Os insensatos, que acreditam serem sábios, são inimigos de si mesmos; fazem más acções, das quais, por fim, só colhem frutos amargos.
Textos sobre Ação
328 resultadosOs Meios para Sermos Felizes
É comum pensarmos que é difícil ser-se feliz e existem boas razões para assim pensar; mas seria mais fácil sermos felizes se, nos homens, as reflexões e a pauta de comportamento precedessem as acções. Somos arrastados pelas circunstâncias e entregamo-nos às esperanças, que nos proporcionam apenas metade do que esperamos. Enfim, só nos damos claramente conta dos meios para sermos felizes quando a idade e os entraves que a nós próprios pusemos lhes colocam obstáculos.
(…) Para sermos felizes, é preciso termo-nos desembaraçado dos preconceitos, seremos virtuosos, gozarmos de boa saúde, termos gostos e paixões, sermos susceptíveis de ter ilusões, pois devemos a maior parte dos nossos prazeres à ilusão, e infeliz daquele que a perder. Longe, pois, de procurarmos fazê-la desaparecer sob o archote da razão, tratemos de passar mais uma camada do verniz que ela lança sobre a maior parte dos objectos; este é-lhe ainda mais necessário do que os cuidados e os adornos o são para os nossos corpos.
É preciso começarmos por dizer a nós próprios e por convencer-nos de que não temos nada mais a fazer neste mundo, para além de nele procurarmos sensações e sentimentos agradáveis. Os moralistas que dizem aos homens «reprimi as vossas paixões e dominai os vossos desejos se desejais ser felizes» não conhecem o caminho para a felicidade.
Não é para Alarde que Devemos Desempenhar o Nosso Papel
Quem só é homem de bem porque os outros o ficarão a saber e porque o estimarão mais depois de o ficarem a saber, quem só quer agir bem na condição da sua virtude chegar ao conhecimento dos homens não é homem de quem possamos obter grandes serviços.
(…) Não é para alarde que a nossa alma deve desempenhar o seu papel; é dentro de nós, no íntimo, aonde outros olhos não chegam excepto os nossos: ali ela nos protege do temor da morte, das dores e mesmo da desonra; tranquiliza-nos contra a perda dos nossos filhos, dos nossos amigos e das nossas fortunas, e, quando a ocasião se apresenta, também nos conduz para os acasos da guerra. Não por algum proveito, mas pela honra da própria virtude (Cícero). Esse proveito é muito maior e muito mais digno de ser desejado e esperado do que as honras e a glória, que são apenas um julgamento favorável que fazem de nós.
É preciso seleccionar de uma nação inteira uma dúzia de homens para julgar sobre uma jeira de terra; e entregamos o julgamento das nossas inclinações e das nossas acções – a matéria mais difícil e mais importante que existe –
Ideais Insanos
Um homem louco é aquele cuja maneira de pensar e agir não se coaduna com a maioria dos seus contemporâneos. A sanidade mental é uma questão de estatística. Aquilo que a maioria dos Homens faz em qualquer dado lugar e período é a coisa ajuizada e normal a fazer. Esta é a definição de sanidade mental na qual baseamos a nossa prática social. Para nós, aqui e agora, são muitos os de mentalidade sã e poucos os loucos. Mas os julgamentos, aqui e agora, são por sua natureza provisórios e relativos. O que nos parece sanidade mental, a nós, porque é o comportamento de muitos, pode parecer, sub specie oeternitalis, uma loucura. Nem é preciso invocar a eternidade como testemunho. A História é suficiente. A maioria auto-intitulada de mentalmente sã, em qualquer dado momento, pode parecer ao historiador, que estudou os pensamentos e acções de inumeráveis mortos, uma escassa mão-cheia de lunáticos. Considerando o assunto de outro ponto de vista, o psicólogo pode chegar à mesma conclusão. Ele sabe que a mente consiste de tais e tais elementos, que existem e devem ser tidos em conta. Se um homem tenta viver como se certos destes elementos constituintes do seu ser não existissem,
Os Elementos Fixadores da Personalidade
Os resíduos ancestrais formam a camada mais profunda e mais estável do carácter dos indivíduos e dos povos. É pelo seu “eu” ancestral que um inglês, um francês, um chinês, diferem tão profundamente.
