Passagens sobre Literatura

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Literatura Real e Literatura Aparente

Em todas as épocas, existem duas literaturas que caminham lado a lado e com muitas diferenças entre si: uma real e outra apenas aparente. A primeira cresce até se tornar uma leitura permanente. Exercida por pessoas que vivem para a ciência ou para a poesia, ela segue o seu caminho com seriedade e tranquilidade, produzindo na Europa pouco menos de uma dúzia de obras por século, que, no entanto, permanecem. A outra, exercida por pessoas que vivem da ciência ou da poesia, anda a galope, com rumor e alarido por parte dos interessados, trazendo anualmente milhares de obras ao mercado. Após poucos anos, porém, as pessoas perguntam: Onde estão essas obras? Onde está a sua glória tão prematura e ruidosa? Por isso, pode-se também chamar esta última de literatura que passa, e aquela, de literatura que fica.

Os Livros Representam a Essência de um Espírito

As obras são a quintessência de um espírito: por conseguinte, mesmo se este for o espírito mais sublime, elas sempre serão, sem comparação, mais ricas de contúdo do que a sua companhia, e a substituirão também na essência – ou melhor, ultrapassá-la-ão em muito e a deixarão para trás: Até mesmo os escritos de uma cabeça medíocre podem ser instrutivos, dignos de leitura e divertidos, justamente porque são sua quintessência, o resultado, o fruto de todo o seu pensamento e estudo; enquanto a sua companhia não nos consegue satisfazer. Sendo assim, podem-se ler livros de pessoas em cujas companhias não se encontraria nenhum prazer, e é por essa razão que uma cultura intelectual elevada nos induz pouco a pouco a encontrar o nosso prazer quase exclusivamente na leitura dos livros, e não na conversa com as pessoas.
Não há maior refrigério para o espírito do que a leitura dos clássicos antigos: tão logo temos um deles nas mãos, e mesmo que seja por apenas meia hora, sentimo-nos imdediatamente refrescados, aliviados, purificados, elevados e fortalecidos; como se nos tivéssemos deleitado na fonte fresca de uma rocha. Tal facto depende das línguas antigas e da sua perfeição ou da grandeza dos espíritos,

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A literatura é uma profissão em que se torna indispensável dar provas constantes de que se tem talento para convencer pessoas que não têm nenhum.

As Três Espécies de Portugueses

Há três espécies de Portugal, dentro do mesmo Portugal; ou, se se preferir, há três espécies de português. Um começou com a nacionalidade: é o português típico, que forma o fundo da nação e o da sua expansão numérica, trabalhando obscura e modestamente em Portugal e por toda a parte de todas as partes do Mundo. Este português encontra-se, desde 1578, divorciado de todos os governos e abandonado por todos. Existe porque existe, e é por isso que a nação existe também.

Outro é o português que o não é. Começou com a invasão mental estrangeira, que data, com verdade possível, do tempo do Marquês de Pombal. Esta invasão agravou-se com o Constitucionalismo, e tornou-se completa com a República. Este português (que é o que forma grande parte das classes médias superiores, certa parte do povo, e quase toda a gente das classes dirigentes) é o que governa o país. Está completamente divorciado do país que governa. É, por sua vontade, parisiense e moderno. Contra sua vontade, é estúpido.

Há um terceiro português, que começou a existir quando Portugal, por alturas de El-Rei D. Dinis, começou, de Nação, a esboçar-se Império. Esse português fez as Descobertas,

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A Vitalidade de uma Nação

Uma nação vive, próspera, é respeitada, não pelo seu corpo diplomático, não pelo seu aparato de secretarias, não pelas recepções oficiais, não pelos banquetes cerimoniosos de camarilhas: isto nada vale, nada constrói, nada sustenta; isto faz reduzir as comendas e assoalhar o pano das fardas – mais nada. Uma nação vale pelos seus sábios, pelas suas escolas, pelos seus génios, pela sua literatura, pelos seus exploradores científicos, pelos seus artistas. Hoje, a superioridade é de quem mais pensa; antigamente era de quem mais podia: ensaiavam-se então os músculos como já se ensaiam as ideias.

Literatura que continue empregando linguística e modos formais de expressão novos para traçar um panorama da sociedade como um todo enquanto ao mesmo tempo a expõe, rasgando as máscaras de sua face, para mim seria merecedora de um prêmio.

No meu ofício de escritor, penso não me ter afastado nunca da minha consciência de cidadão. Defendo que aonde vai um, deve ir o outro. Não recordo ter escrito uma só palavra que estivesse em contradição com as minhas convicções políticas, mas isso não significa que alguma vez tenha posto a literatura ao serviço da minha ideologia. O que significa, isso sim, é que no momento em que escrevo estou expressando a totalidade da pessoa que sou.

