Há um momento na vida de todo menino normal em que surge um desejo furioso de ir a algum lugar e descobrir um tesouro enterrado.
Passagens sobre Momentos
1227 resultadosO que a vida apresenta de pior não é a violenta catástrofe, mas a monotonia dos momentos semelhantes; numa ou se morre ou se vence, na outra verás que o maior número nem venceu nem morreu: flutua sem norte e sem esperança.
A Base da Actividade
Em nenhuma actividade é bom sinal se, de início, existe o desejo de vencer – emulação, violência, ambição, etc. Deve começar-se por amar a técnica de cada actividade por si própria, como se ama a vida pelo simples parazer de viver.
Nisto consiste a verdadeira vocação e a promessa de êxito sério. Em seguida, poderão vir todas as paixões sociais imagináveis, para reanimar o puro amor da técnica – têm mesmo que vir -, mas começar por elas é indício de que se deseja perder tempo. Em suma, é preciso amar uma actividade, como se mais nada existisse no mundo, por si própria.
É por isso que o momento significativo é o do início: porque, então, é como se o mundo (paixões sociais) não existisse ainda no que diz respeito a essa actividade.
Também porque toda a gente é capaz de se interessar por um trabalho que se sabe quanto rende; o difícil é apaixonarmo-nos gratuitamente.
O amor envolve alegrias puras e tristezas fundas, sorrisos sinceros e dores profundas. Amar não é ser feliz. Mas será muito mais importante amar do que ser feliz, porque só é feliz quem ama, seja neste momento ou na eternidade.
Nascemos, vivemos por um momento breve e morremos. Tem sido assim há muito tempo. A tecnologia não está mudando muito este cenário.
O mais perigoso ponto de vista: o que eu faço neste momento é tão importante «para tudo o que virá» como o maior acontecimento do passado; nesta formidável perspectiva do efeito, todas as acções são igualmente grandes e pequenas.
Qual o melhor momento para o jantar? ‘Se alguém é rico, quando quiser, se é pobre, quando puder’.
Tenho neste momento tantos pensamentos fundamentais, tantas coisas verdadeiramente metafísicas para dizer, que me canso de repente, e decido não escrever mais, não pensar mais, mas deixar que a febre de dizer me dê sono, e eu faça festas, como a um gato, a tudo quanto poderia ter dito.
Sempre existe no mundo uma pessoa que espera a outra. E quando essas pessoas se encontram e seus olhos se cruzam, todo passado e todo futuro perde qualquer importância e só existe aquele momento.
O amor tem momentos realmente exaltantes: são as rupturas.
Esta é a vantagem
dos solteiros de má fama como nós:
aquilo que os outros devem dividir todos os dias,
sob escassez e preocupação, com a mulher e os filhos,
nós podemos desfrutar em abundância com um amigo
no momento oportuno.
Todo o homem, por criminoso que seja em demasia, tem o momento da consciência, e o da contrição.
Se Pudesses Estar Comigo Vinte e Quatro horas do Dia
Se pudesses estar comigo durante as vinte e quatro horas do dia, observar cada gesto meu, dormir comigo, comer comigo, trabalhar comigo, tudo isto não poderia ter lugar. Quando me vejo afastado de ti, penso em ti constantemente e isso dá cor a tudo o que eu diga ou faça. Se soubesses o quão fiel te sou! Não apenas fisicamente, mas mentalmente, moralmente, espiritualmente. Aqui não há qualquer tentação para mim, absolutamente nenhuma. Estou imune a Nova Iorque, aos meus velhos amigos, ao passado, a tudo. Pela primeira vez na minha vida, estou completamente centrado em outro ser… Em ti. Sinto-me capaz de dar tudo, sem ter medo de ficar exaurido ou de me ver perdido. Quando ontem escrevi no meu artigo que «se eu nunca tivesse ido para a Europa…», não era a Europa que tinha em mente, mas sim tu.
Mas não posso dizer isso ao mundo num artigo. Tu és a Europa. Pegaste em mim, um homem despedaçado, e tornaste-me completo. E não hei-de desintegrar-me — não existe o menor perigo disso. Mas agora vejo-me mais sensível, mais receptivo a qualquer sinal de perigo. Se te persigo loucamente, se te imploro para ouvires, se fico à tua porta e espero por ti,
Só Chegamos a Ser uma Parte Mínima do que Poderíamos Ser
A actividade de comprar conclui em decidir-se por um objecto; mas é também antes uma eleição, e a eleição começa por perceber as possibilidades que oferece o mercado. De onde resulta que a vida, no seu modo «comprar», consiste primeiramente em viver as possibilidades de compra como tais. Quando se fala de nossa vida sói esquecer-se disto, que me parece essencialíssimo: a nossa vida é em todo o instante e antes que nada consciência do que nos é possível. Se em cada momento não tivéssemos à nossa frente mais que uma só possibilidade, careceria de sentido chamá-la assim. Seria apenas pura necessidade. Mas ai está: esse estranhíssimo facto da nossa vida possui a condição radical de que sempre encontra ante si várias saídas, que por serem várias adquirem o carácter de possibilidades entre as quais havemos de decidir. Tanto vale dizer que vivemos como dizer que nos encontramos num ambiente de determinadas possibilidades. A este âmbito costuma chamar-se «as circunstâncias».
