicionismo não têm limites. Felizmente que a abnegação, a generosidade e o altruísmo também não. E o encanto da vida é precisamente esse: nenhum excesso nela ser previsível. Nem no mal nem no bem. E não me canso de o verificar, de surpresa em surpresa, à luz dos acontecimentos.

Quando julgo que estou devidamente informado sobre o amor, sobre o ódio, sobre a santidade, sobre a perfídia, sobre as virtudes e os defeitos humanos, acabo por concluir que soletro ainda o á-bê-cê da realidade. Cabeçudo como sou, teimo na aprendizagem. Hoje fizeram-me a revelação surpreendente de que um avarento meu conhecido,

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As Coisas Humanas São Efémeras E Sem Valor

Pensa de contínuo em quantos médicos morreram, eles que tinham tanta vez carregado o sobrolho à cabeceira dos seus doentes; quantos astrólogos que julgaram maravilhar os outros predizendo-lhes a morte; quantos filósofos após uma infinidade de ásperas disputas sobre a morte e a imortalidade; quantos príncipes depois de terem dado a morte a tanta gente; quantos tiranos que, como se fossem imortais, abusaram, com uma arrogância nunca vista, do poder, a ponto de atentarem contra a vida humana. Quantas cidades, se assim podemos dizer, morreram de raiz: Heliqué, Pompeia, Herculano, e outras que não têm conto! Enumera agora, um após outro todos aqueles que conheceste. Este, depois de prestar os últimos serviços àquele, foi posto de pés juntos no leito fúnebre por um terceiro a quem também chegou a sua vez.
E em tão pouco espaço de tempo! Em suma, as coisas humanas é considerá-las como efémeras e sem valor: ontem, um pouco de greda; amanhã, múmia e um punhado de cinzas. Esta minúscula duração vive-a a tom com a natureza e chega ao fim com a alma contente: como a azeitona madurinha que tombasse abençoando a terra que a criou e dando graças à árvore que a deixou crescer.

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Que Todos os Dias Sejam Dias de Amor

João Brandão pergunta, propõe e decreta:
Se há o Dia dos Namorados, por que não haver o Dia dos Amorosos, o Dia dos Amadores, o Dia dos Amantes? Com todo o fogo desta última palavra, que circula entre o carnal e o sublime?
E o Dia dos Amantes Exemplares e o Dia dos Amantes Platônicos, que também são exemplares à sua maneira, e dizem até que mais?
Por que não instituir, ó psicólogos, ó sociólogos, ó lojistas e publicitários, o Dia do Amor?
O Dia de Fazê-lo, o Dia de Agradecer-lhe, o de Meditá-lo em tudo que encerra de mistério e grandeza, o Dia de Amá-lo? Pois o Amor se desperdiça ou é incompreendido até por aqueles que amam e não sabem, pobrezinhos, como é essencial amar o Amor.
E mais o Dia do Amor Tranqüilo, tão raro e vestido de linho alvo, o Dia do Amor Violento, o Dia do Amor Que Não Ousava Dizer o Seu Nome Mas Agora Ousa, na arrebentação geral do século?
Amor Complicado pede o seu Dia, não para tornar-se pedestre, mas para requintar em sua complicação cheia de vôos fora do horário e da visibilidade. Amor à Primeira Vista,

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Não Será Tempo de Voltarmos aos Sentidos?

Não somos apenas o nosso corpo, estamos também integrados num corpus social, que solicita, expande e reprime a nossa sensibilidade. Basta ouvir aquele que foi o maior teórico da comunicação do século XX, Marshall McLuhan, para perceber até que ponto isso é aproveitado pela sociedade de comunicação global, para quem o indivíduo passa a ser uma presa. O que diz McLuhan sobre a televisão, por exemplo, é imensamente elucidativo: «Um dos efeitos da televisão é retirar a identidade pessoal. Só por ver televisão, as pessoas tornam-se num grupo coletivo de iguais. Perdem o interesse pela singularidade pessoal.» Se repararmos, os meios que lideram a comunicação humana contemporânea (da televisão ao telefone, do e-mail às redes sociais) interagem apenas com aqueles dos nossos sentidos que captam sinais à distância: fundamentalmente a visão e a audição. Origina-se assim uma descontrolada hipertrofia dos olhos e ouvidos, sobre os quais passa a recair toda a responsabilidade pela participação no real. «Viste aquilo?», «já ouviste a última do…»: os nossos quotidianos são continuamente bombardeados pela pressão do ver e do ouvir. O mesmo se passa com a locomoção: seja a pilotar um avião, a conduzir um automóvel, ou seja o peão a deslocar-se nas artérias das cidades modernas,

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O Perigo da Leitura Excessiva

