Textos sobre Mortos

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Textos de mortos escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

O Bem e o Mal

Quando os acontecimentos nos colocam em oposição ao meio envolvente, todos desenvolvemos as forças de que dispomos, ao passo que nas situações em que apenas fazemos o nosso dever nos comportamos, compreensivelmente, como quem paga os seus impostos. Daqui se conclui que tudo o que é mau se pratica com mais ou menos imaginação e paixão, enquanto o bem se caracteriza por uma inconfundível pobreza de afecto e mesquinhez.
(…) Se abstrairmos daquela grande fatia central do mundo e da vida ocupada por pessoas em cujo pensamento as palavras bem e mal deixaram de ter lugar desde que largaram as saias da mãe, então as margens, onde ainda há propósitos morais deliberados, ficam hoje reservadas àquelas pessoas boas-más ou más-boas, das quais algumas nunca viram o bem voar nem o ouviram cantar e por isso exigem de todas as outras que se extasiem com elas diante de uma natureza da moral com pássaros empalhados pousados em árvores mortas; o segundo grupo, por seu lado, os mortais maus-bons, espicaçados pelos seus rivais, manifestam, pelo menos em pensamento, uma tendência para o mal, como se estivessem convencidos de que é apenas nas más acções, menos desgastadas do que as boas, que ainda pulsa alguma vida moral.

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A Vida em Pleno

Diariamente criticamos o destino: “Porque foi este homem arrebatado a meio da carreira? E aquele, porque não morre, em vez de prolongar uma velhice tão penosa para ele como para os outros?” Diz-me cá, por favor: o que achas tu mais justo, seres tu a obedecer à natureza ou a natureza a ti? Que diferença faz sair mais ou menos depressa de um sítio de onde temos mesmo de sair? Não nos devemos preocupar em viver muito, mas sim em viver plenamente; viver muito depende do destino, viver plenamente, da nossa própria alma. Uma vida plena é longa quanto basta; e será plena se a alma se apropria do bem que lhe é próprio e se apenas a si reconhece poder sobre si mesma. Que interessa os oitenta anos daquele homem passados na inacção? Ele não viveu, demorou-se nesta vida; não morreu tarde, levou foi muito tempo a morrer! “Viveu oitenta anos!”. O que importa é ver a partir de que data ele começou a morrer. “Mas aquele outro morreu na força da vida”. É certo, mas cumpriu os deveres de um bom cidadão, de um bom amigo, de um bom filho, sem descurar o mínimo pormenor; embora o seu tempo de vida ficasse incompleto,

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O Caminho da Salvação

A cegueira e a obstinação dos homens lembra-me às vezes a cegueira e a obstinação das varejeiras enfrenizadas contra as vidraças. Bastava um momento de serenidade, dez-réis de bom senso, e em qualquer fresta estava a liberdade. Mas o demónio da mosca, quanto mais a impossibilidade se lhe põe diante, mais teima. O resultado é cair morta no peitoril.
Não se pode fazer ideia da maravilha de criança que era a filha de um poeta de meia tigela que hoje me lia versos impossíveis, a empurrá-la enfastiado com a mão esquerda, quando ela graciosamente o interrompia. A canção enluarada, a quadra perfeita, o soneto verdadeiro que justificavam aquele homem estavam ali, a brilhar nos olhos da pequenita; e o desgraçado às turras à janela, a zumbir e a magoar-se, sem ver que tinha diante de si o verdadeiro caminho da salvação!

Somos Uma Nação Que Se Regenera

Que somos nós hoje? Uma nação que tende a regenerar-se: diremos mais: que se regenera. Regenera-se, porque se repreende a si própria; porque se revolve no lodaçal onde dormia tranquila; porque se irrita da sua decadência, e já não sorri sem vergonha ao insultar de estranhos; porque principia, enfim, a reconhecer que o trabalho não desonra, e vai esquecendo as visagens senhoris de fidalga. Deixai passar essas paixões pequenas e más que combatem na arena política, deixai flutuar à luz do sol na superfície da sociedade esses corações cancerosos que aí vedes; deixai erguerem-se, tombar, despedaçarem-se essas vagas encontradas e confusas das opiniões! Tudo isto acontece quando se agita o oceano; e o mar do povo agita-se debaixo da sua superfície. O sargaço imundo, a escuma fétida e turva hão-de desparecer. Um dia o oceano popular será grandioso, puro e sereno como saiu das mãos de Deus. A tempestade é a precusora da bonança. O lago asfaltite, o Mar Morto, esse é que não tem procelas.
O nosso estrebuchar, muitas veze colérico, muitas mais mentecapto e ridículo, prova que a Europa se enganava quando cria que esta nobre terra do último ocidente era o cemitério de uma nação cadáver.

