Passagens sobre Clarões

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Véspera

Amor: em teu regaço as formas sonham
o instante de existir: ainda é bem cedo
para acordar, sofrer. Nem se conhecem
os que se destruirão em teu bruxedo.

Nem tu sabes, amor, que te aproximas
a passo de veludo. És tão secreto,
reticente e ardiloso, que semelhas
uma casa fugindo ao arquitecto.

Que presságios circulam pelo éter,
que signos de paixão, que suspirália
hesita em consumar-se, como flúor,
se não a roça enfim tua sandália?

Não queres morder célere nem forte.
Evitas o clarão aberto em susto.
Examinas cada alma. É fogo inerte?
O sacrifício há de ser lento e augusto.

Então, amor, escolhes o disfarce.
Como brincas (e és sério) em cabriolas,
em risadas sem modo, pés descalços,
no círculo de luz que desenrolas!

Contempla este jardim: os namorados,
dois a dois, lábio a lábio, vão seguindo
de teu capricho o hermético astrolábio,
e perseguem o sol no dia findo.

E se deitam na relva; e se enlaçando
num desejo menor, ou na indecisa
procura de si mesmos,

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Noiva Da Agonia

Trêmula e só, de um túmulo surgindo,
Aparição dos ermos desolados,
Trazes na face os frios tons magoados,
De quem anda por túmulos dormindo…

A alta cabeça no esplendor, cingindo
Cabelos de reflexos irisados,
Por entre aureolas de clarões prateados,
Lembras o aspecto de um luar diluindo…

Não és, no entanto, a torva Morte horrenda,
Atra, sinistra, gélida, tremenda,
Que as avalanches da Ilusão governa…

Mas ah! és da Agonia a Noiva triste
Que os longos braços lívidos abriste
Para abraçar-me para a Vida eterna!

O Mundo Velho

Nas crises d’este tempo desgraçado,
Quando nos pomos tristes a espalhar
Os olhos pela historia do passado…
Quem não verá, contente ou consternado,
– Mundo velho que estás a desabar – ?!…

Sim tu estás a morrer, vil socio antigo…
E Pae de nossos vicios e paixões!
Camarada dos crimes, torpe amigo…
– Morre, emfim, correrá no teu jazigo,
Em vez de vinho, o sangue das nações!

Deves morrer, provecto criminoso!
Tens vivido de mais, vil sensual!
Tu estás velho, cansado e desgostoso,
E, como um velho principe gotoso,
Ris, cruelmente, ás sensações do mal.

– Que é feito do teu Deus, do teu Direito?
– Onde estão as visões dos teus prophetas?
– Quem te deu esse orgulho satisfeito?
Muribundo Caiphaz, junto ao teu leito,
Morrem, debalde, os gritos dos poetas!

No tempo em que eras forte, foi teu braço
Que apunhalou os grandes ideaes!…
Hoje estás gordo, sensural, devasso,
E andas, torpe a rir, como um palhaço,
N’um circulo lusente de punhaes.

Tu tens vendido os justos no mercado!

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Carta a Manoel

Manoel, tens razão. Venho tarde. Desculpa.
Mas não foi Anto, não fui eu quem teve a culpa,
Foi Coimbra. Foi esta paysagem triste, triste,
A cuja influencia a minha alma não reziste,
Queres noticias? Queres que os meus nervos fallem?
Vá! dize aos choupos do Mondego que se callem…
E pede ao vento que não uive e gema tanto:
Que, emfim, se soffre abafe as torturas em pranto,
Mas que me deixe em paz! Ah tu não imaginas
Quanto isto me faz mal! Peor que as sabbatinas
Dos ursos na aula, peor que beatas correrias
De velhas magras, galopando Ave-Marias,
Peor que um diamante a riscar na vidraça!
Peor eu sei lá, Manoel, peor que uma desgraça!
Hysterisa-me o vento, absorve-me a alma toda,
Tal a menina pelas vesperas da boda,
Atarefada mail-a ama, a arrumar…
O vento afoga o meu espirito n’um mar
Verde, azul, branco, negro, cujos vagalhões
São todos feitos de luar, recordações.
Á noite, quando estou, aqui, na minha toca,
O grande evocador do vento evoca, evoca
Nosso verão magnifico, este anno passado,
(E a um canto bate,

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Benção

Quando, por uma lei da vontade suprema,
O Poeta vem a luz d’este mundo insofrido
A desolada mãe, numa crise de blasfêmia,
Pragueja contra Deus, que a escuta comovido:

— “Antes eu procriasse uma serpe infernal!
Do que ter dado vida a um disforme aleijão!
Maldita seja a noite em que o prazer carnal
Fecundou no meu ventre a minha expiação!

