Podemos indicar aos outros o caminho certo, mas não podemos força-los a seguir esse caminho. Não é pela força que os homens serão salvos. Para os que querem seguir o caminho que leva a um beco sem saída, deixa-os ir; quando se virem nesse beco, compreenderão que trilham o caminho errado, e esse despertar os colocará no caminho certo. Para tais indivíduos, ‘ver-se num beco sem saída’ é o primeiro passo para a salvação.
Passagens sobre Passos
621 resultadosA Desordem da Minha Natureza
(…) enfrentei pela primeira vez o meu ser natural enquanto decorriam os meus noventa anos. Descobri que a minha obsessão de que cada coisa estivesse no seu lugar, cada assunto no seu tempo, cada palavra no seu estilo, não era o prémio merecido de uma mente ordenada mas, pelo contrário, um sistema completo de simulação inventado por mim para ocultar a desordem da minha natureza. Descobri que não sou disciplinado por virtude, mas como reacção contra a minha negligência; que pareço generoso para encobrir a minha mesquinhez, que passo por prudente por ser pessimista, que sou conciliador para não sucumbir às minhas cóleras reprimidas, que só sou pontual para que não se saiba que pouco me importa o tempo alheio. Descobri, por fim, que o amor não é um estado de alma mas um signo do Zodíaco.
O Pecado da Gula
Ontem à tarde saí.
Queria passear as lembranças
que um dia de chuva faz crescer em nós.
Há dias que o vento rondava a casa
cheio de segredos incompletos
a roçar-me a orelha. E eu não resisto
ao sabor do vento
e a uma boa história para enganar o frio.É fácil perdermo-nos nas ruas.
Nunca se regressa pelos mesmos caminhos
mas todos parecem iguais
com o cheiro da chuva a deixar o alcatrão
e a subir na memória
de outras ruas.
Mas há só um caminho que trilhamos. O corpo
é uma bússola fiel que segue pela estrada
enquanto o pó se levanta
muito para além dos nossos passos.
Morte, Juízo, Inferno e Paraíso
Em que estado, meu bem, por ti me vejo,
Em que estado infeliz, penoso e duro!
Delido o coração de um fogo impuro,
Meus pesados grilhões adoro e beijo.Quando te logro mais, mais te desejo;
Quando te encontro mais, mais te procuro;
Quando mo juras mais, menos seguro
Julgo esse doce amor, que adorna o pejo.Assim passo, assim vivo, assim meus fados
Me desarreigam d’alma a paz e o riso,
Sendo só meu sustento os meus cuidados;E, de todo apagada a luz do siso,
Esquecem-me (ai de mim!) por teus agrados
Morte, Juízo, Inferno e Paraíso.
Amizade
Ser-se amigo é ser-se pai
( — Ou mais do que pai talvez…)
É pôr-se a boca onde cai
A nódoa que nos desfez.É dar sem receber nada,
Consciente da prisão,
Onde os nossos passos vão
Em linha por nós traçada…É saber que nos consome
A sede, e sentirmos bem
O Céu, por na Terra, alguém
Rir, cantar e não ter fome.É aceitar a mentira
E achá-la formosa e humana
Só porque a gente respira
O ar de quem nos engana.
Cada passo que deres no sentido contrário ao da tua pessoa é mais um passo que dás a caminho de ti.
Os meus dias de ontem caminham comigo. Eles mantêm o passo, são os rostos cinzentos que espreitam por cima do meu ombro.
Desconfiança da Virtude Formal
Desconfiança da virtude formal – eis a explicação deste mundo. Os que sentiram uma vez esta desconfiança em relação a si próprios e passaram a tê-la em relação a todos os outros, ganharam uma susceptibilidade incessante relativamente a toda a virtude declarada. Daí a suspeitar da virtude em acto vai apenas um passo. Optaram pois por chamar virtude a quanto sirva ao advento da sociedade que eles desejam. O móbil profundo (esta desconfiança) é nobre. Mas estará o raciocínio certo, eis a questão.
