Textos sobre Sempre

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Textos de sempre escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

O Destino de Cada Homem é o Seu Maior Prazer

No ser vivo toda a necessidade essencial, que brota do próprio ser e não lhe advém de fora acidentalmente, vai acompanhada de voluptuosidade. A voluptuosidade é a cara, a facies da felicidade. E todo o ser é feliz quando satisfaz o seu destino, isto é, quando segue a encosta da sua inclinação, da sua necessidade essencial, quando se realiza, quando está a ser o que é na verdade. Por esta razão Schlegel dizia, invertendo a relação entre voluptuosidade e destino: «Para o que nos agrada temos génio». O génio, isto é, o dom superlativo de um ser para fazer alguma coisa tem sempre simultaneamente uma fisionomia de supremo prazer. Num dia que está próximo e graças a uma transbordante evidência vamo-nos ver surpreendidos e obrigados a descobrir o que agora somente parecerá uma frase: que o destino de cada homem é, ao mesmo tempo, o seu maior prazer.

O Que Devemos Sentir

Todas as pessoas devem ter experimentado a sensação desagradável que se tem nas estações de caminho de ferro. Vamos despedir-nos de alguém. A pessoa já entrou no comboio, mas ele demora a partir. Ali ficam as duas pessoas, uma na plataforma e a outra à janela, esforçando-se por conversar, mas de repente não têm nada para dizer.
Isto, evidentemente, resulta de não podermos sentir o que queremos. A situação impõe-nos um determinado sentimento. E quem não experimentou aquele tremendo alívio quando o comboio finalmente parte?
Ou nos funerais. Quando alguém morre ou adoece, quando surgem as desilusões, espera-se sempre que sintamos determinadas coisas.
Em todas as situações, excepto as mais quotidianas, as mais neutras, há uma pressão que se exerce sobre nós, que nos dita a forma como devemos conduzir-nos, aquilo que devemos sentir, E se examinarmos bem o fenómeno, verificamos, não raras vezes, que esses papéis nos são atribuídos por romances, filmes ou peças de teatro que vimos há muito tempo.
Quando somos realmente confrontados com situações invulgares (por exemplo, rivalidades que prevíamos e não se verificam, e em vez disso se transformam num amor que nos deixa sós), a primeira coisa a que nos agarramos são esses padrões sentimentais livrescos.

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Uma Nação Sem Ideal Desaparece Rapidamente da História

Qualquer que seja a raça ou o tempo considerado, o objectivo constante da atividade humana foi sempre a pesquisa da felicidade, a qual consiste, em última análise, ainda o repito, em procurar o prazer e evitar a dor. Sobre essa concepção fundamental os homens estiveram constantemente de acordo; as suas divergências aplicam-se somente à idéia que se concebe da felicidade e aos meios de a conquistar.
As suas formas são diversas, mas o termo que se tem em mira é idêntico. Sonhos de amor, de riqueza, de ambição ou de fé são os possantes factores de ilusões que a natureza emprega para conduzir-nos aos seus fins. Realização de um desejo presente ou simples esperança, a felicidade é sempre um fenómeno subjectivo. Desde que os contornos do sonho se implantam um pouco no espírito, com ardor nós tentamos obtê-lo.
Mudar a concepção da felicidade de um indivíduo ou de um povo, isto é, o seu ideal, é mudar, ao mesmo tempo, a sua concepção da vida e, por conseguinte, o seu destino. A história não é mais do que a narração dos esforços empregues pelo homem para edificar um ideal e destruí-lo em seguida, quando, tendo-o atingido, descobre a sua fragilidade.

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A Morte Está atrás do Teu Beijo

A morte está atrás do teu beijo,
e não me interessa nada que não me possa matar.

