Em cada pessoa mora uma inocência própria.
Passagens sobre Próprio
3083 resultadosAmar é cansar-se de estar só: é uma cobardia portanto, e uma traição a nós próprios (importa soberanamente que não amemos).
Soneto Do Amigo
Enfim, depois de tanto erro passado
Tantas retaliações, tanto perigo
Eis que ressurge noutro o velho amigo
Nunca perdido, sempre reencontrado.É bom sentá-lo novamente ao lado
Com os olhos que contem o olhar antigo
Sempre comigo um pouco atribulado
E como sempre singular comigo.Um bicho igual à mim, simples e humano
Sabendo se mover e comover
E a disfarçar com meu próprio engano.O amigo: um ser que a vida não explica
Que só se vai ao ver outro nascer
E o espelho de minha alma multiplica…
O Existencialista
Dostoievski escreveu: «Se Deus não existisse, tudo seria permitido». Aí se situa o ponto de partida do existencialismo. Com efeito, tudo é permitido se Deus não existe , fica o homem, por conseguinte , abandonado, já que não encontra em si, nem fora de si, uma possibilidade a que se apegue. Antes de mais nada, não há desculpas para ele. Se, com efeito, a existência precede a essência, não será nunca possível referir uma explicação a uma natureza humana dada e imutável; por outras palavras, não há determinismo, o homem é livre, o homem é liberdade. Se, por outro lado, Deus não existe, não encontramos diante de nós valores ou imposições que nos legitimem o comportamento. Assim, não temos nem atrás de nós, nem diante de nós, no domínio luminoso dos valores, justificações ou desculpas. Estamos sós e sem desculpas. É o que traduzirei dizendo que o homem está condenado a ser livre. Condenado, porque não se criou a si próprio; e no entanto livre, porque uma vez lançado ao mundo, é responsável por tudo quanto fizer. O existencialista não crê na força da paixão. Não pensará nunca que uma bela paixão é uma torrente devastadora que conduz fatalmente o homem a certos actos e que por conseguinte,
Injustiça: de todos os fardos que depositamos nos outros e que carregamos nós próprios, é o mais leve nas mãos e o mais pesado nas costas.
O Sábio Face à Vida
Existe acaso alguém a quem possas colocar acima do sábio? O sábio tem, sobre os deuses, opiniões piedosas. Não teme a morte em momento nenhum, considera-a o fim normal da natureza, julga que o termo dos bens é fácil de atingir e de possuir, sabe que os males têm uma duração e uma gravidade limitadas; sabe o que é mister pensar da fatalidade, da qual se constuma fazer uma ama despótica. Sabe que os acontecimentos nascem, uns da fortuna, outros de nós próprios, porque a fatalidade é cega e a fortuna inconstante; que o que vem de nós não está submisso a nenhuma tirania, sujeito a reproche e a elogio.
Com efeito, melhor fora acreditar nas narrativas mitológicas sobre os deuses que tornar-se escravo da fatalidade dos físicos. A mitologia consente a esperança de que, honrando os deuses, poderemos dispô-los a nosso favor, enquanto a fatalidade é inexorável. O sábio não crê, como o vulgo, que a fortuna seja uma divindade, pois um deus não pode agir de maneira desordenada. Nem é, para ele, uma causa, dada a sua instabilidade. Não a admite como causa do bem e do mal, ou da vida feliz; não obstante, sabe que pode trazer grandes bens ou grandes males.
Não há Liberdade sem Direcção
É fácil estabelecer a ordem de uma sociedade na submissão de cada um dos seus componentes a regras fixas. É fácil moldar um homem cego que tolere, sem protestar, um mestre ou um Corão. Mas é muito diferente, para libertar o homem, fazê-lo reinar sobre si próprio.
Mas o que é libertar? Se eu libertar, no deserto, um homem que não sente nada, que significa a sua liberdade? Não há liberdade a não ser a de «alguém» que vai para algum sítio. Libertar este homem seria mostrar-lhe que tem sede e traçar o caminho para um poço. Só então se lhe ofereceriam possibilidades que teriam significado. Libertar uma pedra nada significa se não existir gravidade. Porque a pedra, depois de liberta, não iria a parte nenhuma.
O Triunfo da Ignorância
As relações privadas entre os homens formam-se, parece, segundo o modelo do bottleneck industrial. Até na mais reduzida comunidade, o nível obedece ao do mais subalterno dos seus membros. Assim, quem na conversação fala de coisas fora do alcance de um só que seja comete uma falta de tacto. O diálogo limita-se, por motivos de humanidade, ao mais chão, ao mais monótono e banal, quando na presença de um só “inumano”. Desde que o mundo emudeceu o homem, tem razão o incapaz de argumentar. Não necessita mais do que ser pertinaz no seu interesse e na sua condição para prevalecer. Basta que o outro, num vão esforço para estabelecer contacto, adopte um tom argumentativo ou panfletário para se transformar na parte mais débil.
Visto que o bottleneck não conhece nenhuma instância que vá além do factual, quando o pensamento e o discurso remetem forçosamente para semelhante instância, a inteligência torna-se ingenuidade, e isso até os imbecis entendem. A conjura pelo positivo actua como uma força gravitória, que tudo atrai para baixo. Mostra-se superior ao movimento que se lhe opõe, quando com ele já não entra em debate. O diferenciado que não quer passar inadvertido persiste numa atitude estrita de consideração para com todos os desconsiderados.
