Textos sobre Filhos

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Textos de filhos escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

Suportar a Adversidade

Das ocorrências indesejadas, falando de maneira genérica, algumas acarretam naturalmente dor e vexação, mas, na maior parte dos casos, é falsa a noção que nos habituou a nos enfadarmos com elas. Como específico contra este tipo de ocorrência, é conveniente ter à mão um dito de Menandro: «Nada te aconteceu de facto enquanto não te importares muito com o ocorrido». Isso quer dizer que não há motivo para o teu corpo e a tua alma se mostrarem afectados se, por exemplo, o teu pai é de baixa extracção, a tua mulher cometeu adultério, tu mesmo te viste privado de alguma coroa honorífica ou privilégio especial, pois nada disso te impede de prosperar de corpo ou alma.
Para a primeira categoria – doenças, privações, a morte de amigos ou filhos -, que parece acarretar naturalmente dor e vexação, esta linha de Eurípedes deve estar à mão: “Ai! por que ai? É o quinhão da mortalidade que nos coube”. Nenhum outro argumento lógico pode romper de forma tão efectiva a espiral descendente das nossas emoções, do que a reflexão de que somente através da compulsão comum da Natureza, um dos elementos da sua constituição física, é que o homem se torna vulnerável à Fortuna;

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A Vida Real de um Pensamento

A vida real de um pensamento dura apenas até ele chegar ao limite das palavras: nesse ponto, ele lapidifica-se, morre, portanto, mas continua indestrutível, tal como os animais e as plantas fósseis dos tempos pré-históricos. Essa realidade momentânea da sua vida também pode ser comparada ao cristal, no instante da cristalização.
Pois, assim que o nosso pensamento encontra as palavras, ele já não é interno, nem está realmente no âmago da sua essência. Quando começa a existir para os outros, ele deixa de viver em nós, como o filho que se desliga da mãe ao iniciar a própria existência. Mas diz também o poeta:

Não me confundais com contradições!

Tão logo se fala, já se começa a errar.

Não Existe Prosa

Não existe prosa. A menos que se refiram os escritos, em prosa ou verso, que pretendem ensinar. Não há nada a ensinar embora haja tudo a aprender. Aquilo que se aprende vem do nosso próprio ensino, vem da pergunta; vão-se aprendendo, pelas esperas, pela imobilidade às portas, pela invisibilidade dos rostos depois de vistos tão prometedoramente, pela emenda sucessiva, pela insónia sucessiva dos olhos e das figurações, sempre, vão-se aprendendo sempre as maneiras da pergunta. Uma pergunta em perguntas, um poema em poemas, uma rebarbativa constelação de objectos ofuscantes. Aprende-se que a pergunta se desloca com a luz inerente; ilumina-se a si mesma, a pergunta constelar; ensina a si mesma, ao longo de si mesma, os estilos de ser dotada dessa luz para fora e para dentro. Leio romances desde que perceba que não estão a responder. Alguns são extraordinárias máquinas interrogativas: “Ulisses”, “Filhos e Amantes”, “O Doutor Fausto”, “O Processo”, “A Morte de Virgílio”, “O Som e a Fúria”, “Debaixo do Vulcão”, “A Obra ao Negro”, “Lolita”, “Diário do Ladrão”, todos os romances de Céline como se fossem um só, alguns outros, antes, agora. Os romances de Agustina Bessa-Luís, porventura os menos amados, são entre nós as quase únicas máquinas vivas de perguntar.

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Ah, a Moral!

