Estamos enterrados em convenções até ao pescoço: usamos as mesmas palavras, fazemos os mesmos gestos. A poeira entranhada sufoca-nos. Pega-se. Adere. Há dias em que não distingo estes seres da minha própria alma; há dias em que através das máscaras vejo outras fisionomias, e, sob a impassibilidade, dor; há dias em que o céu e o inferno esperam e desesperam. Pressinto uma vida oculta, a questão é fazê-la vir à supuração.
Passagens sobre Inferno
250 resultadosVĂtima Do Dualismo
Ser miserável dentre os miseráveis
– Carrego em minhas cĂ©lulas sombrias
Antagonismos irreconciliáveis
E as mais opostas idiosincrasias!Muito mais cedo do que o imagináveis
Eis-vos, minha alma, enfim, dada Ă s bravias
Cóleras dos dualismos implacáveis
E Ă gula negra das antinomias!PsiquĂŞ biforme, o CĂ©u e o Inferno absorvo…
Criação a um tempo escura e cor-de-rosa,
Feita dos mais variáveis elementos,Ceva-se em minha carne, como um corvo,
A simultaneidade ultramonstruosa
De todos os contrastes famulentos!
O inferno para as mulheres que sĂŁo apenas bonitas Ă© a idade.
‘O inferno sĂŁo os outros’ – disse Sartre. E Ă© sobretudo por isso que se usam Ăłculos escuros.
Ao Tempo
Levanta o pano, Ăł tragador das eras,
A cena mostra das fatais desditas,
Pois que no giro das paixões que incitas
Tragar venturas, vorazmente, esperas.Do vário mundo que só nutre feras,
Co’a torva dextra lhe desvia as ditas.
Solta das asas as Tentações malditas,
Os filhos traga, que indolente geras.Leva de rojo, c’o decretado gume,
Planos que traças ao profundo Averno.
Acende e apaga da RazĂŁo o lume!Ă“ Tempo, Ăł Tempo, regedor do Inferno!
Louvem-te as FĂşrias, de quem tens ciĂşme,
Que só adoro as decisões do Eterno.
A mente nĂŁo deve ser modificada pelo tempo e pelo lugar.
A mente Ă© o seu prĂłprio lugar, e dentro de si
Pode fazer um inferno do céu, do céu um inferno.
SĂł o inesperado Ă© terrĂvel. Por isso o inferno nĂŁo basta para conter as almas na virtude.
Uma vida inteira de felicidade! Nenhum homem vivo conseguiria suportá-la. Seria o inferno.
Um feriado perpĂ©tuo – essa deve ser uma voa definição do inferno.
A despedida é tudo o que conhecemos do céu e tudo o que precisamos do inferno.
Quando a Fortuna Encetou com Desgraças
Quando a Fortuna, de inconstante aviso,
Encetou com desgraças
O varĂŁo que nĂŁo veio humilde, abjecto
Adorar o seu Nume,
Na refalsada Corte, ou ante os cofres
Chapeados de Pluto;
Levando avante, o seu empenho, e acinte,
Maléfica lhe emborca
Sobre a cabeça a mágoas devotada,
Toda a Urna infelice,
Que Jove encheu colĂ©rico co’as penas
De atormentado inferno.
Dos ombros do VarĂŁo constante e justo
Resvalam debruçadas
Perdas de bens, desonras mal sofridas
A lhe aferrar o peito
Co’as garras afaimadas da pobreza;
Logo os tristes Pesares
Em torno ao coração serpeiam, mordem,
Trajando a rojo lutos.
Vem a má nova, de agouradas falas,
Que se compõe sequela
De tibiezas, senões, desconfianças,
Desamparo de amigos.
A Doença, com mão finada abrange
Os fatigados membros
E no âmago do peito as amargaras
VĂŁo assentar morada.
Com Ăndice maligno a ProvidĂŞncia
Lhe aponta no futuro,
Em nebuloso quadro hĂłrridas formas
De sinistros sucessos.
Quem nĂŁo quisera, com melhor semblante
Despedir-se do dia,
E fraudar, com as sombras do jazigo,
A estrada para o inferno está repleta de táxis.
Tu, de quantos dragões o Inferno encerra,
És o pior, Inveja pestilente!
Morde a virtude, ao mérito faz guerra
Teu detestável, teu maligno dente.
Na verdade, aqueles suplĂcios que dizem existir
no profundo Inferno, estĂŁo todos aqui, nas nossas vidas.
O inferno e o céu continuam a existir. São eternos. Quem os tira do céu tira-os para a terra.
As pessoas que me dizem que eu vou para o inferno e elas vão para o céu de certa forma deixam-me feliz de não estarmos indo para o mesmo lugar.
A Minha Poesia
A minha poesia e a minha vida fluĂram como um rio americano, como uma torrente de águas do Chile, nascidas na intimidade profunda das montanhas austrais e dirigindo sem cessar para uma saĂda marĂtima o movimento do caudal. A minha poesia nĂŁo rejeitou nada do que pĂ´de transportar nas suas águas. Aceitou a paixĂŁo, desenvolveu o mistĂ©rio, abriu passagem nos corações do povo.
Coube-me sofrer e lutar, amar e cantar. Tocaram-me na partilha do mundo o triunfo e a derrota, provei o gosto do pĂŁo e do sangue. Que mais quer um poeta? Todas as alternativas, do pranto atĂ© aos beijos, da solidĂŁo atĂ© ao povo, estĂŁo vivas na minha poesia, reagem nela, porque vivi para a minha poesia e porque a poesia sustentou as minhas lutas. E se muitos prĂ©mios alcancei, prĂ©mios fugazes como borboletas de pĂłlen evasivo, alcancei um prĂ©mio maior, um prĂ©mio que muitos desdenham, mas que, na realidade, Ă© para muitos inatingĂvel.
Consegui chegar, através de uma dura lição de estética e rebusca, através dos labirintos da palavra escrita, à altura de poeta do meu povo. O meu prémio maior é esse — não os livros e os poemas traduzidos, não os livros escritos para descreverem ou dissecarem as palavras dos meus livros.
Pois julguei-o justo e o considerei brilhante, VocĂŞ que Ă© negro como o inferno e obscuro como a noite.
No mau é que está o seu próprio inferno.
As situações podem mudar; as pessoas podem mudar. Sê o primeiro a procurar e trazer o que é o bem. Não cresças acostumado ao inferno, mas derrota-o com o bem.