Passagens sobre Sonhos

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Frases sobre sonhos, poemas sobre sonhos e outras passagens sobre sonhos para ler e compartilhar. Leia as melhores citações em Poetris.

Stella

Já raro e mais escasso
A noite arrasta o manto,
E verte o Ăşltimo pranto
Por todo o vasto espaço.

Tíbio clarão já cora
A tela do horizonte,
E já de sobre o monte
Vem debruçar-se a aurora.

Ă€ muda e torva irmĂŁ,
Dormida de cansaço,
Lá vem tomar o espaço
A virgem da manhĂŁ.

Uma por uma, vĂŁo
As pálidas estrelas,
E vĂŁo, e vĂŁo com elas
Teus sonhos, coração.

Mas tu, que o devaneio
Inspiras do poeta,
NĂŁo vĂŞs que a vaga inquieta
Abre-te o Ăşmido seio?

Vai. Radioso e ardente,
Em breve o astro do dia,
Rompendo a névoa fria,
Virá do roxo oriente.

Dos Ă­ntimos sonhares
Que a noite protegera,
De tanto que eu vertera
Em lágrimas a pares,

Do amor silencioso,
MĂ­stico, doce, puro,
Dos sonhos de futuro,
Da paz, do etéreo gozo,

De tudo nos desperta
Luz de importuno dia;
Do amor que tanto a enchia
Minha alma está deserta.

A virgem da manhĂŁ
Já todo o cĂ©u domina…

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Benditas Cadeias!

Quando vou pela Luz arrebatado,
Escravo dos mais puros sentimentos
Levo secretos estremecimentos
Como quem entra em mágico Noivado.

Cerca-me o mundo mais transfigurado
Nesses sutis e cândidos momentos…
Meus olhos, minha boca vĂŁo sedentos
De luz, todo o meu ser iluminado.

Fico feliz por me sentir escravo
De um Encanto maior entre os Encantos,
Livre, na culpa, do mais leve travo.

De ver minh’alma com tais sonhos, tantos,
E que por fim me purifico e lavo
Na água do mais consolador dos prantos

Ave Dolorosa

Ave perdida para sempre – crença
Perdida – segue a trilha que te traça
O Destino, ave negra da Desgraça,
Gêmea da Mágoa e núncia da Descrença!

Dos sonhos meus na Catedral imensa
Que nunca pouses. Lá, na névoa baça
Onde o teu vulto lúrido esvoaça,
Seja-te a vida uma agonia intensa!

Vives de crenças mortas e te nutres,
Empenhada na sanha dos abutres,
Num desespero rábido, assassino…

E hás de tombar um dia em mágoas lentas,
Negrejadas das asas lutulentas
Que te emprestar o corvo do Destino!

Trova do Vento que Passa

Para AntĂłnio Portugal

Pergunto ao vento que passa
notĂ­cias do meu paĂ­s
e o vento cala a desgraça
o vento nada me diz.

Pergunto aos rios que levam
tanto sonho à flor das águas
e os rios nĂŁo me sossegam
levam sonhos deixam mágoas.

Levam sonhos deixam mágoas
ai rios do meu paĂ­s
minha pátria à flor das águas
para onde vais? Ninguém diz.

Se o verde trevo desfolhas
pede notĂ­cias e diz
ao trevo de quatro folhas
que morro por meu paĂ­s.

Pergunto Ă  gente que passa
por que vai de olhos no chĂŁo.
SilĂŞncio – Ă© tudo o que tem
quem vive na servidĂŁo.

Vi florir os verdes ramos
direitos e ao céu voltados.
E a quem gosta de ter amos
vi sempre os ombros curvados.

E o vento nĂŁo me diz nada
ninguém diz nada de novo.
Vi minha pátria pregada
nos braços em cruz do povo.

Vi meu poema na margem
dos rios que vĂŁo prĂł mar
como quem ama a viagem
mas tem sempre de ficar.

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Existem várias formas de pobreza. E há, entre todas, uma que escapa às estatísticas e aos indicadores numéricos: é a penúria da nossa reflexão sobre nós mesmos. Falo da dificuldade de nos pensarmos como sujeitos históricos, como lugar de partida e como destino de um sonho.

