Textos sobre Desejos

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Textos de desejos escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

De Palavras Está o País Farto

Governe-se com o parlamento, é esse o meu maior desejo, mas para isso é necessário que ele também faça alguma coisa. É preciso obras e não palavras. De palavras, bem o sabemos, está o País farto. Não quer discussões políticas das quais pouco ou nenhum bem lhe virá, o que quer é que se discuta administração, que se discutam medidas que lhe sejam úteis. Assim poderá o País interessar-se pelo parlamento; com discussões de mera política, interessará os amadores de escândalos vários, esses sim, mas fará com que a parte sensata e trabalhadora do País se desinteresse por completo daquilo que para nada lhe servirá. Por estes motivos é que eu acho inútil para não dizer… perniciosa, uma nova abertura do parlamento.

O Homem é um Deus que se Ignora

Dentro do homem existe um Deus desconhecido: não sei qual, mas existe – dizia Sócrates soletrando com os olhos da razão, à luz serena do céu da Grécia, o problema do destino humano. E Cristo com os olhos da fé lia no horizonte anuveado das visões do profeta esta outra palavra de consolação – dentro do homem está o reino dos céus. Profundo, altíssimo, acordo de dois génios tão distantes pela pátria, pela raça, pela tradição, por todos os abismos que uma fatalidade misteriosa cavou entre os irmãos infelizes, violentamente separados, duma mesma família! Dos dois pólos extremos da história antiga, através dos mares insondáveis, através dos tempos tenebrosos, o génio luminoso e humano das raças índicas e o génio sombrio, mas profundo, dos povos semíticos se enviam, como primeiro mas firme penhor da futura unidade, esta saudação fraternal, palavra de vida que o mundo esperava na angústia do seu caos – o homem é um Deus que se ignora.
Grande, soberana consolação de ver essa luz de concórdia raiar do ponto do horizonte aonde menos se esperava, de ver uma vez unidos, conciliados esses dois extremos inimigos, esses dois espíritos rivais cuja luta entristecia o mundo, ecoava como um tremendo dobre funeral no coração retalhado da humanidade antiga!

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Realização e Êxtase

Conviria distinguir bem um do outro o caminho para o êxtase e o próprio êxtase; o primeiro ainda pode ter algum interesse por todas as lutas interiores, por todas as incertezas, por todo o esforço de pensar amplamente a que em geral dá origem; no entanto já nele mesmo poderíamos ver, além de uma preocupação egoísta, uma alternativa de esperança e desespero, um gosto da revelação e dos auxílios sobrenaturais que não poderão talvez classificar-se como superiores.
Do êxtase, porém, não alimentamos grandes desejos; o amor que nele descobrimos não pertence à categoria do amor que mais nos interessa — o que eleva o amado acima de si próprio, o que se esforça por esculpir uma alma com entusiasmo e paciência; é um amor a que se chega como recompensa de tarefa cumprida; não marca as delícias do caminho difícil, apaga-as da memória; faz desaparecer do peito do homem o seu único motivo de alegria, a sua única fonte de verdadeira glória.
Viver interessa mais que ter vivido; e a vida só é vida real quando sentimos fora de nós alguma coisa de diferente; se a diferença se tornar oposição, se o que era caminho diverso se transformar em muro de rocha,

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A Paz Causa as Impaciências do Desejo

Jantar alegremente numa horta, debaixo das parreiras, vendo correr a água das regas – chorar com os melodramas que rugiam entre os bastidores do Salitre, alumiados a cera, eram contentamentos que bastavam à burguesia cautelosa. Além disso, os tempos eram confusos e revolucionários: e nada torna o homem recolhido, aconchegado à lareira, simples e facilmente feliz – como a guerra. É a paz que, dando os vagares da imaginação – causa as impaciências do desejo.

O Isolamento do Criador

Há uma sensação de infidelidade na comunicação. Essa verificação faz com que o criador esteja sempre insatisfeito, dominado pelo desejo de fazer cada vez melhor, porque há um fracasso imanente em toda a criação. Essa verificação pode levar a uma tentativa interminável ou ao isolamento pelo silêncio. Mas para o criador o isolamento é a sua oficina.

