Passagens sobre Jogo

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Frases sobre jogo, poemas sobre jogo e outras passagens sobre jogo para ler e compartilhar. Leia as melhores citações em Poetris.

O jogo é uma analogia para a vida: não existem cadeiras suficientes ou bons tempos para andar por aí, nem comida suficiente, nem divertimento suficiente, nem camas nem empregos nem risos nem amigos nem sorrisos nem dinheiro nem ar limpo para respirar… e no entanto a música continua.

A Imensa Imoralidade da Existência

Viver era como correr em círculo num grande labirinto, esse género de labirinto para crianças que se vê em certos parques de jogos modernos; em cima de uma pedra no meio do labirinto há uma pedra brilhante; os míudos chegam com as faces coradas, cheios de uma fé inabalável na honestidade do labirinto e começam a correr com a certeza de alcançarem dentro de pouco tempo o seu alvo. Corremos, corremos, e a vida passa, mas continuaremos a correr na convicção de que o mundo acabará por se mostrar generoso para quem correr sem desãnimo, e quando por fim descobrimos que o labirinto só aparentemente tende para o ponto central, é tarde demais – de facto, o construtor do labirinto esmerou-se a desenhar várias pistas diferentes, das quais só uma conduz à pérola, de modo que é o acaso cego e não a justiça lúcida o que determina a sorte dos que correm.
Descobrimos que gastámos todas as nossas forças a realizar um trabalho perfeitamente inútil, mas é muito tarde já para recuarmos. Por isso não é de espantar que os mais lúcidos saiam da pista e suprimam algumas voltas inúteis para atingirem o centro cortando caminho. Se dissermos que se trata de uma acção imoral e maldosa,

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A Essência das Coisas

Nunca me conformei com um conceito puramente científico da Existência, ou aritmético-geométrico, quantitativo-extensivo. A existência não cabe numa balança ou entre os ponteiros dum compasso. Pesar e medir é muito pouco; e esse pouco é ainda uma ilusão. O pesado é feito de imponderáveis, e a extensão de pontos inextensos, como a vida é feita de mortes.
A realidade não está nas aparências transitórias, reflexos palpitantes, simulacros luminosos, um aflorar de quimeras materiais. Nem é sólida, nem líquida, nem gasosa, nem electromagnética, palavras com o mesmo significado nulo. Foge a todos os cálculos e a todos os olhos de vidro, por mais longe que eles vejam, ou se trate dum núcleo atómico perdido no infinitamente pequeno, ou da nebulosa Andrómeda, a seiscentos mil anos de luz da minha aldeia!
A essência das coisas, essa verdade oculta na mentira, é de natureza poética e não científica. Aparece ao luar da inspiração e não à claridade fria da razão. Esta apenas descobre um simples jogo de forças repetido ou modificado lentamente, gestos insubstanciais, formas ocas, a casca de um fruto proibido.
Mas o miolo é do poeta. Só ele saboreia a vida até ao mais íntimo do seu gosto amargoso,

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O amor é um jogo estranho, onde as regras são feitas de improviso, no meio da competição… E, como um jogo louco, é o único em que o empate é considerado uma vitória!

A Inutilidade da Crítica

Que a obra de boa qualidade sempre se destaca é uma afirmação sem valor, se aplicada a uma obra de qualidade realmente boa e se por “destaca” quer-se fazer referência à aceitação na sua própria época. Que a obra de boa qualidade sempre se destaca, no curso de sua futuridade, é verdadeiro; que a obra de boa qualidade, mas de segunda ordem sempre se destaca na sua própria época, é também verdadeiro.
Pois como há-de um crítico julgar? Quais as qualidades que formam, não o incidental, mas o crítico competente? Um conhecimento da arte e da literatura do passado, um gosto refinado por esse conhecimento, e um espírito judicioso e imparcial. Qualquer coisa menos do que isto é fatal ao verdadeiro jogo das faculdades críticas. Qualquer coisa mais do que isto é já espírito criativo e, portanto, individualidade; e individualidade significa egocentrismo e certa impermeabilidade ao trabalho alheio.
Quão competente é, porém, o crítico competente? Suponhamos que uma obra de arte profundamente original surja diante dos seus olhos. Como a julga ele? Comparando-a com as obras de arte do passado. Se for original, porém afastar-se-á em alguma coisa — e quanto mais original mais se afastará — das obras de arte do passado.

