Passagens sobre Evidência

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Frases sobre evidência, poemas sobre evidência e outras passagens sobre evidência para ler e compartilhar. Leia as melhores citações em Poetris.

A Celebridade é um Plebeísmo

Às vezes, quando penso nos homens célebres, sinto por eles toda a tristeza da celebridade.
A celebridade é um plebeísmo. Por isso deve ferir uma alma delicada. É um plebeísmo porque estar em evidência, ser olhado por todos inflige a uma criatura delicada uma sensação de parentesco exterior com as criaturas que armam escândalo nas ruas, que gesticulam e falam alto nas praças. O homem que se torna célebre fica sem vida íntima: tornam-se de vidro as paredes da sua vida doméstica; é sempre como se fosse excessivo o seu traje; e aquelas suas mínimas acções – ridiculamente humanas às vezes – que ele quereria invisíveis, coa-as a lente da celebridade para espectaculosas pequenezes, com cuja evidência a sua alma se estraga ou se enfastia. É preciso ser muito grosseiro para se poder ser célebre à vontade.
Depois, além dum plebeísmo, a celebridade é uma contradição. Parecendo que dá valor e força às criaturas, apenas as desvaloriza e as enfraquece. Um homem de génio desconhecido pode gozar a volúpia suave do contraste entre a sua obscuridade e o seu génio; e pode, pensando que seria célebre se quisesse, medir o seu valor com a sua melhor medida, que é ele próprio.

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Só o Homem Sabe que é Mortal

A única certeza da vida é a morte. E é a certeza em que menos se acredita. Toda a história do mundo assentou sempre na ignorância de que se é mortal. Aqueles mesmo que o sabem não o vêem — a não ser em instantes de excepção. Que seria o mundo com essa evidência sempre presente? Só o homem sabe que é mortal. Mas raramente o homem sobe até si. O animal pesa nele, mesmo no que não é do animal. Assim a arte, a cultura, poucas vezes funcionam como o que é para o espírito, sendo para o que é da nossa grosseria.

Em nossos raciocínios a respeito dos fatos, existem todos os graus imagináveis de certeza. Um homem sábio, portanto, ajusta sua crença à evidência.

A inteligência sabe por em evidência verdades gerais e eternas. A sensibilidade cria verdades particulares e momentâneas.

De que Serve Discutir as Ideologias?

Para compreendermos o homem e as suas necessidades, para o conhecermos naquilo que ele tem de essencial, não precisamos de pôr em confronto as evidências das nossas verdades. Sim, têm razão. Têm todos razão. A lógica demonstra tudo. Tem razão aquele que rejeita que todas as desgraças do mundo recaiam sobre os corcundas. Se declararmos guerra aos corcundas, aprenderemos rapidamente a exaltar-nos. Vingaremos os crimes dos corcundas. E, sem dúvida, também os corcundas cometem crimes.
A fim de tentarmos separar este essencial, é necessário esquecermos por um instante as divisões que, uma vez admitidas, implicam todo um Corão de verdades inabaláveis e o inerente fanatismo. Podemos classificar os homens em homens de direita e em homens de esquerda, em corcundas e não corcundas, em fascistas e em democratas, e estas distinções são incontestáveis.
Mas sabem que a verdade é aquilo que simplifica o mundo, e não aquilo que cria o caos. A verdade é a linguagem que desencadeia o universal.
Newton não «descobriu» uma lei há muito disfarçada de solução de enigma, Newton efectuou uma operação criativa. Instituiu uma linguagem de homem capaz de exprimir simultaneamente a queda da maçã num prado ou a ascensão do sol.

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Se o Queres Partilhar Fica Comigo

O dia estava pronto
mas secreto
embora a claridade o denunciasse
uma denúncia tímida pendente
de uma neutralidade pensativa
os eflúvios ligeiros se cruzavam
tentando revelar a flor de outubro
a sedentária sombra aniquilada
tremia e a lembrança dos teus olhos
se desenhava em soma de silêncio
sobre teu rosto de medalha antiga
eu vinha de cuidados iminentes
buscando te integrar numa elegia
uma elegia simples posta à margem
da solidão metálica da vida
queria a precisão poligeométrica
antecipando o ritmo em teus passos
queria te alcançar antes que a luz
pudesse deflagrar as evidências
sabendo que a evidência era mentira
e te queria plena nos meus braços
sentia esse cuidado que os enfermos
escondem na carência de seus gestos
escondem? não sei bem talvez excluam
por um acto de amor irremediável
eu sou dos que vasados se acumulam
para reconquistar sem se perder
mas aqui ninguém pára
o fruto é suave
se o queres partilhar fica comigo

Não há nada que seja maior evidência de insanidade do que fazer a mesma coisa dia após dia e esperar resultados diferentes.