A alma jamais pode vaguear sem rumo, se tomar a Bíblia para lhe guiar os passos.
XII
Sonhei que me esperavas. E, sonhando,
Saí, ansioso por te ver: corria…
E tudo, ao ver-me tão depressa andando,
Soube logo o lugar para onde eu ia.E tudo me falou, tudo! Escutando
Meus passos, através da ramaria,
Dos despertados pássaros o bando:
“Vai mais depressa! Parabéns!” dizia.Disse o luar: “Espera! que eu te sigo:
Quero também beijar as faces dela!”
E disse o aroma: “Vai, que eu vou contigo!”E cheguei. E, ao chegar, disse uma estrela:
“Como és feliz! como és feliz, amigo,
Que de tão perto vais ouvi-la e vê-la!”
Mito
Virá o dia em que o jovem deus será um homem,
sem sofrimento, com o morto sorriso do homem
que compreendeu. Também o sol se move longínquo
avermelhando as praias. Virá o dia em que o deus
já não saberá onde eram as praias de outrora.Acorda-se uma manhã em que o Verão morreu,
e nos olhos tumultuam ainda esplendores
como ontem e no ouvido os fragores do sol
feito sangue. A cor do mundo mudou.
A montanha já não toca o céu; as nuvens
já não se amontoam como frutos; na água
já não transparece um seixo. O corpo dum homem
curva-se pensativo onde um deus respirava.O grande sol acabou, e o cheiro da terra
e a rua livre, colorida de gente
que ignorava a morte. Não se morre de Verão.
Se alguém desaparecia, havia o jovem deus
que vivia por todos e ignorava a morte.
Nele a tristeza era uma sombra de nuvens.
O seu passo pasmava a terra.Agora pesa
o cansaço sobre todos os membros do homem,
sem sofrimento: o calmo cansaço da madrugada
que abre um dia de chuva.
O Grito
Corria pela rua acima quando a súbita explosão dum grito o fez parar instantaneamente. Todo o seu corpo estremeceu. O que ele desde sempre receara acabara de ocorrer: algures, nesse momento, uma caneta começara a deslizar sobre uma folha de papel, dando assim corpo àquele grito que de há muito, como as esculturas no interior da pedra, se mantinha na expectativa desse simples gesto dum escritor para atingir a realidade. Tapou os ouvidos com as mãos. O grito mais não era que um sinal, mas o que esse sinal lhe transmitia deixava-o aterrado. Acabara de ser posta a funcionar uma engrenagem que a partir de agora nada nem ninguém, e muito menos ele, iria alguma vez poder travar, um mecanismo de que ele próprio iria inapelavelmente ser a maior vítima. Mais tarde ou mais cedo isso teria de se dar, mas agora que, sem qualquer aviso prévio, se soubera propulsado para outra dimensão da sua vida, como se os fios que a governavam tivessem repentinamente mudado de mãos, o facto de há longo tempo o pressentir não o impediu de olhar à sua volta com estranheza, uma estranheza que antes de mais nascia de tudo à primeira vista ter ficado como estava,
A Chave para qualquer Relacionamento
A chave para qualquer relacionamento é a comunicação. E eu sempre pensei que a comunicação é como uma dança. Uma pessoa dá um passo em frente, o outro dá um passo para trás. O mais pequeno tropeção pode fazê-los cair e deixá-los emaranhados numa confusão. Descobri que, quando nos encontramos nesta posição — com o companheiro, um colega, um amigo, um filho —, a melhor opção é sempre perguntar à outra pessoa: «O que é que tu realmente queres?»
Ao princípio pode ser que a pessoa revele um certo nervosismo, que tussa ou que talvez faça um pequeno silêncio. Mas se você ficar calado o tempo suficiente para obter uma resposta, garanto-lhe que será qualquer coisa do tipo: «Quero saber que me dás valor.» Estenda uma mão de conexão e bom entendimento e ofereça-lhe três das palavras mais importantes que qualquer um de nós pode receber: «Estou a ouvir-te.» Tenho a certeza de que isto irá melhorar o vosso relacionamento.