Ah, a palavra «moral»! Sempre que aparece, penso nos crimes que foram cometidos em seu nome. As confusões que este termo engendrou abarcam quase toda a história das perseguições movidas pelo homem ao seu semelhante. Para além do facto de não existir apenas uma moral, mas muitas, é evidente que em todos os países, seja qual for a moral dominante, há uma moral para o tempo de paz e uma moral para a guerra. Em tempo de guerra tudo é permitido, tudo é perdoado. Ou seja, tudo o que de abominável e infame o lado vencedor praticou. Os vencidos, que servem sempre de bode expiatório, «não têm moral».
Pensar-se-á que, se realmente glorificássemos a vida e não a morte, se déssemos valor à criação e não à destruição, se acreditássemos na fecundidade e não na impotência, a tarefa suprema em que nos empenharíamos seria a da eliminação da guerra. Pensar-se-á que, fartos de carnificina, os homens se voltariam contra os assassinos, ou seja, os homens que planeiam a guerra, os homens que decidem das modalidades da arte da guerra, os homens que dirigem a indústria de material de guerra, material que hoje se tornou indescrivelmente diabólico. Digo «assassinos», porque em última análise esses homens não são outra coisa.

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Riqueza Ilimitada mas Mortal

Eu não posso, pensando bem, descobrir como é possível a nós, que demos tanta importância à riqueza ilimitada e que, para falar a verdade, a divinizamos, não admitir nas nossas almas os males que crescem com ela. Acompanha, com efeito, a riqueza sem medida e sem coração, ligada a ela, e como se diz marchando no mesmo passo, a prodigalidade, e à medida que a riqueza abre o acesso às cidades e às casas ela entra junto e coabita. Depois, com o tempo, segundo os sábios, esses seres fazem os seus ninhos nas vidas humanas e rapidamente engendram outros seres, no momento da procriação, como a cupidez, o orgulho e a luxúria, que não são seus bastardos mas filhos legítimos.
Mas se permitir que esses filhos da riqueza avancem na idade, logo para as almas eles engendrarão tiranos inexoráveis, a violência, a ilegalidade e a imprudência. Pois é assim necessariamente; os homens não olham mais para o alto e não dão importância ao renome na posteridade, mas a destruição das vidas (dos homens) completa-se pouco a pouco num tal ciclo e a grandeza das almas fenece, enfraquece e não é mais assunto de emulação, quando se reserva a sua admiração às partes mortais de si mesmo,

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Um Segredo de um Casamento Feliz

Desde que a Maria João e eu fizemos dez anos de casados que estou para escrever sobre o casamento. Depois caí na asneira de ler uns livros profissionais sobre o casamento e percebi que eu não percebo nada sobre o casamento.

Confesso que a minha ambição era a mais louca de todas: revelar os segredos de um casamento feliz. Tendo descoberto que são desaconselháveis os conselhos que ia dar, sou forçado a avisar que, quase de certeza, só funcionam no nosso casamento.

Mas vou dá-los à mesma, porque nunca se sabe e porque todos nós somos muito mais parecidos do que gostamos de pensar.

O casamento feliz não é nem um contrato nem uma relação. Relações temos nós com toda a gente. É uma criação. É criado por duas pessoas que se amam.

O nosso casamento é um filho. É um filho inteiramente dependente de nós. Se nós nos separarmos, ele morre. Mas não deixa de ser uma terceira entidade.

Quando esse filho é amado por ambos os casados – que cuidam dele como se cuida de um filho que vai crescendo -, o casamento é feliz. Não basta que os casados se amem um ao outro.

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As Mães não Descansam

Todas as pessoas têm direito a descanso, menos as mães. Para cada tarefa, profissão ou encargo há direito a uma folga, menos para as mães. Se alguma mãe demonstrar a mínima fadiga de ser mãe, haverá logo uma besta, ignorante de limpar baba e de parir, que se oferecerá para a pôr em causa. Não é mãe, não sabe ser mãe, não foi feita para ser mãe, dirá. Mas, se todas as pessoas têm direito a descanso, será que as mães não são pessoas? A culpa é nossa. Sim, a culpa é das mães. Deixámos que fossem os filhos a definir-nos.

Os Olhos não Permitem a Mentira

Será através dos olhos que passarás aos teus filhos tudo o que souberes.
Pouco valimento será dado às lições que, em vã convicção, te atrevas a dedicar-lhes.
Não poderás ensinar mais do que sabes;
aquilo que souberes será aquilo em que acreditares;
aquilo em que acreditares existirá dentro de ti,
terá a forma de um mistério que nunca entenderás completamente
e, no entanto, os teus filhos irão recebê-lo, de modo puro e inalterado, através dos teus olhos.
Queiras ou não, assim será.
Os olhos não permitem a mentira.