Só posso rezar ao que não conheço. E só posso amar à evidência desconhecida das coisas, e só posso me agregar ao que desconheço. Só esta é que é uma entrega real.

As Novas Verdades

Nenhuma verdade nova, e completamente estranha às opiniões correntes, quando demonstrada pelo primeiro que dela se apercebeu, ainda que com uma evidência e uma exactidão idênticas ou semelhantes às da geometria, conseguiu nunca, se as demonstrações não foram de natureza material, introduzir-se e fixar-se no mundo imediatamente, mas só com o decorrer do tempo, através da prática e do exemplo: habituando-se os homens a acreditar nela como em qualquer outra coisa; ou melhor, acreditando geralmente por habituação e não pela exactidão de experiências concebidas no seu espírito.
Até que por fim essa verdade, começando a ser ensinada às crianças, é comummente aceite, evocado com espanto o seu desconhecimento, e escarnecidas as opiniões diferentes, tanto dos antepassados como dos contemporâneos. E isto com tanto mais dificuldade e demora quanto maiores e mais importantes foram essas novas e incríveis verdades, e, por conseguinte, subversoras de um maior número de opiniões radicadas nos espíritos. Nem mesmo os intelectos perspicazes e treinados sentem facilmente toda a eficiência das razões que demonstram essas verdades ianuditas e que excedem em muito os limites dos conhecimentos e dos hábitos desses intelectos, principalmente quando essas razões e essas verdades se opõem às crenças neles arreigadas.

A Entrega Real

Enfim, enfim quebrara-se realmente o meu invólucro, e sem limite eu era. Por não ser, era. Até ao fim daquilo que eu não era, eu era. O que não sou eu, eu sou. Tudo estará em mim, se eu não for; pois ‘eu’ é apenas um dos espasmos instantâneos do mundo.
Minha vida não tem sentido apenas humano, é muito maior – é tão maior que, em relação ao humano, não tem sentido. Da organização geral que era maior que eu, eu só havia até então percebido os fragmentos. Mas agora, eu era muito menos que humana – e só realizaria o meu destino especificamente humano se me entregasse, como estava me entregando, ao que já não era eu, ao que já é inumano.
E entregando-me com a confiança de pertencer ao desconhecido. Pois só posso rezar ao que não conheço. E só posso amar à evidência desconhecida das coisas, e só me posso agregar ao que desconheço. Só esta é que é uma entrega real.

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O Medo do Fim

Alguns pensam que a felicidade é a ausência de sofrimento… mas, na verdade, está errada essa ideia. A felicidade e o sofrimento são ambos pilares fundamentais da existência. Sem sofrimento a nossa humanidade não seria provada e os nossos dias não teriam valor. Assim também a felicidade, sendo a alegria mais profunda, é o que dá sentido a todas as noites… não são realidades que se possam medir, mas não deixam de ser algo tão concreto como as nossas duas mãos, que sempre trabalham em conjunto, sabendo cada uma o seu papel e o seu valor.

Evitar a dor não nos torna mais fortes.

Tememos as perdas. Tememos a morte. Talvez porque o nada é um abismo que assusta todos quantos têm uma vida com valor. Porque somos impelidos a defender o significado do que erguemos aqui. Não se quer aceitar que tudo quanto se construiu, durante uma vida, seja suprimido sem deixar rasto. Quantas vezes não é o momento do fim que se teme, mas antes o que se pode fazer até lá?
Caminhar rumo ao desconhecido é uma prova de coragem e de fé diante das evidências deste mundo. Os olhos não querem ver nem as pernas caminhar,

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O Poder da Indústria Cultural

O poder magnético que sobre os homens exercem as ideologias, embora já se lhes tenham tornado decrépitas, explica-se, para lá da psicologia, pelo derrube objectivamente determinado da evidência lógica como tal. Chegou-se ao ponto em que a mentira soa como verdade, e a verdade como mentira. Cada expressão, cada notícia e cada pensamento estão preformados pelos centros da indústria cultural. O que não traz o vestígio familiar de tal preformação é, de antemão, indigno de crédito, e tanto mais quanto as instituições da opinião pública acompanham o que delas sai com mil dados factuais e com todas as provas de que a manipulação total pode dispor. A verdade que intenta opor-se não tem apenas o carácter de inverosímil, mas é, além disso, demasiado pobre para entrar em concorrência com o altamente concentrado aparelho da difusão.

