Em Vão
Passo triste na vida e triste sou,
Um pobre a quem jamais quiseram bem!
Um caminhante exausto que passou,
Que não diz onde vai nem donde vem.Ah! Sem piedade, a rir, tanto desdém
a flor da minha boca desdenhou!
Solitário convento onde ninguém
A silenciosa cela procurou!E eu quero bem a tudo, a toda gente…
Ando a amar assim, perdidamente,
A acalentar o mundo nos meus braços!E tem passado, em vão, a mocidade
Sem que no meu caminho uma saudade
Abra em flores a sombra dos meus passos!
Passagens sobre Saudades
548 resultadosEstrada A Fora
Ela passou por mim toda de preto,
Pela mão conduzindo uma criança…
E eu cuidei ver ali uma esperança
E uma Saudade em pálido dueto.Pois, quando a perda de um sagrado afeto
De lastimar esta mulher não cansa,
N’uma alegria descuidosa e mansa,
Passa a criança, o beija-flor inquieto.Também na Vida o gozo e a desventura
Caminham sempre unidos, de mãos dadas,
E o berço, às vezes, leva à sepultura…No coração, – um horto de martírios! –
Brotam sem fim as ilusões douradas,
Como nas campas desabrocham lírios.
Caminho
I
Tenho sonhos cruéis; n’alma doente
Sinto um vago receio prematuro.
Vou a medo na aresta do futuro,
Embebido em saudades do presente…Saudades desta dor que em vão procuro
Do peito afugentar bem rudemente,
Devendo, ao desmaiar sobre o poente,
Cobrir-me o coração dum véu escuro!…Porque a dor, esta falta d’harmonia,
Toda a luz desgrenhada que alumia
As almas doidamente, o céu d’agora,Sem ela o coração é quase nada:
Um sol onde expirasse a madrugada,
Porque é só madrugada quando chora.
Tristêza
O sol do outomno, as folhas a cair,
A minha voz baixinho soluçando,
Os meus olhos, em lagrimas, beijando
A terra, e o meu espirito a sorrir…Eis como a minha vida vae passando
Em frente ao seu Phantasma… E fico a ouvir
Silencios da minh’alma e o resurgir
De mortos que me fôram sepultando…E fico mudo, extatico, parado
E quasi sem sentidos, mergulhando
Na minha viva e funda intimidade…Só a longinqua estrela em mim actua…
Sou rocha harmoniosa á luz da lua,
Petreficada esphinge de saudade…
Ah, não há saudades mais dolorosas do que as das coisas que nunca foram!
Poema Cansado de Certos Momentos
Foi-se tudo
como areia fina escoada pelos dedos.
Mãe! aqui me tens,
metade de mim,
sem saber que metade me pertence.
Aqui me tens,
de gestos saqueados,
onde resta a saudade de ti
e do teu mundo de medos.
Meus braços, vê-os, estão gastos
de pedir luz
e de roubar distâncias.
Meus braços
cruzados
em cruz de calvário dos meus degredos.
Ai que isto de correr pela vida,
dissipando a riqueza que me deste,
de levar em cada beijo
a pureza que pariste e embalaste,
ai, mãe, só um louco ou um Messias
estendendo a face de justopara os homens cuspirem o fel das veias,
só um louco, ou um poeta ou um Cristo
poderá beijar as rosas que os espinhos sangram
e, embora rasgado, beber o perfume
e continuar cantando.
Mãe! tu nunca previste
as geadas e os bichos
roendo os campos adubados
e o vizinho largando a fúria dos rebanhos
pela flor menina dos meus prados.
E assim, geraste-me despido
como as ervas,
e não olhaste os pegos nem as cobras,
Ela Ia, Tranqüila Pastorinha
Ela ia, tranqüila pastorinha,
Pela estrada da minha imperfeição.
Segui-a, como um gesto de perdão,
O seu rebanho, a saudade minha…“Em longes terras hás de ser rainha”
Um dia lhe disseram, mas em vão…
Seu vulto perde-se na escuridão…
Só sua sombra ante meus pés caminha…Deus te dê lírios em vez desta hora,
E em terras longe do que eu hoje sinto
Serás, rainha não, mas só pastora _Só sempre a mesma pastorinha a ir,
E eu serei teu regresso, esse indistinto
Abismo entre o meu sonho e o meu porvir…
Confissão
Vivo um drama interior.