Mas a esses remotos atavismos sobrepõem-se elementos suscitados pelo meio social (casta, classe, profissão, etc.), pela educação e ainda por muitas outras influências. Eles imprimem à nossa personalidade uma orientação assaz constante. Será o “eu”, um pouco artificial, assim formado, que exteriorizaremos cada dia.
Entre todos os elementos formadores da personalidade, o mais activo, depois da raça, é o que determina o agrupamento social ao qual pertencemos. Fundidas no mesmo molde pelas idéias, as opiniões e as condutas semelhantes que lhes são impostas, as individualidades de um grupo: militares, magistrados, padres, operários, marinheiros, etc., apresentam numerosos carácteres idênticos.
As suas opiniões e os seus juízos são, em geral, vizinhos, porquanto sendo cada grupo social muito nivelador, a originalidade não é tolerada nele. Aquele que se quer diferenciar do seu grupo tem-no inteiramente por inimigo.
Essa tirania dos grupos sociais, na qual insistiremos, não é inútil. Se os homens não tivessem por guia as opiniões e a maneira de proceder daqueles que os cercam,
Reclamar com Espalhafato
Pelo facto de uma situação de crise (por exemplo, os vícios de uma administração, a corrupção e o favoritismo em agremiações políticas ou eruditas) ser descrita com forte exagero, essa descrição perde, na verdade, o seu efeito junto das pessoas sensatas, mas actua tanto mais fortemente sobre as que o não são (as quais teriam permanecido indiferentes ante uma exposição bem comedida). Como estas, porém, constituem uma significativa maioria e albergam em si uma maior força de vontade e um gosto mais impetuoso pela acção, esse exagero torna-se pretexto para inquéritos, punições, promessas, reorganizações. É nessa medida que é rentável descrever situações críticas em termos exagerados.
Da Poesia e da Tragédia
Parece que a poesia tem inteiramente a sua origem em duas causas, ambas naturais. Porque a imitação é natural ao homem desde a infância, e nisto difere dos outros animais, pois que ele é o mais imitador de todos, aprende as primeiras coisas por meio da imitação, e todos se deleitam com as imitações. É prova disto o que acontece a respeito dos artífices, porque nós contemplamos com prazer as imagens mais exactas daqueles mesmos objectos para que olhamos com repugnância; por exemplo, a representação de animais ferocíssimos e de cadáveres. E a razão disto é porque o aprender é coisa que muito apraz não só aos filósofos, mas também igualmente aos demais homens, posto que estes sejam menos instruídos. Por isso se alegram de ver as imagens, pois que, olhando para elas, podem aprender e discorrer o que uma delas é e dizer, por exemplo: isto é tal; porque, se suceder que alguém não tenha visto o original, não recebe então prazer da imitação, mas ou da beleza da obra, ou das cores, ou de outro algum motivo semelhante.
Sendo, pois, própria da nossa natureza a imitação, também o é a harmonia e o ritmo (porque é claro que os metros são parte do ritmo).
Os Homens sem Pé no seu Tempo
Das coisas tristes que o mundo tem, são os homens sem pé no seu tempo. Os desgraçados que aparecem assim, cedo de mais ou tarde de mais, lembram-me na vida terras de ninguém, onde não há paz possível. Imagine-se a dramática situação dum cavernícola transportado aos dias de hoje, ou vice-versa. A cada época corresponde um certo tipo humano. Um tipo humano intransponível, feito da unidade possível em tal ocasião, moldado psicològicamente, e fisiològicamente até, pelas forças que o rodeiam. A Idade Média tinha como valores Aristóteles e os doutores da Igreja. E qualquer espírito coevo, por mais alto que fosse, estava irremediàvelmente emparedado entre a Grécia sem Platão e as colunas do Templo. De nada lhe valia sonhar outro espaço de movimento. Cada inquietação realizava-se ali. O que seria, pois, um Vinci do Renascimento, multímodo, aberto a todos os conhecimentos, a bracejar dentro de tão acanhados muros?