Caridade Hipócrita

Nos últimos tempos, preocupava-o sobretudo as misérias das classes – por sentir que nestas democracias industriais e materialistas, furiosamente empenhadas na luta pelo pão egoísta, as almas cada dia se tornavam mais secas e menos capazes de piedade.
«A Fraternidade (dizia ele numa carta de 1886, que conservo) vai-se sumindo, principalmente nestas vastas colmeias de cal e pedra onde os homens teimam em se amontoar e lutar; e, através do constante deperecimento dos costumes e das simplicidades rurais, o Mundo vai rolando a um egoísmo feroz. A primeira evidência deste egoísmo é o desenvolvimento ruidoso da filantropia. Desde que a caridade se organiza e se consolida em instituição, com regulamentos, relatórios, comités, sessões, um presidente e uma campainha, e do sentimento natural passa a função oficial – é porque o homem, não contando já com os impulsos do seu coração, necessita obrigar-se publicamente ao bem pelas prescrições dum estatuto.Com os corações assim duros e os Invernos tão longos, que vai ser dos pobres?…»

A Génese de um Poema

A maior parte dos escritores, sobretudo os poetas, preferem deixar supor que compõem numa espécie de esplêndido frenesim, de extática intuição; literalmente, gelar-se-iam de terror à ideia de permitir ao público que desse uma espreitadela por detrás da cena para ver os laboriosos e incertos partos do pensamento, os verdadeiros planos compreendidos só no último minuto, os inúmeros balbucios de ideias que não alcançaram a maturidade da plena luz, as imaginações plenamente amadurecidas e, no entanto, rejeitadas pelo desespero de as levar a cabo, as opções e as rejeições longamente ponderadas, as tão difíceis emendas e acrescentas, numa palavra, as rodas e as empenas, as máquinas para mudança de cenário, as escadas e os alçapões, o vermelhão e os postiços que em 99% dos casos constituem os acessórios do histrião literário.
(…) No que a mim diz respeito, não compartilho da repugnância de que falei e nunca senti a mínima dificuldade em rememorar a marcha progressiva de todas as minhas obras. Escolho O Corvo por ser a mais conhecida. Proponho-me demonstrar claramente que nenhum pormenor da sua composição se pode explicar pelo acaso ou pela intuição, que a obra se desenvolveu, a par e passo, até à sua conclusão com a precisão e o rigor lógico de um problema matemático.

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O Que é Escrever?

Escrever é isto: comover para desconvocar a angústia e aligeirar o medo, que é sempre experimentado nos povos como uma infusão de laboratório, cada vez mais sofisticada. Eu penso que o escritor com maior sucesso (não de livraria, mas de indignação social profunda) é aquele que protege os homens do medo: por audácia, delírio, fantasia, piedade ou desfiguração. Mas porque a poética precisão de dum acto humano não corresponde totalmente à sua evidência. Ama-se a palavra, usa-se a escrita, despertam-se as coisas do silêncio em que foram criadas. Depois de tudo, escrever é um pouco corrigir a fortuna, que é cega, com um júbilo da Natureza, que é precavida.

Não é Preciso

Não é preciso que a realidade exista
para acreditarmos nela. Na verdade,
se não existir tudo é mais luminoso.
Mundo, evidência submissa e soberana.

É muito mais fácil desenvolver um Eu com “defeitos” estruturais: radical, extremista, automatizado, fóbico, obsessivo, tímido, inseguro, omisso, dissimulador, intolerante, impulsivo, ansioso, hipersensível, insensível, controlador, punitivo, autopunitivo, com uma necessidade neurótica de poder, de evidência social, de estar sempre certo. Quem não tem alguns destes defeitos, ainda que minimamente? Que psiquiatra, psicólogo, médico não tem avarias no seu arcabouço psíquico? O problema não é tê-las, mas reconhecê-las. A questão não é só reconhecê-las, mas saber o que fazer com elas.

O Que Procuro na Literatura

Que é que eu procuro na literatura? Que é que me arrasta para este combate interminável e sempre votado ao fracasso? Como é imbecil pensar-se que se escreve para se «ter nome» e as vantagens que nisso vêm. Espera-se decerto sempre fazer melhor, mas só porque sempre se falhou. Assim se sabe também que se vai falhar de novo. Não se escreve para ninguém, o problema decide-se apenas entre nós e nós. Mas há um lugar inatingível e cada nova tentativa é uma tentativa para o alcançar.
O desejo que nos anima é o de fixar, segurar pela palavra o que entrevemos e se nos furta. Julgamos às vezes que o atingimos, mas logo se sabe que não. Miragem perene de uma presença luminosa, de um absoluto de estarmos inundados dessa evidência, encantamento que nos deslumbra no instante e nesse instante se dissolve.
O que me arrasta nesta luta sem fim é o aceno de uma plenitude de ser, a integração perfeita do que sou no milagre que me entreluz, a transfiguração de mim e do mundo no que fulgura e vai morrer.
Recaído de cada vez no mais baixo, na grossa naturalidade de que sou feito,

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