A vida acontece mais do que tudo naqueles momentos que não fazes a mínima ideia do tempo que demoraram. A felicidade tem tudo menos relógio.
Passagens sobre Momentos
1227 resultadosAcreditar é a felicidade que sobra de quem nunca consegue alcançar aquilo em que acredita, eu acredito e nesse momento, em que acredito, sou feliz, vivo a felicidade possível, a minha felicidade. Acreditar é um instante de felicidade.
O Desejo e a Posse
Um homem não se sente totalmente privado dos bens aos quais nunca sonhou aspirar, mas fica muito satisfeito mesmo sem eles, enquanto outro que possua cem vezes mais do que o primeiro sente-se infeliz quando lhe falta uma única coisa que tenha desejado. A esse respeito, cada um tem também um horizonte próprio daquilo que lhe é possível atingir, e as suas pretensões têm uma extensão semelhante a esse horizonte. Quando determinado objecto, situado dentro desses limites, se lhe apresenta de modo que o faça acreditar na possibilidade de alcançá-lo, o homem sente-se feliz; em contrapartida, sentir-se-à infleliz quando eventuais dificuldades lhe tirarem tal possibilidade. Tudo o que estiver situado externamente a esse campo visual não agirá de forma alguma sobre ele. Por esse motivo, as grandes propriedades dos ricos não perturbam o pobre, e, por outro lado, para o rico cujos propósitos tenham fracassado, serve de consolo as muitas coisas que já possui. (A riqueza assemelha-se à água do mar; quanto mais dela se bebe, mais sede se tem. O mesmo vale para a glória).
O facto de que o nosso humor habitual não resulte muito diferente do anterior após a perda de uma riqueza ou do bem-estar,
Não Queira Ser Especial
Se uma pessoa se aceitar tal como é e usar as suas capacidades para desenvolver a criatividade – e todas as pessoas nascem com certas capacidades, determinados talentos e alguma criatividade será imensamente feliz apesar de não ser ninguém. Um indivíduo não tem de ser forçosamente feliz só porque se converteu no homem mais rico ou no homem mais poderoso do mundo. Estas são as noções infantis do homem primitivo, um fardo que temos carregado até aos dias de hoje.
Eu gostava de lhe pedir: abandone as palavras «aceitação total». Substitua-as por palavras simples e sinta-se alegre interiormente. No momento em que se alegrar em si mesmo, toda a existência se alegra em si. Terá, então, alcançado a sintonia com a dança harmoniosa que acontece ao seu redor.
Só o homem se desfez em pedaços, e o motivo por que se desfez tem que ver com o facto de querer ser especial. Se quiser ser especial, terá de aceitar algum tipo de loucura.
Os melhores momentos do amor são aqueles de uma serena e doce melancolia, em que choras sem saber porquê, e quase aceitas tranquilamente uma desventura que não conheces.
O Sábio Face à Vida
Existe acaso alguém a quem possas colocar acima do sábio? O sábio tem, sobre os deuses, opiniões piedosas. Não teme a morte em momento nenhum, considera-a o fim normal da natureza, julga que o termo dos bens é fácil de atingir e de possuir, sabe que os males têm uma duração e uma gravidade limitadas; sabe o que é mister pensar da fatalidade, da qual se constuma fazer uma ama despótica. Sabe que os acontecimentos nascem, uns da fortuna, outros de nós próprios, porque a fatalidade é cega e a fortuna inconstante; que o que vem de nós não está submisso a nenhuma tirania, sujeito a reproche e a elogio.
Com efeito, melhor fora acreditar nas narrativas mitológicas sobre os deuses que tornar-se escravo da fatalidade dos físicos. A mitologia consente a esperança de que, honrando os deuses, poderemos dispô-los a nosso favor, enquanto a fatalidade é inexorável. O sábio não crê, como o vulgo, que a fortuna seja uma divindade, pois um deus não pode agir de maneira desordenada. Nem é, para ele, uma causa, dada a sua instabilidade. Não a admite como causa do bem e do mal, ou da vida feliz; não obstante, sabe que pode trazer grandes bens ou grandes males.