A Ociosidade

Assim como vemos as terras em repouso, se nédias e férteis, dar origem à proliferação de cem mil espécies de ervas selvagens e inúteis, sendo necessário, para as manter cultiváveis, domá-las e destiná-las a certas sementes por forma a que delas tiremos proveito; e assim como vemos as mulheres, que por si sós produzem informes amontoados e pedaços de carne, terem, para proporcionar uma boa e natural geração, de ser fecundadas por outra semente, assim vemos que se passa o mesmo com os nossos espíritos. Se não os ocuparmos com algum objecto que os freie e constranja, lançar-se-ão eles, desregrados, a percorrer à toa os campos bravios da imaginação:

Tal como a água que tremula em vasilhas de bronze reflecte a luz do sol ou a imagem radiante da lua, cintilações voando pelos ares e atingindo os artesoados tectos – VirgĂ­lio, Eneida

E não há loucura ou desvario que eles não produzam em tal agitação:

Inventam irreais aparições como nos sonhos dos doentes – Horácio, Ars Poetica

A alma que nĂŁo tem um ponto de mira perde-se, pois, como sĂłi dizer-se, Ă© nĂŁo estar em parte nenhuma em todo o lado estar.

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O grande sonho de todo o escritor – se o tiver – será o de nunca encontrar o leitor «ideal». Porque se o encontrasse, a sua obra morreria aĂ­. Cada leitor, com efeito, recria a obra que lĂŞ; e a perpetuidade de uma obra significará a sua perpĂ©tua recriação.

A ideia do futuro, prenhe de uma infinidade de possíveis, é pois mais fecunda do que o próprio futuro, e é por isso que há mais encanto na esperança do que na posse, no sonho do que na realidade.

Hoje

Fiz anos hoje… Quero ver agora
Se este sofrer que me atormenta tanto
Me nĂŁo deixa lembrar a paz, o encanto,
A doce luz de meu viver de outr’ora.

Tão moça e mártir! Não conheço aurora,
Foge-me a vida no correr do pranto,
Bem como a nota de choroso canto
Que a noite leva pelo espaço em fora.

Minh’alma voa aos sonhos do passado,
Em busca sempre d’esse ninho amado
Onde pousava cheia de alegria.

Mas, de repente, num pavor de morte,
Sente cortar-lhe o vĂ´o a mĂŁo da sorte…
Minha ventura sĂł durou um dia.

Essa Que Eu Hei De Amar…

Essa que eu hei de amar perdidamente um dia
será tão loura, e clara, e vagarosa, e bela,
que eu pensarei que Ă© o sol que vem, pela janela,
trazer luz e calor a essa alma escura e fria.

E quando ela passar, tudo o que eu nĂŁo sentia
da vida há de acordar no coração, que vela…
E ela irá como o sol, e eu irei atrás dela
como sombra feliz… — Tudo isso eu me dizia,

quando alguém me chamou. Olhei: um vulto louro,
e claro, e vagaroso, e belo, na luz de ouro
do poente, me dizia adeus, como um sol triste…

E falou-me de longe: “Eu passei a teu lado,
mas ias tĂŁo perdido em teu sonho dourado,
meu pobre sonhador, que nem sequer me viste!”

Neruda e García Lorca em Homenagem a Rubén Dario

Eis o texto do discurso:

Neruda: Senhoras…

Lorca: …e senhores. Existe na lide dos touros uma sorte chamada «toreio dei alimĂłn», em que dois toureiros furtam o corpo ao touro protegidos pela mesma capa.

Neruda: Federico e eu, ligados por um fio eléctrico, vamos emparelhar e responder a esta recepção tão significativa.

Lorca: É costume nestas reuniões que os poetas mostrem a sua palavra viva, prata ou madeira, e saúdem com a sua voz própria os companheiros e amigos.