Todos os grandes males que os homens causam uns aos outros, por força de certas intenções, desejos, opiniões ou princípios religiosos, são devidos por igual à existência, pois que nascem da ignorância, que é a carência da sabedoria.

Ser Feliz

Ser feliz é ter futuro e é dar futuro. Todos pensamos ser felizes e acordamos todos os dias com esse desejo. Mas ser feliz não é uma sorte, nem é ausência de problemas. É viver com sentido, com coragem, construindo o futuro e dando futuro. Isso depende de mim.

Era uma vez um homem que corria e corria pela vida… A vida era curta e necessitava de correr muito para gozar muito e ser feliz. E quanto mais corria, mais necessitava de correr! Descobria sempre mais lugares para visitar! Necessitava encontrar tudo e gozar de tudo. Até que um dia, cansado de tanto correr, parou. Então, a felicidade pôde alcançá-lo.

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Os Homens são como as Crianças

A atitude que nós temos para com as crianças é a atitude que o sábio tem para com todos os homens, que são pueris mesmo após a idade madura e os cabelos brancos. O que terão progredido estes homens, cujos males da sua alma apenas se tornaram em maiores males, que em forma e grandeza corporais tanto diferem das crianças, mas que em tudo o resto não são menos ligeiros e inconstantes, correndo atrás dos desejos sem reflectirem, agitados e que quando se aquietam é por medo, não por engenho seu?
Diria que aquilo que distingue as crianças dos homens é que a avidez das crianças é por dados, nozes e pequenas moedas de ouro, enquanto que a dos homens é pelo ouro e pela prata das cidades; uns imaginam magistrados entre eles mesmos e imitam a toga, o facho e o tribunal, os outros jogam os mesmos jogos, mas a sério, no Campo de Marte, no Fórum e na Cúria; uns, amontoando areia à beira-mar, constroem simulacros de casas, os outros, como quem executa uma grande obra, trabalhando a pedra na construção de paredes e tectos, fazem aquilo que os devia abrigar um verdadeiro perigo. Por isso, entre crianças e homens-feitos o erro é igual,

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O Desejo Comanda a Vida

A vida é curta e tediosa: passa-se inteira no desejar. Adiam-se para o futuro o repouso e as alegrias, muitas vezes até à idade em que os melhores bens, a saúde e a juventude, já desapareceram. Essa época chega e ainda nos surpreende em meio a desejos; estamos nesse ponto quando a febre nos arrebata e extingue: caso nos curássemos, seria apenas para desejarmos por mais tempo.

Nasci de Novo

Terminei o poema e levei-te o terceiro acto. Conduziste-me junto da cadeira, defronte do canapé, abraçaste-me e disseste: «Agora já não desejo mais nada na vida». Nesse dia, a essa precisa hora, nasci de novo. Até então fora uma vida preparatória. Depois começou a minha vida póstuma. Mas nesse momento maravilhoso vivi o meu presente. Sabes bem como o recebi: não sobreexcitado, tempestuoso, inebriado, mas solenemente o recebi, doce, calorosa e profundamente perturbado, e como que olhando o infinito diante de mim. Cada vez me desligara mais dolorosamente do Mundo. Tudo em mim se tornara negação, recusa. As minhas próprias criações eram-me apenas sofrimento, nostalgia, e um insaciável desejo de opor a essa negação, a essa nostalgia, uma afirmação – além de poder desdobrar-me num outro eu. Esse momento único concedeu-mo. Uma mulher terna, tímida, receosa, lançou-se corajosamente no oceano do sofrimento para me oferecer esse instante adorável. Para me dizer: amo-te. Foi como se te tivesses dedicado à morte para me dares a vida; e eu recebi a vida para contigo sofrer e morrer.

