Passagens sobre Casas

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Afinal de contas, talvez eu próprio estivesse, naquela época, a representar esse papel de amante, esse papel de vício revivificador. Mais do que a representar um papel, aliás: a personificar de facto um milagre na vida de alguém, salvando-lhe o casamento, oferecendo-lhe a oportunidade de proteger-se dos filhos durante uma noite ocasional, dando-lhe pelo menos uma de dezoito irrebatíveis razões para fugir de casa, ainda que por instantes apenas.

Caminho Monótono

E por que hei de negar?…Ah! o encanto da estrada
abrindo em cada curva um leque de paisagem,
e o mistério da casa escondida e encantada
que mora sob a sombra amiga da folhagem

E por que hei de negar? Se isso é a vida passada;
se o fastio espantou o encanto da miragem
Hoje – o olhar distraído, e a alma já cansada
repetem todo dia e sempre a mesma viagem

E por que hei de negar? Ah! Aquelas ânsias loucas
dos beijos que cantavam sempre em nossas bocas
e das mãos, não sabendo nunca onde pousar…

Hoje… por mais que venhas, sempre estou sozinho…
E por que hei de negar? Se teu corpo é um caminho
onde de olhos fechados posso caminhar?…

As culpas da casa alheia todos as acreditamos; as da própria poucos as vêem pouco, porque têm nos olhos todas as vigas dos tectos.

Louvor do Aprender

Aprende o mais simples! Pra aqueles
Cujo tempo chegou
Nunca é tarde de mais!
Aprende o abc, não chega, mas
Aprende-o!   E não te enfades!
Começa! Tens de saber tudo!
Tens de tomar a chefia!

Aprende, homem do asilo!
Aprende, homem na prisão!
Aprende, mulher na cozinha!
Aprende, sexagenária!
Tens de tomar a chefia!

Frequenta a escola, homem sem casa!
Arranja saber, homem com frio!
Faminto, pega no livro: é uma arma.
Tens de tomar a chefia.

Não te acanhes de perguntar, companheiro!
Não deixes que te metam patranhas na cabeça:
Vê c’os teus próprios olhos!
O que tu mesmo não sabes
Não o sabes.
Verifica a conta:
És tu que a pagas.
Põe o dedo em cada parcela,
Pergunta: Como aparece isto aqui?
Tens de tomar a chefia.

Tradução de Paulo Quintela

A Casa do Homem

Imagine uma pessoa que não tem lugar. Anda perdido, desorientado. E imagine outra pessoa que é filho de família, tem os pais, os irmãos, a casa. A casa é muito importante. Vai sempre seguro de si porque tem um sítio de acolhimento se as coisas lhe falharem. Digamos a casa, digamos o lugar, digamos o sítio. Tal como o Ulisses volta a casa. Ele quer voltar ao recolhimento, à segurança, ao aconchego. O aconchego do ventre da mãe. A casa do homem é o ventre da mãe. Onde ele está e não precisa de fazer nada, tem tudo. E é feliz. E quando o Ulisses vem moribundo e fala na morte, surge a ideia de túnel que é o nascimento do feto, uma reminiscência. Por exemplo, o filme falado termina com o comandante que vê a casa a destruir-se, porque a casa dele é o navio. Mas há o lado ético: o capitão deve ser o último a deixar o barco, e ele tem um passageiro e não pode ir lá substitui-lo. Este é o grande drama. Ele vê arruinar todo o sistema, toda a sua vida, que está concentrada na sua casa. É essa a tragédia que o mundo sofre agora.

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Mas se eu tivesse ficado em casa, eu seria hoje um chefe respeitado, sabia? E teria uma grande barriga, e muitas vacas e ovelhas.

A Casa

É um chalé com alpendre,
forrado de hera.
Na sala,
tem uma gravura de Natal com neve.
Não tem lugar pra esta casa em ruas que se conhecem.
Mas afirmo que tem janelas,
claridade de lâmpada atravessando o vidro,
um noivo que ronda a casa
— esta que parece sombria —
e uma noiva lá dentro que sou eu.
É uma casa de esquina, indestrutível.
Moro nela quando lembro,
quando quero acendo o fogo,
as torneiras jorram,
eu fico esperando o noivo, na minha casa aquecida.
Não fica em bairro esta casa
infensa à demolição.
Fica num modo tristonho de certos entardeceres,
quando o que um corpo deseja é outro corpo pra escavar.
Uma ideia de exílio e túnel.

Nunca imaginei que o amor ao próximo e a agressividade morassem na mesma casa. Nunca pensei que a paz e a guerra habitavam no mesmo ser humano.

