Textos sobre Alma

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Textos de alma escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

Para a Salvação da Democracia

Ora a democracia cometeu, a meu ver, o erro de se inclinar algum tanto para Maquiavel, de ter apenas pluralizado os príncipes e ter constituído em cada um dos cidadãos um aspirante a opressor dos que ao mesmo tempo declarava seus iguais. Ser esmagada pelos condottieri que dispõem das lanças mercenárias ou pela coalizão dos que manejam o boletim de voto é para a consciência o mesmo choque violento e o mesmo intolerável abuso; um tirano das ilhas vale os trinta de Atenas e os milhares de espartanos. Pode ser esta a origem de muita reacção que parece incompreensível; há almas que se entregaram a outros campos porque se sentiam feridas pela prepotência de indivíduos que defendiam atitudes morais só fundadas na utilidade social, na combinação política. E de facto, o que se tem realizado é, quase sempre, um arremedo de democracia sem verdadeira liberdade e sem verdadeira igualdade, exactamente porque se tomou como base do sistema uma relação do homem com o homem e não uma relação do homem com o espírito de Deus. Por outras palavras: para que a democracia se salve e regenere é urgente que se busque assentá-la em fundamentos metafísicos e se procure a origem do poder não nos caprichos e disposições individuais,

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A Saturação da Servidão

Hoje estão em causa, não as paradas, que é tudo em que as multidões são adestradas, ou a guerra, a que se convidam; está em causa toda uma dinâmica nova para criar o habitat duma humanidade que atingiu a saturação da servidão, depois de há milénios ter dado o passo da reflexão. As pessoas interrogam-se em tudo quanto vivem. A saturação da servidão não é uma revolta; é um sentimento de desapego imenso quanto aos princípios que amaram, os deuses a que se curvaram, os homens que exaltaram. (…) Mas foi crescendo a saturação da servidão, porque a alma humana cresceu também, tornou-se capaz de ser amada espontaneamente; tudo o que servimos era o intermediário do nosso amor pelo que em absoluto nós somos. Serviram-se valores porque neles se representava a aparência duma qualidade, como a beleza, o saber, a força; esses valores estão agora saturados, demolidos pela revelação da verdade de que tudo é concedido ao corpo moral da humanidade e não ao seu executor.
Um grande terror sucede à saturação da servidão. Receamos essa motivação nova que é a nossa vontade, a nossa fé sem justificação a não ser estarmos presentes num imenso espaço que não é povoado pela mitologia de coisa alguma.

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Como é que se Esquece Alguém que se Ama?

Como é que se esquece alguém que se ama? Como é que se esquece alguém que nos faz falta e que nos custa mais lembrar que viver? Quando alguém se vai embora de repente como é que se faz para ficar? Quando alguém morre, quando alguém se separa – como é que se faz quando a pessoa de quem se precisa já lá não está?
As pessoas têm de morrer; os amores de acabar. As pessoas têm de partir, os sítios têm de ficar longe uns dos outros, os tempos têm de mudar Sim, mas como se faz? Como se esquece? Devagar. É preciso esquecer devagar. Se uma pessoa tenta esquecer-se de repente, a outra pode ficar-lhe para sempre. Podem pôr-se processos e acções de despejo a quem se tem no coração, fazer os maiores escarcéus, entrar nas maiores peixeiradas, mas não se podem despejar de repente. Elas não saem de lá. Estúpidas! É preciso aguentar. Já ninguém está para isso, mas é preciso aguentar. A primeira parte de qualquer cura é aceitar-se que se está doente. É preciso paciência. O pior é que vivemos tempos imediatos em que já ninguém aguenta nada. Ninguém aguenta a dor. De cabeça ou do coração.

