Passagens sobre Últimos

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Frases sobre Ășltimos, poemas sobre Ășltimos e outras passagens sobre Ășltimos para ler e compartilhar. Leia as melhores citaçÔes em Poetris.

A Racionalidade Irracional

Eu digo muitas vezes que o instinto serve melhor os animais do que a razĂŁo a nossa espĂ©cie. E o instinto serve melhor os animais porque Ă© conservador, defende a vida. Se um animal come outro, come-o porque tem de comer, porque tem de viver; mas quando assistimos a cenas de lutas terrĂ­veis entre animais, o leĂŁo que persegue a gazela e que a morde e que a mata e que a devora, parece que o nosso coração sensĂ­vel dirĂĄ «que coisa tĂŁo cruel». NĂŁo: quem se comporta com crueldade Ă© o homem, nĂŁo Ă© o animal, aquilo nĂŁo Ă© crueldade; o animal nĂŁo tortura, Ă© o homem que tortura. EntĂŁo o que eu critico Ă© o comportamento do ser humano, um ser dotado de razĂŁo, razĂŁo disciplinadora, organizadora, mantenedora da vida, que deveria sĂȘ-lo e que nĂŁo o Ă©; o que eu critico Ă© a facilidade com que o ser humano se corrompe, com que se torna maligno.

Aquela ideia que temos da esperança nas crianças, nos meninos e nas meninas pequenas, a ideia de que são seres aparentemente maravilhosos, de olhares puros, relativamente a essa ideia eu digo: pois sim, é tudo muito bonito, são de facto muito simpåticos,

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Humanismo e Liberalismo

O termo humanismo Ă© infelizmente uma palavra que serve para designar as correntes filosĂłficas, nĂŁo somente em dois sentidos, mas em trĂȘs, quatro, cinco ou seis. Toda a gente Ă© humanista na hora que passa, atĂ© mesmo certos marxistas que se descobrem racionalistas clĂĄssicos, sĂŁo humanistas num enfadonho sentido, derivado das ideias liberais do Ășltimo sĂ©culo, o dum liberalismo refractado atravĂ©s de toda a crise actual. Se os marxistas podem pretender ser humanistas, as diferentes religiĂ”es, os cristĂŁos, os hindus, e muitos outros afirmam-se tambĂ©m antes de mais humanistas, como por sua vez o existencialista, e de um modo geral, todas as filosofias. Actualmente muitas correntes polĂ­ticas se reivindicam igualmente um humanismo. Tudo isso converge para uma espĂ©cie de tentativa de restabelecimento duma filosofia que, apesar da sua pretensĂŁo, recusa no fundo comprometer-se, e recusa comprometer-se, nĂŁo somente no ponto de vista polĂ­tico e social, mas tambĂ©m num sentido filosĂłfico profundo.

Se o cristianismo se pretende antes de tudo humanista, Ă© porque ele nĂŁo pode comprometer-se, quer dizer participar na luta das forças progressivas, porque se mantĂ©m em posiçÔes reaccionĂĄrias frente a esta revolução. Quando os pseudomarxistas ou os liberais se reclamam da pessoa antes do mais, Ă© porque eles recuam diante das exigĂȘncias da situação presente no mundo.

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Soneto de Separação

De repente do riso fez-se o pranto
Silencioso e branco como a bruma
E das bocas unidas fez-se a espuma
E das mĂŁos espalmadas fez-se o espanto.

De repente da calma fez-se o vento
Que dos olhos desfez a Ășltima chama
E da paixĂŁo fez-se o pressentimento
E do momento imĂłvel fez-se o drama.

De repente, nĂŁo mais que de repente
Fez-se de triste o que se fez amante
E de sozinho o que se fez contente.

Fez-se do amigo prĂłximo o distante
Fez-se da vida uma aventura errante
De repente, nĂŁo mais que de repente.

