Todos aqueles que devem deliberar sobre questões dúbias devem também manter-se imunes ao ódio e à simpatia, à ira e ao sentimentalismo.
Passagens sobre Ódio
426 resultadosAmor Sem Fruto, Amor Sem Esperança
Amor sem fruto, amor sem esperança
É mais nobre, mais puro,
Que o que, domando a ríspida esquivança,
Jaz dos agrados nas prisões seguro.
Meu leal coração, constante e forte,
Vendo a teu lado acesos,
Flérida ingrata, os ódios, os desprezos,
O rigor, a tristeza, a raiva, a morte,
Forjando contra mim, por ordem tua,
Mil setas venenosas,
Em prémio destas lágrimas saudosas,
Inda assim continua
A abrasar-se em teus olhos… Vis amantes,
Corações inconstantes,
De sórdidas paixões envenenados,
Vós, a cujos ardores,
A cujos desbocados
Infames apetites
A Virtude, a Razão não põe limites,
Suspirai por ilícitos favores,
Cevai-vos em torpíssimos desejos,
Tratai, tratai de louco um amor casto,
Que eu nos grilhões que arrasto;
Tão limpos como o Sol, darei mil beijos.
Peçonhenta aliança,
Vergonhoso prazer, de vós não curo;
De ti, sim, porque és puro,
Amor sem fruto, amor sem esperança.
A Nossa Avidez Infinita
Todos nós sofremos de uma avidez infinita. As nossas vidas são-nos preciosas, estamos sempre alerta contra os desperdícios. Ou talvez fosse melhor chamar a isso Sentido de Destino Pessoal. Sim. Creio que é melhor do que avidez. Deverá a minha vida perder um milésimo de polegada da sua plenitude? É uma coisa diferente avaliar-se a si próprio ou vangloriar-se loucamente. E há então os nossos planos, os nossos ideais. Também eles são perigosos. Podem consumir-nos como parasitas, comer-nos, sorver-nos e deixar-nos exangues e prostrados. E no entanto estamos constantemente a convidar os parasitas, como se estivéssemos ansiosos por sermos sorvidos e comidos. Isto porque nos ensinaram que não há limites para o que um homem pode ser.
Há seiscentos anos um homem era o que o seu nascimento demarcava para ele. Satanás e a Igreja, representante de Deus, lutavam por ele. Ele, pela sua escolha, decidia em parte qual seria o resultado. Mas quer fosse, depois da morte, para o céu ou para o inferno, o seu lugar entre os vivos estava marcado. Não podia ser contestado. Desde então o palco foi novamente arranjado e os seres humanos apenas passeiam nele e, sob este novo ponto de vista,
A Fúria Mais Fatal e Mais Medonha
Das Fúrias infernais foi sempre a Inveja
No mundo a mais fatal e a mais medonha,
Pois faz dos bens dos outros a peçonha
Com que a si mesma se envenena e peja.Com ira e com furor, raivosa, arqueja,
Com vinganças, traições, com ódios sonha.
Onde quer que se encoste e os olhos ponha,
Tragar as ditas dos mortais deseja.Mãe dos males fatais à Sociedade,
Vidas, honras destrói, cismas fomenta,
Nutrindo n’alma as serpes da Maldade.O próprio coração que come a alenta,
Vive afogada em ondas de ansiedade,
Da frenética raiva se alimenta.
Conduta e Poesia
Quando o tempo nos vai comendo com o seu relâmpago quotidiano decisivo, as atitudes fundadas, as confianças, a fé cega se precipitam e a elevação do poeta tende a cair como o mais triste nácar cuspido, perguntamo-nos se já chegou a hora de envilecermos. A hora dolorosa de ver como o homem se sustém a puro dente, a puras unhas, a puros interesses. E como entram na casa da poesia os dentes e as unhas e os ramos da feroz árvore do ódio. É o poder da idade, ou proventura, a inércia que faz retroceder as frutas no próprio bordo do coração, ou talvez o «artístico» se apodere do poeta e, em vez do canto salobro que as ondas profundas devem fazer saltar, vemos cada dia o miserável ser humano defendendo o seu miserável tesouro de pessoa preferida?
Aí, o tempo avança com cinza, com ar e com água! A pedra que o lodo e a angústia morderam floresce com prontidão com estrondo de mar, e a pequena rosa regressa ao seu delicado túmulo de corola.
O tempo lava e desenvolve, ordena e continua.
E que fica então das pequenas podridões, das pequenas conspirações do silêncio, dos pequenos frios sujos da hostilidade?
Soneto X
Quais no soberbo mar à nao, que cansa
Lidando c’os assaltos da onda e vento,
Os Ebálios irmãos do Etéreo assento
Lhe confirmam do porto a esperança,Tal vossa vista ao tempo, que se alcança
Desta, que não tem mor contentamento,
No mar de meu cuidado e meu tormento
Mil esperanças cria de bonança.Comparação, conforme a causa, ufana,
Pois quando um me aparece, outro se esconde,
Como no Céu faz ua, e outra estrela.Iguais também no Amor, que em vós responde
Também no desamor da Irmã Troiana,
Que ambos vos conjurais em ódio dela.
Só o egoísmo e o ódio têm pátria; A fraternidade não.
Conquista e Governação
Quando os estados que se conquistam têm a tradição de viver segundo as suas leis e em liberdade, para a sua conservação existem três opções: a primeira é a sua destruição; a segunda é ir para lá viver o príncipe conquistador; e a terceira consiste em deixá-los viver de acordo com as suas leis, mas exigindo-lhes um tributo e criando no seu seio uma oligarquia que vos garanta a sua fidelidade. Porque, sendo este novo poder uma criação daquele príncipe, sabem os seus mandatários que não podem sobreviver sem a sua amizade e apoio, tudo havendo de fazer para manter o novo regime. E mais facilmente se conserva uma cidade habituada a viver livre através do consenso dos seus cidadãos do que de qualquer outro modo.