Neste trágico século vinte, sem qualquer sério conteúdo ideológico, sem nenhuma espécie de grandeza fora do visceral e do somático, todo feito de records orgânicos e de conquistas dimensionais, que serenidade interior poderá ter alguém alicerçado em valores religiosos, estéticos, morais, ou outros? Nenhuma. Entre o abismo da sua impossibilidade natural de deixar de ser o que é,
A Antecipação da Fama Vindoura
Há homens que entregaram voluntariamente a vida visando adquirir, após a morte, um renome do qual não mais poderiam desfrutar. A sua imaginação, entrementes, antecipava a fama que lhes seria concedida em tempos vindouros. Os aplausos que jamais ouviriam soar nos seus ouvidos e os pensamentos daquela admiração, cujos efeitos jamais sentiriam, brincaram em torno dos seus corações, baniram dos seus peitos o mais forte dos medos naturais e levaram-nos a realizar acções que pareceriam quase fora do alcance da natureza humana.
A Repulsa do Poder pelo Homem de Letras
A repulsa dos poderes constituídos pelo homem de letras e pelo homem de pensamento (pois tanto a expressão racionalista do filósofo e do sociólogo como a apreensão intuitiva do real a que procede o ficcionista surgem como ameaça aos sistemas de imposição de ideias ou de coerciva persuasão), esse afastamento do intelectual inconformista, transformado assim, com raras excepções (que nalguns casos já beiram o limite da assimilação) em outsider, representa uma destruição de valores culturais, que se traduz não poucas vezes em atraso de gerações.
Evidentemente, tal relegamento do escritor para zonas de sombra acicata-o por vezes, levando-o a produções vertebradas, que são autênticos gritos da inteligência rebelde e onde não raro se derrama o melhor da capacidade imaginativa, tensa e exasperada, de períodos em que se obscurece a comunicação normal entre os homens e em que a acção do livro, reduzida embora em extensão, ganha uma acutilante qualidade crítica e concentra a dignidade de minorias advertidas culturalmente e firmes no seu espírito de resistência. Mas o saldo não deixa de ser negativo quando se considera não já tudo aquilo que o escritor suporta e sofre, mas – e sobretudo – o muito que a camada dos leitores perde pela falta de convívio efectivo com aqueles que são não,
A acção recta pesa muito menos do que o recto pensamento.
Contágio Mental
O contágio mental representa o elemento essencial da propagação das opiniões e das crenças. A sua força é, muitas vezes, bastante considerável para fazer agir o indivíduo contra os seus interesses mais evidentes. As inumeráveis narrações de martírios, de suicídios, de mutilações, etc., determinados por contágio mental fornecem uma prova disso.
Todas as manifestações da vida psíquica podem ser contagiosas, mas são, especialmente, as emoções que se propagam desse modo. As ideias contagiosas são sínteses de elementos afectivos.
Na vida comum, o contágio pode ser limitado pela acção inibidora da vontade, mas, se uma causa qualquer – violenta mudança de meio em tempo de revolução, excitações populares, etc. – vêm paralisá-la, o contágio exercerá facilmente a sua influência e poderá transformar seres pacíficos em ousados guerreiros, plácidos burgueses em terríveis sectários. Sob a sua influência, os mesmos indivíduos passarão de um partido para outro e empregarão tanta energia em reprimir uma revolução quanto em fomentá-la.
O contágio mental não se exerce somente pelo contacto direto dos indivíduos. Os livros, os jornais, as notícias telegráficas, mesmo simples rumores, podem produzi-lo.
Quanto mais se multiplicam os meios de comunicação tanto mais se penetram e se contagiam. A cada dia estamos mais ligados àqueles que nos cercam.
O Livre-Arbítrio não Existe
Contemplando uma cascata, acreditamos ver nas inúmeras ondulações, serpenteares, quebras de ondas, liberdade da vontade e capricho; mas tudo é necessidade, cada movimento pode ser calculado matemáticamente. O mesmo acontece com as acções humanas; poder-se-ia calcular antecipadamente cada acção, caso se fosse omnisciente, e, da mesma maneira, cada progresso do conhecimento, cada erro, cada maldade. O homem, agindo ele próprio, tem a ilusão, é verdade, do livre-arbítrio; se por um instante a roda do mundo parasse e houvesse uma inteligência calculadora omnisciente para aproveitar essa pausa, ela poderia continuar a calcular o futuro de cada ser até aos tempos mais distantes e marcar cada rasto por onde essa roda a partir de então passaria. A ilusão sobre si mesmo do homem actuante, a convicção do seu livre-arbítrio, pertence igualmente a esse mecanismo, que é objecto de cálculo.