Já nele pouco a pouco me consumo.
E de tanto te buscar,
Mas sem nunca te encontrar,
Sou como um barco sem leme,
Que perdesse o rumo,
No alto mar.Da minha vida, assim,
O que vai ser nem sei!
Dias alegres houvesse…
E os dias são para mim
Rosas mortas de um jardim
Que um vendaval desfizesse.Tenho horas bem amargas.
Eu o confesso,
Eu o digo.
E se tudo passa e esqueço,
Esquecer o teu perfil
É coisa que eu não consigo.Sofro por ti. O frio do que morre
Amortalha a minha alma em saudade.
Atrás de uma ilusão a minha vida corre,
Como se fora atrás de uma verdade.A Deus peço, por fim, o meu sossego antigo.
Não me persiga mais o teu busto delgado.
Passo os dias e as noites a sonhar contigo,
Na cruz da tua ausência estou crucificado.A tua falta sinto. Não o oculto.
Ocultá-lo seria uma mentira.
Vejo por toda a parte a sombra do teu vulto,
LXXXI
Junto desta corrente contemplando
Na triste falta estou de um bem que adoro;
Aqui entre estas lágrimas, que choro,
Vou a minha saudade alimentando.Do fundo para ouvir-me vem chegando
Das claras hamadríades o coro;
E desta fonte ao murmurar sonoro,
Parece, que o meu mal estão chorando.Mas que peito há de haver tão desabrido,
Que fuja à minha dor! que serra, ou monte
Deixará de abalar-se a meu gemido!Igual caso não temo, que se conte;
Se até deste penhasco endurecido
O meu pranto brotar fez uma fonte.
Passei o Dia Ouvindo o que o Mar Dizia
Eu hontem passei o dia
Ouvindo o que o mar dizia.Chorámos, rimos, cantámos.
Fallou-me do seu destino,
Do seu fado…Depois, para se alegrar,
Ergueu-se, e bailando, e rindo,
Poz-se a cantar
Um canto molhádo e lindo.O seu halito perfuma,
E o seu perfume faz mal!Deserto de aguas sem fim.
Ó sepultura da minha raça
Quando me guardas a mim?…Elle afastou-se calado;
Eu afastei-me mais triste,
Mais doente, mais cansado…Ao longe o Sol na agonia
De rôxo as aguas tingia.«Voz do mar, mysteriosa;
Voz do amôr e da verdade!
– Ó voz moribunda e dôce
Da minha grande Saudade!
Voz amarga de quem fica,
Trémula voz de quem parte…»
. . . . . . . . . . . . . . . .E os poetas a cantar
São echos da voz do mar!
Nascerão Saudades de Meu Bem
Alegres campos, verdes arvoredos,
Claras e frescas águas de cristal,
Que em vós os debuxais ao natural,
Discorrendo da altura dos rochedos;Silvestres montes, ásperos penedos
Compostos de concerto desigual;
Sabei que, sem licença de meu mal,
Já não podeis fazer meus olhos ledos.E pois já me não vedes como vistes,
Não me alegrem verduras deleitosas,
Nem águas que correndo alegres vêm.Semearei em vós lembranças tristes,
Regar-vos-ei com lágrimas saudosas,
E nascerão saudades de meu bem.
Eu Passava Na Vida Errante E Vago
Eu passava na vida errante e vago
Como o nauta perdido em noite escura,
Mas tu te ergueste peregrina e pura
Como o cisne inspirado em manso lago,Beijava a onda, num soluço mago,
Das moles plumas a brilhante alvura,
E a voz ungida de eternal doçura
Roçava as nuvens em divino afago.Vi-te; e nas chamas de fervor profundo
A teus pés afoguei a mocidade
Esqueci de mim, de Deus, do mundo ! …Mas ai! Cedo Fugiste ! … da saudade,
Hoje te imploro desse amor tão fundo
Uma idéia, uma queixa, uma saudade!