Neruda: Mas nós vamos colocar entre vós um morto, um comensal viúvo, escuro nas trevas de uma morte maior que as outras mortes, viúvo da vida, da qual foi na sua hora um marido deslumbrante. Vamos esconder-nos sob a sua sombra ardente, vamos repetir-lhe o nome até que a sua grande força salte do esquecimento.

Lorca: NĂłs, depois de enviarmos o nosso abraço com ternura de pinguim ao delicado poeta Amado Villar, vamos lançar um grande nome sobre a toalha, na certeza de que vĂŁo estalar as taças, saltar os garfos, buscando o olhar que todos anseiam, e que um golpe de mar há-de manchar as toalhas. NĂłs vamos evocar o poeta da AmĂ©rica e da Espanha: RubĂ©n…

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Horas Vivas

Noite: abrem-se as flores…
Que esplendores!
CĂ­ntia sonha amores
Pelo céu.
TĂŞnues as neblinas
Ă€s campinas
Descem das colinas,
Como um véu.

MĂŁos em mĂŁos travadas,
Animadas,
VĂŁo aquelas fadas
Pelo ar;
Soltos os cabelos,
Em novelos,
Puros, louros, belos,
A voar.

— “Homem, nos teus dias
Que agonias,
Sonhos, utopias,
Ambições;
Vivas e fagueiras,
As primeiras,
Como as derradeiras
Ilusões!

— Quantas, quantas vidas
VĂŁo perdidas,
Pombas mal feridas
Pelo mal!

Anos apĂłs anos,
TĂŁo insanos,
VĂŞm os desenganos
Afinal.

— “Dorme: se os pesares
Repousares,
Vês? – por estes ares
Vamos rir;
Mortas, nĂŁo; festivas,
E lascivas,
Somos – horas vivas
De dormir!” –

FonĂłgrafo

Vai declamando um cĂ´mico defunto.
Uma platéia ri, perdidamente,
Do bom jarreta… E há um odor no ambiente.
A cripta e a pĂł, – do anacrĂ´nico assunto.

Muda o registo, eis uma barcarola:
LĂ­rios, lĂ­rios, águas do rio, a lua…
Ante o Seu corpo o sonho meu flutua
Sobre um paul, – extática corola.

Muda outra vez: gorjeios, estribilhos
Dum clarim de oiro – o cheiro de junquilhos,
VĂ­vido e agro! – tocando a alvorada…

Cessou. E, amorosa, a alma das cornetas
Quebrou-se agora orvalhada e velada.
Primavera. ManhĂŁ. Que eflĂşvio de violetas!

Vivemos da memória, que é a imaginação do que morreu; da esperança, que é a confiança no que não existe; do sonho, que é a visão do que não pode existir.

Sopra o Sonho

Sopra o sonho por dentro
Das pálpebras em viagem
Enceta o curso habitual nocturno
Num corredor sombrio de pestanas

Antes porém cumprimenta
Toda a matéria viva em que tropeça
Sabe o segredo do corpo tem uma pátria
Bioquímica extremamente embrionária

A morte já habita os seus tecidos
Quando os outros de guarda se abastecem
Pronta ao assalto das células
Como se dormisse

A que fins se destina e a que estranhos
bulĂ­cios suas Ăşltimas vontades?

NĂŁo o sabemos

SĂł mesmo o oceano o incomoda

O amor dum homem? – Terra tĂŁo pisada!
Gota de chuva ao vento baloiçada…
Um homem? – Quando eu sonho o amor dum deus!…

Sonhos

Cada dia que passa faz-me pensar
E reflectir sobre quem ele traiu,
Que enquanto viveu nada fui ganhar
Com a lama vil onde a alma caiu.

Até de meus sonhos a vida me deixa
Na maré nu, na areia, em solidão,
Desolado que, inda vivo, nĂŁo esteja
Seguindo veloz no barco da acção.

Há uma beleza no mundo exterior,
No monte ou planĂ­cie onde chega a vista
Que já é consolo à dúvida e à dor,
Mas, Oh! A beleza que o mundo conquista

Nem Palavra ou verso a pode imaginar
Nem a mente humana, sĂł por si, forjar!