A Educação da Fé

Sendo a fé um dom, como pode ser motivo de educação? Não pode realmente ser ensinada, mas sim irradiada. Os que a possuem podem significar a estrela-guia, a perseverança num encontro difícil de suceder, mas cuja esperança comove todo o nosso ser. É possível que a Igreja se volte para esse apostolado da fé que foi extremamente importante no seu começo. Não o velho sistema de grupos sectários que são o modelo dos processos políticos e que, quando se afirma um movimento e este toma amplitude, se eliminam. Não é isso. Trata-se de focos de comunicação que dispensam a organização premeditada e até a linguagem elaborada, o discurso piedoso e a erudição duma exegese. Um interessar a alma na fé sem recorrer ao preconceito da santidade. Descobrir a imensa novidade da fé num mundo em que o próprio cristão vive de maneira pagã e singularmente a coberto dos antigos textos que esqueceu ou que desconhece completamente.

A prova de que o cristão vive como um bárbaro é o sentido que tomou a arte religiosa. Não é raro encontrar nas salas de convívio burguesas, juntamente com a televisão, ou a mesa de jogo, ou a instalação estereofónica para o gira-disco,

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O Perigo da Extinção do Individualismo

Ao contemplar nas grandes cidades essas imensas aglomerações de seres humanos, que vão e vêm pelas suas ruas ou se concentram em festivais e manifestações políticas, incorpora-se em mim, obsedante, este pensamento: pode hoje um homem de vinte anos formar um projecto de vida que tenha figura individual e que, portanto, necessitaria realizar-se mediante as suas iniciativas independentes, mediante os seus esforços particulares? Ao tentar o desenvolvimento desta imagem na sua fantasia, não notará que é, senão impossível, quase improvável, porque não há à sua disposição espaço em que possa alojá-la e em que possa mover-se segundo o seu próprio ditame? Logo advertirá que o seu projecto tropeça com o próximo, como a vida do próximo aperta a sua. O desânimo leva-lo-á com a facilidade de adaptação própria da sua idade a renunciar não só a todo o acto, como até a todo o desejo pessoal e buscará a solução oposta: imaginará para si uma vida standard, composta de desideratos comuns a todos e verá que para consegui-la tem de a solicitar ou exigir em coletividade com os demais. Daí a acção em massa.
A coisa é horrível, mas não creio que exagera a situação efectiva em que se vão achando quase todos os europeus.

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Deixo-me Ir Como Me Apraz

A ciência e a verdade podem residir em nós sem juízo, e este pode habitar-nos desacompanhado delas: o reconhecimento da própria ignorância é um dos mais belos e seguros testemunhos de juízo que conheço. Não tenho outro sargento para pôr em ordem os meus escritos além da fortuna. À medida que as divagações me ocorrem, eu as empilho; ora se atropelam em bando, ora se dispõem em fila. Quero que todos vejam o meu passo natural e simples, por irregular que ele seja. Deixo-me ir como me apraz, e estes não são assuntos que não seja permitido a um homem ignorar ou tratar de maneira ligeira e casual
Bem que eu desejaria ter conhecimento mais perfeito das coisas, mas não quero comprá-lo por ser muito caro. O meu desejo é passar airada e não laborosiamente o tempo que me resta de vida. Bem nenhum existe que seja capaz de levar-me a quebrar a cabeça por ele, nem mesmo a ciência, por valiosa que seja. Não procuro nos livros senão alcançar prazer mediante um divertimento honesto, ou, se estudo, não busco senão a ciência que trata do conhecimento de nós próprios, e que me ensina a morrer e a viver bem.

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O Medo De Nós Próprios

Acredito que se um homem vivesse a sua vida plenamente, desse forma a cada sentimento, expessão a cada pensamento, realidade a cada sonho, acredito que o mundo beneficiaria de um novo impulso de energia tão intenso que esqueceríamos todas as doenças da época medieval e regressaríamos ao ideal helénico, possivelmente até a algo mais depurado e mais rico do que o ideal helénico. Mas o mais corajoso homem entre nós tem medo de si próprio. A mutilação do selvagem sobrevive tragicamente na autonegação que nos corrompe a vida. Somos castigados pelas nossas renúncias. Cada impulso que tentamos estrangular germina no cérebro e envenena-nos. O corpo peca uma vez, e acaba com o pecado, porque a acção é um modo de expurgação. Nada mais permanece do que a lembrança de um prazer, ou o luxo de um remorso. A única maneira de nos livrarmos de uma tentação é cedermos-lhe. Se lhe resistirmos, a nossa alma adoece com o anseio das coisas que se proibiu, com o desejo daquilo que as suas monstruosas leis tornaram monstruoso e ilegal. Já se disse que os grandes acontecimentos do mundo ocorrem no cérebro. É também no cérebro, e apenas neste, que ocorrem os grandes pecados do mundo.