Não quero trajectos sem calhaus, pessoas sem problemas, muito menos glórias sem lágrimas. Não quero o tédio de só continuar, a obrigação de suportar, andar na rotina só por andar. Não quero o vai-se andando, o é a vida, o tem de ser, nada que não me ponha a gemer. Não quero o prato sempre saudável, a saladinha impoluta, a cama casta, o sexo virgem. Não quero o sol o dia todo, a recta sem a mínima curva, não quero o preto liso nem o branco imaculado, não quero o poema perfeito nem a ortografia ilesa. Não quero aprender apenas com o professor, a palmadinha nas costas, o vá lá que isso passa, a microssatisfação, a minúscula euforia. Não quero os lábios sem língua, a língua sem prazer, fugir do que mete medo, e até acomodar-me ao que me faz doer. Quero o que não cabe no regular, o que não se entende nos manuais, o que não acontece nos guiões. Quero a ruga esquisita, a mão descuidada, a estrada arriscada, a chuva, o vento, as unhas cravadas, o animal do instante.

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A Coragem do Sonhador

Sempre que nos assumimos como “sonhadores”, ficamos mais perto de tornar qualquer sonho em realidade e de inspirar quem quer que seja com essa nossa conquista, como tal, é de louvar quem carrega esta palavra na boca e o seu significado no peito. Sonhar está ao alcance de todos, é um facto, mas poucos o fazem pois poucos são aqueles que o assumem como uma extensão de si mesmos. Quantas pessoas afirmam que têm um sonho? Poucas, muito poucas, e muitas dessas poucas nem chegam a fazer nada para concretizá-lo, ou seja, sobrevivem uma vida inteira sem sonhar, agarrados à miséria a que a preguiça os obriga. Admiro, particularmente, quem se assume como um sonhador, quem admite que o sonho é uma realidade na sua vida, quem se permite levantar os pés do chão e enveredar por caminhos desconhecidos. Nenhum sonho se encontra no fim de um caminho feito por muita gente; o caminho para o teu sonho está cândido, à espera das tuas primeiras pegadas, por isso uma coisa te garanto, quanto mais verbalizares esta palavra, mais a tua mente se desmente e se entrega, mais o corpo acredita, mais forma ele ganha e mais sentido encontrarás nesta experiência.

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Gerir o Êxito

Deixa triunfar à vontade aqueles que praticaram verdadeiras proezas e merecem uma glória autêntica, sem reivindicares uma parte dos louvores: essa glória resplandecerá tanto melhor sobre ti se a ela se juntar a de te teres mostrado acima da inveja.
Atribui a outrém os teus êxitos. Por exemplo, a uma pessoa experiente que te tenha ajudado com a sua previdência e as suas opiniões prudentes.
Disfarça o orgulho pelos teus êxitos, não modifiques a maneira como falas ou como te vestes, nem os teus hábtios à mesa. Ou pelo menos, se alguma coisa tiveres de modificar nestes domínios, que seja por uma boa tazão que todos compreendam.
Se trinufares sobre um adversário, não cedas à tentação de o insultar excessivamente.
Não troces dos teus rivais, evita provocá-los e, sempre que saíres vencedor, contenta-te com o prazer da vitória sem te glorificares em palavras ou acções.

Cada Cabeça, Cada Sentença

A ideia de ninguém ter razão (haja ou não haja pão) é portuguesíssima. Sobre qualquer assunto, Portugal garante-nos sempre pelo menos dez milhões de razões, cada uma com a sua diferençazinha, cada uma com a sua insolenciazeca do “eu cá é que sei”. Não há neste abençoado território um único sujeito, seja eu ou ele cego, surdo e mudo, que não reclame a sua inobjectivável subjectividade. Lá diz o raio do povo, por tratar-se da única coisa em que o povo todo está de acordo, «Cada cabeça, cada sentença». Basta fazer-se uma reunião ou um júri, um governo ou uma comissão, para assistir-se ao milagre da multiplicação das opiniões.

