Recordam-se Vocês do Bom Tempo d’Outrora
(Dedicatória de introdução a «A Musa em Férias»)
Recordam-se vocês do bom tempo d’outrora,
Dum tempo que passou e que não volta mais,
Quando íamos a rir pela existência fora
Alegres como em Junho os bandos dos pardais?
C’roava-nos a fronte um diadema d’aurora,
E o nosso coração vestido de esplendor
Era um divino Abril radiante, onde as abelhas
Vinham sugar o mel na balsâmina em flor.
Que doiradas canções nossas bocas vermelhas
Não lançaram então perdidas pelo ar!…
Mil quimeras de glória e mil sonhos dispersos,
Canções feitas sem versos,
E que nós nunca mais havemos de cantar!
Nunca mais! nunca mais! Os sonhos e as esp’ranças
São áureos colibris das regiões da alvorada,
Que buscam para ninho os peitos das crianças.
E quando a neve cai já sobre a nossa estrada,
E quando o Inverno chega à nossa alma,então
Os pobres colibris, coitados, sentem frio,
E deixam-nos a nós o coração vazio,
Para fazer o ninho em outro coração.
Meus amigos, a vida é um Sol que chega ao cúmulo
Quando cantam em nós essas canções celestes;
Passagens sobre Coração
2137 resultadosUm Silêncio Cauto e Prudente é o Cofre da Sensatez
– (…) Vós quereis tentar a sorte na grande cidade, e sabeis bem que é lá que deveis gastar essa aura de valentia que a longa inacção dentro destas muralhas vos houver concedido. Procurareis também a fortuna, e devereis ser hábil a obtê-la. Se aqui aprendeste a escapar à bala de um mosquete, lá deveis aprender a saber escapar à inveja, ao ciúme, à rapacidade, batendo-vos com armas iguais com os vossos adversários, ou seja, com todos. E portanto escutai-me. Há meia hora que me interrompeis dizendo o que pensais, e com o ar de interrogar quereis mostrar-me que me engano. Nunca mais o façais, especialmente com os poderosos. Às vezes a confiança na vossa argúcia e o sentimento de dever testemunhar a verdade poderiam impelir-vos a dar um bom conselho a quem é mais do que vós. Nunca o façais. Toda a vitória produz ódio no vencido, e se se obtiver sobre o nosso próprio senhor, ou é estúpida ou é prejudicial. Os príncipes desejam ser ajudados mas não superados.
Mas sede prudente também com os vossos iguais. Não humilheis com as vossas virtudes. Nunca falei de vós mesmos: ou vos gabaríeis, que é vaidade, ou vos vituperaríeis,
O Que Eu Sou
Nocturna e dubia luz
Meu sêr esboça e tudo quanto existe…
Sou, num alto de monte, negra cruz,
Onde bate o luar em noite triste…Sou o espirito triste que murmura
Neste silencio lúgubre das Cousas…
Eu é que sou o Espectro, a Sombra escura
De falecidas formas mentirosas.E tu, Sombra infantil do meu Amôr,
És o Sêr vivo, o Sêr Espiritual,
A Presença radiosa…
Eu sou a Dôr,
Sou a tragica Ausencia glacial…Pois tu vives, em mim, a vida nova,
E eu já não vivo em ti…
Mas quem morreu?
Fôste tu que baixaste á fria cova?
Oh, não! Fui eu! Fui eu!Horrivel cataclismo e negra sorte!
Tu fôste um mundo ideal que se desfez
E onde sonhei viver apoz a morte!
Vendo teus lindos olhos, quanta vez,
Dizia para mim: eis o logar
Da minha espiritual, futura imagem…
E viverei á luz daquele olhar,
Divino sol de mistica Paisagem.Era minha ambição primordial
Legar-lhe a minha imagem de saudade;
Mas um vento cruel de temporal,
O coração tem razões que a razão não conhece.
O coração do homem de Estado deve estar na cabeça.
O rosto enganador deve ocultar o que o falso coração sabe.