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Não Penses

Não penses. Que raio de mania essa de estares sempre a querer pensar. Pensar é trocar uma flor por um silogismo, um vivo por um morto. Pensar é não ver. Olha apenas, vê. Está um dia enorme de sol. Talvez que de noite, acabou-se, como diz o filósofo da ave de Minerva. Mas não agora. Há alegria bastante para se não pensar, que é coisa sempre triste. Olha, escuta. Nas passagens de nível, havia um aviso de «pare, escute, olhe» com vistas ao atropelo dos comboios. É o aviso que devia haver nestes dias magníficos de sol. Olha a luz. Escuta a alegria dos pássaros. Não penses, que é sacrilégio.

Quem Aprendeu a Morrer Desaprendeu de Servir

Os homens vão, vêm, andam, dançam, e nenhuma notícia de morte. Tudo isso é muito bonito. Mas, também quando ela chega, ou para eles, ou para as suas mulheres, filhos e amigos, surpreendendo-os imprevistamente e sem defesa, que tormentos, que gritos, que dor e que desespero os abatem! Já vistes algum dia algo tão rebaixado, tão mudado, tão confuso? É preciso preparar-se mais cedo para ela; e essa despreocupação de animal, caso pudesse instalar-se na cabeça de um homem inteligente, o que considero inteiramente impossível, vende-nos caro demais a sua mercadoria. Se fosse um inimigo que pudéssemos evitar, eu aconselharia a adoptar as armas da cobardia. Mas, como isso não é possível, como ele vos alcança fugitivo e poltrão tanto quanto corajoso, De facto ele persegue o cobarde que lhe foge, e não poupa os jarretes e o dorso poltrão de uma juventude sem coragem (Horácio), e que nenhuma ilusão de couraça vos encobre, Inútil esconder-se prudentemente sob o ferro e o bronze: a morte saberá fazer-se expôr à cabeça que se esconde (Propércio), aprendamos a enfrentá-lo de pé firme e a combatê-lo. E, para começar a roubar-lhe a sua maior vantagem contra nós, tomemos um caminho totalmente contrário ao habitual.

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A Inveja não tem Passado

Ainda não tendes advertido, que a inveja faz grande diferença dos mortos aos vivos, e dos presentes aos passados? Os olhos da inveja são como os do Sacerdote Heli, dos quais diz o Texto sagrado, que não podiam ver a luz do Templo, senão depois que se apagava: Oculi ejus caligaverant, nec poterat videre lucernam Dei, antequam extingueretur. Enquanto as luzes são vivas, cada reflexo delas é um raio, que cega os olhos da inveja: porém depois que elas se apagaram, e muito mais se se metem largos anos em meio, então abre a inveja, como ave nocturna, os olhos; então vê o que não podia ver: então venera e celebra essas mesmas luzes, e levanta sobre as Estrelas seus resplendores. Por isso disse com grande juízo S. Zeno Veronense, que todo o invejoso é inimigo dos presentes, e amigo dos passados: In omnibus se inimicum praesentium servat, amicum vero pereuntium. Os mesmos que agora amam, e veneram tanto a Santo António, se viveram em seu tempo, o haviam de aborrecer e perseguir; e as mesmas maravilhas, que tanto celebram e encarecem, se foram obradas na sua Pátria, as haviam de escurecer e aniquilar.