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Testemunhas Aparentes

Não me preocupa tanto qual eu seja para outrem como me preocupa qual eu seja em mim mesmo. Quero ser rico por mim, não por empréstimo. Os estranhos vêem apenas os acontecimentos e as aparências externas; cada qual pode ter um ar alegre exteriormente e por dentro estar cheio de febre e receio. Eles não vêem o meu coração; vêem apenas o meu comportamento. Tem-se razão em depreciar a hipocrisia que existe na guerra; pois o que é mais fácil para um homem oportunista do que esquivar-se dos perigos e fazer-se de bravo, tendo o ânimo repleto de frouxidão? Há tantos meios de evitar as ocasiões de arriscar-se pessoalmente que teremos enganado o mundo mil vezes antes de encetarmos um passo perigoso; e mesmo então, vendo-nos entravados, nesse momento bem sabemos encobrir o nosso jogo com um ar alegre e uma palavra serena, embora a alma nos trema interiormente.
E se alguém pudesse usar o anel de Platão, que tornava invisível quem o levasse no dedo e o virasse para a palma da mão, muitas pessoas amiúde se esconderiam quando mais é preciso apresentar-se e se arrependeriam de estar colocadas num lugar tão honroso, no qual a necessidade as torna seguras: Quem pode alegrar-se com falsas honrarias e temer a calúnia,

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Eu Ela e a Escrita

Eu ela e a escrita existimos desde o princípio. A escrita forma-se em mim, passa por ela e volta à minha pele num jogo sensual e íntimo. É um ser maleável aos gestos que executamos, vive e morre com os nossos impulsos. Quando se ausenta deixa sinais. Faz-nos confidências da sua vida errante, elabora sentimentos que não esperávamos que tivesse quando junta ao nosso, o seu instinto criativo. Assim, utilizo agora palavras que nunca pensei vir a escrever. Aceito-as porque as sei da espécie da personagem que habita connosco, conivente com os erros que cometemos.

Quando adolescente, passava o tempo a ler o dicionário, apercebendo-me da corrosão de algumas palavras, do seu poder destrutivo. Noutras havia sombra e um peso monstruoso. E as que ao tempo foram luminosas, irradiavam um brilho que se colou aos meus dedos. Eu gastava os dias a limpar-me dessa luz até não haver em mim resíduos de leitura. Descobria o esquecimento, onde o poema veio a ser abismo, outra vida onde o sorriso da morte teve muita importância. Amei a imperfeição do ser humano. Revisitei a infância e aquilo que em nós é real. Não soube prescindir da beleza.

Eu vou sugerir que o barbarismo seja considerado como uma característica humana permanente e universal, a qual se torna mais ou menos pronunciada de acordo com o jogo das circunstâncias.

O Antagonismo Racial

O elemento puramente instintivo não constitui senão uma pequena parte do ódio racial e não é difícil de vencer. O medo do que é estrangeiro, que é a sua principal essência, desaparece com a familiaridade. Se nenhum outro elemento o formasse, toda a perturbação desapareceria logo que pessoas de raças diferentes se habituassem umas às outras. Mas há sempre pretextos para se odiarem os grupos estrangeiros. Os seus hábitos são diferentes dos nossos e portanto (em nossa opinião) piores. Se triunfam, é porque nos roubam as oportunidades; se não triunfam, é porque são miseráveis vagabundos. A actual população do mundo descende dos sobreviventes de longos séculos de guerras e por instinto está à espreita de ocasiões de hostilidade colectiva.

O desejo de ter um inimigo fixa-se no coração desse instinto racista e constrói à sua volta um edifício monstruoso de crueldade e de loucura. Tais conflitos representam hoje uma catástrofe universal e não já somente, como outrora, um desastre para os vencidos: daí as inquietações do nosso tempo. É por isso que é mais importante do que nunca conseguir um certo grau de domínio racional sobre os nossos sentimentos destruidores.

Em geral o ódio racial tem duas origens,

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O saber precisa de ser visto com a idiotia que ele próprio comporta, com o jogo de certezas que uma época tem por inevitáveis mas não por permanente. Um mundo sem idiotas é um mundo saturado de falsa dignidade.

O Jogo da Conformidade Ofusca a Visão

A objecção contra o conformar-se a usos que se tornaram peremptos para ti é a de que dissipam a tua força. Fazem-te perder tempo e borram a nitidez do teu carácter. Se manténs uma Igreja morta; se contribuis para uma Sociedade Bíblica morta; se votas com um grande partido tanto a favor como contra o governo; se pões a mesa de igual modo ao das donas de casa mesquinhas – tenho dificuldade em descobrir, sob todos esses mantos, a tua exacta personalidade. E, claro está, muita e muita força é-te subtraída da tua própria vida.
Mas age, que te conhecerei. Executa o teu trabalho e te fortificarás. Um homem deve ter em mente que o jogo da conformidade ofusca a visão.
Se conheço a tua seita, antecipo o teu argumento.

O Sentimento dum Ocidental

I

Avé-Maria

Nas nossas ruas, ao anoitecer,
Há tal soturnidade, há tal melancolia,
Que as sombras, o bulício, o Tejo, a maresia
Despertam-me um desejo absurdo de sofrer.

O céu parece baixo e de neblina,
O gás extravasado enjoa-me, perturba;
E os edifícios, com as chaminés, e a turba
Toldam-se duma cor monótona e londrina.

Batem carros de aluguer, ao fundo,
Levando à via-férrea os que se vão. Felizes!
Ocorrem-me em revista, exposições, países:
Madrid, Paris, Berlim, S. Petersburgo, o mundo!

Semelham-se a gaiolas, com viveiros,
As edificações somente emadeiradas:
Como morcegos, ao cair das badaladas,
Saltam de viga em viga os mestres carpinteiros.