Já que fui a mulher destinada, Senhor,
A tornar infeliz quem a si me ligou,
E não posso atirar ao fogo vingador
O fatal embrião que meu sangue gerou.

Vou fazer recair o meu ódio implacável
No monstro que nasceu das tuas maldições
E saberei torcer o arbusto miserável
De modo que não vingue um só dos seus botões!”

E sobre Deus cuspindo a sua mágoa ingente
Ignorando a razão dos desígnios do Eterno,
A tresloucada mãe condena, inconsciente,
A sua pobre alma às fogueiras do inferno.

Bafeja a luz do sol o fruto malfadado,
Vela pelo inocente um anjo peregrino;
A água que ele bebe é um néctar perfumado,
O pão é um manjar saboroso,

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Em Sonhos

Nos Santos óleos do luar, floria
Teu corpo ideal, com o resplendor da Helade…
E em toda a etérea, branda claridade
Como que erravam fluidos de harmonia…

As Águias imortais da Fantasia
Deram-te as asas e a serenidade
Para galgar, subir a Imensidade
Onde o clarão de tantos sóis radia.

Do espaço pelos límpidos velinos
Os Astros vieram claros, cristalinos,
Com chamas, vibrações, do alto, cantando…

Nos santos óleos do luar envolto
Teu corpo era o Astro nas esferas solto,
Mais Sóis e mais Estrelas fecundando!

Êxtase De Mármore

À grande atriz Apolônia.

O mármore profundo e cinzelado
De uma estátua viril, deliciosa;
Essa pedra que geme, anseia e goza
Num misticismo altíssimo e calado;

Essa pedra imortal — campo rasgado
A comoção mais íntima e nervosa
Da alma do artista, de um frescor de rosa,
Feita do azul de um céu muito azulado;

Se te visse o clarão que pelos ombros
Teus, rola, cai, nos múltiplos assombros
Da Arte sonora, plena de harmonia;

O mármore feliz que é muito artista
Também — como tu és — à tua vista
De humildade e ciúme, coraria!

Ilusão

Vens todas as madrugadas
prender-te nos meus sonhos,
—estátua de Bizâncio
esculpida em neve!
e poisas a tua mâo
mavia e leve
nas minhas pálpebras magoadas…

Vens toda nua, recortada em graça
rebrilhante, iluminada!
Vejo-te cegar
como uma alvorada
de sol!…
E o meu corpo freme,
e a minha alma canta,
como um enamorado rouxinol!

Sobre a nudez moça do teu corpo,
dois cisnes erectos
quedam-se cismando em brancas estesias
e na seda roxa
do meu leito,
em rúbidos clarões,
nascem, maceradas,
as orquídeas vermelhas
das minhas sensações!…

És linda assim; toda nua,
no minuto doce
em que me trazes
a clara oferta do teu corpo
e reclamas firmemente
a minha posse!…

Quero prender-me à mentira loira
do teu grácil recorte…
E os teus beijos perfumados,
nenúfares desfolhados
pela rajada dominante e forte
das minhas crispações,
tombam sobre eu meus nervos
partidos… estilhaçados!

……………………….

Acordo. E os teus braços,
muito ao longe,
desfiam ainda
a cabeleira fulva
do sol
por sobre os oiros adormecidos
da minha alcova…

Visão bendita!

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Amor que morre

O nosso amor morreu… Quem o diria!
Quem o pensara mesmo ao ver-me tonta,
Ceguinha de te ver, sem ver a conta
Do tempo que passava, que fugia!

Bem estava a sentir que ele morria…
E outro clarão, ao longe, já desponta!
Um engano que morre… e logo aponta
A luz doutra miragem fugidia…

Eu bem sei, meu Amor, que pra viver
São precisos amores, pra morrer,
E são precisos sonhos para partir.

E bem sei, meu Amor, que era preciso
Fazer do amor que parte o claro riso
De outro amor impossível que há-de vir!

