O Homem – Uma Fera Domesticada
É preciso ler histórias de crimes e descrições de situações anárquicas para saber do que o homem é realmente capaz no que diz respeito à moral. Esses milhares de indivíduos que, diante dos nossos olhos, empurram-se desordenadamente uns aos outros no trânsito pacifíco devem ser vistos como tigres e lobos, cujos dentes são protegidos por fortes focinheiras.
Passagens sobre Olhos
2007 resultadosOs olhos são os intérpretes do coração, mas só os interessados entendem essa linguagem.
Obstáculo é aquilo que se vê quando se tira os olhos do objetivo que se quer alcançar.
Acreditei que Podia Dar-te um Céu para Brincares
Filho. Gostava que houvesse uma aragem qualquer que me explicasse esse teu sorriso e outra que te explicasse, sem te magoar, o meu silêncio. Gostava de aprender o trejeito dos teus lábios, a maneira dos teus olhos, e to lembrar quando tivesses a minha idade. Fui um dia a tua inocência. E dela ficou-me a grande inocência de acreditar.
Acreditei que podia dar-te um céu para brincares e que a vida seria o que nós quiséssemos. Assim. Bastaria querermos, esforçarmo-nos muito, trabalharmos, e teríamos então o que desejássemos. Não digo coisas majestosas, roupas bonitas ou charretes, mas comida, comida gostosa e bem temperada, e um cavalo de cartão novo, se por acaso esquecesses o teu no quintal numa noite de chuva. Acreditei que a felicidade dos teus olhos a sorrir podia voltar aos olhos da tua mãe, aos meus e perdurar intocada nos teus. Acreditei em tantas coisas. Sabes, aproximo-me da vila e o que me espera é morrer um pouco mais. Preferia que não o soubesses, mas infelizmente nem isso posso esconder-te, porque um dia, quando te contarem a história da tua vida, dir-te-ão que numa noite de estrelas, o teu pai foi à vila e levou uma sova;
Os olhos são a morada da vergonha.
É Actuando que Devemos Abandonar
Eu odeio, no fundo, toda a moral que diz: «Não faças isto, não faças aquilo. Renuncia. Domina-te…». Gosto, pelo contrário, da moral que me leva a fazer uma coisa, a refazê-la, a pensar nela de manhã à noite, a sonhar com ela durante a noite, e a não ter jamais outra preocupação que não seja fazê-la bem, tão bem quanto for capaz entre todos os homens. A viver assim despojamo-nos, uma a uma, de todas as preocupações que não têm nada a ver com esta vida: vê-se sem ódio nem repugnância desaparecer hoje isto, amanhã aquilo, folhas amarelas que o menor sopro um pouco vivo solta da árvore; ou mesmo nem sequer se dá por isso, de tal modo o objectivo absorve o olhar, de tal modo o olhar se obstina em ver para diante, não se desviando nunca, nem para a direita nem para a esquerda, nem para cima nem para baixo. «É a nossa actividade que deve determinar o que temos de abandonar; é actuando que deixaremos», eis o que amo, eis o meu próprio placitum! Mas eu não quero trabalhar para me empobrecer mantendo os olhos abertos, não quero essas virtudes negativas que têm por essência a negação e a renúncia.
Só o Presente é Verdadeiro e Real
Um ponto importante da sabedoria de vida consiste na proporção correcta com a qual dedicamos a nossa atenção em parte ao presente, em parte ao futuro, para que um não estrague o outro. Muitos vivem em demasia no presente: são os levianos; outros vivem em demasia no futuro: são os medrosos e os preocupados. É raro alguém manter com exactidão a justa medida. Aqueles que, por intermédio de esforços e esperanças, vivem apenas no futuro e olham sempre para a frente, indo impacientes ao encontro das coisas que hão-de vir, como se estas fossem portadoras da felicidade verdadeira, deixando entrementes de observar e desfrutar o presente, são, apesar dos seus ares petualentes, comparáveis àqueles asnos da Itália, cujos passos são apressados por um feixe de feno que, preso por um bastão, pende diante da sua cabeça. Desse modo, os asnos vêem sempre o feixe de feno bem próximo, diante de si, e esperam sempre alcançá-lo.
Tais indivíduos enganam-se a si mesmos em relação a toda a sua existência, na medida em que vivem ad interim [interinamente], até morrer. Portanto, em vez de estarmos sempre e exclusivamente ocupados com planos e cuidados para o futuro, ou de nos entregarmos à nostalgia do passado,
Meu Calvário
Ando sempre a seguir-te… a buscar-te distante
como a visão que anseio e os olhos me seduz,
– e espero te encontrar, sentir de perto a luz
do teu olhar feliz em êxtase constante…Mas tu foges de mim, foges a cada instante,
e eu que a este andar eterno já me predispus,
embora às vezes pare, – sigo logo adiante
sem mesmo perceber que esse amor é uma cruz!Não sei se hás de ser minha! O teu afastamento
cresce à frente de mim, – no entanto, o imaginário
desejo de alcançar-te ergue o meu desalento…E, após tanto sofrer, sentir-me-ei consolado,
– se ao cair no caminho… e ao fim do meu Calvário
for morrer sobre a cruz dos braços teus pregado!