Alguns louvam de manhĂŁ o que criticam de noite, mas tĂȘm sempre por certa a Ășltima opiniĂŁo.

Onde Começa a Felicidade

«Aurea mediocritas» – dizia HorĂĄcio, um dos poetas latinos que faz a base da nossa civilização. As palavras com o tempo corrompem-se, alteram-se, adulteram-se. «Mediocritas» em portuguĂȘs deu mediocridade, tal como «parvus» deu parvo, ao contrĂĄrio do castelhano em que apenas significa pequeno, ou «sinistra» em italiano quer apenas dizer esquerda.

A «Aurea mediocritas» que cantava Horåcio era a doce e suave mediania entre as emoçÔes, um equilíbrio quase bucólico na vida a ter e nos negócios a ter na vida. Não, Horåcio, romano educado, não era adepto dos desportos radicais.
EquilĂ­brio entre o quĂȘ? Distorcendo HorĂĄcio, a dois mil anos de distĂąncia, podemos dizer, talvez, equilĂ­brio entre o sonho e a realidade. A felicidade nĂŁo pode ser sĂł o que hĂĄ, senĂŁo apodrecemos, mas tambĂ©m nĂŁo pode ser sĂł o que desejamos, senĂŁo ficamos com uma neurose de tanto ansiar pelo que hĂĄ-de vir.

O resto Ă© com cada qual. Alguns gostam da felicidade bovina de nĂŁo pensar muito, outros gostam de estar sozinhos no deserto, outros ficam felizes com a desgraça alheia. Estes trĂȘs exemplos sĂŁo, cĂĄ para mim, desgraçados, mas o que sei eu dos outros? É por nĂŁo saber nada dos outros que escrevo histĂłrias sobre os outros.

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A filosofia entrevĂȘ os critĂ©rios Ășltimos, a abĂłbada celeste das possibilidades e procura, Ă  luz do aparentemente impossĂ­vel, a via pela qual o homem poderĂĄ enobrecer-se em sua existĂȘncia empĂ­rica.

Deixe-me dizer-lhe pela Ășltima vez que eu nĂŁo tenho recordaçÔes. NinguĂ©m guarda lembranças do que profundamente despreza.

«O castigo Ă© feito para melhorar aquele que castiga»; esta frase representa o Ășltimo recurso dos defensores do castigo.

Soneto I

Ao Duque

A glĂłria do edifĂ­cio, o louvor alto
Do que a Ășltima mĂŁo lhe pĂ”e, se dobra
Em desgraça daquele, e mågoa da obra,
Que no melhor lhe foi escasso e falto.

Este de letras, com que ao Céu me exalto
E que em mim vossa mĂŁo levanta e obra,
Se sua perfeição por vós não cobra,
A todos causa mĂĄgoa e sobressalto.

Jå que os andames da esperança minha
NĂŁo hĂĄ quem desarmĂĄ-los hoje possa,
Fazei com que este meu trabalho monte.

VĂłs sereis minha glĂłria, eu glĂłria vossa,
Ficando Ă  vista as que eu jĂĄ n’alma tinha,
Vossas armas reais em minha fronte.

A Justa Medida do Esforço do Prazer

Os sĂĄbios bem ensinam a nos precavermos contra a traição dos nossos apetities e a discernir entre os prazeres verdadeiros e integrais e os prazeres dĂ­spares e mesclados com mais trabalhos. Pois a maioria dos prazeres, dizem eles, excitam e abraçam para nos estrangular (…). E, se a dor de cabeça nos viesse antes da embriaguez, evitarĂ­amos beber demais. Mas a volĂșpia, para nos enganar, caminha Ă  frente e oculta-nos o seu sĂ©quito. Os livros sĂŁo aprazĂ­veis; mas, se por frequentĂĄ-los perdemos afinal a alegria e a saĂșde, que sĂŁo as nossas melhores partes, abandonemo-los. Sou dos que julgam que o seu fruto nĂŁo pode contrabalançar essa perda. Como os homens que hĂĄ longo tempo se sentem enfraquecidos por alguma indisposição se entregam por fim Ă  mercĂȘ da medicina e deixam que lhes estabeleça artificialmente certas regras de viver para nĂŁo mais ultrapassĂĄ-las, assim tambĂ©m aquele que se isola, entediado e desgostoso da vida em comum, deve conformar esta Ă s regras da razĂŁo, deve organizĂĄ-la e ordenĂĄ-la com premeditação e reflexĂŁo.
Deve dizer adeus a toda a espĂ©cie de esforço, sob qualquer aparĂȘncia que se apresente; e fugir em geral das paixĂ”es que impedem a tranquilidade do corpo e da alma,