O Todo não Representa Nada

Olhem em redor deste universo. Que enorme profusão de seres, animados e organizados, sensíveis e activos! Vocês admiram esta extraordinária variedade e fecundidade. Mas inspeccionem mais atentamente estas existências vivas, os únicos seres que merecem ser observados. Como são hostis e destrutivos uns para os outros! Como todos eles são insuficientes para a sua própria felicidade! Como são desprezíveis ou abomináveis para o espectador! O todo não representa nada a não ser a ideia de uma natureza cega, impregnada de um grande princípio estimulante, e vertendo do regaço, sem discernimento nem cuidado paternal, os seus filhos mutilados e abortivos.

A Maior Necessidade do Homem

A maior necessidade do homem é sentir que é necessário. Se no mundo não existir ninguém que precise de nós, cometeremos suicídio, não conseguiremos viver. É estranho – talvez nunca tenham pensado nisto, que estamos continuamente à procura de quem precise de nós. Isto faz de nós seres preciosos, dá-nos valor, um certo significado. Talvez as mulheres se casem com os homens apenas para preencher a necessidade de se sentir necessária. E a razão poderá ser igualmente válida para os homens, talvez desejem sentir que uma determinada mulher precisa deles.

Os homens tentaram impedir as mulheres de ganharem dinheiro, de trabalharem, de se instruírem e educarem. As explicações para isso são de ordem política, económica, entre outras, mas a razão psicológica reside no facto de os homens desejarem a dependência das mulheres para que elas nunca deixem de precisar deles e os façam sentirem-se bem por haver alguém que precisa deles. Juntos terão filhos e ambos se sentirão bem pelo facto de essas crianças precisarem deles: é um motivo para viver. Temos de viver pelo bem dessas crianças, temos de viver pelo bem da nossa mulher, temos de viver pelo bem do nosso marido: a vida deixa de ser algo desprovido de sentido.

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Nada é Verdadeiramente Satisfatório

Nada é verdadeiramente satisfatório. Mesmo a arte a que um artista é vocacionado, e sobre a qual e para a qual vive, está sempre aquém do seu desejo. Nunca atinge aquele nível, aquele andar que desejaria. Está sempre a tentar, a aproximar-se do limite das possibilidades. No fundo, do absoluto. Um absoluto que se não atinge, [que se] ignora mesmo. A única coisa que sabemos ao certo é: ninguém nasce senão para morrer. Morrer mais cedo ou morrer mais tarde. Tem esse privilégio: acabar com a vida antes do fim natural dela. Se estiver desesperado, acontece. Justamente quando perde a esperança. Quando perde a esperança, perdeu tudo, e então liquida-se.

[Pensou alguma vez? Houve algum momento na sua vida tão desesperançado? Teve tantos reveses…]

Não. Suponho que ninguém deixa de pensar na morte. E quando se chega à minha idade, está-se mais consciente de que se aproxima o fim. Portanto, ele tem que se preparar para esse final. Há muita gente que conheci que se suicidou por isto ou por aquilo. E há o problema da eutanásia, quando o sofrimento é muito grande, a experiência é nula e as pessoas não podem sequer matar-se, têm que pedir que alguém as mate.

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A Idealização do Amor

Eu estava a pensar na forma como se poderá entender o amor, à luz da minha formação. Da minha perspectiva, depende daquilo que o outro representa, se o outro é um prolongamento nosso, é uma parte nossa, como acontece muitas vezes, ou é uma idealização do eu de que falaria o Freud. No sentido psicanalítico poder-se-ia dizer que o amor corresponde ao eu ideal e, portanto, à procura de qualquer coisa de ideal que nós colocamos através de um mecanismo de identificação projectiva no outro.

