Textos sobre Mãos

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Textos de mãos escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

Atenção aos Detalhes do Comportamento dos Outros

Devemos ter muito cuidado para não emitir uma opinião demasiado favorável de um homem que acabamos de conhecer; pelo contrário, na maioria das vezes, seremos desiludidos, para nossa própria vergonha ou até para nosso dano. A esse respeito, uma sentença de Séneca merece ser mencionada: Podem-se obter provas da natureza de um carácter também a partir de miudezas. Justamente nestas é que o homem, quando não se procura conter, é que revela o seu carácter. Nas acções mais insignificantes, em simples maneiras, pode-se amiúde observar o seu egoísmo ilimitado, sem a menor consideração para com os outros e que, em seguida, embora dissimulado, não se desmente nas grandes coisas.
Não se deve perder semelhante oportunidade. Quando alguém procede sem consideração nos pequenos acontecimentos e circunstâncias da vida diária, intentando obter vantagens ou comodidade, em prejuízo de outrem, nas coisas em que se aplica a máxima de a lei não se ocupa com ninharias, ou ainda apropriando-se do que existe para todos, etc., podemos convencer-nos de que no coração de tal indivíduo não reside justiça alguma; ele será um patife também nas grandes situações, caso as suas mãos não sejam atadas pela lei e pela autoridade. Não lhe permitamos, pois,

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A Grande Literatura

Os romances nunca serão totalmente imaginários nem totalmente reais. Ler um romance é confrontar-se tanto com a imaginação do autor quanto com o mundo real cuja superfície arranhamos com uma curiosidade tão inquieta. Quando nos refugiamos num canto, nos deitamos numa cama, nos estendemos num divã com um romance nas mãos, a nossa imaginação passa o tempo a navegar entre o mundo daquele romance e o mundo no qual ainda vivemos. O romance nas nossas mãos pode-nos levar a um outro mundo onde nunca estivemos, que nunca vimos ou de que nunca tivemos notícia. Ou pode-nos levar até às profundezas ocultas de um personagem que, na superfície, parece-se às pessoas que conhecemos melhor. Estou a chamar a atenção para cada uma dessas possibilidades isoladas porque há uma visão que acalento, de tempos a tempos, que abarca os dois extremos. Às vezes tento conjurar, um a um, uma multidão de leitores recolhidos num canto e aninhados nas suas poltronas com um romance nas mãos; e também tento imaginar a geografia de sua vida quotidiana. E então, diante dos meus olhos, milhares, dezenas de milhares de leitores vão tomando forma, distribuídos por todas as ruas da cidade, enquanto eles lêem, sonham os sonhos do autor,

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Vida de Escritor

É fácil reconhecer em mim a concentração de todas as minhas forças sobre a escrita. Quando se tornou claro no meu organismo que escrever era a direcção mais produtiva que podia tomar o meu ser, tudo correu para esse lado e deixou-me vazio de todas as capacidades que se dirigiam para as alegrias do sexo, da comida, da bebida, da reflexão filosófica e, acima de tudo, da música. Eu atrofiava em todas estas direcções. Isto era necessário porque a totalidade das minhas forças é tão leve que só colectivamente é que elas podiam semi-servir a finalidade da minha escrita. É claro que não encontrei esta finalidade independentemente ou conscientemente, ela encontrou-se a si própria e só o escritório interfere com ela, e interfere completamente. De qualquer modo, eu não me devia queixar pelo facto de não conseguir ter uma namorada, de perceber exactamente tanto de amor como de música e de ter de me resignar nos esforços mais superficiais de que posso lançar mão, de na noite de fim de ano ter jantado escorcioneira e espinafres com um quarto de Ceres e de no domingo não ter podido participar na leitura que Max fez dos seus trabalhos filosóficos; a compensação de tudo isto é clara como o dia.

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Seguro Emocional

Com frequência, comento com os meus alunos da licenciatura em psicanálise e psicologia multifocal que uma das tarefas mais nobres e relevantes do Eu é mapear, esquadrinhar os nossos fantasmas e reeditar as nossas janelas traumáticas. De outro modo, podemos fazer parte do rol dos que falam sobre maturidade mas são verdadeiras crianças no território da emoção, pois não sabem ser minimamente criticados, contrariados e, além disso, têm a necessidade neurótica de poder e de que o mundo gravite na sua órbita.