Conhecimento Maduro
Passa-se com os livros uma coisa semelhante ao que sucede com um novo conhecimento que travamos com alguém. Num primeiro momento experimentamos um profundo prazer em encontrar coincidências gerais de opinião ou ao sentirmo-nos tocados num aspecto importante da nossa existência. Só depois, quando o conhecimento se aprofunda, começam a surgir as diferenças. Nessa altura, o comportamento inteligente caracteriza-se pela capacidade de não retroceder imediatamente, como muitas vezes acontece na juventude, e de pelo contrário reter o que há de coincidente enquanto se vão esclarecendo mutuamente todas as diferenças, sem se pretender chegar a acordo absoluto.
Para a Minha Mulher
Desde que a Maria João casou (oficialmente) comigo há treze anos, damos por nós a casarmo-nos um com o outro, voluntária ou involuntariamente, várias vezes por dia.
Vou contar só uma. Esta semana, quando voltávamos da praia, a Maria João estava a pentear-se e deu-me uns cabelos soltos para eu deitar pela janela do carro. Tive ciúmes que alguém pudesse apanhar os lindos cabelos dela e disse-lhe. Dei-lhes um beijinho e atirei-os ao vento. E a Maria João disse: «Agora tenho eu ciúmes que alguém apanhe o cabelo com beijinhos teus».Casámos um com o outro nesse momento. Já tínhamos casado cinco vezes na praia. Casar é o que acontece quando duas pessoas descobrem que, por estarem a fazer ou terem feito uma coisa grande ou pequena, são as duas únicas pessoas no mundo. Todas as outras pessoas não podem fazer parte daquele prazer. Aquele prazer só é possível para duas pessoas concretas: ela e eu.
À nossa volta casavam-se muitas outras pessoas, casando-se mais por nós estarmos de fora, juntamente com todas as outras. Às vezes somos nós os espectadores. Vemos outras pessoas a casarem-se: um homem a rir-se leva uma mulher a rir-se nos braços pelo mar adentro e não a deixa cair até ela pedir.
Alguns têm lampejos de idéias geniais e, colocando-as em prática, tornam-se milionários; outros só têm lampejos de idéias infelizes e permanecem na miséria a vida toda. O que decide o destino de uma pessoa é a natureza desses lampejos – idéias que surgem repentinamente em determinados momentos.
Sol do Meu Dia
Se eu fosse nuvem tinha imensa mágoa
Não te servindo de asas maternais
Que te pudessem abrigar da água
Que chovesse das mais!E sendo eu onda, tinha mágoa suma
Não te podendo a ti, mulher, levar
De praia em praia sobre a alva espuma,
Sem nunca te molhar!E sendo aragem eu, que pela face
Te roçasse de rijo alguma vez
Que o Senhor com mais força respirasse…
Que mágoa imensa… Vês?E a luz do teu olhar que me não luza
Um rápido momento a mim sequer,
Como a águia no ar, que passa e cruza
A terra sem na ver!Mas que me importa a mim! Se me esmagasses
Um dia aos pés o coração a mim,
As vozes que lhe ouviras, se escutasses,
Era o teu nome… sim;O teu nome gemido docemente,
Com toda a fé de um mártir em Jesus.
Se acaso já em Cristo pôs um crente
A fé que eu em ti pus!A fé, mais o amor! Porque ele expira
Sem que a ninguém lhe estale o coração;
Não basta ser santo: é necessária a santidade que o momento presente exige, uma santidade nova, também ela sem precedentes… O mundo precisa de Santos que tenham genialidade, como uma cidade onde grassa a peste tem necessidade de médicos.
Uma vida constantemente atarefada não é uma vida plena. Há sempre algo errado na vida totalmente destituída de espaço para folga. Ter momentos de folga, isto é, de calma e tranquilidade, mesmo em meio a muitos afazeres – este é o verdadeiro modo de viver do ser humano.
Existem momentos na vida em que a única alternativa possível é perder o controle.