Portanto, à luz de uma perspectiva científica, como é apesar de tudo a psicanalítica, o problema começa a pôr-se de uma forma um bocado diferente. Nesse sentido e na medida em que o objecto amado é sempre idealizado e nunca é um objectivo real, a gente, de facto, nunca se está a relacionar com pessoas reais, estamos sempre a relacionarmo-nos com pessoas ideias e com fantasmas. A gente vive, de facto, num mundo de fantasmas: os amigos são fantasmas que têm para nós determinada configuração, ou os pais, ou os filhos, etc.

(…) O amor é uma coisa que tem que tem que ver de tal forma com todo um mundo de fantasmas,

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Ser Escritor

E, então, porque não podemos viver de outra maneira, escrevemos. E cai-nos o cabelo e apodrecem-nos os dentes, como dizia Flannery O’Connor.

E somos uns chatos. E somos maus maridos e maus filhos e maus amigos. E sentimos culpa, e sentimo-nos indignos de estima, e continuamos, mesmo assim, a não responder quando falam connosco.

E não telefonamos nos anos, nem aparecemos nos churrascos, nem vamos ao café. E, se vamos, a única coisa de que falamos é disso: do livro. E tudo aquilo sobre que se conversa pode servir ao livro, caso contrário não nos importa.

E somos os maiores quando um parágrafo nos sai bem, e ficamos de rastos quando não encontramos um verbo. E sabemos que tem de ser mesmo assim, porque se não for o romance fica uma merda. Mas sentimos culpa na mesma.

E não pagamos as contas, e esquecemo-nos de pedir a garrafa do gás, e calçamos meias de pares diferentes. E de repente queremos fumar dois maços de cigarros e beber meia garrafa de uísque, sozinhos no jardim, a olhar para a noite e a chorar.

E temos de fazer um esforço para mudar de roupa,

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O Declínio da Natalidade

A mudança de relações entre pais e filhos é um exemplo típico da expansão geral da democracia. Os pais já não estão muito seguros dos seus direitos sobre os filhos, os filhos já não sentem que devem respeito aos pais. A virtude da obediência, que era outrora exigida sem discussão, passou de moda e com certa razão.
A psicanálise aterrorizou os pais cultos com o medo de causarem, sem querer, mal aos filhos. Se os beijam, podem provocar o complexo de Édipo; se não os beijam, podem provocar crises de ciúmes. Se os repreeendem em qualquer coisa, podem fazer nascer neles o sentimento do pecado; se não o fazem, os filhos adquirem hábitos que os pais consideram indesejáveis. Quando vêem as crianças a chupar no polegar, tiram disso toda a espécie de conclusões terríveis, mas não sabem o que fazer para o evitar. O uso dos direitos dos pais que era antigamente uma manifestação triunfante da autoridade, tornou-se tímido, receoso e cheio de escrúpulos.

Perderam-se as antigas alegrias simples e isto é tanto mais grave quanto é certo que, devido à nova liberdade das mulheres solteiras, a mãe tem de fazer muito mais sacrifícios do que antigamente ao optar pela maternidade.

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Luto por uma Novidade de Espírito

Procuro me manter isolada contra a agonia de viver dos outros, e essa agonia que lhes parece um jogo de vida e morte mascara uma outra realidade, tão extraordinária essa verdade que os outros cairiam de espanto diante dela, como num escândalo. Enquanto isso, ora estudam, ora trabalham, ora amam, ora crescem, ora se afanam, ora se alegram, ora se entristecem. A vida com letra maiúscula nada pode me dar porque vou confessar que também eu devo ter entrado por um beco sem saída como os outros. Porque noto em mim, não um bocado de fatos, e sim procuro quase tragicamente ser. É uma questão de sobrevivência assim como a de comer carne humana quando não há alimento. Luto não contra os que compram e vendem apartamentos e carros e procuram se casar e ter filhos mas luto com extrema ansiedade por uma novidade de espírito. Cada vez que me sinto quase um pouco iluminada vejo que estou tendo uma novidade de espírito.
Minha vida é um reflexo deformado assim como se deforma num lago ondulante e instável o reflexo de um rosto. Imprecisão trémula. Como o que acontece com a água quando se mergulha a mão na água.