Fui um Leitor Apaixonado

Eu fui um leitor apaixonado. Não havia livros em minha casa, mas costumava ler bastante nas biblioteca públicas, especialmente à noite. Lia indiscriminadamente. Lembro-me de ler a tradução do «Paraíso Perdido» quando tinha 16 anos. Não havia ninguém que me dissesse o que experimentar a seguir. Por isso tive uma educação literária anárquica cheia de lacunas, mas com o tempo consegui organizar uma espécie de visão coerente da literatura, acima de tudo da literatura francesa.

O Homem Não é o Indivíduo

«Não é a arranhar interminavelmente o indivíduo que acabamos por encontrar o homem» – diz alguém em certo livro do Malraux. Nada, de facto, mais útil que a separação dos dois conceitos, que tanto tendem a confundir-se, mormente hoje, em que tal confusão parece agravar-se. Com efeito, o «homem» não é o «indivíduo», porque é só do indivíduo aquela parte que pode universalizar-se. E é desta ideia que temos de partir para que um equívoco se não consuma, o equívoco de um individualismo, de um pessoalismo restrito que a arte e o pensamento modernos parecem à primeira vista aceitar.
Que estranho «eu» é pois este que de algum modo dir-se-ia predominar na filosofia e na literatura de hoje? Porque é evidente que uma forte tendência da arte de hoje, do homem actual, apela para a comunicabilidade, para uma fraternidade, e não para um estéril isolamento. Mas acontece que nesse apelo muitas vezes se esquece o que há aí de mecânico, de superficial, de relações externas, imediatas, provisórias, que nos não satisfaz inteiramente. O homem que aí fala é o que se ensurdece a si próprio, às suas vozes profundas, aos avisos que se anunciam desde o limiar da solidão.

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As pessoas que são estranhas ao licôr são incapazes de falar sobre literatura.

Os Clássicos da Literatura

As emoções que a literatura suscita são talvez eternas, mas os meios devem variar constantemente, mesmo que lligeiramente, para não perder a sua virtude. Desgastam-se à medida que o leitor os reconhece. Daí o perigo de afirmar que existem obras clássicas que o serão para sempre.
Cada qual descrê da sua arte e dos seus artifícios. Eu, que me resignei a pôr em dúvida a indefinida duração de Voltaire ou de Shakespeare, acredito (nesta tarde de um dos últimos dias de 1965) na de Schopenhauer e na de Berkeley.
Clássico não é um livro (repito-o) que possui necessariamente tais ou tais méritos. É um livro que as gerações dos homens, motivadas por razões diversas, lêem com prévio fervor e com uma misteriosa lealdade.

A Destruição de Tudo

É a palavra de ordem para o homem de hoje. Destruir. Tudo. Os deuses, as artes, diferenças culturais, ou a só cultura, diferenças sexuais, diferenças literárias ou a só literatura que leva hoje tudo, valores de qualquer espécie, filosofias, o simples pensamento, a simples palavra – tudo alegremente ao caixote. Entretanto, ou por isso, proliferação das gentes com a forma que lhes pertence, devastação da sida, que foi o que de melhor a natureza arranjou para equilibrar a demografia, droga dura para se avançar na vida mais depressa, criminalidade para esse avanço, juventude de esgotos nocturnos, velhos em excesso e que não há maneira de se despacharem e atulham os chamados lares de idosos ou simplesmente os depósitos em que são largados até mudarem de cemitério, politiqueiros que têm a verdade do erro que se segue e o mais e o mais. É tempo de cair um pedregulho como o que acabou com os dinossauros há sessenta milhões de anos e de poder dar-se a hipótese de a vida recomeçar. Até que venha outra vez a destruição e Deus definitivamente se farte do brinquedo. Entretanto vê se vês ainda alguma flor ao natural e demora-te um pouco a admirar-lhe a beleza e estupidez.

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A Cultura Portuguesa e o Provincianismo

A cultura portuguesa tem um amor fatal pelo provincianismo. O provincianismo é a forma mais «engagée» de existir socialmente e literariamente. Daí a impossibilidade, ou melhor, o medo de se realizar sequer um realismo a sério, porquanto este exige uma descida ao inferno e não vejo por aí quem se atreva além do purgatório. Fica-se assim na meia tinta do naturalismo, retratando quadros convencionais de uma sociedade provinciana onde, além da já muito conhecida injustiça social (reparável pela economia e não pela literatura), nada se capta que possa sugerir a simples violência de se estar no mundo. Provincianismo chama-se ainda àquela nossa atitude que toma muito a sério ou, ainda, solenemente, tudo o que faz, tornando inviável uma literatura que desmonte eficazmente a engrenagem humana e social pela incomplacente investida de um humor cruel. Houve recentes tentativas queirozianas para denunciar as fraquezas do meio. Conseguiu-se fazer realismo desta vez? Também não, porque se fez realismo de empréstimo, de segunda mão, colhido no «diz-se diz-se» das esquinas. Escreveu-se razoavelmente má-língua, mas não se agitaram as pessoas e as instituições de forma a tornar visível o lodo depositado no fundo. Isto quanto aos que fazem profissão de fé de realismo social ou burguês.