Sentado aqui, a escrever à minha mesa, com as minhas canetas e lápis, etc., de repente me sobrevêm o mistério do universo e páro, tremo, temo, desejo neste momento deixar de sentir, esconder-me, bater com a cabeça na parede. Feliz aquele que pode pensar em profundidade, mas sentir assim tão em profundidade é uma maldição. Como poderei descrevê-lo? Horror sobre horror…
Vivemos de Matar
Os vivos alimentam-se e engordam às custas dos mortos. É a essência da natureza. Basta ver os documentários sobre a vida selvagem na televisão, aves corpulentas arrancando com o bico as tripas das vítimas, disputando-as entre si; a leoa de focinho enterrado na carne ensanguentada da zebra. Mas nem é preciso ir tão longe: as prateleiras dos supermercados são deprimentes cemitérios: paletes de cordeiro morto, ossos e costeletas de boi esfaqueado, vísceras de vaca sacrificada, lombo de porco eletrocutado, tudo isso em embalagens fabricadas com restos de árvores abatidas. Vivemos do que matamos. Vivemos de matar, ou do que nos é servido morto: os herdeiros consomem os despojos do predecessor, e isso nutre-os, fortalece-os no momento de levantar voo. Quanto maior a quantidade de carne consumida, mais alto e majestoso o voo. E mais elegante, claro. Nada que seja alheio às regras da natureza.
O Progresso Universal do Saber nunca é Imediato
Embora o progresso do saber humano, como a queda dos graves, adquira em cada instante maior celeridade, todavia é muito difícil acontecer que uma mesma geração de homens mude de opiniões ou reconheça os próprios erros, de maneira que acredite hoje no contrário daquilo em que acreditou num outro tempo. Prepara, sim, essas possibilidades para a que se lhe segue, a qual depois descobre e acredita, em muitos aspectos, no oposto daquela. Mas, assim como ninguém sente o movimento perpétuo que nos transporta em rotação juntamente com a Terra, também a generalidade dos homens não se apercebe do progresso contínuo que os seus conhecimentos fazem, nem da constante variação dos seus juízos. E nunca muda de opinião de tal modo que fique convencida de a ter mudado. Porém, não poderia deixar de ficar convencida e de dar por isso, sempre que concebesse de repente uma ideia muito contrária àquelas que vigoravam até àquele momento. Portanto, nenhuma verdade construída desta maneira, a não ser que seja palpável, será alguma vez unanimamente credível para os conemporâneos do primeiro que a descobriu.
Seleccionei para Ti
Seleccionei para ti
esta manhã de setembro
à margem dela
trabalho
para que
em canto e glória
sejas o centro unitário
no corpo dessa elegia
relacionei coisas miúdas
que possam complementar
o equilíbrio das formas
que te transitam eleita
na exaltação de meu sonho
e dentro desse equilíbrio
um núcleo de resistência
feito uma flor
uma fonte
que se iluminam feridas
de uma incidência de luz
o pouso breve de um pássaro
que em vigilância
nos olhos
preserva o voo completo
a música radical
do teu contexto moreno
a fala que não se escuta
na fundação dos abraços
evocação do momento
que defrontou
por acaso
a minha
e a tua vida
erguido o painel de espaço
és madrugada no dia
e retomada no tempo
és unidade centrada
compondo a mesma harmonia
assim usei tua ausência
num pressuposto de esquema
buscando tua presença
sobre alicerces de um poema
A amizade nasce no momento em que uma pessoa diz para a outra ‘O que? Você também! Pensei que eu era o único.
A Sabedoria e a Alegria
Vou ensinar-te agora o modo de entenderes que não és ainda um sábio. O sábio autêntico vive em plena alegria, contente, tranquilo, imperturbável; vive em pé de igualdade com os deuses. Analisa-te então a ti próprio: se nunca te sentes triste, se nenhuma esperança te aflige o ânimo na expectativa do futuro, se dia e noite a tua alma se mantém igual a si mesma, isto é, plena de elevação e contente de si própria, então conseguiste atingir o máximo bem possível ao homem! Mas se, em toda a parte e sob todas as formas, não buscas senão o prazer, fica sabendo que tão longe estás da sabedoria como da alegria verdadeira. Pretendes obter a alegria, mas falharás o alvo se pensas vir a alcançá-la por meio das riquezas ou das honras, pois isso será o mesmo que tentar encontrar a alegria no meio da angústia; riquezas e honras, que buscas como se fossem fontes de satisfação e prazer, são apenas motivos para futuras dores.
Toda a gente, repito, tende para um objectivo: a alegria, mas ignora o meio de conseguir uma alegria duradoura e profunda. Uns procuram-na nos banquetes, na libertinagem; outros, na satisfação das ambições, na multidão assídua dos clientes;
O sentimento da vingança é tão agradável, que muitas vezes o homem deseja ser ofendido para se poder vingar, e não falo apenas de um inimigo habitual, mas de uma pessoa indiferente, ou até mesmo, sobretudo em alguns momentos de humor negro, de um amigo.