Todos sabemos que cada dia que nasce é o primeiro para uns e será o último para outros e que, para a maioria, é só um dia mais.
Passagens sobre Últimos
618 resultadosAdoro os prazeres simples. São o último refúgio das pessoas complicadas.
As últimas nódoas são sempre as primeiras.
A Portugalite
Entre as afecções de boca dos portugueses que nem a pasta medicinal Couto pode curar, nenhuma há tão generalizada e galopante como a Portugalite. A Portugalite é uma inflamação nervosa que consiste em estar sempre a dizer mal de Portugal. É altamente contagiosa (transmite-se pela saliva) e até hoje não se descobriu cura.
A Portugalite é contraída por cada português logo que entra em contacto com Portugal. É uma doença não tanto venérea como venal. Para compreendê-la é necessário estudar a relação de cada português com Portugal. Esta relação é semelhante a uma outra que já é clássica na literatura. Suponhamos então que Portugal é fundamentalmente uma meretriz, mas que cada português está apaixonado por ela. Está sempre a dizer mal dela, o que é compreensível porque ela trata-o extremamente mal. Chega até a julgar que a odeia, porque não acha uma única razão para amá-la. Contudo, existem cinco sinais — típicos de qualquer grande e arrastada paixão — que demonstram que os portugueses, contra a vontade e contra a lógica, continuam apaixonados por ela, por muito afectadas que sejam as «bocas» que mandam.
Em primeiro lugar, estão sempre a falar dela. Como cada português é um amante atraiçoado e desgraçado pela mesma mulher,
A Utilidade dos Inimigos
A utilidade dos inimigos é um daqueles temas cruciais em que um compilador de lugares-comuns como Plutarco pôde dar a mão a um arguto preceptor de heróis como Gracian y Morales e a um paradoxista como Nietzsche. Os argumentos são sempre esses – e todos o sbaem.
Os inimigos como os únicos verdadeiros; como aqueles que, conservando os olhos sempre voltados para cima, obrigam à circunspecção e ao caminho rectilíneo; como auxiliares de grandeza, porque obrigam a superar as más vontades e os obstáculos; como estímulos do aperfeiçoamento de si e da vigilância; como antagonistas que impelem para a competição, a fecundidade, a superação contínua. Mas são bem vistos, sobretudo, como prova segura da grandeza e da fortuna.
Quem não tem inimigos é um santo – e às vezes os santos têm inimigos – ou uma nulidade ambulante, o último dos últimos. E alguns, por arrogância, imaginam ter mais inimigos do que na realidade têm ou tentam consegui-los, para obter, pelo menos por esse caminho, a certeza da sua superioridade.
Mas todos os registadores utilitários da utilidade de inimigos esquecem que essas vantagens são pagas por um preço elevado e só constituem vantagens enquanto somos, e não sabemos ser,
Nos Extremos é que Está a Sabedoria
Pode-se dizer que, muito plausivelmente, há uma ignorância abecedária que precede o saber e uma outra, doutoral, que se lhe segue, ignorância esta que o saber produz e engendra da mesma maneira que desfaz e destrói aqueloutra. Dos espíritos simples, menos curiosos e menos instruídos, fazem-se bons cristãos, que, por reverência e obediência, com simplicidade, crêem e mantêm-se submissos às leis. É nos espíritos de vigor e capacidade médios que se engendram as opiniões erróneas, pois eles seguem a aparência das suas primeiras impressões e têm pretextos para interpretar como simpleza e estultícia o nosso apego aos antigos usos, considerando que nós aí não chegámos por via do estudo dessas matérias.
Os grandes espíritos, mais avisados e clarividentes, constituem um outro género de bons crentes: por meio de uma aturada e escrupulosa investigação, penetram nas Escrituras até atingir uma luz mais profunda e abstrusa, e entendem o misterioso e divino segredo da nossa política eclesiástica. Vemos, porém, alguns, com maravilhoso proveito e com consolidação da sua fé, chegarem, através do segundo, a este último nível, como o extremo limite da inteligência cristã, e rejubilar na sua vitória com refrigério, acções de graças, reformas dos costumes e grande modéstia. Não entendo nesta categoria situar aqueloutros que,
As Minhas Ilusões
Hora sagrada dum entardecer
De Outono, à beira-mar, cor de safira,
Soa no ar uma invisível lira …
O sol é um doente a enlanguescer …A vaga estende os braços a suster,
Numa dor de revolta cheia de ira,
A doirada cabeça que delira
Num último suspiro, a estremecer!O sol morreu … e veste luto o mar …
E eu vejo a urna de oiro, a balouçar,
À flor das ondas, num lençol de espuma.As minhas Ilusões, doce tesoiro,
Também as vi levar em urna de oiro,
No mar da Vida, assim … uma por uma …
A Aprendizagem da Apreciação da Poesia
Pode-se dizer que toda a poesia parte das emoções experimentadas pelos seres humanos nas relações consigo próprios, uns com os outros, com entes divinos e com o mundo à sua volta; por isso, ocupa-se também do pensamento e da acção que a emoção provoca, e de que a emoção resulta. Todavia, por mais primitiva que seja a fase de expressão e de apreciação, a função da poesia nunca pode ser unicamente despertar estas mesmas emoções no auditório do poeta.