A Morte Não É Nada Para Nós

Habitua-te a pensar que a morte não é nada para nós, pois que o bem e o mal só existem na sensação. Donde se segue que um conhecimento exacto do facto de a morte não ser nada para nós permite-nos usufruir esta vida mortal, evitando que lhe atribuamos uma idéia de duração eterna e poupando-nos o pesar da imortalidade. Pois nada há de temível na vida para quem compreendeu nada haver de temível no facto de não viver. É pois, tolo quem afirma temer a morte, não porque sua vinda seja temível, mas porque é temível esperá-la.
Tolice afligir-se com a espera da morte, pois trata-se de algo que, uma vez vindo, não causa mal. Assim, o mais espantoso de todos os males, a morte, não é nada para nós, pois enquanto vivemos, ela não existe, e quando chega, não existimos mais.
Não há morte, então, nem para os vivos nem para os mortos, porquanto para uns não existe, e os outros não existem mais. Mas o vulgo, ou a teme como o pior dos males, ou a deseja como termo para os males da vida. O sábio não teme a morte, a vida não lhe é nenhum fardo,

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A Vaidade e a Inveja Desaparecem com a Idade

Com o passar do tempo, há dois sentimentos que desaparecem: a vaidade e a inveja. A inveja é um sentimento horrível. Ninguém sofre tanto como um invejoso. E a vaidade faz-me pensar no milionário Howard Hughes. Quando ele morreu, os jornalistas perguntaram ao advogado: «Quanto é que ele deixou?» O advogado respondeu: «Deixou tudo.» Ninguém é mais pobre do que os mortos.

Compaixão Mórbida

Todos os dias desfaço-me, por via da razão, desse sentimento pueril e inumano que faz que desejemos que os nossos males suscitem a compaixão e o pesar nos nossos amigos. Fazemos valer os nossos infortúnios desproporcionadamente para provocar as suas lágrimas. E a firmeza face à má fortuna, que louvamos em toda a gente, reprovamo-la e repudiamo-la aos nossos íntimos quando a má fortuna é a nossa. Não nos contentamos com que eles sejam sensíveis às nossas dores, precisamos que com elas se aflijam.
Deve-se espalhar a alegria, mas conter, tanto quanto possível, a tristeza. Quem quer ser compadecido sem razão é homem que não o merece ser quando houver razão para tal. Estar sempre a lamentar-se é caso para se não ser lamentado, pois quem tantas vezes faz de coitadinho não inspira dó a ninguém. Quem faz de morto estando vivo sujeita-se a ser tido por vivo em morrendo. Vi doentes abespinharem-se por os acharem de bom semblante e com o pulso normal, reprimirem o riso porque este denunciava a sua cura e odiarem a saúde por ela não suscitar compaixão.

Perfeição é Virtude e não Ausência de Defeitos

A virtude é a perfeição no estado de homem e não a ausência de defeitos. Se eu quero construir uma cidade, pego na malandragem e na ralé. O poder há-de nobilitá-las. Ofereço-lhes uma embriaguez, diferente da embriaguez medíocre da rapina, da usura ou da violação. É ver aqueles braços nodosos que edificam. O orgulho vai-se transformando em torres, templos e muralhas. A crueldade torna-se grandeza e rigor na disciplina. E ei-los a servirem uma cidade nascida deles próprios. Trocaram-se por ela no fundo dos corações. E morrerão de pé, nas muralhas, para a salvarem. Só descobrirás neles virtudes resplandecentes.
«Mas tu, que pões má cara diante do poder da terra, diante da grosseria, da podridão e dos vermes dos homens, começas por pedir ao homem que não seja e que não tenha nem sequer cheiro. Reprovas-lhe a expressão da sua força. Instalas capados à frente do império. E eles entram a perseguir o vício, que não passa de poder mal empregado. É o poder e a vida que eles perseguem e, no entanto, tornam-se guardiões de museu e vigiam um império morto»

Só a Morte Desperta os Nossos Sentimentos

Não amaremos talvez insuficientemente a vida? Já notou que só a morte desperta os nossos sentimentos? Como amamos os amigos que acabam de deixar-nos, não acha?! Como admiramos os nossos mestres que já não falam, com a boca cheia de terra! A homenagem surge, então, muito naturalmente, essa mesma homenagem que talvez eles tivessem esperado de nós, durante a vida inteira. Mas sabe porque nós somos sempre mais justos e mais generosos para com os mortos? A razão é simples! Para com eles, já não há deveres.