O Amolecimento pela Sociedade de Consumo

Nos países subdesenvolvidos, a arte (literatura, pintura, escultura) entra quase sempre em conflito com as classes possidentes, com o poder instituído, com as normas de vida estabelecidas. Em revolta aberta, o artista, originário por via de regra da média e da pequena burguesia ou mais raramente das classes proletárias, contesta o statu quo, propõe soluções revolucionárias ou, quando estas não podem sequer divisar-se, limita-se a derruir (ou a tentar fazê-lo pela crítica, violenta ou irónica) o baluarte dos preconceitos, das defesas que os beneficiários do sistema de produção ergueram contra as aspirações da maioria. Nas sociedades industriais mais adiantadas, o artista pode permanecer numa atitude idêntica de inconformismo; porém, os resultados da sua actividade de criação e reflexão tornam-se matéria vendável e, nalguns casos, matéria integrável.
O consumo do objecto artístico, seja ele o livro, o quadro ou o disco, quando feito sob uma tutela de opinião, que os meios de comunicação de massa, em escala larguíssima , exercem, torna-se, senão totalmente inócuo, pelo menos parcialmente esvaziado do seu conteúdo crítico. Despotencializa-se. Amolece. É o que se verifica, por exemplo, em boa parte, nos Estados Unidos. A ideologia repressiva da liberdade no mundo capitalista monopolista torna-se tanto mais perigosa quanto aborve,

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O Engano do Imediato

É preciso dominar a impressão produzida pelo que é visível e presente; tal impressão tem uma força extraordinária se for confrontada com o que é meramente pensado e sabido, não em virtude de sua matéria e seu conteúdo, frequentemente insignificantes, mas da sua forma, da clareza e do imediatismo por meio dos quais ela se impõe ao espírito, perturbando a sua paz ou até mesmo fazendo vacilar os seus propósitos. É assim que algo agradável, ao qual renunciamos depois de reflectir, nos estimula quando o temos diante dos olhos; assim nos magoa um julgamento cuja incompetência é do nosso conhecimento, irrita-nos uma ofensa cujo carácter desprezível compreendemos; da mesma maneira, dez razões contra a existência de um perigo são sobrepujadas pela falsa aparência da sua real presença etc.

(…) Quando todos os que nos circundam têm uma opinião diferente da nossa e se comportam em conformidade com ela, é difícil não ficarmos abalados, por mais que estejamos convencidos do erro dessas pessoas. Pois o que é presente, o visível, por estar facilmente ao alcance da vista, age sempre com toda a sua força; em contrapartida, pensamentos e causas requerem tempo e calma para serem analisados com cuidado, razão pela qual não podemos tê-los presentes a todo o instante.

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A Fronteira Entre a Amizade e o Amor

Há na pura amizade um prazer a que não podem atingir os que nasceram medíocres. A amizade pode subsistir entre pessoas do mesmo sexo a diferentes, isenta mesmo de toda a materialidade. Uma mulher, entretanto, olha sempre um homem como um homem; e reciprocamente, um homem olha uma mulher como uma mulher; essa ligação não é paixão nem pura amizade: constitui uma classe aparte.
O amor nasce bruscamente, sem outra reflexão, por temperamento, ou por fraqueza: um detalhe de beleza nos fixa, nos determina. A amizade, pelo contrário, forma-se pouco a pouco, com o tempo, pela prática, por um longo convívio. Quanta inteligência, bondade, dedicação, serviços e obséquios, nos amigos, para fazer, em anos, muito menos do que faz, às vezes, num minuto, um rosto bonito e uma bela mão!
O tempo, que fortalece as amizades, enfraquece o amor. Enquanto o amor dura, subsiste por si, e às vezes pelo que parece dever extingui-lo: caprichos, rigores, ausência, ciúme; a amizade, pelo contrário, precisa de alento: morre por falta de cuidados, de confiança, de atenção. É mais comum ver um amor extremo que uma amizade perfeita.
O amor e a amizade excluem-se um ao outro. Aquele que teve a experiência de um grande amor descuida a amizade;

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Nunca Aprendi a Viver

De repente eu me vi e vi o mundo. E entendi: o mundo é sempre dos outros. Nunca meu. Sou o pária dos ricos. Os pobres de alma nada armazenam. A vertigem que se tem quando num súbito relâmpago-trovoada se vê o clarão do não entender. EU NÃO ENTENDO! Por medo da loucura, renunciei à verdade. Minhas idéias são inventadas. Eu não me responsabilizo por elas. O mais engraçado é que nunca aprendi a viver. Eu não sei nada. Só sei ir vivendo. Como o meu cachorro. Eu tenho medo do ótimo e do superlativo. Quando começa a ficar muito bom eu ou desconfio ou dou um passo para trás. Se eu desse um passo para a frente eu seria enfocada pelo amarelado de esplendor que quase cega.