Na poesia mais primitiva, ou na fruição mais rudimentar da poesia, a atenção do ouvinte dirige-se para o assunto; o efeito da arte poética sente-se sem o ouvinte estar totalmente cônscio desta arte. Com o desenvolvimento da consciência da linguagem há outra fase em que o ouvinte, que pode nessa altura ter-se transformado no leitor, está consciente de um duplo interesse numa história por si própria e no modo como é contada: isto é, torna-se consciente do estilo. Então podemos sentir deleite na discriminação entre os modos como diferentes poetas tratarão o mesmo assunto; uma apreciação que não é simplesmente de melhor ou pior, mas de diferenças entre estilos que são igualmente admirados. Numa terceira fase de desenvolvimento, o assunto pode recuar para último plano: em vez de ser o propósito do poema,
O Coração é o Seu Amigo
O verdadeiro problema reside na mente, porque a mente é formada pela sociedade humana e especialmente projectada para nos manter escravizados. O corpo tem uma beleza própria. Ainda faz parte das árvores e do oceano, das montanhas e das estrelas. Não foi contaminado pela sociedade nem foi envenenado pelas igrejas, pelas religiões e pelos padres. Mas a mente foi completamente condicionada e distorcida ao receber ideias que são totalmente falsas. A nossa mente funciona quase como uma máscara que esconde o nosso verdadeiro rosto.
A arte da meditação consiste em transcender a mente, e o Oriente dedicou toda a sua inteligência e todo o seu génio durante quase dez mil anos a um único objectivo: descobrir a maneira de transcender a mente e os seus condicionamentos. Do esforço de dez mil anos resultou o aperfeiçoamento do método da meditação.
Em poucas palavras, meditação significa olhar para a mente, observar a mente. Tente examinar a mente, olhando em silêncio para ela – sem explicações, sem apreciações, sem condenações, sem qualquer julgamento, a favor ou contra -, observe-a apenas, como se não tivesse nada a ver com ela. Aprecie apenas o tráfego que vai na mente. E o milagre da meditação faz com que,
Post Coitum Animal Triste
Em ti o poema, o amplo tecido da água ou a forma
do segredo. Outrora conheceste a margem abandonada
do desejo, a sua extensão e principias a entregar
os vasos alongados para receberes as mãos das chuvas.Apagaram-se junto dos teus olhos as praias, as árvores
que se ergueram um dia sobre as estradas romanas,
o vestígio dos últimos peregrinos, aves nuas
que já desceram, cansadas, pelo interior do teu peito.Uma voz, no silêncio calmo das águas, esquece
a mentira das primeiras colheitas, onde os nossos gestos
perderam os sorrisos ou o orvalho que os cerca.Serenamente, começaram a fechar-se os sonhos de Deus
no interior de novos frutos e, abandonado, fico
junto do teu corpo, onde principia a sombra deste poema.
A Mente Precisa de Ser Desafiada Todos os Dias
A mente, muito mais do que o corpo, precisa de ser desafiada todos os dias. Se possível com treinos bi ou tridiários. Sair da cama sem identificar a razão pela qual acordamos maldispostos, passar horas a julgar este e aquele sem conhecer verdadeiramente ninguém ou a contestar o emprego que nós próprios escolhemos e ir para a cama enjoados com o dia que tivemos, são razões mais do que suficientes para nos questionarmos. A soma de não sei quantos dias assim, e acredita que se não for o teu caso é a situação da maioria das pessoas, resultará indubitavelmente em estados depressivos e de enfermidade precoce. Não podes continuar a aceitar a dor sem que faças nada para a curar e é por isso, por desejar profundamente o teu reencontro contigo e com a tua verdadeira realidade, que te grito: «HÁ SOLUÇÃO!!!» E a solução passa por identificares o artista que há em ti, pois treinar a mente é meramente uma arte. Até se atingir o estatuto de comandante da nossa vida e a tão pretendida velocidade cruzeiro naquele que é o oceano da nossa mente é necessário um altíssimo nível de concentração e criatividade. Precisas de estar sempre alerta e altamente focado no que a tua mente te sugere para depois,
Muito Tempo Há que a Mentira se Tem Posto em Pés de Verdade
Muito tempo há que a mentira se tem posto em pés de verdade, ficando a verdade sem pés e com dobradas forças a mentira; e é força que, sustentando-se em pés alheios, ande no mundo a mentira muito de cavalo; e se houve filósofo que com uma tocha numa mão buscava na luz do meio-dia um sábio, hoje, por mais que se multipliquem luzes às do Sol, não se descobrirá um afecto verdadeiro. Buscava-se então a ciência com uma vela, hoje pode-se buscar a verdade com a candeia na mão, que apenas se acha nos últimos paroxismos da vida.