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Crueldade e Sofrimento

A crueldade é constitutiva do universo, é o preço a pagar pela grande solidariedade da biosfera, é ineliminável da vida humana. Nascemos na crueldade do mundo e da vida, a que acrescentámos a crueldade do ser humano e a crueldade da sociedade humana. Os recém-nascidos nascem com gritos de dor. Os animais dotados de sistemas nervosos sofrem, talvez os vegetais também, mas foram os humanos que adquiriram as maiores aptidões para o sofrimento ao adquirirem as maiores aptidões para a fruição. A crueldade do mundo é sentida mais vivamente e mais violentamente pelas criaturas de carne, alma e espírito, que podem sofrer ao mesmo tempo com o sofrimento carnal, com o sofrimento da alma e com o sofrimento do espírito, e que, pelo espírito, podem conceber a crueldade do mundo e horrorizar-se com ela.
A crueldade entre homens, indivíduos, grupos, etnias, religiões, raças é aterradora. O ser humano contém em si um ruído de monstros que liberta em todas as ocasiões favoráveis. O ódio desencadeia-se por um pequeno nada, por um esquecimento, pela sorte de outrem, por um favor que se julga perdido. O ódio abstracto por uma ideia ou uma religião transforma-se em ódio concreto por um indivíduo ou um grupo;

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A Única Coisa que Desculpa o Casamento é o Amor

Na carta que lhe escrevi dava-lhe, como me tinha pedido, a minha opinião sobre o casamento. É a seguinte: acho o casamento uma coisa revoltante! E isto por uma única razão mas que para mim é tudo, para mim e para aquelas mulheres que não são apenas fêmeas, para todas as delicadas, para todas as que têm pudor, espírito e consciência. Essa razão é a posse, essa suprema e grande lei da Natureza que, no entanto, revolta tudo quanto eu tenho de delicado e bom no íntimo da minha alma. Ganha-se um amigo muitas vezes, é certo; um amigo que às vezes é o nosso supremo amparo, mas em compensação quantas revoltas, quantas mágoas, quantas desilusões! Quantas!… A minha querida faz bem, faz muito bem em não se querer sujeitar ao mercado, à venda. Eu casei e casei por amor. É a única coisa que desculpa, no meu entender, o casamento, porque do contrário, quando nele apenas entram o interesse e a ambição, revolta-me e indigna-me.

A Essência das Coisas

Nunca me conformei com um conceito puramente científico da Existência, ou aritmético-geométrico, quantitativo-extensivo. A existência não cabe numa balança ou entre os ponteiros dum compasso. Pesar e medir é muito pouco; e esse pouco é ainda uma ilusão. O pesado é feito de imponderáveis, e a extensão de pontos inextensos, como a vida é feita de mortes.
A realidade não está nas aparências transitórias, reflexos palpitantes, simulacros luminosos, um aflorar de quimeras materiais. Nem é sólida, nem líquida, nem gasosa, nem electromagnética, palavras com o mesmo significado nulo. Foge a todos os cálculos e a todos os olhos de vidro, por mais longe que eles vejam, ou se trate dum núcleo atómico perdido no infinitamente pequeno, ou da nebulosa Andrómeda, a seiscentos mil anos de luz da minha aldeia!
A essência das coisas, essa verdade oculta na mentira, é de natureza poética e não científica. Aparece ao luar da inspiração e não à claridade fria da razão. Esta apenas descobre um simples jogo de forças repetido ou modificado lentamente, gestos insubstanciais, formas ocas, a casca de um fruto proibido.
Mas o miolo é do poeta. Só ele saboreia a vida até ao mais íntimo do seu gosto amargoso,

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Pense por si Próprio

Do que você precisa, acima de tudo, é de se não lembrar do que eu lhe disse; nunca pense por mim, pense sempre por você; fique certo de que mais valem todos os erros se forem cometidos segundo o que pensou e decidiu do que todos os acertos, se eles foram meus, não são seus. Se o criador o tivesse querido juntar muito a mim não teríamos talvez dois corpos distintos ou duas cabeças também distintas. Os meus conselhos devem servir para que você se lhes oponha. É possível que depois da oposição, venha a pensar o mesmo que eu; mas, nessa altura. já o pensamento lhe pertence. São meus discípulos, se alguns tenho, os que estão contra mim; porque esses guardaram no fundo da alma a força que verdadeiramente me anima e que mais desejaria transmitir-lhes: a de se não conformarem.