Polidez é Inteligência

A polidez é uma convenção tácita para ignorarmos a mísera condição moral e intelectual do ser humano e assim evitarmos acusá-la mutuamente; desse modo, ela vem menos a lume, para proveito de todos. Polidez é inteligência; consequentemente, impolidez é parvoíce. Criar inimigos por impolidez, de maneira desnecessária e caprichosa, é tão demente quanto pegar fogo à própria casa. Pois a polidez, como as fichas de jogo, é notoriamente uma moeda falsa: economizá-la é prova de insensatez. Pelo contrário, gastá-la em profusão é prova de sensatez. Todas as nações concluem as suas cartas com «seu mui obediente servidor». Só os alemães suprimem o «servidor» porque, segundo dizem, não é verdadeiro! Quem, pelo contrário, leva a polidez até ao sacrifício dos interesses reais, assemelha-se àquele que, em lugar das fichas de jogo, desse autênticas moedas de ouro. Do mesmo modo que a cera, dura e quebradiça, torna-se maleável com um pouco de calor, assumindo qualquer forma desejada, também se pode, com alguma polidez e amabilidade, tornar flexíveis e dóceis os homens recalcitrantes e hostis. A polidez, portanto, é para o homem o que o calor é para a cera.

Meu Camarada e Amigo

Revejo tudo e redigo
meu camarada e amigo.
Meu irmão suando pão
sem casa mas com razão.
Revejo e redigo
meu camarada e amigo

As canções que trago prenhas
de ternura pelos outros
saem das minhas entranhas
como um rebanho de potros.
Tudo vai roendo a erva
daninha que me entrelaça:
canção não pode ser serva
homem não pode ser caça
e a poesia tem de ser
como um cavalo que passa.

É por dentro desta selva
desta raiva   deste grito
desta toada que vem
dos pulmões do infinito
que em todos vejo ninguém
revejo tudo e redigo:
Meu camarada e amigo.

Sei bem as mós que moendo
pouco a pouco trituraram
os ossos que estão doendo
àqueles que não falaram.

Calculo até os moinhos
puxados a ódio e sal
que a par dos monstros marinhos
vão movendo Portugal
— mas um poeta só fala
por sofrimento total!

Por isso calo e sobejo
eu que só tenho o que fiz
dando tudo mas à toa:
Amigos no Alentejo
alguns que estão em Paris
muitos que são de Lisboa.

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Quem disse que eu me mudei? Não importa que a tenham demolido: A gente continua morando na velha casa em que nasceu.

Cantiga do Campo

Por que andas tu mal commigo?
Ó minha doce trigueira?
Quem me dera ser o trigo
Que, andando, pisas na eira!

Quando entre as mais raparigas
Vaes cantando entre as searas,
Eu choro ao ouvir-te as cantigas
Que cantas nas noutes claras!

Os que andam na descamisa
Gabam a violla tua,
Que, ás vezes, ouço na brisa
Pelos serenos da lua.

E fallam com tristes vozes
Do teu amor singular
Áquella casa onde cozes,
Com varanda para o mar.

Por isso nada me medra,
Ando curvado e sombrio!
Quem me dera ser a pedra
Em que tu lavas no rio!

E andar comtigo, ó meu pomo,
Exposto ás chuvas e aos soes!
E uma noute morrer como
Se morrem os rouxinoes!

Morrer chorando, n’um choro
Que mais as magoas consolla,
Levando só o thesouro
Da nossa triste violla!

Por que andas tu mal commigo?
Ó minha doce trigueira?
Quem me dera ser o trigo
Que, andando, pisas na eira!

– Vamos descobrir um tesouro naquela casa? – Mas não há nenhuma casa… – Então vamos construí-la !

Não há Nada que Resista ao Tempo

Não há nada que resista ao tempo. Como uma grande duna que se vai formando grão a grão, o esquecimento cobre tudo. Ainda há dias pensava nisto a propósito de não sei que afecto. Nisto de duas pessoas julgarem que se amam tresloucadamente, de não terem mutuamente no corpo e no pensamento senão a imagem do outro, e daí a meia dúzia de anos não se lembrarem sequer de que tal amor existiu, cruzarem-se numa rua sem qualquer estremecimento, como dois desconhecidos.
Essa certeza, hoje então, radicou-se ainda mais em mim.
Fui ver a casa onde passei um dos anos cruciais da minha vida de menino. E nem as portas, nem as janelas, nem o panorama em frente me disseram nada. Tinha cá dentro, é certo, uma nebulosa sentimental de tudo aquilo. Mas o concreto, o real, o número de degraus da escada, a cara da senhoria, a significação terrena de tudo aquilo, desaparecera.

Feche a porta, mude o disco, limpe a casa, sacuda a poeira. Afinal se coisas boas se vão é para que coisas melhores possam vir. Esqueça o passado, desapego é o segredo!