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O Amor não se Promete

Há uma distância fundamental entre as palavras e os gestos de cada homem. As palavras prometem mundos, os gestos constroem-nos. As palavras esclarecem pouco, os gestos definem quase tudo.

O amor é um projeto, uma construção que necessita de ser realizada a cada dia. Sem grandes discursos. Qualquer hora é tempo de amar. Se o amor é verdadeiro, não há tempos de descanso, porque o silêncio no coração dos que buscam lutar contra as trevas dos egoísmos é a paz mais profunda e o maior descanso… ainda que se cravem espinhos na carne, ainda que não sarem as feridas antigas, ainda que a esperança tenha pouco mais onde se apoiar do que nela própria.

Cada um de nós é aquilo que for capaz de ir construindo de firme e duradouro a cada dia por entre todas as tempestades da vida.
Há muito quem sonhe e passe o tempo a desejar o que não é… esperam e desesperam por algo que lhes há de chegar de fora… rejeitando quase tudo quanto são, quando, na verdade, é com o que temos e somos que devemos ser felizes, por pouco e por pior que seja… somos nós. Mas nós não somos quem somos só para nós mesmos.

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Religião do Medo

Com o homem primitivo é o medo acima de tudo que evoca noções religiosas — medo da fome, das feras, da doença, da morte. Como neste estado de existência o conhecimento das relações causais está usualmente pouco desenvolvido, a mente humana cria seres ilusórios mais ou menos semelhantes a si própria de cujos desejos e actos dependem esses acontecimentos assustadores. Por isso, tentamos obter o favor destes seres realizando acções e oferecendo sacrifícios que, de acordo com as tradições passadas de geração em geração, os tornam favoráveis ou bem dispostos em relação aos mortais. Neste sentido, estou a falar de uma religião do medo. Isto, apesar de não ter sido criado, é em alto grau estabilizado pela criação de uma casta sacerdotal especial que se institui a si mesma como mediadora entre as pessoas e os seres que elas receiam e ergue uma hegemonia assente nisso. Em muitos casos, um líder, um governante ou uma classe privilegiada, cuja posição assenta noutros factores, combinam as funções sacerdotais com a sua autoridade secular, de modo a garantirem mais firmemente a primeira, ou os governantes políticos e a casta sacerdotal defendem a mesma causa para defenderem os próprios interesses.

Entendimento Apaixonado

Mau grado o que dizem os moralistas, o entendimento humano deve muito às paixões, que, de comum acordo, também lhe devem muito: é pela sua actividade que a nossa razão se aperfeiçoa; só procuramos conhecer porque desejamos gozar; e não é possível conceber porque aquele que não tivesse desejos nem temores se desse ao trabalho de raciocinar. As paixões, por sua vez, originam-se a partir das nossas necessidades, e o seu progresso dos nossos conhecimentos; porque só podemos desejar ou temer coisas segundo as ideias que temos delas, ou pelo simples impulso da natureza; e o homem selvagem, privado de toda a sorte de luzes, só experimenta as paixões dessa última espécie; os únicos bens que conhece no universo são a sua nutrição, uma fêmea e o repouso; os únicos males que teme são a dor e a fome. Digo a dor, e não a morte; porque jamais o animal saberá o que é morrer; e o conhecimento da morte e dos seus terrores foi uma das primeiras aquisições que o homem fez afastando-se da condição animal.

A Crença é Baseada no Desejo

A influência dos nossos desejos sobre as nossas crenças é do conhecimento e da observação de todos, mas a natureza dessa influência é, em geral, muito mal interpretada. É costume supor que a massa das nossas crenças provém de alguma base racional e que o desejo é apenas uma força perturbadora ocasional. Exactamente o oposto se aproximaria mais da verdade: a grande massa de crenças pela qual somos amparados na nossa vida diária é apenas projecção do desejo, corrigida aqui e ali, em pontos isolados, pelo rude choque dos factos.