Moralidade e Êxito
Não são só os espectadores de um acto que, amiúde, medem o que é moral ou imoral no mesmo, consoante o êxito: não, o próprio autor também o faz. Pois os motivos e as intenções raramente são suficientemente claros e simples, e, às vezes, a própria memória parece perturbada pelo efeito do acto, de modo que a pessoa atribui ao seu próprio acto motivos falsos ou trata como essenciais os motivos secundários. O êxito dá, muitas vezes, a um acto todo o honesto brilho da boa consciência, um malogro coloca a sombra do remorso sobre a acção mais respeitável. Daí resulta a conhecida prática do político, que pensa: «Dai-me simplesmente o êxito! Com ele, também terei posto do meu lado todas as almas honestas… e ter-me-ei tornado honesto, perante mim próprio». De maneira análoga, o êxito é suposto substituir a melhor fundamentação.
O Ingrato e o seu Oposto
O ingrato tortura-se e aflige-se a si mesmo; odeia os benefícios que recebe por ter de retribuí-los, procura reduzir a sua importância e, pelo contrário, agigantar enormemente as ofensas que lhe foram causadas. Há alguém mais miserável do que um homem que se esquece dos benefícios para só se lembrar das ofensas? A sabedoria, pelo contrário, valoriza todos os benefícios, fixa-se na sua consideração, compraz-se em recordá-los continuamente. Os maus só têm um momento de prazer, e mesmo esse breve: o instante em que recebem o benefício; o sábio, pelo seu lado, extrai do benefício recebido uma satisfação grande e perene. O que lhe dá prazer não é o momento de receber, mas sim o facto de ter recebido o benefício; isto é para ele algo de imortal, de permanente. O sábio não tem senão desprezo por aquilo que o lesou; tudo isso ele esquece, não por incúria, mas voluntariamente. Não interpreta tudo pelo pior, não procura descobrir o culpado do que lhe sucedeu, preferindo atribuir os erros dos homens à fortuna.
Não atribui más intenções às palavras ou aos olhares dos outros, antes procura dar do que lhe fazem uma interpretação benevolente. Prefere lembrar-se do bem que lhe fizeram,
Vivência Limitada
A. impossibilidade de participar de todas as combinações em desenvolvimento a qualquer instante numa grande cidade tem sido uma das dores de minha vida. Sofro como se sentisse em mim, como se houvesse em mim uma capacidade desmesurada de agir. Entretanto, na parte de ação que a vida me reserva, muitas vezes me abstenho e outras me confundo. […] A ideia de que diariamente, a cada hora, a cada minuto e em cada lugar se realizam milhares de ações que me teriam profundamente interessado, de que eu certamente deveria tomar conhecimento e que entretanto jamais me serão comunicadas — basta para tirar o sabor a todas as perspectivas de ação que encontro à minha frente. O pouco que eu pudesse obter não compensaria jamais esse infinito perdido. Nem me consola o pensamento de que, entrando na confrontação simultânea de tantos acontecimentos, eu não pudesse sequer registrá-los, quanto mais dirigi-los à minha maneira ou mesmo tomar de cada um o aspecto singular, o tom e o desenho próprios, uma porção, mínima que fosse, de sua peculiar substância.
Vence a Tua Inércia!
O destino que nos oprime é a inércia do nosso espírito. Através do alargamento e formação da nossa actividade transmutamo-nos, nós próprios, em Destino.
Tudo parece fluir para nós vindo do exterior, porque nós não fluímos para o exterior. Somos negativos, apenas, porque o queremos – quanto mais positivos nos tornarmos, mais negativo será o mundo à nossa volta – até que, por fim, já não haverá negação e nós seremos tudo em tudo.