Descer ao Nível do Outro

Há certas pessoas de certo estofo ou carácter com as quais nunca nos devemos meter, das quais não nos devemos queixar senão o menos que pudermos, contra as quais não é permitido termos razão.
Entre duas pessoas que tiveram uma violenta discussão, na qual uma tem razão e a outra não, o que a maior parte das pessoas que assistiram à discussão nunca deixam de fazer, para se dispensarem de julgar, ou por temperamento que sempre me pareceu deslocado, é condenar os dois: lição importante, motivo urgente e indispensável para fugir a oriente quando o tolo está no ocidente, a fim de evitar dividir com ele o mesmo agravo.

A Felicidade Reside Sempre no Futuro ou no Passado

A sedutora miragem do distante mostra-nos paraísos que desvanecem, semelhantes a ilusões de óptica, assim que nos deixamos arrebatar por ela. A felicidade reside sempre, portanto, no futuro, ou ainda no passado, e o presente parece ser uma nuvenzinha escura que o vento empurra sobre a planície ensolarada; na frente e atrás dela, tudo é claro; sozinha, não cessa ela própria de projectar uma sombra.

Pensamento e Acção

O movimento não é progresso, assim como a actividade não é realização. O esquilo na sua gaiola rotativa faz movimento e mostra actividade sem chegar a parte alguma. Quem se deixa ir ao sabor das ondas pode ter grande actividade mas mover-se para trás. A sua energia pode dissipar-se, como o vapor de água no espaço vazio, se falar demais sobre os seus planos. Seja um executor, não um falador.
«Pense», sim, mas não divague até outra pessoa pensar, resolver e agir. O homem que tem de ser convencido a agir antes de entrar em actividade não é um homem de acção… tem de agir conforme respira. Proceda como se fosse impossível falhar. Só as suas acções determinam e mostram o seu valor. Se ficar recostado e quieto a ver o mundo passar – o mundo passa mesmo. Não há nenhuma força do destino a planear a vida dos homens. O que nos sucede, de bom ou de mau, é quase sempre o resultado da nossa acção ou da falta dela. A acção é a base de qualquer realização.

A Raiz do Vício

Um vício, apesar de ser uma terrível dependência e um péssimo hábito, é um escape maravilhoso e uma profunda ilusão acerca do «sentir bem». Quando não tens nada para fazer ou não sabes como te acalmar fumas uns cigarros ou coisas do género, entopes-te de comida, bebes uns copos e assim andas sempre ocupado e falsamente tranquilo, pois após o efeito seja do que for voltas ao mesmo estado em que te encontravas. Perdão, não me fiz entender bem: fumas sem vontade de fumar, comes sem vontade de comer e bebes sem vontade de beber. Isto é ser viciado, é pura poluição, sobretudo quando não existe um desejo natural de fazê-lo. Esclarecido? Ótimo. Já percebeste o teu desafio? Não, não é deixares de ser um viciado, isso não é um problema porque tens consciência que o és, logo, podes mudar quando entenderes apaixonar-te por ti, o problema é outro e, se queres saber, bem mais sério. Consegues descobri-lo? Era excelente se o dissesses antes de me leres: significaria que também já estarias consciente disso e, nesse sentido, deixaria de ser mais um problema na tua vida. Os problemas são, única e exclusivamente, fruto da inconsciência, pois quando se tem consciência do que se passa já não é um problema,

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Fazer Cumprir quem não Cumpre

Sistemáticamente usados, o adiamento, a prorrogação, a isenção, a dispensa dos preceitos legais têm a tal ponto deseducado o espírito público que a maior parte da gente não acredita que a lei venha a ser cumprida ao menos «tão inteiramente como nela se contém». Do uso e abuso de tais processos resulta que no nosso País quem se apressa a cumprir a lei, a cumpri-la rigorosamente, lisamente, a fazer uma declaração exacta e em devido tempo, fica sempre em condições inferiores a todos os outros que não fizeram o mesmo. Pois é absolutamente preciso, «por uma questão de educação e de ordem», que comecemos de vez a praticar o sistema inverso e a fazer com que quem não cumpre — por mais razoável que seja o motivo da falta —- fique em situação pior que os que cumprem.