Piedade
O coração de todo o ser humano
Foi concebido para ter piedade,
Para olhar e sentir com caridade
Ficar mais doce o eterno desengano.Para da vida em cada rude oceano
Arrojar, através da imensidade,
Tábuas de salvação, de suavidade,
De consolo e de afeto soberano.Sim! Que não ter um coração profundo
É os olhos fechar à dor do mundo,
ficar inútil nos amargos trilhos.É como se o meu ser campadecido
Não tivesse um soluço comovido
Para sentir e para amar meus filhos!
Quando encontrar alguém e esse alguém fizer seu coração parar de funcionar por alguns segundos, preste atenção: pode ser a pessoa mais importante da sua vida.
As mãos não são nada sem o coração.
Estamos convencidos de que os grandes escritores colocaram a sua própria história nas suas obras. Pinta-se bem apenas o próprio coração, atribuindo-o a um outro.
O lar é onde o coração do homem cria raízes.
Meu Coração eu Perdi-o
Meu coração eu perdi-o,
Não era meu entreguei-o
Às tristes águas do rio,
Para o levar ao teu seio.E o rio que ao longe chora,
Foi-to levar a correr,
E por mais que eu faça, agora,
Já não o sinto bater.Meu coração descontente,
Meu coração sofredor,
Lancei-o à água corrente,
Para o levar ao meu amor.E o meu amor que sorria,
Como uma rosa em botão,
Chora desde aquele dia,
Em que viu o meu coração.
A brandura pesca corações, inda que seja com mentiras.
No fundo do nosso coração, bem mais fundo do que a morte em nós, está Deus.
Subjuga com cordas os cornos dos bois, e com benefícios o coração dos homens.
O Beijo
Congresso de gaivotas neste céu
Como uma tampa azul cobrindo o Tejo.
Querela de aves, pios, escarcéu.
Ainda palpitante voa um beijo.Donde teria vindo! (Não é meu…)
De algum quarto perdido no desejo?
De algum jovem amor que recebeu
Mandado de captura ou de despejo?É uma ave estranha: colorida,
Vai batendo como a própria vida,
Um coração vermelho pelo ar.E é a força sem fim de duas bocas,
De duas bocas que se juntam, loucas!
De inveja as gaivotas a gritar…
Por detrás da máscara de gelo que as pessoas usam, existe um coração de fogo.
Hino à Alegria
Tenho-a visto passar, cantando, à minha porta,
E às vezes, bruscamente, invadir o meu lar,
Sentar-se à minha mesa, e a sorrir, meia morta,
Deitar-se no meu leito e o meu sono embalar.Tumultuosa, nos seus caprichos desenvoltos,
Quase meiga, apesar do seu riso constante,
De olhos a arder, lábios em flor, cabelos soltos,
A um tempo é cortesã, deusa ingénua ou bacante…Quando ela passa, a luz dos seus olhos deslumbra;
Tem como o Sol de Inverno um brilho encantador;
Mas o brilho é fugaz, — cintila na penumbra,
Sem que dele irradie um facho criador.Quando menos se espera, irrompe de improviso;
Mas foge-nos também com uma presteza igual;
E dela apenas fica um pálido sorriso
Traduzindo o desdém duma ilusão banal.Onda mansa que só à superfície corre,
Toda a alegria é vã; só a Dor é fecunda!
A Dor é a Inspiração, louro que nunca morre,
Se em nós crava a raiz exaustiva e profunda!No entanto, eu te saúdo e louvo, hora dourada,
Em que a Alegria vem extinguir,
Súplica
Se tudo foge e tudo desaparece,
Se tudo cai ao vento da Desgraça,
Se a vida é o sopro que nos lábios passa
Gelando o ardor da derradeira prece;Se o sonho chora e geme e desfalece
Dentro do coração que o amor enlaça,
Se a rosa murcha inda em botão, e a graça
Da moça foge quando a idade cresce;Se Deus transforma em sua lei tão pura
A dor das almas que o ideal tortura
Na demência feliz de pobres loucos…Se a água do rio para o oceano corre,
Se tudo cai, Senhor! por que não morre
A dor sem fim que me devora aos poucos?
Melhor do que ter uma grande beleza, é ter um grande coração.