Enfrentar-se a Si Próprio

Ódio da introspecção activa. Explicações da nossa alma, tais como: ontem eu estava assim e assado, por esta ou por aquela razão; hoje estou assim e assado, por qualquer outra razão. Não é verdade, nem por esta razão nem por aquela razão, e por isso também nem assim nem assado.
Enfrentar-se a si próprio calmamente, sem precipitações, viver como se tem de viver, não andar à caça do próprio rabo como o cão.
Adormeci nos arbustos. Um barulho acordou-me. Encontrei um livro nas minhas mãos, que tinha estado a ler. Deitei-o fora e levantei-me de um salto. Passava pouco do meio-dia; em frente da colina em que eu estava estendia-se uma grande planura com aldeias e lagos e sebes todas iguais, altas, que pareciam feitas de junco. Pus as mãos nas ancas, examinei tudo com o olhar, e ao mesmo tempo escutei o barulho.

Felicidade e Prazer

Devemos estudar os meios de alcançar a felicidade, pois, quando a temos, possuímos tudo e, quando não a temos, fazemos tudo por alcançá-la. Respeita, portanto, e aplica os princípios que continuadamente te inculquei, convencendo-te de que eles são os elementos necessários para bem viver. Pensa primeiro que o deus é um ser imortal e feliz, como o indica a noção comum de divindade, e não lhe atribuas jamais carácter algum oposto à sua imortalidade e à sua beatitude. Habitua-te, em segundo lugar, a pensar que a morte nada é, pois o bem e o mal só existem na sensação. De onde se segue que um conhecimento exacto do facto de a morte nada ser nos permite fruir esta vida mortal, poupando-nos o acréscimo de uma ideia de duração eterna e a pena da imortalidade. Porque não teme a vida quem compreende que não há nada de temível no facto de se não viver mais. É, portanto, tolo quem declara ter medo da morte, não porque seja temível quando chega, mas porque é temível esperar por ela.
É tolice afligirmo-nos com a espera da morte, visto ser ela uma coisa que não faz mal, uma vez chegada. Por conseguinte, o mais pavoroso de todos os males,

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A Alma Dominada pela Solidão

Se protegerdes com demasiada devoção o jardin secret da tua alma, ele pode facilmente começar a florescer de um modo excessivamente luxuriante, transbordar para além do espaço que lhe estava reservado e tomar mesmo pouco a pouco posse da tua alma de domínios que não estavam destinados a permanecer secretos. E é possível que toda a tua alma acabe por se tornar um jardim bem fechado, e que no meio de todas as suas flores e dos seus perfumes ela sucumba à sua solidão.

Corpo e Espírito

A maior parte das pessoas tem um corpo que, ou é desleixado, formado e deformado pelo acaso, e que parece quase não ter relação com o seu espírito e o seu carácter, ou então é recoberto pela máscara do desporto que lhe dá o aspecto daquelas horas em que ele tirou férias de si próprio. Essas são aquelas horas em que um homem desfia o sonho diurno da sua boa figura, que foi buscar às revistas do grande mundo da elegância e da beleza. Todos esses jogadores de ténis, cavaleiros e corredores de automóveis, bronzeados e musculosos, com ares de baterem todos os recordes, apesar de, em geral, dominarem apenas razoavelmente a sua especialidade, essas damas bem vestidas ou bem despidas, sonham sonhos diurnos, e só se distinguem do comum dos mortais que têm sonhos despertos porque o seu sonho não permanece encerrado no cérebro, mas sai para o ar livre, como projecção da alma das massas, configurada de forma corpórea, dramática, quase apetecia dizer, na linguagem de fenómenos ocultos mais que suspeitos, ideoplástica. Mas têm em comum com os vulgares construtores de fantasias uma certa banalidade dos seus sonhos, tanto no que se refere ao conteúdo como à proximidade do estado de vigília.

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Ter Opiniões Definidas e Certas

Ter opiniões definidas e certas, instintos, paixões e carácter fixo e conhecido – tudo isto monta ao horror de tornar a nossa alma um facto, de a materializar e tornar exterior. Viver num doce e fluido estado de desconhecimento das coisas e de si próprio é o único modo de vida que a um sábio convém e aquece.