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YANG

Minha mĂșsica se mostra, avança
serena feito vaca mansa.

Este som, rock’n roll
estandarte que tremula ao sol.

Este som, escarlate
pedra que brilha, quilate.

Mas é só uma canção
para aquecer seu coração.

Jå conheço essa minha guitarra
arma, bomba, cimitarra.

Me conheço, sem eira nem beira.
Poesia, Ășltima trincheira.

Minha mĂșsica, cor quente
eu quero Ă© pratear sua mente.

Novamente.

Eu quero Ă© pratear sua mente.

Chegada a Hora o Sonho SerĂĄ Terra

Chegada a hora o sonho serĂĄ terra,
o medo darĂĄ seu Ășltimo vintĂ©m,
e o passado e o futuro serĂŁo guerra
do não-ser sobre terras de ninguém
Árvore gémea à que em dor se enterra,
o céu descerå em busca de outro além,
e unidos ambos, corpo e céu, a alma er-
rarå distante, mas morta, também.
SerĂĄ possĂ­vel mesmo o fim de tudo,
tudo tão rápido? Ó pássaro ao vento,
Ăł ave sombria: cantai num templo mudo,
a atroz saudade da alma nunca vista,
passo perdido em negro firmamento,
paisagem morta — que a terra conquista!

Os ClĂĄssicos da Literatura

As emoçÔes que a literatura suscita são talvez eternas, mas os meios devem variar constantemente, mesmo que lligeiramente, para não perder a sua virtude. Desgastam-se à medida que o leitor os reconhece. Daí o perigo de afirmar que existem obras clåssicas que o serão para sempre.
Cada qual descrĂȘ da sua arte e dos seus artifĂ­cios. Eu, que me resignei a pĂŽr em dĂșvida a indefinida duração de Voltaire ou de Shakespeare, acredito (nesta tarde de um dos Ășltimos dias de 1965) na de Schopenhauer e na de Berkeley.
ClĂĄssico nĂŁo Ă© um livro (repito-o) que possui necessariamente tais ou tais mĂ©ritos. É um livro que as geraçÔes dos homens, motivadas por razĂ”es diversas, lĂȘem com prĂ©vio fervor e com uma misteriosa lealdade.

És como o Ar que Respiro

Qual Ă© a força extraordinĂĄria que possuis? — pergunto muitas vezes a mim mesmo. Dois ou trĂȘs princĂ­pios cristĂŁos inabalĂĄveis — e por trĂĄs milhares de seres que desapareceram ignorados, cumprindo a vida ignorada. Nem sequer se debateram. Entregaram-se. Confiaram. A mulher portuguesa comunica ao lar a ternura com que os pĂĄssaros aquecem o ninho. Sua vida dĂĄ luz, para alumiar os outros. Foi assim com tĂŁo pequenos meios, que me ensinaste. Com uma palavra e mais nada, com um simples olhar, com silĂȘncio e mais nada. Uma atitude fazia-me pensar. E mal sabes tu quando Os teus dedos ĂĄgeis trabalhavam a meu lado, teciam ao mesmo tempo o pano grosso de casa e a nossa vida espiritual.