A Europa como um Novo Império Germânico
Uma vez mais. Sou um europeu céptico que aprendeu tudo do seu cepticismo com uma professora chamada Europa. Não falando da questão do «ressentimento histórico», a que sou especialmente sensível, mas que, de todo o modo, é ultrapassável, rejeito a denominada «construção europeia» por aquilo que vejo estar a ser a constituição premeditada de um novo «sacro império germânico», com objectivos hegemónicos que só nos parecem diferentes dos do passado porque tiveram a habilidade de apresentar-se disfarçados sob roupagens de uma falsa consensualidade que finge ignorar as contradições subjacentes, as que constituem, queiramo-lo ou não, a trama em que se moveram e continuam a mover-se as raízes históricas das diversas nações da Europa. A União Europeia parece não querer compreender o que se está a passar na ex-União Soviética, nem sequer, apesar de tão à vista dos seus míopes olhos, nos Balcãs, para não falar do que irá passar-se amanhã em África, espaço já anunciado dos grandes conflitos do século XXI, se uma oportuna estratégia de hegemonias partilhadas não instaurar ali um colonialismo de novo tipo… A questão política principal do nosso tempo deveria ser o respeito pelas nações e a dignificação de todas as minorias étnicas, como meio de prevenir os nacionalismos xenófobos,
O Desgaste da Inveja
De todas as características que são vulgares na natureza humana a inveja é a mais desgraçada; o invejoso não só deseja provocar o infortúnio e o provoca sempre que o pode fazer impunemente, como também se torna infeliz por causa da sua inveja. Em vez de sentir prazer com o que possui, sofre com o que os outros têm. Se puder, priva os outros das suas vantagens, o que para ele é tão desejável como assegurar as mesmas vantagens para si próprio. Se uma tal paixão toma proporções desmedidas, torna-se fatal a todo o mérito e mesmo ao exercício do talento mais excepcional.
Por que é que o médico deve ir ver os seus doentes de automóvel quando o operário vai para o seu trabalho a pé? Por que é que o investigador científico pode passar os dias num quarto aquecido, quando os outros têm de expor-se à inclemência dos elementos? Por que é que um homem que possui algum talento raro de grande importância para o mundo deve ser dispensado do penoso trabalho doméstico? Para tais perguntas a inveja não encontra resposta. Afortunadamente, porém, há na natureza humana um sentimento compensador, chamado admiração. Todos os que desejm aumentar a felicidade humana devem procurar aumentar a admiração e diminuir a inveja.
Meu amor, meu amor
Meu amor meu amor
meu corpo em movimento
minha voz à procura
do seu próprio lamento.Meu limão de amargura meu punhal a escrever
nós parámos o tempo não sabemos morrer
e nascemos nascemos
do nosso entristecer.Meu amor meu amor
meu nó e sofrimento
minha mó de ternura
minha nau de tormentoeste mar não tem cura este céu não tem ar
nós parámos o vento não sabemos nadar
e morremos morremos
devagar devagar.
Escritores, meditem muito e corrijam pouco. Fazei as vossas rasuras no vosso próprio cérebro.
Onde é que se pode encontrar o teu próprio eu? Sempre no mais profundo encantamento que experimentaste.
A Vida sempre cresce de dentro para fora. Se for puxado pelo lado de fora à força. acabará por se romper. Mas se crescer com a sua própria força interior, jamais se romperá.
Egoísta é um sujeito mais interessado em si próprio do que em mim.
Ego é o homem carnal; é a mente comandada pela carne. O ego é sempre a causa dos sofrimentos, seja qual for o rumo que ele tome. Quem tenta impor seu ego causa sofrimento a si próprio e aos outros.
Suponho que a história da minha vida é uma busca de amor, mas mais do que isso, fui à procura de um caminho próprio para a reparação dos danos que sofri desde o início, bem como definir a minha obrigação, se eu tivesse alguma, para mim e para minha espécie.
Aquele que a si próprio censura, espera que o contradigam.
Nem Hóspede Será do que Conheço
Rasteja mole pelos campos ermos
O vento sossegado.
Mais parece tremer de um tremor próprio,
Que do vento, o que é erva.
E se as nuvens no céu, brancas e altas,
Se movem, mais parecem
Que gira a terra rápida e elas passam,
Por muito altas, lentas.
Aqui neste sossego dilatado
Me esquecerei de tudo,
Nem hóspede será do que conheço
A vida que deslembro.
Assim meus dias seu decurso falso
Gozarão verdadeiro.
Nem Excelente Nem Absoluto
Todo o Excelente merece o ostracismo. É um bem, se ele a si próprio se condenar. Todo o Absoluto deve ser banido do mundo. No Mundo tem de se viver com o Mundo. E só se vive, se for no sentido dos Homens com os quais se vive. Todo o bem que há no Mundo provém do interior (e portanto vem-lhe a ele do exterior), mas é apenas uma faísca que, veloz, o percorre. Todo o Excelente faz avançar o Mundo, mas deve desaparecer quanto antes.