É assim o homem, caro senhor, tem duas faces. Não pode amar sem se amar. Observe os seus vizinhos, se calha de haver um falecimento no prédio. Dormiam na sua vida monótona e eis que, por exemplo, morre o porteiro. Despertam imediatamente, atarefam-se, enchem-se de compaixão. Um morto no prelo, e o espectáculo começa, finalmente. Têm necessidade de tragédia, que é que o senhor quer?, é a sua pequena transcendência, é o seu aperitivo.
É preciso que algo aconteça, eis a explicação da maior parte dos compromissos humanos. É preciso que algo aconteça, mesmo a servidão sem amor, mesmo a guerra ou a morte.

Ouvi-los a Todos, no Silêncio

Detesto a acção. A acção mete-me medo. De dia podo as minhas árvores, à noite sonho. Sinto Deus – toco-o. Deus é muito mais simples do que imaginas. Rodeia-me – não o sei explicar. Terra, mortos, uma poeira de mortos que se ergue em tempestades, e esta mão que me prende e sustenta e que tanta força tem…
Como em ti, há em mim várias camadas de mortos não sei até que profundidade. Às vezes convoco-os, outras são eles, com a voz tão sumida que mal a distingo, que desatam a falar. Preciso da noite eterna: só num silêncio mais profundo ainda, conto ouvi-los a todos.

Os Deuses Reclinados

… Por todos os lados as estátuas de Buda, de Lorde Buda… As severas, verticais, carcomidas estátuas, com um dourado de resplendor animal, com uma dissolução como se o ar as desgastasse… Crescem-lhes nas faces, nas pregas das túnicas, nos cotovelos, nos umbigos, na boca e no sorriso pequenas máculas: fungos, porosidades, vestígios excrementícios da selva… Ou então as jacentes, as imensas jacentes, as estátuas de quarenta metros de pedra, de granito areento, pálidas, estendidas entre as sussurrantes frondes, inesperadas, surgindo de qualquer canto da selva, de qualquer plataforma circundante… Adormecidas ou não adormecidas, estão ali há cem anos, mil anos, mil vezes mil anos… Mas são suaves, com uma conhecida ambiguidade ultraterrena, aspirando a ficar e a ir-se embora… E aquele sorriso de suavíssima pedra, aquela majestade imponderável, mas feita de pedra dura, perpétua, para quem sorriem, para quem, sobre a terra sangrenta?… Passaram as camponesas que fugiam, os homens do incêndio, os guerreiros mascarados, os falsos sacerdotes, os turistas devoradores…

E manteve-se no seu lugar a estátua, a imensa pedra com joelhos, com pregas na túnica de pedra, com o olhar perdido e não obstante existente, inteiramente inumana e de alguma forma também humana, de alguma forma ou de alguma contradição estatuária,

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Vivemos de Matar

Os vivos alimentam-se e engordam às custas dos mortos. É a essência da natureza. Basta ver os documentários sobre a vida selvagem na televisão, aves corpulentas arrancando com o bico as tripas das vítimas, disputando-as entre si; a leoa de focinho enterrado na carne ensanguentada da zebra. Mas nem é preciso ir tão longe: as prateleiras dos supermercados são deprimentes cemitérios: paletes de cordeiro morto, ossos e costeletas de boi esfaqueado, vísceras de vaca sacrificada, lombo de porco eletrocutado, tudo isso em embalagens fabricadas com restos de árvores abatidas. Vivemos do que matamos. Vivemos de matar, ou do que nos é servido morto: os herdeiros consomem os despojos do predecessor, e isso nutre-os, fortalece-os no momento de levantar voo. Quanto maior a quantidade de carne consumida, mais alto e majestoso o voo. E mais elegante, claro. Nada que seja alheio às regras da natureza.