Toda a vida é achar-se dentro da «circunstância» ou mundo. Porque este é o sentido originário da idéia (mundo). Mundo é o repertório das nossas possibilidades vitais. Não é, pois, algo à parte e alheio à nossa vida,
O Amor Exige a Verdade
A maioria das pessoas hoje em dia não considera o amor como relacionado de alguma forma com a verdade. O amor é visto como uma experiência associada com o mundo das emoções fugazes, e não com a verdade. Mas é esta uma descrição adequada do amor? O amor não pode ser reduzido a uma emoção efémera. É verdade que estimula a nossa afectividade, mas, a fim de o abrir para o amado e, assim, abrir o caminho que conduz longe do egocentrismo e em direção à outra pessoa, a fim de construir um relacionamento duradouro, o amor visa a união com o amado. Aqui começamos a ver como o amor exige a verdade. Só na medida em que o amor é fundamentado na verdade pode ser suportado ao longo do tempo, pode transcender o momento passageiro e ser suficientemente sólido para sustentar uma viagem compartilhada. Se o amor não está vinculado à verdade, é uma presa emoções inconstantes e não pode resistir ao teste do tempo. Amor verdadeiro, por outro lado, unifica todos os elementos da nossa pessoa e torna-se uma nova luz que aponta o caminho para uma vida grande e realizada. Sem a verdade, o amor é incapaz de estabelecer um vínculo firme;
Bondade e Sabedoria devem ser Inocentes
Quando a bondade se mostra abertamente já não é bondade, embora possa ainda ser útil como caridade organizada ou como acto de solidariedade. Daí: «Não dês as tuas esmolas diante dos homens, para seres visto por eles». A bondade só pode existir quando não é percebida, nem mesmo por aquele que a faz; quem quer que se veja a si mesmo no acto de fazer uma boa obra deixa de ser bom; será, no máximo, um membro útil da sociedade ou zeloso membro de uma igreja. Daí: «Que a tua mão esquerda não saiba o que faz a tua mão direita.»
(…) O amor à sabedoria e o amor à bondade, que se resolvem nas actividades de filosofar e de praticar boas acções, têm em comum o facto de que cessam imediatamente – cancelam-se, por assim dizer – sempre que se presume que o homem pode ser sábio ou ser bom. Sempre houve tentativas de dar vida ao que jamais pode sobreviver ao momento fugaz do próprio acto, e todas elas levaram ao absurdo.
Sentimos saudade de certos momentos da nossa vida e de certos momentos de pessoas que passaram por ela.
Mais uma vez ou duas na vida – talvez num fim de tarde, num instante de amor, no momento de morrer – teria sublime inconsciência criadora, a intuição aguda e cega de que era realmente imortal para todo o sempre.
Estado Frenético de Tagarelice
Assola o país uma pulsão coloquial que põe toda a gente em estado frenético de tagarelice, numa multiplicação ansiosa de duos, trios, ensembles, coros. Desde os píncaros de Castro Laboreiro ao Ilhéu de Monchique fervem rumorejos, conversas, vozeios, brados que abafam e escamoteiam a paciência de alguns, os vagares de muitos e o bom senso de todos. O falatório é causa de inúmeros despautérios, frouxas produtividades e más-criações.
Fala-se, fala-se, fala-se, em todos os sotaques, em todos os tons e décibeis, em todos os azimutes. O país fala, fala, desunha-se a falar, e pouco do que diz tem o menor interesse. O país não tem nada a dizer, a ensinar, a comunicar. O país quer é aturdir-se. E a tagarelice é o meio de aturdimento mais à mão.
(…) Telefones móveis! Soturna apoquentação! Um país tagarela tem, de um momento para o outro, dez milhões de íncolas a querer saber onde é que os outros param, e a transmitir pensamentos à distância.
Afortunados ventos que batem todas as altitudes e pontos cardeais e levam as mais das palavras, às vezes frases inteiras, parágrafos, grosas deleas, para as afogar no mar, embeber nos lameiros de Espanha, gelar nos confins da Sibéria,
Conhecer-se a Si Próprio
Conhece-te a ti próprio – eis o que é difícil. Ainda posso conhecer os outros, mas a mim mesmo não consigo conhecer-me. Um fio – instintos e um fantasma… Dos outros faço ideia mais ou menos aproximada, de mim não faço ideia nenhuma.
Há uma disparidade entre mim e mim. Há em mim o homem correcto, o homem igual a todos os homens – e o homem que lá dentro sonha, grita e é capaz, por insignificâncias, de imaginar um terramoto ou de desejar uma catástrofe. O que eu me tenho desfeito dos meus inimigos – o que é razoável – mas dos meus amigos que me fazem sombra!…
O meu verdadeiro ser não é aquele que compus, recalcando lá para o fundo os instintos e as paixões; o meu verdadeiro ser é uma árvore desgrenhada – é o fantasma que nos momentos de exaltação me leva a rasto para actos que reprovo. Só a custo o contenho. Parece que está morto, e está mais vivo que o histrião que represento. Asseguro este simulcaro até à cova com os hábitos de compressão que adquiri. Não sei se a maior parte dos homens é assim – eu sou assim: sou um fantasma desesperado.