Deus quer deuses.
Se o nosso corpo, em si mesmo, não é senão um centro de acção comum dos nossos sentidos – se nós possuímos o domínio dos nossos sentidos – se os podemos fazer agir à vontade – se os podemos centrar em comunidade, então não depende senão de nós o darmos a nós próprios o corpo que queremos.
Sim, se os nossos sentidos não são senão modificações do órgão pensante – do elemento absoluto – então poderemos, também, pela dominação deste elemento, modificar e dirigir, como nos agradar, os nossos sentidos.
O Tabu e a Metáfora
A metáfora é provavelmente a potência mais fértil que o homem possui. A sua eficiência chega a raiar os confins da taumaturgia e parece uma ferramenta de criação que Deus deixou esquecida dentro de uma das suas criaturas na ocasião em que a formou, como o cirurgião distraído deixa um instrumento no ventre do operado.
Todas as demais potências nos mantêm inscritos no interior do real, do que já é. O mais que podemos fazer é somar ou subtrair as coisas entre si. Só a metáfora nos facilita a evasão e cria entre as coisas reais recifes imaginários, floração de leves ilhas.
É verdadeiramente estranha a existência no homem desta actividade mental que consiste em substituir uma coisa por outra, não tanto no esforço de chegar à segunda como no intento de esquivar a primeira. A metáfora escamoteia um objecto mascarando-o por meio de outro, e não teria sentido se não víssemos nela um instinto que induz o homem a evitar as realidades.
Ao interrogar-se sobre qual poderia ser a origem da metáfora, um psicólogo recentemente descobriu, surpreendido, que uma das suas raízes se encontra no espírito do tabu. Houve uma época em que o medo foi a máxima inspiração humana,
O que é Dar a Vida?
Dar a vida é amar. Abdicar de si… em favor de um outro. Vencer egoísmos e medos com a convicção de que dar-se nunca é um excesso nem uma cobardia.
Dar a vida é perder-se para se encontrar. Entregar-se para se receber… É aparecer, sair de si até ao ponto de se poder ver bem diante dos próprios olhos.
Dar a vida é vivê-la tal como ela é na essência: generosa! Ser mais vida na vida de outro alguém. Cuidar da existência do outro com a sua… dar a vida é ser outro. Melhor. Muito.
Dar a vida é ser um sorriso apenas com um olhar. É oferecer lágrimas a quem já perdeu as suas. Ser um silêncio onde há paz… e uma melodia que revela que o melhor do mundo repousa em nós… à espera de nós.Dar a vida é reconhecer a beleza que há neste mundo. No outro e no mundo do outro. É contribuir para o equilíbrio e ficar em harmonia… com tudo e com cada coisa, compreendendo que a verdadeira alegria é a coisa mais séria da vida.
Dar a vida é guardar-se para o momento oportuno,
Nada Vence as Paixões Profundas de Cada Um
As paixões opõem-se às paixões, e podem servir de contrapeso umas às outras; mas a paixão dominante não se pode conduzir senão pelo seu próprio interesse, real ou imaginário, porque ela reina despoticamente sobre a vontade, sem a qual nada se pode. Contemplo humanamente as coisas, e acrescento nesse espírito: nem todo o alimento é próprio para todos os corpos; nem todos os objetos são suficientes para tocar determinadas almas. Quem acredita serem os homens árbitros soberanos dos seus sentimentos não conhece a natureza; consiga-se que um surdo se divirta com os sons encantadores de Mureti, peça-se a uma jogadora, que está a jogar uma grande partida, que tenha a complacência e a sabedoria de se enfadar durante a mesma, nenhuma arte pode fazê-lo.
Os sábios enganam-se quando oferecem a paz às paixões: as paixões são inimigas dela. Eles elogiam a moderação para aqueles que nasceram para a acção e para uma vida agitada; que importa a um homem doente a delicadeza de um festim que lhe repugna? Nós não conhecemos os defeitos de nossa alma; mas ainda que pudéssemos conhecê-los, raramente haveríamos de os querer vencer.
As nossas paixões não são distintas de nós mesmos; algumas delas são todo o fundamento e toda a substância da nossa alma.