XLII
Morfeu doces cadeias estendia,
Com que os cansados membros me enlaçava;
E quanto mal o coração passava,
Em sonhos me debuxa a fantasia.Lise presente vi, Lise, que um dia
Todo o meu pensamento arrebatava,
Lise, que na minha alma impressa estava,
Bem apesar da sua tirania.Corro a prendê-la em amorosos laços
Buscando a sombra, que apertar intento;
Nada vejo (ai de mim!) perco os meus passos.Então mais acredito o fingimento:
Que ao ver, que Lise foge de meus braços,
A crê pelo costume o pensamento.
Passagens sobre Bem
3255 resultadosA Piedade
A piedade é um sentimento natural, que, moderando em cada indivíduo a actividade do amor de si próprio, concorre para a conservação mútua de toda a espécie. É ela que nos leva sem reflexão em socorro daqueles que vemos sofrer; é ela que, no estado de natureza, faz as vezes de lei, de costume e de virtude, com a vantagem de que ninguém é tentado a desobedecer à sua doce voz; é ela que impede todo o selvagem robusto de arrebatar a uma criança fraca ou a um velho enfermo a sua subsistência adquirida com sacrifício, se ele mesmo espera poder encontrar a sua alhures; é ela que, em vez desta máxima sublime de justiça raciocinada, faz a outrem o que queres que te façam, inspira a todos os homens esta outra máxima de bondade natural, bem menos perfeita, porém mais útil, talvez, do que a precedente: faz o teu bem com o menor mal possível a outrem. Em uma palavra, é nesse sentimento natural, mais do que em argumentos subtis, que é preciso buscar a causa da repugnância que todo o homem experimentaria em fazer mal, mesmo independentemente das máximas da educação. Embora possa competir a Sócrates e aos espíritos da sua têmpera adquirir a virtude pela razão,
A beleza é a harmonia entre o acaso e o bem.
Narciso
Dentro de mim me quis eu ver. Tremia,
Dobrado em dois sobre o meu próprio poço…
Ah, que terrível face e que arcabouço
Este meu corpo lânguido escondia!Ó boca tumular, cerrada e fria,
Cujo silêncio esfíngico bem ouço!
Ó lindos olhos sôfregos, de moço,
Numa fronte a suar melancolia!Assim me desejei nestas imagens.
Meus poemas requintados e selvagens,
O meu Desejo os sulca de vermelho:Que eu vivo à espera dessa noite estranha,
Noite de amor em que me goze e tenha,
…Lá no fundo do poço em que me espelho!
Quem não vê bem uma palavra não pode ver bem uma alma.
O mal que se vê é aguilhão para o bem que se deseja; e quanto mais duro, quanto mais agressivo, se bate em peito de aço, tanto mais valioso auxiliar num caminho de progresso.
Mal ou bem, tudo é pensar.
Há boas qualidades que degeneram em defeitos quando são naturais e outras que nunca são perfeitas quando adquiridas. É preciso, por um lado, que a razão nos faça obreiros do nosso bem e da nossa confiança; é preciso, por outro, que a natureza nos dê bondade e coragem.
Cuidem bem dos vossos fãs e podem ter a certeza que eles cuidarão bem de vocês.
Os bens da Terra apenas servem para escavar a alma e aumentar-lhe o vazio.
A Regra Fundamental de Vida
Quando nós dizemos o bem, ou o mal… há uma série de pequenos satélites desses grandes planetas, e que são a pequena bondade, a pequena maldade, a pequena inveja, a pequena dedicação… No fundo é disso que se faz a vida das pessoas, ou seja, de fraquezas, de debilidades… Por outro lado, para as pessoas para quem isto tem alguma importância, é importante ter como regra fundamental de vida não fazer mal a outrem. A partir do momento em que tenhamos a preocupação de respeitar esta simples regra de convivência humana, não vale a pena perdermo-nos em grandes filosofias sobre o bem e sobre o mal. «Não faças aos outros o que não queres que te façam a ti» parece um ponto de vista egoísta, mas é o único do género por onde se chega não ao egoísmo mas à relação humana.
A carne do acém é pouca e sabe bem, mas não é para quem filhos tem.
Flutuante Estou fora de alcance, do bem ou do mal, em transe momentâneo, verdadeiro juízo final. Longe de tudo, fora do quadrante, asas quebradas e a mente flutuante.
Freira
Em teu calmo semblante e em teu olhar parado
há perdido – bem sei – um mistério qualquer…
– quem sabe se pecaste… e se foi teu pecado
quem te fez esquecer que és bela e que é mulher…Hoje es santa… O passado passou — é passado…
– dele já não terás uma ilusão sequer,
e o amor que se tornou funesto e amargurado,
sepultas no silêncio… e em teu árduo mister…Mais à frente está a vida… a vida humana e bela!
– teu presente é uma prece; teu passado: um poema;
teu futuro: um rosário, um altar, uma cela…Evadida do mundo – ao ver-te, à luz do dia
– não sei se te admiro a renúncia suprema,
ou se lastimo a tua imensa covardia!
Uma Boa Ideia
Não há nada mais prático do que uma boa ideia. Uma boa ideia não é apenas algo de interessante que nos vem à cabeça, mas é, sobretudo, um propósito que nos leva a fazer o bem e a querer ser bons. Há pessoas que ficam a discutir ideias até se desgastarem. E há outras que procuram confrontar as suas ideias na acção para mudar o mundo.
(
Mudam-se os Tempos, Mudam-se as Vontades
Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,
Muda-se o ser, muda-se a confiança:
Todo o mundo é composto de mudança,
Tomando sempre novas qualidades.Continuamente vemos novidades,
Diferentes em tudo da esperança:
Do mal ficam as mágoas na lembrança,
E do bem (se algum houve) as saudades.O tempo cobre o chão de verde manto,
Que já coberto foi de neve fria,
E em mim converte em choro o doce canto.E afora este mudar-se cada dia,
Outra mudança faz de mor espanto,
Que não se muda já como soía.
O bem só se conhece quando se perde.
Dentro de mim, bem no fundo
há reservas colossais de tempo,
futuro, pós-futuro, pretérito.
Porquê Camuflar as Nossas Convicções?
Desde que nos propomos emitir uma verdade de acordo com as nossas convicções damos logo a impressão de fazer retórica. Que espécie de prestidigitação vem a ser essa? Como é que nos nossos dias não poucas verdades, proferidas que sejam, por vezes, mesmo em tom patético, imediatamente ganham aspectos retóricos? Porquê é que na nossa época cada vez há mais necessidade, quando pretendemos dizer a verdade, de recorrer ao humor, à ironia, à sátira? Porquê adoçar a verdade como se se tratasse de uma pílula amarga? Porquê envolver as nossas convicções num misto de altiva indiferença, digamos, de desprezo para com o público? Numa palavra, porquê certo ar de pícara condescendência? Em nossa opinião, o homem de bem não tem de envergonhar-se das suas convicções, ainda mesmo que estas transpareçam sob a forma retórica, sobretudo se está certo delas.
Teu Corpo de Terra e Água
Teu corpo de terra e água
Onde a quilha do meu barco
Onde a relha do arado
Abrem rotas e caminhoTeu ventre de seivas brancas
Tuas rosas paralelas
Tuas colunas teu centro
Teu fogo de verde pinhoTua boca verdadeira
Teu destino minha alma
Tua balança de prata
Teus olhos de mel e vinhoBem que o mundo não seria
Se o nosso amor lhe faltasse
Mas as manhãs que não temos
São nossos lençóis de linho