E como tu milhares de seres tĂȘem cumprido a vida em silĂȘncio, aceitando-a sem exageros. Nas mĂŁos das mulheres atĂ© as coisas vulgares que se fazem na aldeia, cozer o pĂŁo, lançar a teia — assumem um carĂĄcter sagrado. Elas passam desconhecidas e dispĂ”em dum poder extraordinĂĄrio. MantĂȘem a vida ordenada com um sorriso tĂ­mido. A mulher estĂĄ mais perto que nĂłs da natureza e de Deus.

Cada vez me aproximo mais de ti. O que hĂĄ de puro em mim a ti o devo.

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A Cultura Portuguesa e o Provincianismo

A cultura portuguesa tem um amor fatal pelo provincianismo. O provincianismo Ă© a forma mais «engagĂ©e» de existir socialmente e literariamente. DaĂ­ a impossibilidade, ou melhor, o medo de se realizar sequer um realismo a sĂ©rio, porquanto este exige uma descida ao inferno e nĂŁo vejo por aĂ­ quem se atreva alĂ©m do purgatĂłrio. Fica-se assim na meia tinta do naturalismo, retratando quadros convencionais de uma sociedade provinciana onde, alĂ©m da jĂĄ muito conhecida injustiça social (reparĂĄvel pela economia e nĂŁo pela literatura), nada se capta que possa sugerir a simples violĂȘncia de se estar no mundo. Provincianismo chama-se ainda Ă quela nossa atitude que toma muito a sĂ©rio ou, ainda, solenemente, tudo o que faz, tornando inviĂĄvel uma literatura que desmonte eficazmente a engrenagem humana e social pela incomplacente investida de um humor cruel. Houve recentes tentativas queirozianas para denunciar as fraquezas do meio. Conseguiu-se fazer realismo desta vez? TambĂ©m nĂŁo, porque se fez realismo de emprĂ©stimo, de segunda mĂŁo, colhido no «diz-se diz-se» das esquinas. Escreveu-se razoavelmente mĂĄ-lĂ­ngua, mas nĂŁo se agitaram as pessoas e as instituiçÔes de forma a tornar visĂ­vel o lodo depositado no fundo. Isto quanto aos que fazem profissĂŁo de fĂ© de realismo social ou burguĂȘs.

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Todos os tipos de conhecimento, em Ășltima anĂĄlise, sĂŁo auto-conhecimento.

A Esperança é o Bordão da Vida

A esperança Ă© o bordĂŁo da vida. HĂĄ uma coisa do Padre Vieira, muito bonita, em que ele fala do Non. TerrĂ­vel palavra Ă© o non, de qualquer lado por onde se pegue, Ă© sempre Non – isto aparece no meu filme “Non ou a vĂŁ glĂłria de mandar”, dito por esse grande actor, o Ruy de Carvalho. A Ășltima palavra do Vieira sobre Non Ă©: “O Non tira a esperança, que Ă© a Ășltima coisa que a natureza deixou ao homem”. Sem esperança nĂŁo se pode viver.

[A esperança e o desejo sĂŁo o que nos impele a fazer, prosseguir. Mas nĂŁo Ă© supremamente difĂ­cil mantĂȘ-los vivos?]

O desejo nĂŁo nos impele para existir. O desejo impele para a continuidade da espĂ©cie. O que nos impele Ă  existĂȘncia Ă© o que diz o maia, “come para viveres”, e isso Ă© a fome. A fome Ă© o que nos garante a subsistĂȘncia. Se nĂŁo tivĂ©ssemos fome, nĂŁo comĂ­amos, nĂŁo comendo, nĂŁo sobrevivĂ­amos. Se nĂŁo tivĂ©ssemos o desejo, nĂŁo terĂ­amos a relação sexual e a relação sexual Ă© que garante a continuidade da espĂ©cie. O desejo Ă© uma coisa, a fome Ă© outra. SĂŁo os dois para a continuidade: um para a continuidade do indivĂ­duo,

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