E viram assombrados o trem enfeitado de flores que, já da primeira vez, chegava com oito meses de atraso. O inocente trem amarelo que tantas incertezas e evidencias, e tantos deleites e desventuras, e tantas mudanças, calamidades e saudades haveria de trazer para Macondo.
Em que Emprego o Meu Tempo?
Em que emprego o meu tempo? Vou e venho,
Sem dar conta de mim nem dos pastores,
Que deixam de cantar os seus amores,
Quando passo e lhes mostro a dor que tenho.É de tristezas o torrão que amanho,
Amasso o negro pão com dissabores,
Em ribeiros de pranto pesco dores,
E guardo de saudades um rebanho.Meu coração à doce paz resiste,
E, embora fiqueis crendo que motejo,
Alegre vivo por viver tão triste!Amor se mostra nesta dor que abrigo:
Quero triste viver, pois vos não vejo,
Nem sequer muito ao longe vos lobrigo.
Soneto VI – À Mesma Senhora
Tão doce como o som da doce avena
Modulada na clave da saudade;
Como a brisa a voar na soledade,
Branda, singela, límpida e serena;Ora em notas de gozo, ora de pena,
Já cheia de solene majestade,
Já lânguida exprimindo piedade,
Sempre essa voz é bela, sempre amena.Mulher, do canto teu no dom supremo
A dádiva descubro mais subida
Que de um Deus pode dar o amor paterno.E minh’alma, num êxtase embebida,
Aos teus lábios deseja um canto eterno,
E, só para gozá-lo, eterna a vida.
A saudade é um bem pelo qual se sofre. Uma saudade que se extingue é sinal de um amor que não existiu. Os amores que acabam nunca são verdadeiros…
Tenho por ti uma paixão
Tão forte e acrisolada,
Que até adoro a saudade
Quando por ti é causada.
Que Mimoso Prazer!
1
Que mimoso prazer! Teu rosto amado
Me raiou na alma! Oh astro meu luzente!
Desfez-se em continente
O negrume cerrado,
Que me assombrava o coração aflito,
Em saudades tristíssimas sopito.2
Bem, como quando aponta o sol radiante
Pelos ervosos cumes dos outeiros;
Fogem bruscos nevoeiros,
Da roxa luz brilhante;
Assim, mal vi teu rosto, assim fugiam
As Mágoas, que de luto a alma cobriam3
Quem sempre assim de amor nos brandos laços!
Doces queixas de amor absorto ouvira!
Da idade não sentira
O voo. Entre os teus braços
Me corte o fio, com a fouce, a Morte;
Que perco a vida, sem sentir o corte!4
Se a meiga Vénus, se o gentil Cupido
Cede a meus votos, cede à minha Amada:
Se esta união prezada
Não rompe um Nume infido…
Não dou por mais feliz o vil Mineiro
Sobre montes de sórdido dinheiro.5
Não dou por mais feliz o Rei no trono
Lisonjado de Cortesãos astutos.
Amor
Quando é noite, e, na voz da Imensidade,
Um alto sonho em lágrimas crepita,
Tua graça de morte me visita,
Teu olhar é um sorriso de saudade…E a tua Ausência intimamente invade
Meu coração que morto inda palpita;
E a lágrima que eu sangro se ilimita,
Reflecte em sua dor a eternidade!Vens de Além; são de sombras teus vestidos;
Tua noite de morte me ilumina,
Confundimos em êxtase os sentidos…Um canto ri na cruz da nossa dor;
Canto onde brilha uma oração divina,
Morre o Desejo e principia o Amor!
Manhã No Campo
A Maria Nunes
Estendo os olhos pelo prado a fora:
Verdura e flores é o que a vista alcança…
– Bendito oásis onde o olhar descansa
Quando saudades do passado chora. –Escuto ao longe uma canção sonora.
Voz de mulher ou, antes, de criança
Entoa o hino branco da Esperança,
Hino das aves ao nascer da Aurora.
Por toda parte risos e fulgores
E a Natureza desabrochando em flores,
Iluminada pelo Sol risonho,Recorda um’alma diluída em prece,
Um coração feliz que inda estremece
À luz sagrada do primeiro sonho!