Um Século de Discursos sem Resultados

O eterno «deficit»; o mistério tenebroso das contas e da dívida pública; o espectro da bancarrota; a quebra da moeda; o «deficit» da balança comercial; a insuficiência económica; a miséria agrícola; a irrigação do Alentejo; o repovoamento florestal; as estradas; os portos; o analfabetismo; o abandono das populações rurais; a pesca; a marinha mercante ; a administração colonial; a instrução e rearmamento do Exército; a reconstrução da marinha de guerra; a viciosa educação da gente portuguesa; a emigração; o quadro das nossas relações internacionais; a questão religiosa — tudo isto absorveu literalmente um século de discursos, toneladas de artigos e não deu um passo, salvo sempre o respeito pelos esforços honestos e realizações parciais úteis, entre as quais se destacam o fomento das comunicações e a ocupação colonial.

Só se Pode Ser Feliz Simplificando

Só se pode ser feliz simplificando, simplificando sempre, arrancando, diminuindo, esmagando, reduzindo; e a inteligência cria em volta de nós um mar imenso de ondas, de espumas, de destroços, no meio do qual somos depois o náufrago que se revolta, que se debate em vão, que não quer desaparecer sem estreitar de encontro ao peito qualquer coisa que anda longe: raio de sol em reflexo de estrelas. E todos os astros moram lá no alto.

Esquecimento Esvaziante

A variedade das nossas emoções torna claro que cada homem guarda dentro de si os celeiros do contentamento e do descontentamento: os jarros das coisas boas e más não estão depositados «na soleira de Zeus», mas na alma. O néscio negligencia e desdenha as coisas boas que lá estão porque a sua imaginação acha-se sempre voltada para o futuro; o sensato, porém, torna os factos pregressos vividamente presentes com recordá-los. O presente oferece-se ao toque da nossa mão apenas por um instante e logo nos ilude os sentidos; os tolos julgam que ele não é mais nosso, que não mais nos pertence.
Há a pintura de um cordoeiro no inferno, com um asno a engolir toda a corda feita por ele, à medida que ele a entretece; assim é a multidão acometida e dominada pelo esquecimento insensato e ingrato, que apaga cada acto, cada sucesso, cada experiência aprazível de bem-estar, de camaradagem e de deleite.
O esquecimento não consente à vida desenvolver-se unitariamente, o passado entretecido com o presente, mas separa o ontem do hoje, como se fossem de diferente substância, e o hoje do amanhã, como se não fossem o mesmo; transforma toda a ocorrência em não-ocorrência.

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Indulgência com os Outros

Para sobreviver por este mundo afora, é conveniente levar consigo uma grande provisão de precaução e indulgência. Pela primeira seremos protegidos de danos e perdas, pela segunda, de disputas e querelas. Quem tem de viver entre os homens não deve condenar, de maneira incondicionada, individualidade alguma, nem mesmo a pior, a mais mesquinha ou a mais ridícula, pois ela foi definitivamente estabelecida e ofertada pela natureza. Deve-se, antes, tomá-la como algo imutável que, em virtude de um princípio eterno e metafísico, tem de ser como é. Quanto aos casos mais lamentáveis, deve-se pensar: «É preciso que haja também tais tipos no mundo.» Do contrário, comete-se uma injustiça e desafia-se o outro a uma guerra de vida ou morte, já que ninguém pode mudar a sua própria individualidade, isto é, o seu carácter moral, as suas faculdades de conhecimento, o seu temperamento, a sua fisionomia, etc. Ora, se condenarmos o outro em toda a sua essência, então nada lhe restará a não ser combater em nós um inimigo mortal, pois só lhe reconhecemos o direito de existir sob a condição de tornar-se uma pessoa diferente da que invariavelmente é.
Portanto, para vivermos entre os homens, temos de deixar cada um existir como é,

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