Quando lemos, outra pessoa pensa por nós: repetimos apenas o seu processo mental. Ocorre algo semelhante quando o estudante que está a aprender a escrever refaz com a pena as linhas traçadas a lápis pelo professor. Sendo assim, na leitura, o trabalho de pensar é-nos subtraído em grande parte. Isso explica o sensível alívio que experimentamos quando deixamos de nos ocupar com os nossos pensamentos para passar à leitura. Porém, enquanto lemos, a nossa cabeça, na realidade, não passa de uma arena dos pensamentos alheios. E quando estes se vão, o que resta? Essa é a razão pela qual quem lê muito e durante quase o dia inteiro, mas repousa nos intervalos, passando o tempo sem pensar, pouco a pouco perde a capacidade de pensar por si mesmo – como alguém que sempre cavalga e acaba por desaprender a caminhar. Tal é a situação de muitos eruditos: à força de ler, estupidificaram-se. Pois ler constantemente, retomando a leitura a cada instante livre, paralisa o espírito mais do que o trabalho manual contínuo, visto que, na execução deste último, é possível entregar-se aos seus próprios pensamentos.
No entanto, como uma mola que, pela pressão constante acarretada por meio de um corpo estranho,

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A Lusitânia

A terra mais ocidental de todas é a Lusitânia. E porque se chama Ocidente aquela parte do mundo? Porventura porque vivem ali menos, ou morrem mais os homens? Não; senão porque ali vão morrer, ali acabam, ali se sepultam e se escondem todas as luzes do firmamento. Sai no Oriente o Sol com o dia coroado de raios, como Rei e fonte da Luz: sai a Lua e as Estrelas com a noite, como tochas acesas e cintilantes contra a escuridade das trevas, sobem por sua ordem ao Zénite, dão volta ao globo do mundo resplandecendo sempre e alumiando terras e mares; mas em chegando aos Horizontes da Lusitânia, ali se afogam os raios, ali se sepultam os resplendores, ali desaparece e perece toda aquela pompa de luzes.
E se isto sucede aos lumes celestes e imortais; que nos lastimamos, Senhores, de ler os mesmos exemplos nas nossas Histórias? Que foi um Afonso de Albuquerque no Oriente? Que foi um Duarte Pacheco? Que foi um D. João de Castro? Que foi um Nuno da Cunha, e tantos outros Heróis famosos, senão uns Astros e Planetas lucidíssimos, que assim como alumiaram com estupendo resplendor aquele glorioso século, assim escurecerão todos os passados?

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A Importância da Arrogância

A arrogância não é nenhum meio adequado para se chegar a qualquer forma de entendimento com as pessoas que nos rodeiam e que menosprezamos, pelo que nos são insuportáveis. Mas, se não tivéssemos a arrogância, estaríamos perdidos, pois ela não é senão um meio de impormos a nossa vontade contra um mundo que de outro modo e, portanto, sem essa arrogância, nos devoraria por completo. Ele não teria por nós o mínimo respeito. Nós temos de a ele nos antecipar com a nossa própria arrogância, disse eu para comigo, empregá-la onde ela nos salva de sermos devorados. Pois não nos iludamos, pensei eu, os chamados parvos, os que por assim dizer menos apreciamos são os que menos consideração têm por nós, não lhes importa o que nós sentimos, desde que nos possam incomodar e destruir e por último aniquilar.
A arrogância é um meio absolutamente adequado para conseguirmos impor-nos no mundo que nos rodeia e que está orientado contra nós, essa arrogância teme-a ele e respeita-a, mesmo que seja só simulada como a minha, como eu pensei. Nós escudamo-nos com a arrogância para nos podermos afirmar, esta é que é a verdade, eu sou arrogante para sobreviver, isto dito assim de modo consequente.

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Tremo Sempre Diante do Amor

Nadia, deves ter visto a falta de jeito com que no último momento te pedi o número do telefone e este endereço de correio eletrónico para onde te escrevo, e deves ter-te apercebido também da peregrina desculpa: os dois sabemos que podes conseguir de mil outras maneiras diferentes 05 livros que fiquei de te emprestar. Há-os em muitos lados. Toda a gente os tem. Pode até acontecer que já façam parte da tua biblioteca há anos e que neste momento estejas a olhar as suas lombadas da cadeira onde estás sentada enquanto me lês; e também pode acontecer, na realidade não me admiraria nada, que seja eu quem não os tem nem os teve nunca. Durante o jantar não conseguia tirar os olhos de ti, mas isso já tu sabes. Perante isso, apenas posso esperar que o resto dos comensais, especialmente os teus amigos, não se tenham apercebido de até que ponto me eram indiferentes as restantes pessoas e conversas. Como viste, tenho já um longo caminho percorrido. Sou um homem com passado, como se costuma dizer, embora isso não faça com que seja mais fácil para mim escrever uma carta como esta. Porque isto é uma carta, não é verdade?

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