Vítimas e Vencidos

A ilusão constante da Revolução está em acreditar que as vítimas da força, estando inocentes das violências que se exercem, se lhes colocássemos na mão a força, a manuseariam com justiça. Mas à excepção das almas que estão bastante próximas da santidade, as vítimas são maculadas pela força como os carrascos. O mal que se encontra no punho da espada é transmitido para a ponta. E as vítimas, chegadas assim a este ponto e inebriadas pela mudança, fazem tanto mal ou mais ainda, e de imediato reincidem.
(…) O socialismo consiste em atribuir o bem aos vencidos, e o racismo aos vencedores. Mas a asa revolucionária do socialismo serve-se daqueles que, ainda nascidos em baixo, são por natureza e por vocação vencedores, e assim conduz à mesma ética.

Paixão Única

Quem me dera poder ver-te!
Ai! quem me dera dizer-te,
Que pude amar-te, e perder-te,
Mas olvidar-te… isso não!
Que no ardor de outros amores,
Através de mil dissabores,
Senti vivas sempre as dores
Duma remota paixão.

Com que dorida saudade
Penso nessa mocidade,
Nessa vaga ansiedade,
Que soubeste compreender!
E tu só, só tu soubeste,
Que, num mundo, como este,
Qual florinha em penha agreste,
Pode a flor da alma morrer.

Orvalhaste-a quando ainda,
Ao nascer, singela e linda,
Respirava a esperança infinda,
Que consigo a infância tem.
Amparaste-a, quando o norte
Das paixões, soprando forte,
Lhe quiz dar rápida morte
Como à cândida cecem!

E, depois, nuvem escura
Lá no céu desta ventura
Enlutou-me a aurora pura
Dos meus anos infantis.
Houve nesta vida um espaço,
Onde nunca dei um passo,
Em que não deixasse um traço
De paixões torpes e vis !

E não tenho outra memória
Que me inspire altiva gloria,
Nem outro nome na historia
De meus delírios fatais.

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A Alma do Amor

Quando um homem, quer tenda para os rapazes ou para as mulheres, encontra aquele mesmo que é a sua metade, é um prodígio como os transportes de ternura, confiança e amor os tomam. Eles não desejariam mais separar-se, nem por um só instante. E pensar que há pessoas que passam a vida toda juntas, sem poder dizer, diga-se de passagem, o que uma espera da outra; pois não parece que seja o prazer dos sentidos que lhes faça encontrar tanto encanto na companhia uma da outra. É evidente que a alma de ambas deseja outra coisa, que não pode dizer, mas que adivinha e deixa adivinhar.

A Moderação é o Caminho para a Felicidade

Se a princípio a profusão e a variedade de diversões parecem contribuir para a felicidade, se a uniformidade de uma vida igual parece a princípio enfastiante, considerando-se melhor, percebe-se, pelo contrário, que o hábito mais doce da alma consiste numa moderação de gozo que deixa pouco espaço ao desejo e ao desgosto.

A Opinião Pura e Elevada

A opinião que se emite ou a regra que se estabelece não tem que se importar com as circunstâncias em que se encontram os homens nem com as possibilidades de acolhimento ou recusa que o mundo lhe oferece; o que é hoje grão seco levanta-se amanhã sobre as ondas do campo como a espiga mais alta e mais cheia; o culto da verdade não se compadece com a adoração dos deuses que presidem aos dias nem com a vã agitação que é de regra no formigueiro humano; cada um tomará o que se diz como quiser; a sua atitude, porém, só interessará enquanto fenómeno base para uma nova legalidade.
Não há aqui nem indiferença, nem egoísmo; é mais larga a alma que a par do amor dos homens actuais sente vibrar o amor dos homens do futuro, mais forte o espírito que se orienta para o eterno; a justiça sempre o terá a seu lado armado de todas as armas, não porque sinta para ela um impulso momentâneo mas porque a defende em qualquer tempo; e sempre se há-de recusar, sejam quais forem as razões, a passar em claro uma injustiça ou a servir-se de qualquer meio, apenas porque tal proceder se aparenta vantajoso aos seus interesses ou aos interesses dos seus amigos.