Certa vez, perguntei a executivos das cinquenta empresas psicologicamente mais saudáveis do país: «Quem tem algum tipo de seguro?» Todos responderam que tinham. Em seguida, indaguei: «Quem tem um seguro emocional?» Ninguém arriscou levantar a mão. Foram sinceros. Como podemos falar de empresas saudáveis sem mencionar os mecanismos básicos para proteger a emoção? Só fazemos um seguro daquilo que nos é caro. Mas, infelizmente, a mais importante propriedade tem tido um valor irrelevante.

Em geral, estes profissionais são ótimos para a empresa, mas carrascos de si mesmos. Acertam no trivial, mas erram muito no essencial. E eu? E o leitor? Ainda que possamos dizer que a mente humana é a mais complexa de todas as «empresas»,

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Ninguém é Feliz quando Treme pela sua Felicidade

Ninguém é feliz quando treme pela sua felicidade. Não se apoia em bases sólidas quem tira a sua satisfação de bens exteriores, pois acabará por perder o bem-estar que obteve. Pelo contrário, um bem que nasce dentro de nós é permanente e constante, e vai sempre crescendo até ao nosso último momento; todos os demais bens ante os quais se extasia o vulgo são bens efémeros. “E então? Quer isso dizer que são inúteis e não podem dar satisfação?” É evidente que não, mas apenas se tais bens estiverem na nossa dependência, e não nós na dependência deles. Tudo quanto cai sob a alçada da fortuna pode ser proveitoso e agradável na condição de o seu beneficiário ser senhor de si próprio em vez de ser servo das suas propriedades. É um erro pensar-se, Lucílio, que a fortuna nos concede o que quer que seja de bom ou de mau; ela apenas dá a matéria com que se faz o bom e o mau, dá-nos o material de coisas que, nas nossas mãos, se transformam em boas ou más.
O nosso espírito é mais poderoso do que toda a espécie de fortuna, ele é quem conduz a nossa vida no bom ou no mau sentido,

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No Teatro, a Verdade Esquiva-se Sempre

No teatro, a verdade esquiva-se sempre. Nunca a encontramos por completo, mas é forçoso procurá-la. Essa busca é claramente aquilo que guia os nossos esforços. É essa a nossa tarefa. Na maioria das vezes é no escuro que tropeçamos na verdade, esbarramos nela, ou vislumbramos uma imagem ou uma forma que parece corresponder à verdade, muitas vezes sem nos darmos conta disso. Mas a verdade verdadeira é que, na arte do teatro, não há nunca uma verdade única que possamos encontrar. Há muitas. Estas verdades desafiam-se mutuamente, fogem, reflectem-se, ignoram-se, espicaçam-se, são insensíveis umas às outras. Às vezes pensamos que temos a verdade de um momento na mão, e depois ela escapa-se-nos por entre os dedos e desaparece.

Saber Zangar-se

O que me parece é que as pessoas, em geral, como que deixaram de saber zangar-se. Deixaram de saber zangar-se com aquilo que consideram errado – e, pior ainda, deixaram de saber dizê-lo na cara umas das outras. A não ser, naturalmente, que haja uma agenda.

Ainda nos zangamos muito, é verdade. Mas zangamo-nos mal. Com a maior das facilidades nos zangamos contra inimigos abstractos, como «o Governo», «o capitalismo selvagem» ou mesmo apenas «a crise». Com a maior das facilidades nos zangamos com aqueles que entendemos como nossos subordinados, no trabalho e na vida em geral (afinal, os nossos «superiores» acabam de pôr-nos a pata em cima. alguém vai ter de pagar a conta). Com aqueles que estão, de alguma forma, em ascendente sobre nós, já não nos zangamos: amuamos, que é a forma mais cobarde de nos zangarmos. Aos nossos iguais simplesmente não dizemos nada: engolimos e tornamos a engolir, convencendo-nos de que do outro lado está, afinal, um pobre diabo, tão pobre que nem sequer merece uma zanga – e, quando enfim nos zangamos, é para dar-lhe um tiro na cabeça, como todos os dias nos mostram os jornais.

A impressão com que eu fico é que tudo isto vem dessa mania das social skills e do team building e dos demais chavões moderninhos que os gurus dos livros de Economia nos enfiaram pela garganta abaixo,

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Enfrentar-se a Si Próprio

Ódio da introspecção activa. Explicações da nossa alma, tais como: ontem eu estava assim e assado, por esta ou por aquela razão; hoje estou assim e assado, por qualquer outra razão. Não é verdade, nem por esta razão nem por aquela razão, e por isso também nem assim nem assado.
Enfrentar-se a si próprio calmamente, sem precipitações, viver como se tem de viver, não andar à caça do próprio rabo como o cão.
Adormeci nos arbustos. Um barulho acordou-me. Encontrei um livro nas minhas mãos, que tinha estado a ler. Deitei-o fora e levantei-me de um salto. Passava pouco do meio-dia; em frente da colina em que eu estava estendia-se uma grande planura com aldeias e lagos e sebes todas iguais, altas, que pareciam feitas de junco. Pus as mãos nas ancas, examinei tudo com o olhar, e ao mesmo tempo escutei o barulho.