Voltam os calafates, aos magotes,
De jaquetão ao ombro, enfarruscados, secos;
Embrenho-me, a cismar, por boqueirões, por becos,
Ou erro pelos cais a que se atracam botes.

E evoco, então, as crónicas navais:
Mouros, baixéis, heróis, tudo ressuscitado!
Luta Camões no Sul, salvando um livro a nado!
Singram soberbas naus que eu não verei jamais!

E o fim da tarde inspira-me; e incomoda!

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Aproveitar o Tempo

Aproveitar o tempo!
Mas o que é o tempo, que eu o aproveite?
Aproveitar o tempo!
Nenhum dia sem linha…
O trabalho honesto e superior…
O trabalho à Virgílio, à Mílton…
Mas é tão difícil ser honesto ou superior!
É tão pouco provável ser Milton ou ser Virgílio!

Aproveitar o tempo!
Tirar da alma os bocados precisos – nem mais nem menos –
Para com eles juntar os cubos ajustados
Que fazem gravuras certas na história
(E estão certas também do lado de baixo que se não vê)…
Pôr as sensações em castelo de cartas, pobre China dos serões,
E os pensamentos em dominó, igual contra igual,
E a vontade em carambola difícil.
Imagens de jogos ou de paciências ou de passatempos –
Imagens da vida, imagens das vidas. Imagens da Vida.

Verbalismo…
Sim, verbalismo…
Aproveitar o tempo!
Não ter um minuto que o exame de consciência desconheça…
Não ter um acto indefinido nem factício…
Não ter um movimento desconforme com propósitos…
Boas maneiras da alma…
Elegância de persistir…

Aproveitar o tempo!

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A Vida e o Jogo

Quando a criança cresceu e abandonou os seus jogos, quando durante anos se esforçou psiquicamente por agarrar as realidades da vida com a seriedade desejada, pode acontecer que um dia se encontre de novo numa disposição psíquica que volta a apagar esta oposição entre o jogo e a realidade. O homem adulto lembra-se da grande seriedade com que se entregava aos jogos infantis e acaba por comparar as suas ocupações por assim dizer graves com esses jogos dos tempos da infância: liberta-se então da opressão demasiado pesada da vida e conquista a fruição superior do humor.

Reivindico o Meu Direito Próprio de Pensar

Queixas-te de teres aí falta de livros. Não interessa a quantidade, mas sim a qualidade: a leitura é proveitosa se for metódica, se apenas for variada torna-se um mero divertimento. Quem deseja chegar à meta que se propôs deve seguir um só caminho, e não vaguear por vários: de outro modo não viaja, deixa-se ir ao acaso.
(…) Confio, e muito, no pensamento dos grandes homens, mas reivindico o meu direito próprio de pensar. De resto eles não nos legaram verdades acabadas, mas sim sujeitas à investigação; e porventura teriam descoberto o essencial se não tivessem investigado também temas supérfluos. Mas gastaram tempo imenso em jogos de palavras, em discussões capciosas que aguçam inutilmente o engenho. Construimos argumentos tortuosos, empregamos termos de significação ambígua, finalmente desatamos toda a trama. Temos assim tanto tempo livre? Já sabemos como encarar a vida e a morte? O que devemos procurar, com todas as forças, é o modo de nos não deixarmos enganar pelas coisas, e não pelas palavras.
Para quê analisar as diferenças entre palavras sinónimas, que não causam dificuldade a ninguém a não ser em discussões de escola? As coisas enganam-nos: aprendamos a observá-las. Tomamos por bens coisas que o não são,

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Dissimular as Paixões

As paixões são as seteiras do espírito. O mais prático consiste em dissimular. Corre o risco de perder quem joga jogo aberto. Que a detença do recatado compita com a atenção do advertido; a linces da palavra, sibas de interioridade. Que não lhe conheçam o gosto, para que não se previnam, uns para a contradição, outros para a lisonja.

As Discussões Nunca São Feitas de Boa Fé

Só os ingénuos podem crer que uma discussão visa resolver um problema ou esclarecer uma questão difícil. Na realidade, a sua única justificação é testar a capacidade de os participantes derrubarem o adversário. O que está em jogo não é a verdade, mas o amor próprio. O bem falante leva a melhor sobre o que tartamudeia, o temerário sobre o tímido e o arrebatado sobre o escrupuloso. Estar de boa fé equivale a potenciar as desvantagens, porquanto os escrúpulos se somam à circunspecção, dificultando a expressão. O que é a boa fé? Uma conduta de fracasso, um autêntico suicídio… Quem participa em debates fala sem escutar, espezinha qualquer raciocínio que não seja conduzido por si próprio, despreza as oposições, ignora as obstrucções e, de certo modo, conquista a vitória à força de palavras.
Cultiva a má fé com o profissionalismo do jardineiro que cria uma planta venenosa cujo veneno possui suavidades tão profundas que quem o prova já não passa sem ele. Para dar melhor resultado, a má fé não deve ser demasiado subtil. Com efeito, o seu impacte não será suficiente para desnortear o outro, rápida e duradouramente. Nesta matéria, a subtileza não substitui a brutalidade que, não obstante a detestável fama em certos meios intelectuais,

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