Apartava-Se Nise De Montano
Apartava-se Nise de Montano,
em cuja alma partindo-se ficava;
que o pastor na memória a debuxava,
por poder sustentar-se deste engano.Pelas praias do Índico Oceano
sobre o curvo cajado s’encostava,
e os olhos pelas águas alongava,
que pouco se doíam de seu dano.Pois com tamanha mágoa e saudade
(dezia) quis deixar-me a que eu adoro,
por testemunhas tomo Céu e estrelas.Mas se em vós, ondas, mora piedade,
levai também as lágrimas que choro,
pois assi me levais a causa delas!
Precisava de tanta concentração para engastar escamas, incrustar minúsculos rubis nos olhos, laminar barbatanas e montar nadadeiras que não sobrava um só vazio para encher com a desilusão da guerra
Nos olhos do jovem, arde a chama. Nos olhos do velho brilha a luz.
Corre suave e brando
Com tuas claras águas,
Saídas de meus olhos, doce Tejo.
Enquanto a cor da pele for mais importante que o brilho dos olhos, haverá guerra.
Mas sou sempre eu, assente sobre os mesmos pés. O mesmo sempre, graças ao céu e à terra. E aos meus olhos e ouvidos atentos. E à minha clara simplicidade de alma…
A cegueira quando dá é pelos olhos.
Balada dos Amigos Separados
Onde estais vós Alberto Henrique
João Maria Pedro Ana?
Onde anda agora a vossa voz?
Que ruas escutam vossos passos?
Ao norte? ao sul? aonde? aonde?
José António Branca Rui
E tu Joana de olhos claros
E tu Francisco E tu Carlota
E tu Joaquim?
Que estradas colhem vosso olhar?
Onde anda agora a vossa vida repartida?
A oeste? A leste? Aonde? aonde?
Olho prà frente prà cidade
e pràs outras cidades por trás dela
onde se agitam outras gentes
que nunca ouviram vosso nome
e vejo em tudo a vossa cara
e oiço em tudo o som amigo
a voz de um a voz de outro
e aquele fio de sol que se agitava
sempre
em todos nós
Dançam as casas nesta noite
ébrias de sombra nesta noite
que se prolonga em plena angústia
aos solavancos do destino
e não consegue estrangularmos
Sigo e pergunto ao vento à rua
e a esta ânsia inviolável
que embebe o ar de calafrios
Onde estais vós? onde estais vós?
E por detrás de cada esquina
e por detrás de cada vulto
o vento traz-me a vossa voz
a rua traz-me a vossa voz
a voz de um a voz de outro
toada amiga que me banha
tão confiante tão serena
Aqui aqui em toda a parte
Aqui aqui E tu?
Falar à Humanidade é Demagogia
Esquece-se demasiadamente que todo o autêntico dizer não só diz algo, como diz alguém a alguém. Em todo o dizer há um emissor e um receptor, os quais não são indiferentes ao significado das palavras. Este varia quando aquelas variam. Duo si idem dicunt non est idem. Todo o vocábulo é ocasional. A linguagem é por essência diálogo, e todas as outras formas do falar destituem a sua eficácia. Por isso eu creio que um livro só é bom na medida em que nos traz um diálogo latente, em que sentimos que o autor sabe imaginar concretamente o seu leitor e este percebe como se de entre as linhas saísse uma mão ectoplástica que tacteia a sua pessoa, que quer acariciá-la – ou bem, mui cortesmente, dar-lhe um murro.
Abusou-se da palavra e por isso ela caiu em desgraça. Como em tantas outras coisas, o abuso aqui consistiu no uso sem preocupação, sem consciência da limitação do instrumento. Há quase dois séculos que se acredita que falar era falar urbi et orbi, isto é, a todos e a ninguém. Eu detesto essa maneira de falar e sofro quando não sei concretamente a quem falo.
Contam, sem insistir demasiado sobre a realidade do facto,
Os olhos já vão rompendo a núvem de poeira que se tem levantado diante deles; e o povo algum dia declarar-se-á solenemente contra o escárneo que há 20 anos todos os governos em Portugal dele têm feito. E fatal e tremendo será esse desagravo. Ainda é tempo de remediá-lo, mas não há tempo a perder.
Nunca tive os olhos tão claros e o sorriso em tanta loucura. Sinto-me toda igual às árvores: solitária, perfeita e pura.
Do Viver me Desapossa aquele Riso com que a Vida Dais
Formosos olhos, que na idade nossa
Mostrais do Céu certíssimos sinais,
Se quereis conhecer quanto possais,
Olhai-me a mim, que sou feitura vossa.Vereis que do viver me desapossa
Aquele riso com que a vida dais;
Vereis como de Amor não quero mais,
Por mais que o tempo corra, o dano possa.E se ver-vos nesta alma, enfim, quiserdes,
Como num claro espelho, ali vereis
Também a vossa, angélica e serena.Mas eu cuido que, só por me não verdes,
Ver-vos em mim, Senhora, não quereis:
Tanto gosto levais de minha pena!