O Pressuposto Indispensável para se Ser um Grande-Escritor

O pressuposto indispensável para se ser um grande-escritor é, então, o de escrever livros e peças de teatro que sirvam para todos os níveis, do mais alto ao mais baixo. Antes de produzir algum bom efeito, é preciso primeiro produzir efeito: este princípio é a base de toda a existência como grande-escritor. É um princípio miraculoso, eficaz contra todas as tentações da solidão, por excelência o princípio goethiano do sucesso: se nos movermos apenas num mundo que nos é propício, tudo o resto virá por si. Pois quando um escritor começa a ter sucesso dá-se logo uma transformação significativa na sua vida. O seu editor pára de se lamentar e de dizer que um comerciante que se torna editor se parece com um idealista trágico, porque faria muito mais dinheiro negociando com tecidos ou papel virgem. A crítica descobre nele um objecto digno da sua actividade, porque os críticos muitas vezes até nem são más pessoas, mas, dadas as circunstâncias epocais pouco propícias, ex-poetas que precisam de um apoio do coração para poderem pôr cá fora os seus sentimentos;são poetas do amor ou da guerra, consoante o capital interior que têm de aplicar com proveito, e por isso é perfeitamente compreensível que escolham o livro de um grande-escritor e não o de um comum escritor.

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Vítimas e Vencidos

A ilusão constante da Revolução está em acreditar que as vítimas da força, estando inocentes das violências que se exercem, se lhes colocássemos na mão a força, a manuseariam com justiça. Mas à excepção das almas que estão bastante próximas da santidade, as vítimas são maculadas pela força como os carrascos. O mal que se encontra no punho da espada é transmitido para a ponta. E as vítimas, chegadas assim a este ponto e inebriadas pela mudança, fazem tanto mal ou mais ainda, e de imediato reincidem.
(…) O socialismo consiste em atribuir o bem aos vencidos, e o racismo aos vencedores. Mas a asa revolucionária do socialismo serve-se daqueles que, ainda nascidos em baixo, são por natureza e por vocação vencedores, e assim conduz à mesma ética.

Conselhos para o Ensino

Vou falar de questões que, independentemente do espaço e do tempo, sempre estiveram e sempre estarão relacionadas com a educação. Nesta tentativa não posso dizer que sou uma autoridade, particularmente tão inteligente e bem-intencionado como os homens que ao longo do tempo trataram dos problemas da educação e que certamente exprimiram repetidas vezes os seus pontos de vista acerca destas matérias. Com que base posso eu, um leigo no âmbito da pedagogia, arranjar coragem para exprimir opiniões sem qualquer fundamento, excepto a minha experiência pessoal e a minha convicção pessoal? Quando se trata de uma matéria científica, é fácil uma pessoa sentir-se tentada a ficar calada com base nestas considerações.
Contudo, tratando-se de assuntos respeitantes ao ser humano, é diferente. Neste caso, o conhecimento apenas da verdade não é suficiente; pelo contrário, este conhecimento deve ser continuamente renovado à custa de um esforço contínuo, sob pena de se perder. Lembra uma estátua de mármore no deserto que está continuamente em perigo de ser enterrada pela areia em movimento. As mãos de serviço têm de estar continuamente a trabalhar para que o mármore continue indefinidamente a brilhar ao sol. A este grupo de mãos também pertencem as minhas.
A escola sempre foi o mais importante meio de transferência da riqueza da tradição de uma geração para a seguinte.