Sinfonia de Cor

Sempre defronte
de mim
o mar azul, o mar imenso, o mar sem fim,
todo igual e azul até ao horizonte.

Neste dia delirante
de luz crua a jorrar, intensa, lá do alto,
uma vela distante
mancha de branco o seu azul-cobalto.

Um traço de espuma branca
junto à penedia
marca a linha da costa em enseada franca.

E a nota branca
das gaivotas em bando,
esvoaçando
à revelia,
e um ritmo novo de alegria,
de ruído e de graça.

Perto uma vela passa,
lenço branco a acenar…

Não ter asas também para poder voar
aonde me levasse a minha fantasia!
E ser gaivota e mergulhar
na água e bater asas,
alegre, todo o dia!

Poisar nos calhaus negros, que são brasas,
brasas negras a arder,
e ver aos pés a referver
aos borbotões de espuma.

Dar um grito e subir,
subir alto e distante,
já quando a terra se esfuma
e o mar aumenta, quanto mais avante.

Partir!

Partir para o delírio das alturas,

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Uma Vida Feliz

Uma condição de exaltado prazer somente se mantém por momentos ou, em alguns casos, e com algumas interrupções, por horas ou dias. Ela é o brilhante clarão ocasional da alegria, e não a sua chama firme e constante. Disso sempre estiveram tão cientes os filósofos que ensinaram ser a felicidade a finalidade da vida como aqueles que a eles se opuseram. A felicidade que concebiam não era a do arrebatamento, mas de momentos assim em meio a uma existência constituída de poucas e transitórias dores, muitos e variados prazeres, com um predomínio decidido do componente activo sobre o passivo, e tendo como fundamento do todo não esperar da vida mais do que ela é capaz de oferecer. Uma vida assim constituída, para aqueles que tiveram a boa fortuna de obtê-la, sempre pareceu merecedora da designação de feliz. E uma existência assim é, mesmo hoje em dia, o destino de muitos durante uma parte considerável de suas vidas. A educação falida e os arranjos sociais falidos são os únicos obstáculos reais que impedem que isso esteja ao alcance de quase todos.

Hino À Razão

Razão, irmã do Amor e da Justiça,
Mais uma vez escuta a minha prece.
É a voz dum coração que te apetece,
Duma alma livre só a ti submissa.

Por ti é que a poeira movediça
De astros, sóis e mundos permanece;
E é por ti que a virtude prevalece,
E a flor do heroísmo medra e viça.

Por ti, na arena trágica, as nações
buscam a liberdade entre clarões;
e os que olham o futuro e cismam, mudos,

Por ti podem sofrer e não se abatem,
Mãe de filhos robustos que combatem
Tendo o teu nome escrito em seus escudos!

Musica Misteriosa

Tenda de Estrelas níveas, refulgentes,
Que abris a doce luz de alampadários,
As harmonias dos Estradivarius
Erram da Lua nos clarões dormentes…

Pelos raios fluídicos, diluentes
Dos Astros, pelos trêmulos velários,
Cantam Sonhos de místicos templários,
De ermitões e de ascetas reverentes…

Cânticos vagos, infinitos, aéreos
Fluir parecem dos Azuis etéreos,
Dentre os nevoeiros do luar fluindo…

E vai, de Estrela a Estrela, a luz da Lua,
Na láctea claridade que flutua,
A surdina das lágrimas subindo…

Adoração

Eu não te tenho amor simplesmente. A paixão
Em mim não é amor; filha, é adoração!
Nem se fala em voz baixa à imagem que se adora.
Quando da minha noite eu te contemplo, aurora,
E, estrela da manhã, um beijo teu perpassa
Em meus lábios, oh! quando essa infinita graça
do teu piedoso olhar me inunda, nesse instante
Eu sinto – virgem linda, inefável, radiante,
Envolta num clarão balsâmico da lua,
A minh’alma ajoelha, trémula, aos pés da tua!
Adoro-te!… Não és só graciosa, és bondosa:
Além de bela és santa; além de estrela és rosa.
Bendito seja o deus, bendita a Providência
Que deu o lírio ao monte e à tua alma a inocência,
O deus que te criou, anjo, para eu te amar,
E fez do mesmo azul o céu e o teu olhar!…

Pacto Das Almas (I) Para Sempre!