Alimentar o Ego
Para quem faz do sonho a vida, e da cultura em estufa das suas sensações uma religião e uma política, para esse primeiro passo, o que acusa na alma que ele deu o primeiro passo, é o sentir as coisas mínimas extraordinária — e desmedidamente. Este é o primeiro passo, e o passo simplesmente primeiro não é mais do que isto. Saber pôr no saborear duma chávena de chá a volúpia extrema que o homem normal só pode encontrar nas grandes alegrias que vêm da ambição subitamente satisfeita toda ou das saudades de repente desaparecidas, ou então nos actos finais e carnais do amor; poder encontrar na visão dum poente ou na contemplação dum detalhe decorativo aquela exasperação de senti-los que geralmente só pode dar, não o que se vê ou o que se ouve, mas o que se cheira ou se gosta — essa proximidade do objecto da sensação que só as sensações carnais — o tacto, o gosto, o olfacto – esculpem de encontro à consciência; poder tornar a visão interior, o ouvido do sonho — todos os sentidos supostos e do suposto — recebedores e tangíveis como sentidos virados para o externo: escolho estas, e as análogas suponham-se,
Por Cima Destas Águas, Forte E Firme
Por cima destas águas, forte e firme,
irei por onde as sortes ordenaram,
pois, por cima de quantas me choraram
aqueles claros olhos, pude vir me.Já chegado era o fim de despedir me,
já mil impedimentos se acabaram,
quando rios de amor se atravessaram
a me impedir o passo de partir me.Passei os eu com ânimo obstinado,
com que a morte forçada e gloriosa
faz o vencido já desesperado.Em que figura, ou gesto desusado,
pode já fazer medo a morte irosa,
a quem tem a seus pés rendido e atado?
Cada momento da vida é um passo para morte.
A maior jornada começa por um passo.
Mentira
Tanta cousa passou… E, no entanto, vivemos
noutros tempos, felizes, como namorados…
– Nossa vida… ora a vida, era um barco sem remos,
levando-nos ao léu… a sonhar acordados…Ontem juntos, felizes… hoje, separados,
– (não pensei que este amor chegasse a tais extremos…)
E sorrimos em vão… sorrimos conformados
na mentira cruel de que a tudo esquecemos. . .Cruzamos nossos passos muita vez: – é a vida!
– eu, volto o rosto (fraco à paixão que ainda sinto),
tu, recalcando o amor, nem me olhas, distraída…Mentira inútil, cruel… se ontem, tal como agora,
tu sabes que padeço, sabes quanto eu minto,
e eu sei quanto este amor te atormenta e devora!
A razão é o passo, o aumento da ciência o caminho, e o benefício da humanidade é o fim.
O Triunfo dos Imbecis
Não nos deve surpreender que, a maior parte das vezes, os imbecis triunfem mais no mundo do que os grandes talentos. Enquanto estes têm por vezes de lutar contra si próprios e, como se isso não bastasse, contra todos os medíocres que detestam toda e qualquer forma de superioridade, o imbecil, onde quer que vá, encontra-se entre os seus pares, entre companheiros e irmãos e é, por espírito de corpo instintivo, ajudado e protegido. O estúpido só profere pensamentos vulgares de forma comum, pelo que é imediatamente entendido e aprovado por todos, ao passo que o génio tem o vício terível de se contrapor às opiniões dominantes e querer subverter, juntamente com o pensamento, a vida da maioria dos outros.
Isto explica por que as obras escritas e realizadas pelos imbecis são tão abundante e solicitamente louvadas – os juízes são, quase na totalidade, do mesmo nível e dos mesmos gostos, pelo que aprovam com entusiasmo as ideias e paixões medíocres, expressas por alguém um pouco menos medíocre do que eles.
Este favor quase universal que acolhe os frutos da imbecilidade instruída e temerária aumenta a sua já copiosa felicidade. A obra do grande, ao invés, só pode ser entendida e admirada pelos seus pares,