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Testemunhas Aparentes

Não me preocupa tanto qual eu seja para outrem como me preocupa qual eu seja em mim mesmo. Quero ser rico por mim, não por empréstimo. Os estranhos vêem apenas os acontecimentos e as aparências externas; cada qual pode ter um ar alegre exteriormente e por dentro estar cheio de febre e receio. Eles não vêem o meu coração; vêem apenas o meu comportamento. Tem-se razão em depreciar a hipocrisia que existe na guerra; pois o que é mais fácil para um homem oportunista do que esquivar-se dos perigos e fazer-se de bravo, tendo o ânimo repleto de frouxidão? Há tantos meios de evitar as ocasiões de arriscar-se pessoalmente que teremos enganado o mundo mil vezes antes de encetarmos um passo perigoso; e mesmo então, vendo-nos entravados, nesse momento bem sabemos encobrir o nosso jogo com um ar alegre e uma palavra serena, embora a alma nos trema interiormente.
E se alguém pudesse usar o anel de Platão, que tornava invisível quem o levasse no dedo e o virasse para a palma da mão, muitas pessoas amiúde se esconderiam quando mais é preciso apresentar-se e se arrependeriam de estar colocadas num lugar tão honroso, no qual a necessidade as torna seguras: Quem pode alegrar-se com falsas honrarias e temer a calúnia,

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O Prazer é Abrir as Mãos

O prazer é abrir as mãos e deixar escorrer sem avareza o vazio-pleno que se estava encarniçadamente prendendo. E de súbito o sobressalto: ah, abri as mãos e o coração, e não estou perdendo nada! E o susto: acorde, pois há o perigo do coração estar livre!
Até que se percebe que nesse espraiar-se está o prazer muito perigoso de ser. Mas vem uma segurança estranha: sempre ter-se-á o que gastar. Não ter pois avareza com esse vazio-pleno: gastá-lo.

Somos Traídos pela Nossa Própria Percepção e Experiência

Vemos muito bem que as coisas não se alojam em nós com a sua forma e essência, e não penetram em nós pela sua própria força e autoridade; porque, se assim fosse, recebê-las-íamos do mesmo modo: o vinho seria o mesmo na boca do doente e na boca do homem são. Quem tem os dedos gretados, ou que os tem entorpecidos, encontraria na lança ou na espada que maneja uma rigidez semelhante à que o outro encontra. Os objetos externos rendem-se então à nossa mercê; alojam-se em nós como nos apraz. Ora, se da nossa parte recebêssemos alguma coisa sem alteração, se as faculdades humanas fossem bastante capazes e firmes para apreender a verdade pelos nossos próprios meios, esses meios sendo comuns a todos os homens, essa verdade se transmitiria de mão em mão de um para outro. E pelo menos se encontraria uma coisa no mundo, entre tantas que há, que seria acreditada pelos homens por um consenso universal. Mas o facto de não se ver proposição alguma que não seja debatida e controversa entre nós, ou que não o possa ser, mostra bem que o nosso julgamento natural não apreende muito claramente aquilo que apreende; pois o meu julgamento não pode fazer com que isso seja aceite pelo julgamento do meu companheiro,

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Conta Comigo Sempre

Conta comigo sempre. Desde a sílaba inicial até à última gota de sangue. Venho do silêncio incerto do poema e sou, umas vezes constelação e outras vezes árvore, tantas vezes equilíbrio, outras tantas tempestade. A nossa memória é um mistério, recordo-me de uma música maravilhosa que nunca ouvi, na qual consigo distinguir com clareza as flautas, os violinos, o oboé.
O sonho é, e será sempre e apenas, dos vivos, dos que mastigam o pão amadurecido da dúvida e a carne deslumbrada das pupilas. Estou entre vazios e plenitudes, encho as mãos com uma fragilidade que é um pássaro sábio e distraído que se aninha no coração e se alimenta de amor, esse amor acima do desejo, bem acima do sofrimento.
Conta comigo sempre. Piso as mesmas pedras que tu pisas, ergo-me da face da mesma moeda em que te reconheço, contigo quero festejar dias antigos e os dias que hão-de vir, contigo repartirei também a minha fome mas, e sobretudo, repartirei até o que é indivisível. Tu sabes onde estou.
Sabes como me chamo. Estarei presente quando já mais ninguém estiver contigo, quando chegar a hora decisiva e não encontrares mais esperança, quando a tua antiga coragem vacilar.

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O Homem Honroso

O homem honroso dá atenção especial a nove coisas. Dedica-se a ver bem o que olha, a ouvir bem o que escuta; cuida para ter uma aparência afável, para ter uma atitude deferente, para ser sincero nas suas palavras, para ser diligente nas suas acções; no meio das suas dúvidas, tem o cuidado de interrogar; quando está descontente, pensa nas consequências desastrosas da cólera; frente a um bem a obter, lembra-se da justiça.
(…) Buscar o bem, como se temêssemos não conseguir alcançá-lo; evitar o mal, como se tivéssemos enfiado a mão na água fervente; é um princípio que eu vi ser posto em prática e que aprendi. Viver isolado na busca do seu ideal, praticar a justiça, a fim de realizar a sua Via, é um princípio que aprendi, mas ainda não vi ninguém segui-lo.

