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A delicadeza deve concluir-se, e não ver-se. (…) A grosseria só começa quando começa a delicadeza; e o impudor desde que o pudor exista.

Mãe…

Mãe — que adormente este viver dorido,
E me vele esta noite de tal frio,
E com as mãos piedosas ate o fio
Do meu pobre existir, meio partido…

Que me leve consigo, adormecido,
Ao passar pelo sítio mais sombrio…
Me banhe e lave a alma lá no rio
Da clara luz do seu olhar querido…

Eu dava o meu orgulho de homem — dava
Minha estéril ciência, sem receio,
E em débil criancinha me tornava.

Descuidada, feliz, dócil também,
Se eu pudesse dormir sobre o teu seio,
Se tu fosses, querida, a minha mãe!

…Liberdade, essa palavra que o sonho humano alimenta que não há ninguém que explique e ninguém que não entenda…

A Casa

É um chalé com alpendre,
forrado de hera.
Na sala,
tem uma gravura de Natal com neve.
Não tem lugar pra esta casa em ruas que se conhecem.
Mas afirmo que tem janelas,
claridade de lâmpada atravessando o vidro,
um noivo que ronda a casa
— esta que parece sombria —
e uma noiva lá dentro que sou eu.
É uma casa de esquina, indestrutível.
Moro nela quando lembro,
quando quero acendo o fogo,
as torneiras jorram,
eu fico esperando o noivo, na minha casa aquecida.
Não fica em bairro esta casa
infensa à demolição.
Fica num modo tristonho de certos entardeceres,
quando o que um corpo deseja é outro corpo pra escavar.
Uma ideia de exílio e túnel.

Os avarentos amealham como se fossem viver para sempre, os pródigos dissipam, como se fossem morrer.

Nada é indiferente àqueles a quem tudo é indiferente. Um gesto, uma cor, tudo os deleita e os detém até que outra minimidade a destrona.

O desenvolvimento técnico só vai deixar um único problema por resolver: a debilidade da natureza humana.

E muito estranho. Mas eu prefiro pensar que essa melhora inexplicável seja uma prova da existência de Deus, e de que ele me protege.

As cidades não são pátrias. É na província que se encontra o carácter e a mística duma nação, e os grandes escritores deixam-se amarrar ao espírito das terras nulas e sensatas a que extraem um brilho que a pedra polida da capital não tem.

Mesmo que eu observe todos os outros obstáculos (condição física, pais, carácter), obtenho uma desculpa muito boa para não me limitar apenas à literatura apesar de tudo: não posso ousar fazer nada enquanto não tiver um trabalho que me satisfaça plenamente. Isso, é claro, é irrefutável.

Pornografia materializa supremacia masculina. Ela é o DNA de dominância masculina. Cada regra do abuso sexual, cada nuance do sadismo sexual, cada estrada ou caminho secundário de exploração sexual, está codificada nela.

A vida me fez de vez em quando pertencer, como se fosse para me dar a medida do que eu perco não pertencendo. E então eu soube: «pertencer é viver». Experimentei-o com a sede de quem está no deserto e bebe sôfrego os últimos goles de água de um cantil. E depois a sede volta e é no deserto mesmo que caminho.

Ela sabia que se podia amar alguém mais do que qualquer coisa e ainda assim não gostar assim tanto dessa pessoa, se estiver ocupada com outras coisas.

Devemos esforçar-nos por ser razoáveis, mas não por termos razão; a sinceridade acima da infalibilidade.