A Amizade e o Amor Segundo uma Lógica de Bazar
Desconfia-se do que é dado e pesa-se o que se recebe. A amizade e o amor parecem gerir-se, por vezes, segundo uma lógica de bazar. Já nem é considerado má-educação perguntar quanto é que uma prenda custou. Se esse preço é excessivo chega-se a dizer que não se pode aceitar. Recusar uma dádiva é como chamar interesseiro ao dador. É desconfiar que existe uma segunda intenção. De qualquer forma, só quem tem medo (ou corre o risco) de se vender pode pensar que alguém está a tentar comprá-lo. Quem dá de bom coração merece ser aceite de bom coração. A essência sentimental da dádiva é ultrajada pela frieza da avaliação.
A mania da equitatividade contamina os espíritos justos. É o caso das pessoas que, não desconfiando de uma dádiva, recusam-se a aceitar uma prenda que, pelo seu valor, não sejam capazes de retribuir. Esta atitude, apesar de ser nobre, acaba por ser igualmente destrutiva, pois supõe que existe, ou poderá vir a existir, uma expectativa de retribuição da parte de quem dá. Mas quem dá não dá para ser pago. Dá para ser recebido. Não dá como quem faz um depósito ou investimento. O valor de uma prenda não está na prenda –
Passagens sobre Amizade
554 resultadosSe a todos fosse dado o poder mágico de ler nos pensamentos dos outros, suponho que o primeiro resultado seria o desaparecimento de toda a amizade.
Amizade renovada é como sopa requentada.
O negócio pode trazer dinheiro, mas a amizade raramente o faz.
A (Má-)Emoção Controlada Pela Razão
Há a ideia de que quando se concede à razão inteira liberdade ela destrói todas as emoções profundas. Esta opinião parece-me devida a uma concepção inteiramente errada da função da razão na vida humana. Não é objectivo da razão gerar emoções, embora possa ser parte da sua função descobrir os meios de impedir que tais emoções sejam um obstáculo ao bem-estar. Descobrir os meios de dminuir o ódio e a inveja é sem dúvida parte da função da psicologia racional. Mas é um erro supor que diminuindo essas paixões, diminuiremos ao mesmo tempo a intensidade das paixões que a razão não condena.
No amor apaixonado, na afeição dos pais, na amizade, na benevolência, na devoção às ciências ou às artes, nada há que a razão deseje diminuir. O homem racional, quando sente essas emoções, ficará contente por as sentir e nada deve fazer para diminuir a sua intensidade, pois todas elas fazem parte da verdadeira vida, isto é, da vida cujo objectivo é a felicidade, a própria e a dos outros. Nada há de irracional nas paixões como paixões e muitas pessoas irracionais sentem sómente as paixões mais triviais. Ninguém deve recear que ao optar pela razão torne triste a vida.
O maior esforço da amizade não consiste em confessarmos os nossos defeitos a um amigo, mas em fazê-lo ver os seus.
Poucas amizades subsistiriam se cada um soubesse aquilo que o amigo diz de si nas suas costas.
Os laços de amizade são mais estreitos dos que os de sangue e da família.
Com a intimidade, com o amor, com a sua abertura a muita gente, fica mais rico. E se puder viver em amor profundo, em amizade profunda, em intimidade profunda com muitas pessoas, terá vivido de maneira acertada e, onde quer que por acaso esteja, aprendeu a arte e também aí viverá, felizmente.
Companheirismo A verdadeira amizade é aquela que nos permite falar ao outro todos os seus defeitos e suas qualidades.
Amizades são inexplicáveis e não devem ser explicadas, se não se deseja destruí-las.
Um Amigo se faz rapidamente; já a amizade é um fruto que amadurece lentamente.
Cantar do Amigo Perfeito
Passado o mar, passado o mundo, em longes praias,
de areia e ténues vagas, como esta
em que haverá de nossos passos a memória
embora soterrada pela areia nova,
e em que sobre as muralhas quanta sombra
na pedra carcomida guarda que passámos,
em longes praias, outras nuvens, outras vozes,
ainda recordas esta, ó meu amigo?Aqui passeámos tanta vez, por entre os corpos
da alheia juventude, impudica ou severa,
esplêndida ou sem graça, à venda ou pronta a dar-se,
ido na brisa o sol às mais sombrias curvas;
e o meu e o teu olhar guiando-se leais,
de nós um para o outro conquistando
– em longes praias, outras nuvens, outras vozes,
ainda recordas, diz, ó meu amigo?Também aqui relembro as ruas tenebrosas,
de vulto em vulto percorridas, lado a lado,
numa nudez sem espírito, confiança
tranquila e áspera, animal e tácita,
já menos que amizade, mas diversa
da suspeição do amor, tão cauta e delicada
– em longes praias, outras nuvens, outras vozes,
ainda as recordas, diz, ó meu amigo?Também aqui,
E toma cuidado, pois, se não conservares essas amizades, será bem difícil conquistares outras semelhantes no futuro; amizades, quero dizer, fora da classe à qual pertences: e assim viverás numa única classe, e o homem que frequenta uma única classe social é como o estudioso que lê apenas um livro.
A sensação da amizade é semelhante à de se estar confortavelmente cheio de rosbife; o amor, é como estar alegrado pelo champanhe.
Nós nascemos sozinhos, vivemos sozinhos e morremos sozinhos. Somente através do amor e das amizades é que podemos criar a ilusão, durante um momento, de que não estamos sozinhos.
Suportem-se então os prazeres do amor e da amizade. O principal deles é o de se ter alguém à mão para exercitar a nossa vocação sadomasoquista.
Quem teima em dizer verdades, perde amizades.
Que encantamento fazer amizade com alguém que você desprezava.
Quem me dera, ao menos uma vez, ter de volta todo o ouro que entreguei a quem conseguiu me convencer que era prova de amizade se alguém levasse embora até o que eu não tinha.