Quando Chegar esse Momento

Meu querido, que és o meu querido. Tanto que eu esperei por isto, meu amor bendito. Tantas noites acordada a olhar para o tecto do quarto, a noite inteira a passar tão devagarinho e eu sempre a pensar: quando chegar esse momento, quando chegar esse momento. E agora, finalmente, finalmente. Em certos dias, eu até me parecia que… (passa a mão pelo rosto) Mas o que é que é preciso fazer, pensava eu. Se houvesse alguma coisa para fazer, eu tinha feito. Nem que fosse… Eu sei lá. Eu fiz tanta coisa, meu doce. E eu sempre a pensar: quando chegar esse momento, quando chegar esse momento. Eu até me parecia que… (passa a mão pelo rosto) Mas passou-se tudo. E agora, finalmente, finalmente. Dá cá um bocanço, meu santo amor. Dá cá o nosso primeiro bocanço de casados. Agora, podemos descansar, temos a vida toda à nossa frente.

(O tempo permanece suspenso e infinito.)

A Audácia é Má no Conselho e boa na Execução

A audácia é filha da ignorância e da rudeza, e muito inferior a todos os outros dons. Ela fascina, porém, atando-lhes os pés e as mãos, aos que são débeis de entendimento e falhos de coragem que formam a maioria; e prevalece até sobre os homens sábios nas horas da fraqueza. Por isso vemos que ela fez maravilhas nos Estados populares, menos do que nos governados por Senados ou por Príncipes; e muito mais ao primeiro arranco das pessoas audaciosas, do que depois, porque a audácia é má cumpridora de promessas.
(…) Certamente aos homens de grande entendimento, os audacciosos dão um espectáculo de muito gozo; e até mesmo para o vulgo, a audácia não deixa de ser ridícula. Porque se o absurdo é o fundamento do riso não duvideis de que uma grande audácia raramente existe sem absurdo.
(…) Deve ser bem considerado que a audácia é sempre cega, para não ver os perigos e as inconveniências. Por isso ela é má no conselho e boa na execução; para bem aproveitar e utilizar as pessoas audacciosas é preciso que elas nunca estejam na chefia do comando, mas em segundo lugar, sob a direcção de outros. Porque no conselho é bom ver os perigos,

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Os Livros Representam a Essência de um Espírito

As obras são a quintessência de um espírito: por conseguinte, mesmo se este for o espírito mais sublime, elas sempre serão, sem comparação, mais ricas de contúdo do que a sua companhia, e a substituirão também na essência – ou melhor, ultrapassá-la-ão em muito e a deixarão para trás: Até mesmo os escritos de uma cabeça medíocre podem ser instrutivos, dignos de leitura e divertidos, justamente porque são sua quintessência, o resultado, o fruto de todo o seu pensamento e estudo; enquanto a sua companhia não nos consegue satisfazer. Sendo assim, podem-se ler livros de pessoas em cujas companhias não se encontraria nenhum prazer, e é por essa razão que uma cultura intelectual elevada nos induz pouco a pouco a encontrar o nosso prazer quase exclusivamente na leitura dos livros, e não na conversa com as pessoas.
Não há maior refrigério para o espírito do que a leitura dos clássicos antigos: tão logo temos um deles nas mãos, e mesmo que seja por apenas meia hora, sentimo-nos imdediatamente refrescados, aliviados, purificados, elevados e fortalecidos; como se nos tivéssemos deleitado na fonte fresca de uma rocha. Tal facto depende das línguas antigas e da sua perfeição ou da grandeza dos espíritos,

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A Democracia como Círculo Vicioso Desonesto

Não estamos em condições de nos salvar a nós próprios, sobre isso não restam dúvidas. Falamos em democracia, mas ela é apenas a expressão política para um estado de espírito caracterizado pelo «Pode ser assim, mas também de outro modo». Vivemos na época do boletim de voto. Até votamos todos os anos no nosso ideal sexual, a rainha da beleza, e o facto de termos transformado a ciência no nosso ideal intelectual não significa mais do que pôr na mão dos chamados factos um boletim de voto, para que eles escolham por nós. Este tempo é antifilosófico e cobarde: não tem coragem para decidir o que tem ou não tem valor, e a democracia, reduzida à sua expressão mais simples, significa: Fazer aquilo que acontece! Diga-se de passagem que é um dos mais desonestos círculos viciosos que alguma vez existiu na história da nossa raça.