O acordo é o último recurso dos que não têm imaginação.
A Arte e a Vida
Todos nós sabemos, quando fazemos algo, o quanto deixámos de fora, o quão grandemente falhámos, e carregamos dentro de nós uma imagem da coisa perfeita que falhou na materialização, e isso nós encaramos como o poema, isso é o que pedimos que nos reconheçam. Isso é o nosso orgulho, o nosso ego, exigindo completo reconhecimento.
E é difícil separar a obra de arte do homem ou da mulher que a produziu. Tendemos a confundir os dois. No fim de contas, suponho, a história da luta que o artista atravessou para dar à luz a sua ideia é tão patente, tão intensa, que mesmo que queiramos permanecer críticos — às vezes — vemos que é quase impossível fazê-lo. Mas só porque a arte não é vida, só porque a arte é uma criação tão inextrincavelmente ligada à vida, precisamos de fazer grandes esforços para isolar o elemento da arte em vez do elemento da vida. Por vezes, parece-me quase ridículo dizermos que este homem é mais humano do que aquele, que revela mais da vida, etc., no seu trabalho.
Como pode alguém realmente dizer isso… se levarmos isto ao limite? Porque o último movimento da caneta é revelador…
Num certo momento da vida, não é a esperança a última a morrer, mas a morte é a última esperança.
Carta de Amor
Eu sabia que seria apenas depois de te teres ido embora que iria perceber a completa extensão da minha felicidade e, alas! o grau da minha perda também. Ainda não a consegui ultrapassar, e se não tivesse à minha frente aquela caixinha pequena com a tua doce fotografia, pensaria que tudo não teria passado de um sonho do qual não quereria acordar. Contudo os meus amigos dizem que é verdade, e eu próprio consigo-me lembrar de detalhes ainda mais charmosos, ainda mais misteriosamente encantadores do que qualquer fantasia sonhadora poderia criar. Tem que ser verdade. Martha é minha, a rapariga doce da qual todos falam com admiração, que apesar de toda a minha resistência cativou o meu coração logo no primeiro encontro, a rapariga que eu receava cortejar e que veio para mim com elevada confiança, que fortaleceu a minha confiança em mim próprio e me deu esperanças e energia para trabalhar, na altura que eu mais precisava.
Quando tu voltares, querida rapariga, já terei vencido a timidez e estranheza que até agora me inibiu perante a tua presença. Iremos sentar-nos de novo sozinhos naquele pequeno quarto agradável, vais-te sentar naquela poltrona castanha , eu estarei a teus pés no banquinho redondo,
Não me leve a mal; Me leve à toa pela última vez
A simplicidade é o último recurso dos que não sabem complicar agradavelmente a vida.
Genérico
E tu, meu pai? Adivinho esses vidrilhos
das lágrimas quebrando
um a um na boca triste mas
por dentro, para que digamos
mais tarde, sem invenção escusada:
o pai não chorou.Eu soube das tuas fúrias
mordendo-se em silêncio,
ou de como te pões
às vezes tão de cinza.
O barco, o barco. Ficaremos
ainda estes minutos quantos.
Do que quiseres. E como quiseres.
Fala. Mas nada de telegramas
para depois da barra
– posso não os abrir,
juro que posso.
Se eu fosse um amigo, se estivesses
em frente dum copo.
Custava menos. Assim
deslizas a unha
pelo tecido da farda, inútil
dedo terno com os olhos longe.
O pai, que não chorou, tremia
de modo imperceptível.Lembro-me da bebedeira
em Alpedrinha, na estalagem,
com o Luís Melo
subitamente velho.
«Tramados, pá, tramados.»
O carro falha, são as velas
os platinados sujos
«a puta que os pariu» (Luís).Um último aceno só vinho
para estas adolescentes
ao balcão do bar e depois e depois?
O último conselheiro do homem privado de toda a virtude é o crime.