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Testemunhas Aparentes

Não me preocupa tanto qual eu seja para outrem como me preocupa qual eu seja em mim mesmo. Quero ser rico por mim, não por empréstimo. Os estranhos vêem apenas os acontecimentos e as aparências externas; cada qual pode ter um ar alegre exteriormente e por dentro estar cheio de febre e receio. Eles não vêem o meu coração; vêem apenas o meu comportamento. Tem-se razão em depreciar a hipocrisia que existe na guerra; pois o que é mais fácil para um homem oportunista do que esquivar-se dos perigos e fazer-se de bravo, tendo o ânimo repleto de frouxidão? Há tantos meios de evitar as ocasiões de arriscar-se pessoalmente que teremos enganado o mundo mil vezes antes de encetarmos um passo perigoso; e mesmo então, vendo-nos entravados, nesse momento bem sabemos encobrir o nosso jogo com um ar alegre e uma palavra serena, embora a alma nos trema interiormente.
E se alguém pudesse usar o anel de Platão, que tornava invisível quem o levasse no dedo e o virasse para a palma da mão, muitas pessoas amiúde se esconderiam quando mais é preciso apresentar-se e se arrependeriam de estar colocadas num lugar tão honroso, no qual a necessidade as torna seguras: Quem pode alegrar-se com falsas honrarias e temer a calúnia,

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Imitadores

Os homens não descendem dos macacos, mas desenvolvem todos os esforços para o fazer crer. O pecado original aproximou-nos dos animais e toda a alma é, de uma maneira ou de outra, uma crestomia zoológica. O que Dante diz das ovelhas – «e o que uma faz primeiro as outras imitam» – poder-se-ia aplicar a quase todos nós.
Desde que Adão resolveu imitar Eva e mordeu o fruto, somos, a despeito da nossa ilusão em contrário, uma sucessão infinita de cópias. Um único cunho – em regra, chamado génio – basta para imprimir milhares e milhares daquelas moedas vulgares que circulam pela Terra. E o génio nem sempre se liberta da servidão universal da imitação. Toda a vida é um mosaico de plágios.
A maioria imita por preguiça, para se poupar o trabalho de procurar e inventar, ou por prudência, que aconselha os caminhos percorridos e as experiências coroadas de êxito. Compreende-se que a humildade, embora rara, leve naturalmente quem a possui a imitar aqueles que reconhece superiores, mas a própria soberba, que deveria afastar da repetição, torna-nos macacos. Se viver é distinguir-se, o orgulhoso deveria providenciar para não se parecer com ninguém. Mas a inveja, sob a sonante designação da emulação,

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A Companhia do Amor

O que eu sinto não seria para si uma coisa nova de que necessitasse uma clara afirmação; é o mesmo que eu sentia quando passeávamos ambos nas areias da Costa Nova. Ou antes, não é o mesmo sentimento: é outro mais belo, mais completo; porque tendo, apesar de tudo, ficado comigo, desde que nos separámos, e tendo sido o doce e fiel companheiro da minha vida desde então – esse sentimento penetrou-me de um modo mais absoluto e mais absorvente, exaltou-se e idealizou-se, e de tal sorte me invadiu todo que eu cheguei a não ter pensamento, ideia, esperança, plano, a que não estivesse misturada a sua imagem. E na Costa Nova ainda não era assim. Dizer porque é que eu, apesar de tudo, insistia em pensar em si, não sei. O facto de não serem dependentes da vontade os movimentos do coração não é uma suficiente explicação: porque eu podia resistir à importunidade desta ideia, e em lugar disso abandonava-me a ela como à minha única alegria. Devo portanto concluir que havia um pressentimento latente, uma vaga quase certeza, uma fé secreta de que a afinidade que existe entre as nossas naturezas se viria um dia a manifestar apesar de tudo,

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