Miseráveis Macabros

É que não foram tão poucas como isso as vezes que vi a piedade enganar-se. Nós, que governamos os homens, aprendemos a sondar-lhes os corações, para só ao objecto digno de estima dispensarmos a nossa solicitude. Mais não faço do que negar essa piedade às feridas de exibição que comovem o coração das mulheres. Assim como também a nego aos moribundos, e além disso aos mortos. E sei bem porquê.
Houve uma altura da minha mocidade em que senti piedade pelos mendigos e pelas suas úlceras. Até chegava a apalavrar curandeiros e a comprar bálsamos por causa deles. As caravanas traziam-me de uma ilha longínqua unguentos derivados do ouro, que têm a virtude de voltar a compor a pele ao cimo da carne. Procedi assim até descobrir que eles tinham como artigo de luxo aquele insuportável fedor. Surpreendi-os a coçar e a regar com bosta aquelas pústulas, como quem estruma uma terra para dela extrair a flor cor de púrpura. Mostravam orgulhosamente uns aos outros a sua podridão e gabavam-se das esmolas recebidas.
Aquele que mais ganhara comparava-se a si próprio ao sumo sacerdote que expõe o ídolo mais prendado. Se consentiam em consultar o meu médico, era na esperança de que o cancro deles o surpreendesse pela pestilência e pelas proporções.

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Neruda e García Lorca em Homenagem a Rubén Dario

Eis o texto do discurso:

Neruda: Senhoras…

Lorca: …e senhores. Existe na lide dos touros uma sorte chamada «toreio dei alimón», em que dois toureiros furtam o corpo ao touro protegidos pela mesma capa.

Neruda: Federico e eu, ligados por um fio eléctrico, vamos emparelhar e responder a esta recepção tão significativa.

Lorca: É costume nestas reuniões que os poetas mostrem a sua palavra viva, prata ou madeira, e saúdem com a sua voz própria os companheiros e amigos.

Neruda: Mas nós vamos colocar entre vós um morto, um comensal viúvo, escuro nas trevas de uma morte maior que as outras mortes, viúvo da vida, da qual foi na sua hora um marido deslumbrante. Vamos esconder-nos sob a sua sombra ardente, vamos repetir-lhe o nome até que a sua grande força salte do esquecimento.

Lorca: Nós, depois de enviarmos o nosso abraço com ternura de pinguim ao delicado poeta Amado Villar, vamos lançar um grande nome sobre a toalha, na certeza de que vão estalar as taças, saltar os garfos, buscando o olhar que todos anseiam, e que um golpe de mar há-de manchar as toalhas. Nós vamos evocar o poeta da América e da Espanha: Rubén…

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Emoção e Poesia

Quem quer que seja de algum modo um poeta sabe muito bem quão mais fácil é escrever um bom poema (se os bons poemas se acham ao alcance do homem) a respeito de uma mulher que lhe interessa muito do que a respeito de uma mulher pela qual está profundamente apaixonado. A melhor espécie de poema de amor é, em geral, escrita a respeito de uma mulher abstracta. Uma grande emoção é por demais egoísta; absorve em si própria todo o sangue do espírito, e a congestão deixa as mãos demasiado frias para escrever. Três espécies de emoções produzem grande poesia – emoções fortes, porém rápidas, captadas para a arte tão logo passaram; emoções fortes e profundas ao serem lembradas muito tempo depois; e emoções falsas, isto é, emoções sentidas no intelecto. Não a insinceridade, mas sim, uma sinceridade traduzida, é a base de toda a arte.
O grande general que pretende ganhar uma batalha para o império do seu país e para a história do seu povo não deseja – não pode desejar ter muitos dos seus soldados assassinados (mortos). Contudo, uma vez que tenha penetrado na contemplação da sua estratégia, escolherá (sem um pensamento para os seus homens) o golpe melhor,

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Arrumar os Mortos

É preciso que compreendam: nós não temos competência para arrumarmos os mortos no lugar do eterno.
Os nossos defuntos desconhecem a sua condição definitiva: desobedientes, invadem-nos o quotidiano, imiscuem-se do território onde a vida deveria ditar sua exclusiva lei.
A mais séria consequência desta promiscuidade é que a própria morte, assim desrespeitada pelos seus inquilinos, perde o fascínio da ausência total.
A morte deixa de ser a mais incurável e absoluta diferença entre os seres.