Ah! para sempre! para sempre! Agora
Não nos separaremos nem um dia…
Nunca mais, nunca mais, nesta harmoia
Das nossas almas de divina aurora.

A voz do céu pode vibrar sonora
Ou do Inferno a sinistra sinfonia,
Que num fundo de astral melancolia
Minh’alma com a tu’alma goza e chora.

Para sempre está feito o augusto pacto!
Cegos serenos do celeste tacto,
Do Sonho envoltas na estrelada rede.

E perdidas, perdidas no Infinito
As nossas almas, no Clarão bendito,
Hão de enfim saciar toda esta sede…

A Ti

Como o sol nasce do monte
E todo o vale alumia,
Assim no meu horizonte
Nasceu teu olhar, um dia.

Nessa manhã cor-de-rosa,
Que dos teus olhos saía,
Tua voz melodiosa
Foi a voz da cotovia.

E logo na minha mágoa,
Neste canteiro sem flor,
Brotou, qual nascente de água,
O teu amor, meu Amor!

Então fez sol deslumbrante
Nos dias da minha vida:
Já não era a luz distante,
Já não a fonte escondida.

Nuvens, tormentas e dores,
Que enchiam meu coração,
Tudo se cobriu de flores,
A esse divino clarão!

E à luz que os teus olhos deram,
Como faróis redentores,
Mundos no mundo nasceram,
Do amor brotaram amores.

Três aves no nosso ninho
O enchem de um fulgor sagrado:
Já não és o sol sozinho,
Fizeste o céu estrelado!

Deus te proteja e te guarde,
Minha Mulher, minha Irmã,
Ó minha Estrela da Tarde,
Minha Estrela da Manhã!

Nunca Aprendi a Viver

De repente eu me vi e vi o mundo. E entendi: o mundo é sempre dos outros. Nunca meu. Sou o pária dos ricos. Os pobres de alma nada armazenam. A vertigem que se tem quando num súbito relâmpago-trovoada se vê o clarão do não entender. EU NÃO ENTENDO! Por medo da loucura, renunciei à verdade. Minhas idéias são inventadas. Eu não me responsabilizo por elas. O mais engraçado é que nunca aprendi a viver. Eu não sei nada. Só sei ir vivendo. Como o meu cachorro. Eu tenho medo do ótimo e do superlativo. Quando começa a ficar muito bom eu ou desconfio ou dou um passo para trás. Se eu desse um passo para a frente eu seria enfocada pelo amarelado de esplendor que quase cega.

Aparição

Um dia, meu amor (e talvez cedo,
Que já sinto estalar-me o coração!)
Recordarás com dor e compaixão
As ternas juras que te fiz a medo…

Então, da casta alcova no segredo,
Da lamparina ao trémulo clarão,
Ante ti surgirei, espectro vão,
Larva fugida ao sepulcral degredo…

E tu, meu anjo, ao ver-me, entre gemidos
E aflitos ais, estenderás os braços
Tentando segurar-te aos meus vestidos…

— «Ouve! espera!» — Mas eu, sem te escutar,
Fugirei, como um sonho, aos teus abraços
E como fumo sumir-me-ei no ar!

Hino à Solidão

Diz-se que a solidão torna a vida um deserto;
Mas quem sabe viver com a sua alma nunca
Se encontra só; a Alma é um mundo, um mundo
[aberto
Cujo átrio, a nossos pés, de pétalas se junca.

Mundo vasto que mil existências povoam:
Imagens, concepções, formas do sentimento,
— Sonhos puros que nele em beleza revoam
E ficam a brilhar, sóis do seu firmamento.

Dia a dia, hora a hora, o Pensamento lavra
Esse fecundo chão onde se esconde e medra
A semente que vai germinar na Palavra,
Cantar no Som, flores na Cor, sorrir na Pedra!

Basta que certa luz de seus raios aqueça
A semente que jaz na sua leiva escondida,
Para que ela, a sorrir, desabroche e floresça,
De perfumes enchendo as estradas da Vida.

Sei que embora essa luz nem para todos tenha
O mesmo brilho, o mesmo impulso criador,
Da Glória, sempre vã, todo o asceta desdenha,
Vivendo como um deus no seu mundo interior.

E que mundo sublime, esse em que ele se agita!
Mundo que de si mesmo e em si mesmo criou,

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