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O Orgulho de Ser Português

Aquelas qualidades que se revelaram e fixaram e fazem de nós o que somos e não outros; aquela doçura de sentimentos, aquela modéstia, aquele espírito de humanidade, tão raro hoje no mundo; aquela parte de espiritualidade que, mau grado tudo que a combate inspira ainda a vida portuguesa; o ânimo sofredor; a valentia sem alardes; a facilidade de adaptação e ao mesmo tempo a capacidade de imprimir no meio exterior os traços do modo de ser próprio; o apreço dos valores morais; a fé no direito, na justiça, na igualdade dos homens e dos povos; tudo isso, que não é material nem lucrativo, constitui traços do carácter nacional. Se por outro lado contemplamos a História maravilhosa deste pequeno povo, quase tão pobre hoje como antes de descobrir o mundo; as pegadas que deixou pela terra de novo conquistada ou descoberta; a beleza dos monumentos que ergueu; a língua e literatura que criou; a vastidão dos domínios onde continua, com exemplar fidelidade à sua História e carácter, alta missão civilizadora – concluiremos que Portugal vale bem o orgulho de se ser português.

Todos Nós Hoje Nos Desabituamos do Trabalho de Verificar

Todos nós hoje nos desabituamos, ou antes nos desembaraçamos alegremente, do penoso trabalho de verificar. É com impressões fluídas que formamos as nossas maciças conclusões. Para julgar em Política o facto mais complexo, largamente nos contentamos com um boato, mal escutado a uma esquina, numa manhã de vento. Para apreciar em Literatura o livro mais profundo, atulhado de ideias novas, que o amor de extensos anos fortemente encadeou—apenas nos basta folhear aqui e além uma página, através do fumo escurecedor do charuto. Principalmente para condenar, a nossa ligeireza é fulminante. Com que soberana facilidade declaramos—«Este é uma besta! Aquele é um maroto!» Para proclamar—«É um génio!» ou «É um santo!» of erecemos uma resistência mais considerada. Mas ainda assim, quando uma boa digestão ou a macia luz dum céu de Maio nos inclinam à benevolência, também concedemos bizarramente, e só com lançar um olhar distraído sobre o eleito, a coroa ou a auréola, e aí empurramos para a popularidade um maganão enfeitado de louros ou nimbado de raios. Assim passamos o nosso bendito dia a estampar rótulos definitivos no dorso dos homens e das coisas. Não há acção individual ou colectiva, personalidade ou obra humana, sobre que não estejamos prontos a promulgar rotundamente uma opinião bojuda E a opinião tem sempre,

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Não Percamos de Vista os Nossos Antepassados

Quando uma literatura chega a ter êxito, aquilo que nela havia de mais activo em momentos anteriores torna-se menos claro e é ultrapassado por aquilo que nela é mero produto dessa actividade. É por isso que é bom olhar de vez em quando para trás. Tudo o que em nós há de original conservar-se-á tanto melhor e será tanto mais apreciado, quanto mais formos capazes de não perder de vista os nossos antepassados.

A Minha Lista dos Grandes Autores

Uma revista espanhola teve a ideia de pedir a uns quantos escritores que elaborassem a sua árvore genealógica literária, isto é, a que outros autores consideravam eles como avoengos seus, directos ou indirectos, excluindo-se do inventado parentesco, obviamente, qualquer presunção de relações ou equivalências de mérito que a realidade, pelo menos no meu caso, logo se encarregaria de desmentir. Também se pedia que, em brevíssimas palavras, fosse dada a justificação dessa espécie de adopção ao contrário, em que era o «descendente» a escolher o «ascendente». A cada escritor consultado foi entregue o desenho de uma árvore com onze molduras dispersas pelos diferentes ramos, onde suponho que hão-de vir a aparecer os retratos dos autores escolhidos. A minha lista, com a respectiva fundamentação, foi esta: Luís de Camões, porque, como escrevi no «Ano da Morte de Ricardo Reis», todos os caminhos portugueses a ele vão dar; Padre António Vieira, porque a língua portuguesa nunca foi mais bela que quando ele a escreveu; Cervantes, porque sem ele a Península Ibérica seria uma casa sem telhado; Montaigne, porque não precisou de Freud para saber quem era; Voltaire, porque perdeu as ilusões sobre a humanidade e sobreviveu a isso; Raul Brandão, porque demonstrou que não é preciso ser-se génio para escrever um livro genial,

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