(…) Na verdade, o único modo seguro de conservar uma cidade conquistada é a sua destruição. Quem se torna senhor de uma cidade habituada a viver livre e a não desfaça, pode preparar-se para ser por ela desfeito, porque sempre encontrarão grande receptividade no seio da rebelião a recordação da liberdade e das antigas instituições, as quais nem pela acção do tempo nem pela concessão de benesses se apagarão da sua memória. O que quer que se faça ou se disponha,
Homens ofendem por medo ou por ódio
Loucura é pagar a amizade com o ódio.
Sátira
Besta e mais besta! O positivo é nada…
(Perdoa, se em gramática te falo,
Arte que ignoras, como ignoras tudo.)
Besta e mais besta! Na palavra embirro;
Que a besta anexa ao mais teu ser define.Dás-me louvor servil na voz do prelo,
Grande me crês, proclamas-me famoso,
Excelso, transcendente, incomparável,
Confessas que d’Elmano a fúria temes…
E, débil estorninho, águias provocas,
Aves de Jove, que o corisco empunham!És de rábula vil corrupta imagem;
Tu vendes o louvor, como ele as partes,
Mas ele na enxovia infâmias paga,
E tu, com tústios, que aos caloiros pilhas,
Compras gravatas, em que a tromba enorme
Sumas ao dia, que de a ver se embrusca,
Qual em tenra mãozinha esconde a face
Mimoso infante de papões vexado.
Útil descuido aos cárceres te furta,
À digna habitação de ti saudosa
(Digo, o Castelo), estância equivalente
Aos méritos morais, que em ti reluzem.De saloios vinténs larápio sujo,
A glória do teu ódio restitui
A quem no teu louvor desacreditas.
Se honrada pelos sábios d’Ulisseia
(D’Ulisseia não só,
Ainda o amo, esse é o meu tormento. Lestat, eu nunca amei. Mas você! A medida de meu ódio é este amor. São iguais! Agora sabe o quanto o odeio!.
Quero dos Deuses só que me não Lembrem
Quero dos deuses só que me não lembrem.
Serei livre — sem dita nem desdita,
Como o vento que é a vida
Do ar que não é nada.
O ódio e o amor iguais nos buscam; ambos,
Cada um com seu modo, nos oprimem.
A quem deuses concedem
Nada, tem liberdade.
O afeto ou o ódio mudam a face da justiça.
Os homens graves e melancólicos ficam mais leves graças ao que torna os outros pesados, o ódio e o amor, e assim surgem de vez em quando à sua superfície.
O mal que fazemos não nos suscita tantas perseguições e ódio como as nossas boas qualidades.
A minha fé impele-me a olhar para a Cruz.
Como eu queria que por um instante os homens e as mulheres de boa vontade olhassem para a Cruz!
Pode ler-se lá a resposta de Deus, á violência respondeu-se com a mansidão, à morte não se respondeu com o ódio.
O oposto do amor não é o ódio, mas a indiferença.
Humilhações
Esta aborrece quem é pobre. Eu, quase Jó,
Aceito os seus desdéns, seus ódios idolatro-os;
E espero-a nos salões dos principais teatros,
Todas as noites, ignorado e só.Lá cansa-me o ranger da seda, a orquestra, o gás;
As damas, ao chegar, gemem nos espartilhos,
E enquanto vão passando as cortesãs e os brilhos,
Eu analiso as peças no cartaz.Na representação dum drama de Feuillet,
Eu aguardava, junto à porta, na penumbra,
Quando a mulher nervosa e vã que me deslumbra
Saltou soberba o estribo do coupé.Como ela marcha! Lembra um magnetizador.
Roçavam no veludo as guarnições das rendas;
E, muito embora tu, burguês, me não entendas,
Fiquei batendo os dentes de terror.Sim! Porque não podia abandoná-la em paz!
Ó minha pobre bolsa, amortalhou-se a idéia
De vê-la aproximar, sentado na platéia,
De tê-la num binóculo mordaz!Eu ocultava o fraque usado nos botões;
Cada contratador dizia em voz rouquenha:
— Quem compra algum bilhete ou vende alguma senha?
E ouviam-se cá fora as ovações.Que desvanecimento!
Mensagem – Mar Português
MAR PORTUGUÊS
Possessio Maris
I. O Infante
Deus quer, o homem sonha, a obra nasce.
Deus quis que a terra fosse toda uma,
Que o mar unisse, já não separasse.
Sagrou-te, e foste desvendando a espuma,E a orla branca foi de ilha em continente,
Clareou, correndo, até ao fim do mundo,
E viu-se a terra inteira, de repente,
Surgir, redonda, do azul profundo.Quem te sagrou criou-te português.
Do mar e nós em ti nos deu sinal.
Cumpriu-se o Mar, e o Império se desfez.
Senhor, falta cumprir-se Portugal!II. Horizonte
Ó mar anterior a nós, teus medos
Tinham coral e praias e arvoredos.
Desvendadas a noite e a cerração,
As tormentas passadas e o mistério,
Abria em flor o Longe, e o Sul sidério
’Splendia sobre as naus da iniciação.Linha severa da longínqua costa —
Quando a nau se aproxima ergue-se a encosta
Em árvores onde o Longe nada tinha;
Mais perto, abre-se a terra em sons e cores:
E, no desembarcar, há aves,