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O Individual como Base do Colectivo

Tudo quanto é apenas colectivo é desordem. A ordem vem da composição individual. Mas a composição individual para formar em si a ordem necessita de que esta também se projecte no colectivo.
A expressão do colectivo é o pânico. O terror só se submete pelo terror. O pânico tem duas expressões de terror: a centrífuga e a centrípeta. A expressão que se desfaz a si mesma e a que permanece estática e se adentra.

A única maneira de aparentar a ordem no colectivo é manejar o pânico. Mas como todo o estado psíquico, por mais inteiro que se apresente tende a suavizar-se se era violento e a tornar-se violento se era suave, é necessário para manter o estado de pânico, que se lhe estabeleçam tantas modalidades diferentes e sucessivas que consigam realmente fazer desviar as atenções da sua insistência. Porém, este processo não tem fim. É o processo da mística colectiva. Filha do desespero individual, a mística colectiva não faz alterar a realidade mas consegue temporáriamente submeter todos os indivíduos às mesmas circunstâncias. E até que se formem as novas élites as místicas colectivas são espera.
Ao vermos os grandes exércitos, reluzentes nas paradas ou disfarçados com a própria cor da terra das batalhas,

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Perca Pragmática

Em relação a qualquer coisa nunca digas: «Perdi-a»; diz, ao contrário: «Devolvi-a». Morreu-te o filho? Devolveste-o. Morreu-te a mulher? Devolveste-a. O teu campo foi roubado? Foi também devolvido. Mas quem o roubou é um miserável? Que te importa por quem o retirou aquele que to dera? Enquanto te deixam tais bens, toma conta deles como de um bem que pertence a outrem, como fazem os viajantes numa hospedaria.

Os Descrentes

Nunca encontrei um descrente, apenas desvairados inquietos… é assim que é melhor tratá-los. São pessoas diferentes, não se percebe bem o que são: tanto os grandes como os pequenos, os ignorantes como os cultos, mesmo a gente da classe mais simples, tudo neles é desvario. Porque passam a vida a ler e a interpretar e depois, fartos da doçura livresca, continuam perplexos e não conseguem resolver nada.
Há quem se disperse, de maneira que não consegue atentar em si mesmo. Há quem seja rijo como pedra, mas no seu coração vagueiam sonhos. Há também o insensível e fútil que só quer gozar e ironizar. Há quem só tire dos livros florinhas, e mesmo elas consoante a sua opinião, e há nele desvario e falta de perspicácia. E digo mais: há muito tédio.
O homem pequeno é necessitado, não tem pão, não tem com que sustentar os filhos, dorme na palha áspera, mas tem o coração leve e alegre; é pecador e malcriado, mas mantém na mesma o coração alegre. E o homem grande farta-se de comer e beber, senta-se num montão de ouro, mas tem sempre a mágoa no coração. Há quem domine as ciências mas não se livre do tédio.

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O Prazer em Perspectiva: a Esperança

A esperança é filha do desejo, mas não é o desejo. Constitui uma aptidão mental, que nos fez crer na realização de um desejo. Podemos desejar uma coisa sem que a esperemos. Toda gente deseja a fortuna, muito poucos a esperam. Os sábios desejam descobrir a causa primitiva dos fenômenos; eles não têm nenhuma esperança de consegui-lo. O desejo aproxima-se algumas vezes da esperança, a ponto de confundir-se com ela. Na roleta, eu desejo e espero ganhar.
A esperança é uma forma de prazer em expectativa que, na sua atual fase de espera, constitui uma satisfação freqüentemente maior do que o contentamento produzido pela sua realização. A razão é evidente. O prazer realizado limita-se em quantidade e em duração, ao passo que nada limita a grandeza do sonho criado pela esperança. A força e o encanto da esperança consistem em conter todas as possibilidades de prazer. Ela constitui uma espécie de vara mágica que transforma tudo. Os reformadores nunca fizeram mais do que substituir uma esperança por outra.